(En)Cena entrevista a psicóloga Maria Aires Gomes Estevão de Souza

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O 3º Simpósio de Avalição Psicológica Tocantinense, que ocorrerá do dia 25/05/22, abordará diversos temas relevantes para o mundo acadêmico e profissional, dentre eles está a orientação profissional no transtorno do espectro autista, que será ministrado pela Psicóloga Maria Aires Gomes Estevão de Sousa, egressa do Curso de Psicologia do CEULP/ULBRA.

Fonte: Arquivo Pessoal

Em entrevista concedida ao portal (En)Cena, a palestrante respondeu algumas perguntas sobre o universo da psicologia.

En (Cena) – Há quanto tempo atua no mercado como psicóloga? Quais são suas especialidades e áreas de atuação?

Maria – Atuo na área há 3 anos, sou especialista em TCC, e estou me especializando em Intervenção em ABA para pessoas com TEA e DI

En (Cena) – Qual foi o ponto crucial que te levou a escolher este tema para apresentar no 3º Simpósio de Avaliação Psicológica Tocantinense?

Maria – No momento na clínica o meu maior público de atendimento são crianças, adolescente e adultos dentro do espectro autista. Trabalho com grupos de Habilidades Sociais para Adolescentes com TEA.  E fazemos orientação profissional, por isso o tema escolhido

En (Cena) – Esse tema escolhido por você para apresentar no O 3º Simpósio de Avalição Psicológica Tocantinense, como ele está presente na sua atividade profissional?

Maria – É uma demanda crescente e carente desse atendimento especializado.

En (Cena) – Qual a importância da orientação profissional no transtorno do espectro autista?

Maria – O público do Espectro autista tem dificuldade quando se fala em reconhecer suas habilidades e competências, além das emoções. Aspectos essenciais na escolha da profissão que melhor se enquadra ao seu perfil.

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Avaliação Neuropsicológica do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade

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O 3º Simpósio de Avalição Psicológica Tocantinense que ocorrerá do dia 25/05/22 abordará diversos temas relevantes para o mundo acadêmico e profissional, dentre eles está a avalição neuropsicológica do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH. O TDAH é uma condição psicológica que atinge uma gama gigantesca de adultos e crianças, sendo facilmente identificada na primeira infância dado os comportamentos característicos desta condição mental.

Fonte: encurtador.com.br/zCFNX

Uma pessoa que sofre deste Transtorno, caso não tenha um diagnóstico comprovado, poderá sofrer demasiadamente em sua vida pessoal e profissional. O déficit de atenção pode muitas vezes ser confundido com preguiça ou desleixo de uma pessoa, vez que não terá facilidade na hora de se concentrar ou na execução de atividades longas ou monótonas.

Tudo isso, pode ser trabalhado, evitado ou melhorado com o devido diagnóstico do transtorno, proporcionando uma vida mais completa para seu portador. O teste para diagnosticar o TDAH deve realizado por profissional especializado que irá avaliar as capacidades cognitivas do indivíduo através de exercícios específicos, além de uma entrevista pessoal com o paciente, que servirão de material para o diagnóstico e possibilitará a melhor alternativa de tratamento do indivíduo.

REFERÊNCIAS

ABRAHÃO, Anaísa Leal Barbosa; ELIAS, Luciana Carla dos Santos. Estudantes com TDAH: Habilidades Sociais, Problemas Comportamentais, Desempenho Acadêmico e Recursos Familiares. Psico-USF [online]. 2021, v. 26, n. 3 [Acesso em 07 de maio de 2022] , pp. 545-557. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/1413-82712021260312>. ISSN 2175-3563. https://doi.org/10.1590/1413-82712021260312.

SALAZAR, Hernán et al. Funções executivas em escolares com e sem TDAH de acordo com pais e professores. Logos, La Serena, v. 31, n. 1, p. 138-155, Jul. 2021. Disponível em <http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0719-32622021000100138&lng=es&nrm=iso>. acessado em 07 de maio de 2022. http://dx.doi.org/10.15443/rl3108.

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Crip Camp: Revolução pela Inclusão

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Um recorte da luta por direitos dos deficientes

O documentário Crip Camp: Revolução Pela Inclusão, retrata as vivências no inovador acampamento para pessoas com deficiência nos anos 70, bem como aborda posteriormente a batalha política por reconhecimento de igualdade e pelos direitos sociais e civis dessas pessoas. Influenciado pelo movimento hippie, o Camp Jened era uma colônia de férias, ao norte do estado americano de Nova Iorque, sendo considerada o fator motivacional para, mais tarde, um grupo de jovens com deficiência se mobilizarem em torno da causa que lutava pelos direitos de igualdade em uma sociedade que desconsiderava a inclusão. Tal mobilização mais tarde se tornaria um movimento de grande impacto nos Estados Unidos, o 504 Sit-in, que exigia a regulamentação de uma importante seção da lei norte-americana, concernente aos direitos das pessoas com deficiências.

