Produtos da Civilização: Um Neonazista Opressor analisado pelo Judeu Oprimido?

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Fazendo uso dos conhecimentos possibilitados por Freud, em “O Mal-Estar na Civilização”, como a impossibilidade de se amar incondicionalmente o próximo e a produção de sofrimento causada pelo processo civilizatório para que possamos viver em harmonia, realizei um trabalho cuja proposta foi analisar a dinâmica social colocada sob os dois personagens principais do longa-metragem “Um Skinhead no Divã” e possibilitar um olhar mais critico acerca daquilo que chamamos de “civilização”.

“Um Skinhead no Divã” é uma produção Sueca de 1993, quinto filme da Diretora Suzane Osten, que apresenta dois indivíduos, frutos de uma mesma civilização, porém, antagônicos. De um lado encontramos Soren, um jovem Neonazista, um skinhead; e do outro Jacob, um psiquiatra judeu que se dispõe a ajudar o primeiro com as suas questões, rumo ao melhor entendimento de sua vida psíquica.

Tudo se inicia com o encontro desses dois personagens em um trem, local no qual o psiquiatra vem a cuidar de alguns ferimentos do neonazista e a convida-lo para ir a seu consultório. Esse filme diz muito da sociedade nazista e dos indivíduos os quais ela produziu, sejam os agressores ou os agredidos, trazendo um pouco acerca de um processo de (não) civilização que se fez presente e causou atrito entre dois grandes grupos culturais.

Existe ódio na relação que foi estabelecida, como não o poderia? Um se torna igual a um violento grupo que odeia os supostos diferentes e o outro é o “diferente”. Toda essa trama de ódio pode ser problematizada a partir da Obra de Sigmund Freud, “O Mal-Estar na Civilização”, a qual nos fornece ferramentas para compreender melhor de onde surge tanto ódio e por que ele é descarregado de forma tão hostil e até mesmo elucidar por que o outro, diferente de mim, merece meu ódio e não o meu amor.

Pode-se inferir, segundo Freud, que a civilização tenta frear a grande descarga de ódio direcionada no outro, isso para que seja possível estabelecer alguma ordem entre os humanos, para que seja possível as pessoas se unirem e viverem juntas, dentro de uma organização social estável. Mas esse ódio não desaparece, ele precisa ser direcionado para algo/alguém, a solução é desferir o ódio contra si mesmo, assim nasce a grande instância do Super-eu que vem a lhe vigiar e a lhe causar sensações de culpa, não apenas por infligir regras sociais, mas por meramente pensar em infringi-las.

Soren aparenta se sentir culpado por descarregar tanto ódio no meio externo, no outro, mas acaba por sofrer ao realizar o caminho inverso. O terapeuta vem para ajuda-lo a compreender a organização social a qual ele se insere e a mostrar que ele, e o seu grupo, não são tão diferentes quanto parece.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

UM SKINHEAD NO DIVÃ

Diretor: Suzanne Osten
Elenco: Etienne Glaser; Simon Norrthon; Anna-Yrsa Falenius e outros.
País: Suécia
Ano: 1993
Classificação: 16

 

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Responsabilidade Social e Comunidade

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Um dia em que a universidade estreita laços com a comunidade: assim é o Dia da Responsabilidade Social, uma iniciativa do CEULP/ULBRA que estimula a participação dos acadêmicos em ações socialmente responsáveis, na medida em que oferece á comunidade uma gama de atividades que envolvem: educação, saúde, cultura e meio ambiente, visando o bem-estar e a qualidade de vida da população.

Esta ação faz parte do Dia da Responsabilidade Social do Ensino Superior Particular, desenvolvida pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), com o intuito de mostrar atividades resultantes dos projetos de ensino, pesquisa e extensão desenvolvidos pelo CEULP/ULBRA.

