Amadurecimento e “dissolução do ego”: aproximações entre a Psicologia Analítica e a Filosofia Oriental

Compartilhe este conteúdo:

É possível renunciar à hegemonia do Ego, dando espaço para que outros componentes e estruturas da psique – até então inconscientes, mas tão importantes quanto o Ego – possam se manifestar

Depois que o Ocidente entrou em contato com as filosofias e religiões orientais, e com a crescente popularização desses conhecimentos, tornou-se bastante comum ouvirmos dizer que é preciso “abandonar o Ego” ou que é necessário que “o Ego seja dissolvido”. Do ponto de vista da Psicologia, essa concepção não está completamente errada, mas há algumas considerações que precisam ser feitas, de forma a evitarmos perigosos mal entendidos e compreendermos exatamente a que se referem esses termos. Para tanto, precisamos olhar para o processo de estruturação e consolidação dessa instância em nossa psique, sua função e importância, para depois podermos compreender o que significa essa “dissolução”.

De forma geral, o desenvolvimento e amadurecimento do Ego se dá a partir de três níveis (ou estágios) sucessivos e distintos entre si: um primeiro estágio de indiferenciação psíquica, um segundo estágio onde há o surgimento e estruturação do Ego e um terceiro estágio onde deve haver a tal “dissolução”, que é, na verdade, a subordinação do Ego à uma realidade maior, o Self, também chamado por Jung de Si-mesmo.

encurtador.com.br/foxI2

No momento em que nascemos e, mais ou menos, nos dois anos seguintes, a estrutura da psique ainda não está organizada. Não há um Ego, o que significa que não há ainda um senso de identidade, individualidade e existência. Estamos em identificação com a realidade inconsciente, ou seja, somos inconscientes: não há diferenciação entre nós e aquilo que nos rodeia, entre mundo interno e mundo externo. Vivemos a vida ao sabor dos instintos e dos impulsos psíquicos básicos e reagimos a partir deles. Quando somos confrontados por dificuldades nessa fase, sentidas por nós como insuperáveis e que impedem a manifestação desses mesmos impulsos e instintos, costumamos reagir com violência e descontrole emocional. É o tipo de comportamento característico das crianças pequenas e, também, de certos transtornos em indivíduos adultos, cuja estruturação egóica foi comprometida em algum ponto e medida durante essa fase do desenvolvimento. 

Em seguida, para que possamos dar conta das demandas da realidade objetiva, a psique inicia um processo de diferenciação dos seus componentes, através da organização de uma personalidade individual. O Ego vai emergindo lentamente da totalidade inconsciente, estruturando-se como centro da Consciência. Ele, então, torna-se o principal organizador das atividades psíquicas, entre elas o pensamento, o sentimento, a percepção, a intuição, a linguagem e a memória. Os desejos e impulsos instintivos se subordinam a ele, ficando sob o controle consciente. Surge o senso de Eu: nos reconhecemos como uma individualidade separada e começamos a sentir necessidade de nos afirmar e impor no mundo. É, portanto, uma fase bastante marcada pelo autocentramento e, também, pelo individualismo e competitividade, pelos medos e apegos, pelas inibições e restrições e pelos sentimentos de superioridade ou inferioridade, entre outros, pois o Ego percebe-se como algo separado de todo o resto. Quando enfrentamos alguma dificuldade, quando somos frustrados na satisfação dos nossos desejos, costumamos culpar fatores externos, o destino ou os outros, atitude considerada bastante normal para os padrões da nossa cultura. 

No entanto, esse modo de operar vai gerando uma carga cada vez maior de sofrimento, de modo que o Ego vai sendo conduzido para o próximo estágio do desenvolvimento. Agora, ele precisa começar a perceber suas verdadeiras dimensões e capacidades e a se experimentar, não mais como o centro da totalidade da psique e do mundo, mas apenas como uma pequena parte deles. É a fase do reconhecimento e subordinação ao Self, a realidade psíquica maior, que abrange tanto o consciente quanto o inconsciente, à qual o Ego deve se submeter e estar à serviço. É a hora de abrir espaço para que tudo aquilo que somos se manifeste, para que seja compreendido, assimilado e integrado.

encurtador.com.br/uyACI

Nesse estágio, começamos a perceber as dificuldades como verdadeiras oportunidades de crescimento. Procuramos encontrar as causas e as explicações para as restrições sentidas em nosso mundo interior, assumindo a responsabilidade pelos nossos problemas. E, na mesma medida em que o Ego – e suas imposições – vão gradualmente diminuindo de tamanho, vão também diminuindo nossos sentimentos de medo, inibição e limitação, dando lugar à sentimentos de aceitação, compreensão, cooperação, solidariedade, humildade, desapego, transcendência. Entramos para a fase da sabedoria e individuação, o caminho de nos tornarmos quem realmente somos.