A princípio, o documentário explora a rotina do acampamento, onde parecia não haver diferença entre os monitores e os campistas. Ali havia cadeirantes, jovens com paralisia cerebral e espinha bífida, entre outras condições. Contudo, tais condições eram meros detalhes onde todos estavam unidos pela semelhança entre si. Ali, compartilhando suas experiências, os jovens relatam suas inseguranças e sobre a realidade fora daquele lugar carregada de rejeição e exclusão. Mas a experiência vai muito além das conversas sobre a vida, a ponto de compreender uma vivência surreal de acolhimento e aceitação.

Na colônia de férias, onde eles vivem o que não é costumeiro, sentem como se a deficiência não fosse uma limitação ou algo que os diferem dos demais, pois todos têm isso em comum. Com as atividades que eles desenvolvem, o que aprendem e até mesmo as relações amorosas os fazem se sentir iguais, diferentemente de como se sentem fora do acampamento.

Para contextualizar a época desses eventos descritos, em contrapartida é abordado no documentário instituições de “cuidados especiais” para pessoas com deficiência, onde o modelo segregacionista de cuidados era a prática de saúde adotada. Essas estruturas asilares aplicavam práticas desumanas de cuidados. Os internos viviam em meio a sujeira, recebiam uma má alimentação, dormiam em lugares que não favoreciam o bem-estar físico, eram muitas as atrocidades cometidas em seu interior que violavam os direitos humanos.

Fonte: encurtador.com.br/dBIT9

O documentário apresenta questões históricas vivenciadas por essas pessoas, como a exemplo iniciando na idade média, por alguns séculos elas eram tidas como aberrações, ou “criaturas” que estivessem sob alguma forma de castigo celestial, podendo ser retratadas em filmes e etc. como tais. Sendo assim começou o afastamento por parte da sociedade dessas pessoas, pondo-as em instituições fechadas ou até mesmo em sua maioria, sanatórios. O que ocorria há até pouco tempo atrás como relatado no próprio documentário, que estes quando em atividades na cidade eram tidos como problemáticos para os “normais”.

Contudo, ao considerar o ambiente inclusivo do Camp Jened, onde todos são eles próprios, sem os estereótipos e rótulos, fica clara que, no que tange às deficiências, o problema não era com as pessoas com deficiência, mas o problema era com os que não tinham nenhuma deficiência. No acampamento, eles brincavam, cantavam, namoravam, eram irreverentes e faziam jus ao espírito da contracultura de sua época, vivendo à sua maneira de uma forma inspiradora e motivacional.

McGill (2020), analisando a experiência do Camp Jened salienta a irreverência e o ativismo no brilho do verão, cujo radicalismo moldou várias gerações. Quanto à irreverência, isso é explícito nas filmagens da época, onde os jovens não têm nenhuma inibição quanto a falar de temas tidos como tabus, tal qual a sexualidade e o corpo humano. Isso pode chocar aqueles que não esperam tal comportamento dessas pessoas, devido à suas deficiências. Contudo, o documentário deixa implícita a lição de que eles, por serem jovens, por serem humanos, têm as mesmas necessidades que os demais, as quais variam apenas em sua intensidade e as circunstâncias pessoais.

Desde 1951 até seu encerramento em 1977, o acampamento proporcionou lugar onde adolescentes com deficiências podiam atuar e sentir-se livres. Isso compreendia uma abordagem permissiva do comportamento, e também uma cultura política que abriu caminho para o ativismo futuro. Suas discussões mostram que eles eram cientes de suas dificuldades, e ainda mais cientes de seus direitos, os quais eram cerceados pelos preconceitos alheios e pela inadequação das edificações, na contramão da acessibilidade.

Fonte: encurtador.com.br/pwMU4

A fala dos campistas revela seus desafios. Jimmy Lebrecht queria ser parte do mundo, mas não via ninguém como ele nesse mundo, tentava se encaixar em um mundo que não foi construído para ele. Segundo ele, todos no acampamento viram que suas vidas poderiam ser melhores, e que não há nada para lutar se o indivíduo não sabe que algo a ser conquistado existe. Para Steve Hoffman, todos eles querem ficar sozinhos às vezes, pensar sozinhos, mas lhe negavam o direito à privacidade. Para Corbett O’Toole, o mundo não os queria por perto, queria-os mortos. A realidade era, “será que sobreviverei? Será que recuo? Será que luto para estar aqui?”. Ele dizia que alguém poderia chamar isso de raiva, mas ele via como impulso para estar disposto a prosperar, ou não conseguiria nada.

Para Judith Heumann, quem na infância contraiu poliomielite e, por consequente, a levou a precisar de cadeira de rodas, um dos verdadeiros problemas é que, ao crescer deficiente, a pessoa não é considerada nem homem, nem mulher, é pensada como alguém deficiente e até mesmo assexual. Heumann não acreditava sentir vergonha de sua deficiência, mas sentia mais exclusão. Para essa jovem, que anos mais tarde lideraria a luta internacional pelos direitos das pessoas com deficiência, se ela e as pessoas como ela não se respeitassem a si próprias, e não exigissem o que elas acreditam que deveria ser delas, não iriam conseguir.

A inspirador papel de Judith Heumann, com seu espírito de liderança que a acompanha desde a juventude, é um dos mais comovedores no documentário. Em uma cena, durante o acampamento, ela lidera e coordena seus companheiros acerca dos ingredientes para um almoço. Abaixo, fotografias de Heumann quando jovem e atualmente. Anos mais tarde seria uma das organizadoras de um ato que pressionaria Washington, e posteriormente se converteria em uma das principais ativistas pelos direitos das pessoas com deficiência, a nível mundial.

No acampamento, a experiência de aceitação por parte dos outros traz à tona uma verdade inspiradora, o fato de que a mudança é possível, de que os direitos podem ser desejados e, principalmente, é possível lutar por eles até as últimas consequências. Bastaria que eles estivessem unidos em prol das causas coletivas.

Fonte: encurtador.com.br/uxzM5

Apesar da liberdade proporcionada no acampamento, os próprios jovens reconhecem que aquela colônia de férias era uma utopia, que passaria tão logo acabasse o verão e eles voltassem para suas cidades. Razão pela qual houve choros na despedida, prestes a retornarem à agitação e impaciência na cidade grande.

Porém, a feliz vivência no acampamento mostrou-lhes que a realidade poderia ser diferente do que vinha sendo, e que deveriam lutar, ir atrás dos seus direitos porque, se ficassem resignados, ninguém iria fazer algo ao seu favor. Assim sendo, mais tarde houve um movimento que lutou pela aplicação da Lei de Reabilitação, mais precisamente a seção 504 da referida lei, que atesta que organizações que recebem recursos federais não podem discriminar uma pessoa por causa de sua deficiência.

Houve resistência por parte das autoridades, mas – após fortes manifestações, ocupação do prédio federal da Secretaria de Saúde, Educação e Bem-Estar Social, por duas semanas, além de greve de fome, aliado ao apoio de pessoas ligadas à causa LGBT, aos Panteras Negras e a uma igreja progressista – o secretário Joseph Califano regularizou a aplicação da seção 504.  Hoje os EUA detêm a Lei dos Americanos com Deficiência, que garante aos americanos portadores de necessidades especiais a proteção dos seus direitos civis de ter um emprego, de ter acesso à educação, saúde, transporte e lazer.

Entre os envolvidos nesse movimento pela aplicação da lei, incluindo Judy Heumann, uma dos organizadores dos protestos – quem segura um cartaz na foto acima, e fala ao microfone na fotografia abaixo – havia pessoas que fizeram parte do Camp Jened.

Fonte: encurtador.com.br/qHIY5

Esse era o ápice de uma experiência iniciada no acampamento, a qual desde o primeiro momento envolvia união, validação das emoções e dos discursos, e resultou na coletiva demanda pelos direitos que o Estado, a todo custo, ignorava e buscava esquivar-se disso.

Assim sendo, a emocionante experiência daquela colônia de férias ensina como uma vivência compartilhada com um número reduzido de pessoas pode resultar em lutas contra um sistema indiferente à inclusão, o que leva mudança para milhões de cidadãos. Nesse caso, o governo da maior potência mundial viu-se encurralado e obrigado a cumprir com sua obrigação. Além disso, a experiência do surreal acampamento – que não deixou de ser um experimento social ousado – mostra que, muitas vezes, pessoas com deficiência são mais compreendidas entre os seus iguais, pessoas que passam por lutas semelhantes às suas. O Camp Jened ensina que o problema não é do que não consegue usufruir plenamente de um lugar ou serviço, mas do ambiente que não propicia um direito basilar. Por isso há um dito de que, se um lugar não é apto para todas as pessoas, tal lugar é deficiente.

Obviamente a dimensão política que, de alguma forma, germinara naquele acampamento é estupendamente maravilhosa, isso é bem ressaltado no documentário. Entretanto, a obra também prova como qualquer pessoa pode ter uma vida satisfatória, desde suas vivências sociais até sua íntima vida sexual. McGill (2020) cita que o documentário homenageia a irreverência que tornou a experiência do acampamento tão poderosa. É evidente que, assim como ocorria afora, o Camp Jened era uma amostra da contracultura, particularmente ousado em seu trato com a deficiência.

Retratada no documentário, Denise Sherer Jacobson, escritora com paralisia cerebral, conta como conheceu seu marido banqueiro no Camp Jened. Ela relata sua experiência de contrair gonorreia desde o seu primeiro encontro sexual, e como estava orgulhosa de si perante a reação perturbada do seu médico, pelo fato de ela ser sexualmente ativa. Jacobson, então, fez um mestrado em sexualidade humana. O documentário termina com ela, de volta ao local onde existiu o acampamento, a dizer “quase quero sair da minha cadeira de rodas e beijar a merda do chão”. Abaixo, uma fotografia de Denise, quando mais jovem, em cuja blusa se lê: “Por trás dessa camiseta está uma mulher sensual”.

Fonte: encurtador.com.br/jtMZ3

FICHA TÉCNICA DO DOCUMENTÁRIO

Nome: Crip Camp: Revolução pela Inclusão

Nome Original: Crip Camp

Cor filmagem: Colorida

Origem: EUA

Ano de produção: 2020

Gênero: Documentário

Duração: 106 min

Classificação: 14 anos

Direção: Nicole Newnham, James Lebrecht

Referências

Alexa Fernando. 11 Memorable Quotes from Crip Camp. Disponível em: <https://accessnow.com/blog/memorable-quotes-from-crip-camp/ >. Acesso em 12 de maio de 2021.

Judith Heumann. Wikipedia. Disponível em: < https://es.wikipedia.org/wiki/Judith_Heumann >. Acesso em 12 de maio de 2021.

McGill, Hannah. Crip Camp review: irreverence and activism in the glow of summertime. Disponível em: < https://www2.bfi.org.uk/news-opinion/sight-sound-magazine/reviews-recommendations/crip-camp-1970s-disability-rights-documentary>. Acesso em 12 de maio de 2021.

Crip Camp: A interview with Filmmaker Jim LeBrecht About Acessibility, Universal Design, and Spaces of Freedom. Disponível em: < https://archinect.com/features/article/150185908/crip-camp-an-interview-with-filmmaker-jim-lebrecht-about-accessibility-universal-design-and-spaces-of-freedom >. Acesso em 13 de maio de 2021.

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Incluir e socializar ou normalizar os anormais – Eu deficiente

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A falsa segurança de normalidade, inserido e socializado desmoronou quando a condição antes tida como “normal”, mudou radicalmente para uma condição diferente, precisando de um auxílio biônico para ouvir melhor. Não sendo isso os monstros das minhas madrugadas, o contraste teria vários nomes, viria de várias formas, estaria em vários lugares, teria várias faces. O nosso olhar se prende ao cerne de algo, quando somos pego por uma força que nos atrai, algo tão forte que construído pelo tempo em nós corpos ambulantes, torna-nos resistentes comparados aos heróis de quadrinhos. Foi quando surgiu em determinada conversa, sobre a vontade de fazer uma pós, que um amigo falou sobre a possibilidade de inscrever-me como aluno especial no Programa de Pós-graduação do Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos da FFLCH, USP, mais conhecido como Diversitas, que surgiu em mim a força de tentar.

A viagem semanal que faço a cidade de São Paulo deslocou meu corpo de um costume completamente diferente do que era de praxe, para essa cidade que atrai pessoas do mundo inteiro, em que ser normal ou anormal não faz muita diferença. Os corpos que geram imunidade e sobrevivem diante do determinismo, onde pessoas não procuram saber o nome do outro nem ao menos se cumprimentam, assim o povo dessa metrópole socializa-se e vive nessa grande bolha.

Está em São Paulo seria um sonho realizado, embora já tenha tido outras passagens por esta cidade, mas foi no Programa de Pós-Graduação que passei a ter um convívio mais próximo da cidade paulistana. Aos poucos, fui aprendendo a conviver com um trânsito absurdo, andar em ônibus, trem e metrô lotados, onde por muitas vezes somos jogados literalmente para fora na saída. Entender o que estava acontecendo comigo, nessa cidade, tornou-se visível a partir da disciplina Corpo, Conhecimento e Compreensão na Cidade, este corpo sou eu, tendo que me adaptar, conhecer, compreender esse espaço. O que antes era visto apenas como uma oportunidade de socializar, incluir pessoas, abriu-se o leque sobre necessidades maiores.

A experiência inicial, todas as semanas, de fazer parte de um espaço, de diversidade densa, contraste claros, aprendendo sobre os reflexos de experimentação que os corpos passam é um processo de desconstrução do pensamento do “eu corpo” pertencente à coletividade que começa logo nas primeiras aulas.

Fonte: encurtador.com.br/iklpT

A interdisciplinaridade de conversação, a experiência em conviver com a diversidade explicita que há na cidade, instiga mais ainda uma luta alimentada a alguns anos por inclusão e socialização como fundamental a dignidade humana. Segundo o que está elencado no escopo da Constituição de 1988, o que é percebido na cidade mais desenvolvida do Brasil é o desrespeito avassalador a esse direito.

Uma das leituras iniciais feitas neste processo foi Courtine (2013), Decifrar o Corpo, a partir de então entender o corpo como meio e não dissociá-lo da imagem e verbo. Enquanto a linguística e imagem é indícios fortes de identificação, o corpo não seria apenas o meio, mas também como suporte de imagem, existindo um corpo no meio que conversa de várias formas. O paralelo às minhas observações foi se provocando, de corpos com deficiência em Palmas, para corpos zumbis; linguagem de sinais, para linguagem de quem pertencem às favelas; imagens de corpos que dormem ao céu aberto expostos ao perigo, para minha casa simples em Palmas, um tripé que dialogou comigo no experimento inicial do meu corpo.

Assim tenta-se normalizar esses corpos dentro de seus espaços, assim como na cidade parisiense, em que os corpos eram usados como atrações para burguesia, expostos para trazer prazer aos poderosos. Quanto mais bizarro fosse a deficiência e maior capacidade intelectual tivessem, mais pessoas seriam atraídas. Uma prática de superveniência pelos próprios familiares desses corpos, tudo por um retorno financeiro.

Nos dias atuais a exposição tem outra roupagem, perguntei-me algumas vezes, enquanto estudante, com holística acadêmica, científica de pesquisador, se não seria um meio de blindagem, separar-me das imagens que falam; não me relacionando com imagens internas e externas ao ponto de me sentir um corpo incluído, nessa coletividade; assim como outros grupos distintos que apreciam esses corpos chamando-os por outros nomes.

Fonte: encurtador.com.br/bnIOR

Nas idas e vindas a cidade São Paulo, balbuciei comigo se na condição de pessoa com deficiência, eu não estaria me distanciando daquilo que meu próprio corpo sofre, com discriminação, rechaço, olhar analítico, essa maneira incineradora que se tem para com as minorias. Ao me deparar como essa cidade, que se difere muito da minha, na diversidade, estrutura, economia, cultura, procurei não me ultrajar de uma máscara para viver esta experiência.

É inaceitável admitir que dentro de um mesmo espaço, a diferença que há de proteção, dignidade, seguridade para esses corpos sejam tão grandes e que a vitrine a que são expostos tem outros nomes, arquitetura, patrocinadores, desde que continuem como entretenimento.

As quartas-feiras, no meu translado para universidade, vivenciei experiências incríveis, em todos os meios de transportes, seja no ônibus do aeroporto de Guarulhos para Congonhas, ubers, trem, metrô e transporte coletivo. Sempre que me identificava, surgiram vários comentários e perguntas, dentre eles “nunca ouvir falar em Palmas”, “Tocantins ficar em qual Estado?”, “estudar na USP não é para qualquer um”. Fiquei abismado quando certo dia ao sair com um colega do curso, dirigi-lhe a pergunta, se ele não se sentia incomodado com tantas pessoas jogadas pelas ruas, enquanto passávamos por alguns. Ele respondeu que não, que ainda não tinha visto ninguém; era comum aquele tipo de situação em São Paulo.

Visitar durante as minhas aventuras, vários locais, na busca de decifrar corpos, de entender os movimentos da cidade; sair com demais colegas para estudos em campo, avenida paulista, Luz, Brás, e Santo Amaro, que virou minha segunda casa; viver essa experiência foi desafiador, as diferenças mudam de nomes, mas as essências dos corpos continuam as mesmas. Tem algo neste deslumbre experimental, que nos une independente do Estado brasileiro em que vivemos. É a maneira de como nossos corpos são usados, para interesse estatal ou de quem comanda essa máquina.

Fonte: encurtador.com.br/bkwHV

Começa-se a perceber características antes não vistas, de um corpo que entra em movimento de acordo ao ambiente, para que não seja destruído, esmagado, rechaçado, excluído por não ser adaptável como outros. Quando se tem no imaginário, a perceção de quanto maior o desenvolvimento, mais esses corpos estariam incluídos, socializados, normalizados. No entanto a verdade salto pelos olhos, a gente desconstrói o velho discurso, de que o Brasil é do povo brasileiro.

O multiculturalismo territorial brasileiro, tem sido preponderante na disseminação do entendimento trazido pelos tratados, convenções e estatutos e todas as formas, garantindo a diversidade e igualdade como princípios fundamentais; para a democratização por meio de políticas públicas; alcançando a efetivação. Isso é visto no Brasil como algo muito complexo, devido o histórico de políticas públicas fragilizadas e inoperantes. O desafio, talvez, seja desconstruir o ensinamento existente por décadas de não exclusão, mas sim inclusão.

A morosidade do Estado em cuidar de assuntos inerentes ao seu povo, em baila, o cidadão que sofre a discriminação e a sua inclusão no convívio social, com portas abertas para recebê-lo na educação; com programas voltados para atender suas necessidades básicas, preparando-o para a vida; de maneira plena. São direitos garantidos na constituição e também estabelecidos nas diretrizes da educação nacional. É o mínimo que se espera de um Estado democrático e de uma governança com o povo e para o povo.

Fredrich Müller (2000), no livro “Quem é o Povo?”, trata em um dos capítulos sobre “Povo” como ícone, correspondente àquela situação que, em termos jurídicos, já não se fundamenta em nenhum tipo de relação entre governantes e governados. A falha no regime político-jurídico deste povo, em que se visualizam brechas na legitimidade da democracia, mesmo existindo um povo ativo ou até mesmo em um regime em que o povo não legitima juridicamente, mas é chamado a participar concedendo tal legitimidade.

Fonte: encurtador.com.br/bdqLP

A manipulação ideológica, neste caso, está escancarada na palavra “povo”, usada pelos seus governantes, para que pareçam que atuam em nome dos seus cidadãos, sendo que não o fazem. Neste sentido, mistificam o povo como entidade abstrata, genérica, apoiadores do regime político-jurídico, apenas com concepções ideológicas. Passando a ser utilizado um discurso político do povo, para o povo, pelo povo; servindo apenas como uma ideologia para dominação das massas dentro do Estado.

Müller trata em um dos capítulos sobre exclusão, talvez este seja o capítulo mais importante do livro, já que é nele que o autor fala acerca da busca pela legitimidade democrática, como uma forma de se acabar com a exclusão social, política, econômica e jurídica de parcelas da sociedade.

Pode haver situações ocasionadas por condicionantes econômicos ou sociais, em que parcelas da sociedade, ainda que juridicamente incluídas, acabam por não ter acesso aos sistemas prestacionais estatais.

Quando a situação de parcela da sociedade chega a esse ponto, não se pode falar mais de simples “marginalização”, mas sim de “exclusão”, no sentido de que esses grupos populacionais dependem (negativamente) das prestações dos mencionados sistemas funcionais da sociedade, sem que tenham simultaneamente acesso às mesmas “(no sentido positivo)”.

Fonte: encurtador.com.br/giFL7

Há forte interferência da esfera econômica no dia a dia dos cidadãos e esta interferência, muitas vezes, traz reflexos também para a própria legitimação da democracia.

O contraste visto em uma cidade, tida como a mais evoluída economicamente do país, em que tem em suas ruas, tantos corpos perambulando, excluídos, vivendo completamente fora de um contexto de dignidade, respeito e valoração, põe em questão o que seja uma democracia.

Quanto a Palmas, uma cidade tida como a mais nova capital dos pais, diferencia-se em muito de São Paulo; seja à economia, educação, tecnologia, emprego, saúde; além dessas díspares situações, existe ainda uma grande discriminação da pessoa com deficiência, do idoso, homossexuais, transexuais, índios, quilombolas, negros etc… Uma minoria que ainda desconhece algumas conquistas, como existente em São Paulo, a exemplo da casa de apoio aos transexuais, situada nas proximidades da cracolândia, que apoia e cuida daqueles que a procura.

Em geral, a experiência adquirida pelo meu corpo, diante dos contrastes existentes, entre ambas as cidades, tem afetado o meu conhecimento e consequentemente meu crescimento pessoal, o que ocasionou várias perguntas, quanto a percepção e decifração do corpus na cidade? Do indivíduo pertencente a essa coletividade? De como meu corpo se sentiria, incluído, normalizado enquanto eu deficiente?.

Fonte: encurtador.com.br/ensO5

Referência:

MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo?: a questão fundamental da democracia. São Paulo: Max Limonad, 2000.

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Memórias são feitas de Proteínas?

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Proteínas e sua relação com a esquizofrenia, a deficiência intelectual e a síndrome do X frágil.

Em nossas aulas de química e biologia no ensino médio, ensinaram-nos que as proteínas executam a maior parte das funções das células. Logo, mesmo esquecendo grande parte de todas as teorias estudadas em relação a isso, guardamos um fato importante: a relevância desta substância química.  Como explicado no excelente livro sobre a história do Gene de Siddhartha Mukherjee [1], as células só existem graças às reações químicas. Considerando essa premissa, quando durante a respiração o açúcar combina-se quimicamente ao oxigênio para produzir dióxido de carbono e energia, são as proteínas que induzem e controlam essas reações químicas fundamentais das células. E acrescenta:

A vida pode ser química, mas é uma circunstância especial de química. Organismos existem não graças a reações que são possíveis, mas a reações que estão nos limites do possível. Se a reatividade fosse excessiva, entraríamos em combustão espontânea. Se fosse moderada demais, resfriaríamos até a morte. Proteínas possibilitam essas reações nos limites do possível e nos permitem viver na fronteira da entropia química – patinando de modo perigoso, mas sem jamais cair.  [1]

Um estudo publicado na revista Proceedings of National Academy of Sciences [2], de pesquisadores do Picower Institute for Learning e Memory do MIT, baseado em experimentos e observações de duas proteínas, lança luz sobre os mecanismos moleculares da memória e como isso pode melhorar a compreensão de deficiências cognitivas, além de distúrbios como a esquizofrenia e a síndrome do X frágil (mais informações em [3]). Isso reforça a premissa de outras pesquisas de que as proteínas têm efeitos extraordinários no processamento de informação. Para entender esse complexo estado de processamento de informação, voltamos ao livro de Mukherjee [1], em que ele aponta que “um gene ‘atua’ codificando informação para construir uma proteína, e a proteína concretiza a forma ou função do organismo”, conforme ilustrado a seguir:

Fonte: Figura extraída do livro “Gene” [1]

Essa capacidade da proteína de transformar forma em função permite que estas executem diversas funções nas células Ou seja, podem assumir uma forma globular e capacitar reações químicas – isto é, enzimas, podem ligar substâncias coloridas e tornar-se pigmentos no olho ou em uma flor, podem, especialmente, especificar como uma célula nervosa se comunica com outra célula nervosa e, assim, se tornam árbitros de cognição e do desenvolvimento neural normal [1]. Esse último exemplo é onde está situada a descoberta apontada neste texto.

A pesquisa apresentada em [2] vai além das descobertas realizadas por neurocientistas há algum tempo, que resultaram no entendimento de que a criação de novas memórias implica necessariamente na criação de novas proteínas. Segundo o pesquisador Weifeng Xu, professor assistente do Departamento de Ciências Cerebrais e Cognitivas do MIT e autor sênior do estudo em questão [4], ainda há várias camadas de perguntas, por exemplo: “Quão rápido é a síntese de proteínas necessária para a codificação da memória? Quais alvos ou sínteses de proteínas se correlacionam com o processo de codificação? E esses alvos são necessários para a codificação? [4]

Em um esforço de responder aos questionamentos iniciais da pesquisa, a equipe de Xu, conforme apresentado em [2], conduziu experimentos em camundongos em uma região do cérebro denominada hipocampo, considerada a principal sede da memória.  Para elucidar como foram feitos os experimentos, é importante entender que “a produção de proteínas associada à formação de novas memórias ocorre em locais chamados sinapses, onde os neurônios se conectam em circuitos com outros neurônios e isso pode ser impulsionado pela atividade neural desencadeada por eventos específicos, como encontrar um novo local” [4]. Basicamente, o experimento foi realizado a partir do seguinte raciocínio:

Quando ocorre a memória de uma nova experiência, um novo padrão de conexões se forma entre os neurônios. Novas conexões podem ser feitas, enquanto as existentes são fortalecidas e outras, enfraquecidas. Sabe-se que isso requer um amplo suprimento de novas proteínas. Assim, a atividade neural associada a uma nova experiência, como a entrada em um novo local, faz com que as células do cérebro aumentem a produção de proteínas [5].