Este ano, a atividade aconteceu na Escola Municipal Maria Rosa de Castro Sales – localizada no Setor Morada do Sol – Palmas/TO, tendo a participação de acadêmicos dos cursos de dos cursos de Ciências Contábeis, Direito, Educação Física, Farmácia, Fisioterapia, Medicina Veterinária, Odontologia, Psicologia, entre outros.

Entre as atividades realizadas estavam na Programação (2014): bazar solidário; educação em questões de zoonoses endêmicas; orientações sobre a importância do uso do protetor solar em adultos e crianças e distribuição de amostras manipuladas pelos acadêmicos; avaliação de pressão arterial e realizar ausculta cardíaca; sala dos direitos da criança; atividades lúdicas; recreação e lutas; exposição sobre o tema higiene bucal; oficinas de materiais de recicláveis; campanha de imunização; realização de testes rápidos para dosagens de glicemia e tipagem sanguínea em lâmina;  prática da higienização e esfoliação, seguida de hidratação e fotoproteção facial, dos pais das crianças participantes do evento; entre outras.

O (En)Cena ouviu alguns acadêmicos que estavam desenvolvendo atividades. Eles falaram sobre a ação e a importância da mesma para a comunidade local e sua formação.

Laureano Silva de Carvalho – Acadêmico do curso de Fisioterapia.

“Eu acho que é um dia muito importante, pois envolve o nosso curso com ações diretamente na comunidade, principalmente na comunidade mais carente. Isso faz com que cada curso, cada pessoa possa observar na comunidade que o seu curso é importante, e ver como ele pode trabalhar isso de uma forma responsável.

Estamos disponibilizando avaliação na parte corporal e também tratamento de forma gratuita, dessa forma podemos inserir nosso curso na comunidade. Tratamento de acordo com a avaliação, cada pessoa vai receber um diagnóstico fisioterapeutico e cada pessoa vai fazer o tratamento conforme o diagnóstico.”

Camila Alves Nascimento – Acadêmica do curso de Biomedicina.

A contribuição para o meu curso é poder ter a oportunidade de lidar com o paciente, oportunidade de humanização, de novas pesquisas, de ser algo diferente, de solidário, ser uma ação solidária. É um conhecimento diferente porque a gente, os biomédicos, não lida com os pacientes, diretamente. Ficamos lá dentro do laboratório, então quem tem o contato com o paciente é o coletor, o recepcionista que fica lá fora, logo é bom ter o contato com paciente,  perguntar o histórico e tudo.

O bom para a comunidade é poder fazer um teste sanguíneo, pois tem gente que não tem condições, fazer um exame para medir a glicemia, aferir a pressão… muita gente aqui, carente, não tem condições para fazer. É bom contribuir.”

Wandressa Salazar – Acadêmica do curso de Estética e Cosmética.

“É importante estarmos aqui. O curso estética e cosmética está oferecendo hoje um protocolo de hidratação facial. Para nós da área é relevante porque estamos tendo o contato com as pessoas antes mesmo de terminar o curso, um contato mais na prática.

Para a comunidade eu vejo que é importante porque eles vão saber o que a gente faz lá, pois tem muita gente que não conhece ainda o nosso trabalho, apesar de ser uma coisa que está aí na mídia.”

Luzia Gonzaga Vieira – Acadêmica do curso de Educação Física.

Olha, é muito importante, porque, para a gente que está iniciando o curso é o nosso contato com a comunidade, porque é a nossa profissão que iremos atuar no futuro, logo, temos contato com a prática e validamos o que estamos aprendendo na teoria. O contato é muito importante, porque além de nos socializar com a comunidade ainda nos proporciona o prazer daquilo que nós vamos fazer futuramente.

A comunidade se beneficia porque as pessoas participam das diversas atividades e ainda se socializam não só com os colegas de turma, mas com a sociedade em geral. Aqui não tem como ficar parado, e é muito prazeroso de estar fazendo parte desse movimento.”

Érica Araújo Gomes – Acadêmica do curso de Psicologia.

“A gente passa para as crianças que é possível reutilizar o material reciclável, como brinquedos bem legais. Ver o rosto das crianças, todo mundo feliz, é muito gratificante, saber que nosso trabalho está atingindo eles de alguma forma, que ficam felizes, que dá para passar essa ideia que o material dá pra ser reutilizado.

Para formação importante, agrega bastante conhecimento, este contato traz troca, tanto a criança que vem e a gente, vai conversando… Então esse momento é muito gratificante e esse dia com certeza vai ficar marcado na memória como um dia muito legal.”

Neide Carvalho da Silve – Acadêmica do curso de Serviço Social.

Hoje é o dia da responsabilidade social e, quando se trata desse assunto, eu acho que remete ao nosso curso, dessa responsabilidade, enquanto profissional, de estar na responsabilização de direito do indivíduo, dessa inserção dele, enquanto indivíduo, na sociedade, na busca de seus direitos. É o dia que trabalhamos essa responsabilidade social levando pra sociedade, principalmente assim, hoje, adolescente, criança, é entender de direito, e isso faz parte do contexto social, enquanto você profissional, você pode, se pautar na ética no profissionalismo e de forma que você contribua para a sociedade fazendo essa ponte de direito de ser humano na sociedade.”

Para saber mais sobre o evento:

http://ulbra-to.br/noticia/2014/09/22/Confira-como-foi-o-Dia-da-Responsabilidade-Social

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O teu cabelo não nega mulata – um pouco do que se pode ler nas entrelinhas das marchinhas de carnaval

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Agora que os blocos carnavalescos tradicionais voltaram com tudo no Rio de Janeiro e já começaram a se popularizar em outras praças, as marchinhas tornaram-se novamente a trilha sonora de muita gente.

Um ritmo contagiante, que surge lá no início do século passado de uma mistura de ritmos portugueses a qual se acrescenta, nos anos seguintes, um pouco do swing americano, a marchinha é democrática ao possibilitar que se dance com o estilo que se desejar. Nada de passos difíceis, ou requebros impossíveis para alguns. Para dançar ao ritmo da marchinha o que conta é a diversão, de todo e qualquer jeito, naquilo que poderia ser chamado até de estilo livre, onde vale inclusive aquela dancinha com os dedinhos para cima, tão habitué das pessoas mais tímidas ou dos gringos que por aqui aparecem na época de carnaval.

E é nesse ritmo que as letras, que tradicionalmente têm alguns refrãos de fácil memorização, vão sendo cantadas sem que seu significado seja plenamente assimilado. Entretanto, ao mergulhar nos sentidos das letras e contextualizando-as com o momento em que foram escritas percebemos que temos em mãos quase que um tratado antropológico da vida social de um povo. Ali se tem história, sociedade, cultura, tradição e mil outras particularidades expostas a quem se dispor a estudá-las e entendê-las.

 

 

Desde “Ó Abre Alas”, que é considerada a primeira marcha composta para um carnaval em 1899, e que foi composta, pasmem (fim do século retrasado, lembrem-se), por uma mulher, a compositora e maestrina carioca Chiquinha Gonzaga, temos as marchinhas mostrando ao mundo ao que vieram.

É divertido ver, em uma época em que a mulher ainda buscava seu lugar no mundo então essencialmente masculino, a Colombina dando um belo de um pontapé no pobre “Pierrô Apaixonado” (Noel Rosa e Heitor dos Prazeres, 1935) que estava a lhe encher a paciência, chorando, chorando:

Um Pierrô apaixonado
Que vivia só cantando

Por causa de uma Colombina
Acabou chorando, acabou chorando!

A Colombina entrou no botequim
Bebeu, bebeu, saiu assim, assim
Dizendo: ‘Pierrô cacete! Vai tomar sorvete com o Arlequim!’
Um grande amor tem sempre um triste fim

Com o Pierrô aconteceu assim
Levando este grande chute
Foi tomar vermute com amendoim.

Bom, em dias atuais poderíamos até pensar se a Colombina não estava era insinuando ao Pierrô que procurasse curar sua dor-de-cotovelo amorosa buscando consolo com o Arlequim.

Não é de hoje que as condições climáticas aliadas às péssimas condições de moradia davam a devida deixa para que as marchinhas expusessem a grita da comunidade.  Na “Marcha do Caracol” (Peter Pan e Afonso Teixeira, 1951), é ilustrada a insatisfação popular com a situação vivida naqueles tempos e que, convenhamos, só fez piorar até hoje.

Há quanto tempo não tenho onde morar
Se é chuva apanho chuva/Se é sol apanho sol
Francamente, pra viver nessa agonia
Eu preferia ter nascido caracol

Levava a minha casa nas costas muito bem
Não pagava aluguel nem luvas a ninguém!
Morava um dia aqui, um outro acolá
Leblon, Copacabana, Madureira ou Irajá!

 

Da mesma forma era ilustrada nas marchinhas a insatisfação com as condições socioeconômicas, além da própria questão da moradia, como o “Pedreiro Waldemar” (Roberto Martins e Wilson Batista, 1947) que pegava o trem de madrugada, comia a marmita que levava embrulhada no jornal, construía muitas casas e não tinha onde morar.

 

Você conhece o pedreiro Waldemar?
Não conhece, mas eu vou lhe apresentar
De madrugada toma o trem da circular
Faz tanta casa e não tem casa pra morar

Leva a marmita embrulhada no jornal
Se tem almoço, nem sempre tem jantar
O Waldemar, que é mestre no ofício
Constrói o edifício e depois não pode entrar

 

Vale lembrar que o carnaval das marchinhas concentrava-se no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, e estas acabavam registrando a realidade local como se fossem crônicas do cotidiano. Por isso grande parte das críticas acabava ligada à realidade local.  Foi o caso de Vagalume (Vítor Simon e Fernando Martins, 1954) que retratava de forma divertida a não tão divertida falta de água e luz que a cidade vivia nos anos 1950.

 

Rio de Janeiro
Cidade que nos seduz
De dia falta água

De noite falta luz.

Abro o chuveiro
Não cai nem um pingo
Desde segunda
Até domingo.

Eu vou pro mato
Ai! pro mato eu vou
Vou buscar um vagalume
Pra dar luz ao meu chatô.

 

Mas, da mesma forma que havia espaço para a crítica social, havia também o machismo, o preconceito em relação às diferenças e às minorias, algo que hoje, em tempo de patrulha do politicamente correto, seria inconcebível. Ainda que inconcebível tal pensamento hoje em dia, são estas marchinhas que retornam do passado machista e preconceituoso para serem tocadas nos blocos que se apresentam nos carnavais atuais.

 

Os gagos têm sua vez na pilhéria na marchinha “Piada de Salão” de Klécius Caldas e Armando Cavalcanti, de 1954, também conhecida como “Marcha do Gago”, que apresenta o incompreensível diálogo entre o cliente e o dono do botequim, ambos gagos.

 

“É ou não é
Piada de salão
Se acha que não é
Então não conto não.

Um sujeito que era gago
Procurou um botequim
Chegou perto do gerente
Outro gago bem ruim

E disse assim:
Eu estou, tô, tô, tô, tô
Aonde é que está, tá, tá
Mas o outro gaguejou
Chi! tra, rá, rá, rá, rá.”

Vem lá de 1920 a crítica machista que se mostra no finalzinho da letra de Pé de Anjo (Sinhô), quando a mulher é comparada à galinha no quesito “interesse”.

 

Eu tenho uma tesourinha
Que corta ouro e marfim
Serve também pra cortar
Línguas que falam de mim

O pé de anjo, o pé de anjo
És rezador, és rezador
Tens o pé tão grande
Que és capaz de pisar nosso senhor

A mulher e a galinha
São dois bichos interesseiros
A galinha pelo milho
E a mulher pelo dinheiro

 

Evidente que a posição da mulher como um objeto de interesse sexual tem seu lugar, inclusive abrindo espaço para uma crítica ao comportamento de algumas mulheres que aparentemente faziam por merecer as alcunhas que lhe eram conferidas. Assim era com “Maria Escandalosa” (Klécius Caldas e Armando Cavalcanti, 1955).

 

Maria escandalosa
Desde criança sempre deu alteração
Na escola, não dava bola
Só aprendia o que não era da lição

Depois a Maria cresceu
Juízo que é bom encolheu

E a Maria escandalosa
É muito prosa, é mentirosa, mas é gostosa

Hoje ela não sabe nada
De história, de geografia
Mas seu corpo de sereia
Dá aulas de anatomia

Maria escandalosa
É muito prosa, é mentirosa, mas é gostosa

 

Pulando para 1960 tem-se uma amostra do preconceito em relação aos indígenas, quando o que se espera de um índio é que ele, tal qual no período colonial, seja facilmente comprado por algum presente vindo dos brancos. E o que é apresentado na marchinha é que, quando se espera que o índio busque algo melhor do que um colar esquisito, tem-se que “Índio quer apito” (Haroldo Lobo e Milton de Oliveira).

Ê ê ê ê ê índio quer apito
Se não der pau vai comer

Lá no bananal mulher de branco
Levou pra pra índio colar esquisito
Índio viu presente mais bonito
Eu não quer colar
Índio quer apito

 

A orientação sexual também não foi poupada e João Roberto Kelly teve grande participação nisso desde a sua ordem para cortar a Cabeleira do Zezé (João Roberto Kelly e Roberto Faissal, 1964) até a sua percepção, já nos anos 1980, de que o sapatão era um sucesso dentro e fora do país, como é até hoje cantado em “Maria Sapatão” (João Roberto Kelly, Don Carlos, Chacrinha e Leleco, 1980). Em sua defesa, deve-se ressaltar que João Roberto Kelly sempre afirmou que “Cabeleira do Zezé” tinha como alvo os jovens da década de 60 que começavam a usar cabelos compridos, não tendo nada a ver com a questão sexual.

Olha a cabeleira do Zezé
Será que ele é
Será que ele é
Será que ele é bossa nova
Será que ele é maomé
Parece que é transviado
Mas isso eu não sei se ele é
Corta o cabelo dele!

Corta o cabelo dele!

   Maria Sapatão
Sapatão, Sapatão
De dia é Maria
De noite é João

O sapatão está na moda
O mundo aplaudiu
É um barato
É um sucesso
Dentro e fora do Brasil

Nada mais interessante do que os versos de “O teu cabelo não nega” (Lamartine Babo-Irmãos Valença, 1931) que são cantados ano a ano sem que se dê a devida atenção a sua letra que acaba por traduzir a forma como o racismo é encarado no Brasil: ao mesmo tempo em que se diz que o povo brasileiro não é racista e que enaltece todas as etnias tem-se um preconceito velado mostrando-se de forma sutil em pequenos sinais que se observa no dia a dia. Isso vê-se refletido  na letra desta marchinha que, antes mesmo de enaltecer a beleza da mulata, adverte de que o seu amor é objeto de desejo porque a cor não se pega:  “mas como a cor não pega mulata, mulata eu quero o teu amor”.

O teu cabelo não nega mulata
Porque és mulata na cor
Mas como a cor não pega mulata
Mulata eu quero o teu amor

Tens um sabor bem do Brasil
Tens a alma cor de anil
Mulata mulatinha meu amor
Fui nomeado teu tenente interventor

Quem te inventou meu pancadão
Teve uma consagração
A lua te invejando faz careta
Porque mulata tu não és deste planeta

Quando meu bem vieste à terra
Portugal declarou guerra
A concorrência então foi colossal
Vasco da gama contra o batalhão naval

As marchinhas também serviram para traduzir uma visão geral que havia à época (e que ainda se observa país afora hoje em dia) das condições privilegiadas do funcionalismo público. É assim com “Maria Candelária” (Klécius Caldas e Armando Cavalcanti, 1952) que explicita a forma como alguns funcionários públicos são alçados às suas funções (saltou de paraquedas, caiu na letra) ao mesmo tempo em que são displicentes quanto às suas obrigações trabalhistas.

 

Maria Candelária é alta funcionária
Saltou de paraquedas, caiu na letra ó, ó, ó, ó, ó!
Começa ao meio-dia

Coitada da Maria!

Trabalha, trabalha
Trabalha de fazer dó, ó, ó, ó, ó!
À uma, vai ao dentista
Às duas, vai ao café
Às três, vai à modista

Às quatro, assina o ponto e dá no pé!
Que grande vigarista que ela é!…

Claro que para conseguir um empreguinho público sem a necessidade do devido retorno em termos de trabalho efetivo necessita-se de uma indicação de alguém. E nada melhor para esse alguém do que um “Cordão dos Puxa-sacos” (Frazão e Roberto Martins, 1945)

 

Lá vem o cordão dos puxa-sacos, dando vivas aos seus maiorais
Quem está na frente é passado pra trás
E o cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais
Vossa Excelência, Vossa Eminência

Quanta reverência nos cordões eleitorais
Mas se o doutor cai do galho e vai ao chão
A turma toda ‘evolui’ de opinião
E o cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais

 

A ambiguidade, o duplo sentido, não podiam ficar de fora. “Sassaricando” (Luiz Antônio, Zé Mario, Oldemar Magalhães, 1951) já tem no seu nome a ideia de algo ligado à malícia brasileira. O interessante é ver que até o velho, na porta da Colombo, é um assombro. E óbvio que quem não tem seu sassarico, sassarica mesmo só!

 

Sá-sassaricando
Todo mundo leva a vida no arame

Sá-sassaricando
A viúva, o brotinho e a madame!
O velho, na porta da Colombo
É um assombro

Sassaricando
Quem não tem seu sassarico
Sassarica mesmo só
Porque sem sassaricar
Essa vida é um nó

 

A coisa fica um pouco mais apelativa em algumas marchinhas como “Diabo sem Rabo” (Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, 1938) que usavam do duplo sentido para fazer graça nos blocos carnavalescos.

 

A minha fantasia é de diabo
Só falta o rabo, só falta o rabo
Eu vou botar um anúncio no jornal:
Precisa-se de um rabo pra brincar no carnaval

Já comprei lança, carapuça, comprei tudo/Até o pé-de-pato e a capa de veludo
Mas, que diabo! Puxa, puxa, que diabo!
Depois de tudo pronto eu notei que falta o rabo

 

Nem sempre a malícia é proposital. Característica que parece ser natural do brasileiro, quando a letra não traz em si claramente a tal malícia acaba sendo o próprio povo que dá um jeito de inventar. Foi assim com “A História da Maçã” (Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, 1954).

 

A história da maçã
É pura fantasia
Maçã igual aquela
Papai também comia.

Eu li no almanaque
Que um dia de manhã
Adão estava com fome
E comeu a tal maçã.

Comeu com casca e tudo
Não deixando nem semente
Depois botou a culpa
Na pobre da serpente.”

 

Na versão popular, os primeiros versos viraram “A história da maçã/É pura safadeza/ Adão comeu a Eva/E a maçã de sobremesa”.

 

 

Muito mais há para se comentar sobre as marchinhas dos carnavais de antigamente. Há espaço para entender a política, o amor, o patriotismo, a economia, entre inúmeras outras variáveis. Há autores que não poderiam ficar de fora e, ops!, ficaram, como o João de Barro, o Braguinha. Há interpretações que deveriam ter sido citadas, mas que não acharam seu espaço neste texto, como a de Carmen Miranda em “Para você gostar de mim”, mais conhecida como “Taí”. E várias outras marchinhas até mais conhecidas do que algumas aqui apresentadas acabaram por ficar de fora. O autor até queria continuar a escrever “mas é Carnaval!/não me diga mais quem é você!/amanhã tudo volta ao normal/deixa a festa acabar, deixa o barco correr…”

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Adolescentes em conflitos com a lei: a convivência prematura com as drogas

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“Sinto falta de andar de bicicleta, conversar com meus primos e estou decidido quando sair daqui, estudar e mudar de vida”. São palavras de M.R.A, 14, há quase um ano detido no Centro de Atendimento Socioeducativo de Palmas (Case). O menor em conflito com a lei, lamenta ter passado seu aniversário de 14 anos em um lugar fora da família e isolado do mundo.

Foto: Walquerley Ribeiro

Os pais de M.R.A,  se separaram assim que o menino nasceu, sendo criado pela mãe solteira. Quando completou 11 anos, o garoto seguiu destino e realizou o desejo de ir morar com o pai. Segundo a tia, J.B.A, o ambiente em que o pai de M.R.A vivia, tinha em certas ocasiões convívio com drogas e muitas bebidas. Aos 13 anos, M.R.A começou a sair à noite e ficar fora de casa até por três dias.

A tia conta que o menino passou a se envolver com drogas, apresentando um comportamento totalmente diferente de um adolescente normal. Em certa ocasião, M.R.A  foi flagrado pelo pai usando drogas. Isso fez com que ele decidisse arrumar as malas do adolescente de apenas 12 anos despejando o menino e enviando  a ir “morar na rua”. “A partir dai, meu sobrinho começou na companhia de amizades duvidosas, morando em praças e sem residência fixa”, diz a tia, lembrando ainda que, um parente materno ofereceu apoio e o acolheu na própria residência.  “Mas era tarde demais! O menino já estava bastante influenciado pelo uso de drogas e infrações da lei”. A tia conta ainda que, o garoto aos 13 anos, saiu por conta própria da casa do familiar e foi morar com amigos, identificados pela família como traficantes. Seis meses depois M.R.A, foi detido por tráfico de drogas.

Segundo dados da Secretaria de Estado da Defesa Social do Tocantins (Seds), existe hoje em torno de 150 adolescentes cumprindo medidas socioeducativas em todo o Estado. A história do adolescente M.R.A, é apenas um exemplo de milhares de casos de adolescentes que passam a cometer infrações, causando um dos mais preocupantes e alarmantes problemas sociais de politicas publicas que a sociedade brasileira enfrenta na atualidade. Diante da opinião pública, a sociedade culpa o Estado pela ineficiência no combate e prevenção, já por parte do governo a culpa é creditada a uma péssima base familiar recebida por esses adolescentes.

A responsabilidade social, fica dividida entre as três esferas, a de prevenção que é do município, a segunda etapa é o tratamento em parceria compartilhada com o Estado, e a repreensão que é uma obrigação do Estado junto com o Governo federal.

No caso de medidas de repreensão fechada de internação, quando o adolescente comete um ato infracional grave, ele aguarda a sentença judicial na medida provisória podendo ficar até 45 dias. Ele pode ser liberado ou sentenciado a cumprir medida de Internação, podendo ficar até três anos ou cumprir a semiliberdade para ser acompanhado e avaliado, de acordo com a lei do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