Isso é o que muitas das antigas tradições orientais querem dizer quando falam do “abandono”, “morte” ou “dissolução” do Ego. Não que ele deva desaparecer, até porque isso significaria regredir ao estágio anterior a ele – identificar-se novamente com a totalidade inconsciente, ser dominado pelos instintos e impulsos psíquicos básicos, perdendo contato com a razão e a realidade objetiva – o que só acontece na insanidade. O que se propõe é que possamos chegar a um determinado nível de desenvolvimento em que seja possível “abrir mão” da sua hegemonia, dando espaço para que outros componentes e estruturas da psique – até então inconscientes, mas tão importantes quanto o Ego – possam se manifestar, contribuindo para nos tornarmos cada vez mais íntegros e em harmonia com a realidade interna e externa.

“Tudo acontece como se o ego não tivesse sido produzido pela natureza para seguir ilimitadamente os seus próprios impulsos arbitrários, e sim para ajudar a realizar, verdadeiramente, a totalidade da psique”, como disse Marie Louise Von Franz, principal colaboradora do Jung, em “O Homem e seus Símbolos”.

Compartilhe este conteúdo:

Doutor Estranho: a metamorfose do homem ocidental

Compartilhe este conteúdo:

Indicado ao OSCAR:

Melhores Efeitos Visuais (Stephane Ceretti, Richard Bluff, Vincent Cirelli e Paul Corbould )

Banner Série Oscar 2017

Doutor Estranho é um filme norte americano, baseado no personagem homônimo da Marvel Comics. Stephen Strange, é um bem-sucedido neurocirurgião, com um ego inflado. O filme retrata um homem, que vive para a profissão e para o umbigo. Sua arrogância o leva a desprezar as relações, inclusive com sua colega de trabalho e ex – namorada, Christine. A forma como Strange lida com o mundo, de forma prática e racional, nos mostra que parece se tratar de alguém com função principal sensação e auxiliar pensamento. Seu gosto apurado, sua relação apenas com o que é tangível e sua predileção pelo intelecto em detrimento do sentimento e das relações, mostram esses aspectos. O filme então ilustra o que ocorre, quando uma função principal se desgasta e é necessário desenvolver as demais, principalmente a inferior.

De um ponto de vista coletivo, podemos observar muito daquilo que é admirado no mundo ocidental: o homem com poder e prestígio externos, a realização profissional, a eficiência, o ter e os processos racionais e cognitivos. O irracional, a sensibilidade, o ser, a intuição e a alma, são desprezados pela cultura ocidental. O filme então, mostra uma crítica e uma mudança de paradigma. Strange perde o uso de suas mãos em um acidente de carro e isso me faz lembrar do conto de fadas A Donzela sem mãos, quando a mocinha tem suas mãos cortadas pelo pai que fez um pacto com o diabo.

Fonte: http://zip.net/bqtD3H

De certa forma, Strange também vende sua alma ao diabo e faz um pacto infeliz com os valores externos em prol de sua alma. Ao perder o uso das mãos, ele perde sua capacidade de fazer algo no mundo externo. Ele perde sua capacidade de atuação e seus dons criativos. Ele precisou perder sua capacidade extrovertida de atuar para olhar de forma introvertida para aquilo que falta nele.

Em Catmandu, Nepal o feiticeiro Kaecilius e seus seguidores entram no composto secreto Kamar-Taj e assassinam seu bibliotecário, guardião de textos antigos e místicos. Eles roubam o ritual de um livro proibido pela Anciã, uma feiticeira que vive vários séculos e que ensinou a todos em Kamar-Taj, incluindo Kaecilius, nos modos das artes místicas. A Anciã persegue os traidores, mas Kaecilius e alguns de seus seguidores escapam com as páginas.

Sua ex-amante e colega de trabalho Christine Palmer tenta ajudá-lo a seguir em frente, mas o arrogante Strange quer desesperadamente curar seus ferimentos. Depois de meses tentando cirurgias experimentais em suas mãos, e usando todos os seus recursos, Strange ouve falar de Jonathan Pangborn, um paraplégico que misteriosamente foi capaz de andar novamente. Pangborn fala a Strange sobre o Kamar-Taj, no Nepal. Lá, outro feiticeiro, Karl Mordo, apresenta Strange à Anciã. A Anciã mostra à Strange o seu poder, revelando o plano astral e outras dimensões, como a Dimensão Espelhada. Strange implora para ela ensiná-lo, e ela finalmente concorda quando Mordo a lembra das forças da Dimensão Negra. Apesar da arrogância de Strange, ela finalmente aceita, o que a faz lembrar de Kaecilius.