Segundo [5], os pesquisadores descobriram que a formação da memória está associada a um aumento singular nos níveis de mRNA (RNA mensageiro) do gene Ngrn, que codifica uma proteína chamada neurogranina, que foi ligada pela primeira vez à formação da memória em 2017.  Para um entendimento mais didático de como um gene codifica uma proteína, três fluxos de informações são apresentados a seguir. São três formas de entender uma mesma sequência e foram retiradas (e adaptadas) do livro O Gene [1]:

Nas palavras de Mukherjee [1], “o DNA fornece instruções para construir o RNA. O RNA fornece as instruções para construir proteínas. Por fim, as proteínas ensejam a estrutura e a função, dando vida aos genes”.

Os pesquisadores observaram que a formação de memórias relacionadas à experiência parece depender da rápida produção de altos níveis de neurogranina, mas em investigações posteriores foi revelada uma outra proteína, chamada de FMRP. Segundo [5], “o FMRP interage com o mRNA da neurogranina, permitindo que ele retransmita suas instruções de produção de proteína.” Assim, quando o gene para a FMRP foi inativado, os ratos tiveram dificuldade em formar novas memórias. As proteínas que foram evidenciadas nesse experimento, neurogranina (NRGN) e FMRP, rapidamente foram associadas a questões relacionadas a alguns distúrbios. Uma síntese das descobertas está apresentada a seguir [4]:

De fato, anormalidades em ambas as proteínas têm sido associadas a distúrbios neuropsiquiátricos e de neurodesenvolvimento humanos – FMRP significa “Proteína do Retardo Mental do X Frágil” porque é central para a condição genética síndrome do X frágil, que especialmente quando apresentada em meninos possui alguns traços que remetem ao espectro do autismo; e estudos anteriores ligaram a neurogranina à esquizofrenia e à deficiência intelectual. [4]

Para os pesquisadores, “este estudo é parte de um esforço contínuo em experiências no laboratório para elucidar a maquinaria molecular necessária para sintonizar a transmissão sináptica crítica para a cognição” [2]. Logo, mais do que fornecer insights sobre como o cérebro se lembra de novos lugares e como as proteínas são fundamentais na formação da memória, essa pesquisa mostrou novos caminhos sobre como os contextos envolvendo essas duas proteínas em outras partes do cérebro, como o córtex frontal, podem prejudicar a cognição no contexto desses distúrbios.

Para lidar com questões tão complexas, especialmente quando se trata dos códigos informacionais que fornecem a base de determinadas patologias ou elucidam questões relacionadas a como o cérebro guarda (ou esquece) nossas vivências, entender entre tantas possibilidades como uma variável se comporta, é uma grande vitória.  Mas, voltando à pergunta que deu título a esse texto, “memórias são feitas de proteínas?”, em nosso cérebro, sim, mas existem porque ocorreu um acontecimento que a gerou. O contexto nos afeta, são estímulos para despertar todo o emaranhado de informações químicas em nossa mente. Se por um lado a ciência nos mostra factualmente que somos um complexo mecanismo de reações químicas, uma extraordinária máquina de processamento de informações, por outro a memória é evidenciada no cerne da natureza complexa da nossa humanidade, mostrando-nos que somos aquilo que vivenciamos, sentimos ou imaginamos, mas também, o que nossos mecanismos de defesa sabiamente nos permitem esquecer.

Referências:

[1] Siddhartha Mukherjee. O Gene: uma história íntima. Tradução: Laura Teixeira Motta. 1ª. Edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.

[2] J. Jones, Sebastian Templet, Khaled Zemoura, Bozena Kuzniewska, Franciso X. Pena, Hongik Hwang, Ding J. Lei, Henny Haensgen, Shannon Nguyen, Christopher Saenz, Michael Lewis, Magdalena Dziembowska, Weifeng Xu. “Rapid, experience-dependent translation of neurogranin enables memory encoding Kendrick”. Proceedings of the National Academy of Sciences Jun 2018, 115 (25) E5805-E5814; DOI: 10.1073/pnas.1716750115

[3] https://drauziovarella.uol.com.br/doencas-e-sintomas/sindrome-do-x-fragil/

[4] https://picower.mit.edu/news/protein-pair-quickly-makes-memories-new-places#

[5] https://cosmosmagazine.com/biology/memories-are-made-of-this-two-proteins

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