De acordo com o Coordenador das Políticas Anti-Drogas da Prefeitura de Palmas (TO), Ricardo Ribeirinha, o município tem atuado com a sua missão de prevenção ao combate de drogas para menores infratores, com palestras nas escolas da rede municipal. Através do esporte, o depoimento do atleta palmense Hudson Lee, campeão mundial de Jiu Jitsu, tem ministrado palestras motivacionais com o título, “A arte de Sonhar”. O atleta faz um retrospecto da sua trajetória de vida, relatando sobre as dificuldades enfrentadas, a superação, e as oportunidades que a espiritualidade e a prática do esporte lhe proporcionaram. “O Hudson Lee, é um campeão da nossa região, e com toda sua bagagem de um jovem vencedor que venha influenciar e mostrar a esses menores que a verdadeira luta não é com as mãos e sim com a inteligência”, explica Ribeirinha, recordando da sua própria experiência de vida, como ex-recuperando da Fazenda da Esperança nos tempos em que já “sentiu na pele” e conheceu o mundo de um menor infrator, “mudar a nossa vida é muito fácil, mas mudar a vida das outras pessoas é muito difícil, pois depende da boa vontade e disposição do recuperando”, diz.

Ainda de acordo com Ribeirinha, a Prefeitura de Palmas, investiu na reestruturação dos conselhos tutelares, que é o órgão que dá garantia aos adolescentes, com a chegada de novos carros, liberando autonomia para deslocamentos dentro da cidade de Palmas, além de uma integração com as redes das políticas públicas, onde serão desenvolvidos projetos do tipo: A Casa Abrigo, CREAS POP e o consultório de Rua em parceria com o Governo do Estado e federal.  “A preocupação da nova política do governo de Palmas não é com o adolescente preso, e sim, que o jovem não seja preso, o nosso trabalho é silencioso, tímido, pois os jovens que adotam e se interessam a mudar de vida pela prevenção, não podem ser identificados, pois, não saem por ai cometendo infração ou com uso de drogas”, finaliza.

J.B.A, tia do adolescente M.R.A, critica as ações de políticas públicas dos governos em todas suas esferas e lembra que na época que identificou o sobrinho como usuário de drogas, procurou ajuda clínica e não teve facilidades e apoio para uma possível prevenção. “Para internação, o garoto tinha que assinar com o próprio punho aceitando o tratamento clínico, uma criança de 13 anos, às vezes, não compreende e não tem a atitude de fazer uma carta a punho solicitando tratamento e aceitando que tem problema de saúde, ele sempre imagina que a vida tá indo bem e que no futuro isso não trará consequências alarmantes”, a tia lembra ainda que o menino não aceitava ajuda, pois não considerava que maconha fosse droga e não acreditava que a maconha poderia levá-lo a uma detenção. “Foi a maconha que levou ele pra rua e fez ele cometer infrações”, desabafa J.B.A.

Projeto: “Um Novo Caminhar: prevenção e tratamento ao uso de drogas”

O Projeto: “Um Novo Caminhar: prevenção e tratamento ao uso de drogas”, desenvolvido pelo governo do Tocantins, pretende promover ações de prevenção, tratamento e reinserção social desses adolescentes dentro do Centro de Atendimento Socioeducativo de Palmas (Case) e no Centro de Internação Provisória (Ceip).

Através da Secretaria de Estado da Defesa Social (Seds), o projeto será realizado nas Unidades Socioeducativas do Tocantins e conta com o apoio da Universidade Luterana do Brasil (Ceulp/Ulbra), Fazenda da Esperança e diversos parceiros que promoverão ações integradas com a finalidade de gerar o retorno social dos adolescentes a suas famílias.

Segundo a diretora do Departamento de Ações sobre Drogas, Magda Valadares, o projeto tende a promover ações integradas com o objetivo de trabalhar a prevenção e o tratamento de dependências químicas, como também ações profissionalizantes e de lazer. “Não gosto da palavra combate ao uso de drogas, porque nos faz pensar que estamos em guerra contra as drogas e não é isto, precisamos trabalhar e nos unir para proporcionar um novo estilo de vida para as pessoas, seja os adolescentes, jovens ou adultos que estão sofrendo as conseqüências da dependência química e também trabalhar a prevenção”, finaliza.

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