Fonte: http://zip.net/bmtCYJ

Strange começa o seu ensinamento com a Anciã e Mordo, e aprende mais dos livros antigos na biblioteca, que agora é protegida pelo mestre Wong. Strange avança os meses estudando vários feitiços, se mostrando muito inteligente. Curioso, Stephen encontra o Olho de Agamotto e o usa para manipular o tempo numa maçã usando os feitiços descritos no livro proibido da Anciã. Mordo e Wong chegam a tempo de impedir ele de ir longe de mais com tanto poder em posse.

Strange fica confuso então Mordo e Wong explicam que a Terra é protegida de outras dimensões por um feitiço formado a partir de três blocos chamados Sanctum’s, encontrados em Nova York, Londres e Hong Kong. A tarefa dos feiticeiros é proteger os Sanctum’s, embora Pangborn escolheu a renunciar esta responsabilidade em favor de canalizar energia para andar de novo; Strange terá que decidir entre recuperar o uso de suas mãos ou defender o mundo.

Kaecilius e seus seguidores usam as páginas roubadas para começar a convocar o poderoso Dormammu da Dimensão Negra, onde o tempo não existe e todos podem viver para sempre. Isso destrói o Sanctum de Londres, e envia Strange de Kamar-Taj para o Sanctum de Nova York. Os seguidores de Kaecilius então atacam lá, onde Strange os mantém fora com o Místico Manto de Levitação. Strange é ferido por um dos seguidores de Kaecilius.

Fonte: http://zip.net/bbtCZ2

Ele viaja para o hospital onde trabalhava a procura de Christine enquanto o Manto da levitação da cobertura com um dos seguidores. Stephen sai do seu corpo, se tornando uma forma astral e ajudando Christine a reviver o seu corpo. Strange deixa Christine ao perceber que o seguidor de Kaecillius se livrou do manto ao mudar pra sua forma astral. Uma luta no hospital no mundo astral começa e Strange vence com ajuda de Christine.

Strange volta para o Sanctum de Nova York e encontra Mordo. Strange e Mordo tem uma pequena discussão quando Stephen revela que, segundo Kaecilius, a Anciã drena energia da Dimensão Negra para ter mais poder e longevidade. Eles confrontam Kaecilius e seus seguidores de novo pelas ruas e predios distorcidos de Nova York. A Anciã surge e enfrenta Kaecillius cara a cara e é ferida por ele, voltando ao mundo normal e caindo de praticamente 20 metros de altura. A Anciã é levada para o hospital e antes de morrer, no plano astral, conversa com Strange e dá um conselho que uma hora ele vai ter que quebrar certas regras como ela e então o deixa.

Stephen vai pedir a ajuda de Mordo e eles vão para o Sanctum de Hong Kong. Eles chegam lá e veem a cidade ser praticamente destruida pelo surgimento da Dimensão Negra. Strange usa o Olho de Agamotto para voltar no tempo e impedir que tudo aquilo acontecesse, salvando Wong, entretanto, Kaecillius e seus seguidores conseguem sair do feitiço temporal e, tentam impedir Strange de acabar com os seus planos.

Stephen vai para a Dimensão Negra e pede uma barganha entre ele e o senhor da Dimensão, Dormammu. Strange prende Dormammu em um loop temporal pra sempre e, Dormammu decide entrar em acordo com ele, tirando Kaecilius e seus seguidores da Terra. Desgostoso com as decisões de Strange e da Anciã, Mordo vai embora. Stephen devolve o Olho de Agamotto ao seu lugar e Wong cita que ela é uma Joia do Infinito. Strange vai para o Sanctum de Nova York onde com permissão de Wong, residiria como Guardião.

Fonte: http://zip.net/bftC0Z

Em uma cena no meio dos créditos, Thor encontra-se no Sanctum de Nova York pedindo ajuda de Strange para encontrar Odin, junto com seu irmão Loki, que está desaparecido. Strange aceita ajudá-lo com a condição de que nunca mais volte á terra. Na cena pós-créditos, Mordo, após alguns meses viajando, vai a procura de Pangborn e absorve os poderes que ele tinha para permanecer andando e, Mordo fala que o mal do mundo é que existem feiticeiros de mais.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

doctor-strange-doutor-estranho-cartaz

DOUTOR ESTRANHO

Direção e Roteiro: Scott Derrickson
Elenco: Benedict Cumberbatch, Tilda Swinton, Chiwetel Ejiofor, Mads Mikkelsen
Ano: 2016
País: EUA
Classificação: 12
Compartilhe este conteúdo: