Para Goldstain não existe um ser humano dividido, mas sim, um indivíduo que embora com partes que são “divididas” estão inteiramente interligadas afetando-se mutuamente e se auto regulando
A teoria organísmica foi desenvolvida por Kurt Goldstain, que era um neurologista e psiquiatra. Ele criou uma teoria holística do organismo, com base na teoria da Gestalt que influenciou profundamente o desenvolvimento da Gestalt-terapia. Goldstein realizou seus estudos em pacientes com lesões cerebrais causadas por ferimentos de guerra, e após investigação percebeu que mesmo as lesões sendo em áreas específicas do cérebro, estas modificaram e afetaram outras partes do corpo.
Um exemplo citado é de uma lesão na área motora que afetava não somente a estrutura cerebral, mas também os movimentos físicos e a forma de pensar e se relacionar com as outras pessoas. Então, observou que estas “transformações” ocorriam de forma holística, ou seja, os indivíduos haviam modificado não somente a estrutura cerebral, mas também o físico, e os processos de relacionamento pessoal e interpessoal. Para ele, era como se houvesse uma reorganização no campo cerebral ou neuronal, com a função de acomodar se a esta nova realidade.
Fonte: https://bit.ly/2U82lc6
Para Goldstain não existe um ser humano dividido, mas sim, um indivíduo que embora com partes que são “divididas” estão inteiramente interligadas afetando-se mutuamente e se auto regulando, numa espécie de auto realização que o organismo faz, com a função de acomodar-se a esta nova realidade, função essa ligada a auto-realização, ou seja, uma tendência criativa da natureza humana, que pode ser entendido como o ‘princípio orgânico pelo qual o organismo se torna mais desenvolvido e mais completo’.
Para Goldstain qualquer necessidade é um estado de déficit que motiva o organismo a supri-lo, de acordo com as potencialidades individuais e inatas diferentes, que dão forma aos seus fins e dirigem as linhas do seu desenvolvimento individual. No entanto a teoria organísmica enfatiza a unidade, a integração, a consistência e a coerência da personalidade normal, ou seja a organização é o estado natural do organismo.
É natural de o organismo selecionar aspectos do ambiente os quais ele mesmo irá reagir, exceto em circunstâncias raras e anormais, o ambiente não pode forçar o indivíduo a se comportar de maneira inapropriada a sua natureza, logo se o organismo não consegue controlar o ambiente, ele tentará se adaptar à ele, portanto é mais valoroso um estudo compreensivo de uma pessoa do que uma investigação extensiva de uma função psicológica observada em muitos indivíduos. Atrelado a isso a teoria organísmica e a Psicologia da Gestalt assemelham-se na forma como ambas tendem a “ver” e perceber o ser humano de modo unificado e não como um conjunto de partes separadas.
Fonte: https://bit.ly/2GbQS7M
A teoria organísmica tem como principais conceitos (PORTAL EDUCAÇÃO, 2012):
➔ O organismo tende a estar organizado; é um estado natural do organismo. A desorganização, por sua vez, pode ser considerada patológica e, frequentemente, é consequência do impacto do meio ambiente.
➔ Os teóricos organísmicos creem ser impossível compreender o todo estudando as partes de forma isolada.
➔ O organismo age motivado por um impulso dominante, o de auto realização, e não por vários impulsos. Isto quer dizer que o homem luta continuamente para realizar suas potencialidades inerentes.
➔ Crê que as potencialidades do indivíduo lhe permitem desenvolver-se de forma ordenada, em um meio apropriado. Nada é naturalmente mau no organismo, faz-se mau por interferência de um meio ambiente inadequado, lembrando as ideias de Jacques Rousseau, de que todo homem é naturalmente bom, mas pode ser corrompido por um meio que lhe negue oportunidade de atuar conforme sua natureza.
➔ O estudo sobre as percepções e a aprendizagem do organismo constitui a base para a compreensão do organismo total.
➔ Afirma que pode aprender mais com o estudo compreensivo da pessoa do que em uma investigação extensiva de uma função psicológica específica e isolada do indivíduo.
Relação com a Gestalt
A Gestalt-Terapia é uma abordagem psicológica que dá ênfase e estuda o papel dos processos de criatividade como uma das ferramentas para a auto-regulação organísmica. Esta noção de auto-regulação, é advinda da Teoria Organísmica, pois Kurt Goldstein foi médico assistente de Fritz Perls, sendo este muito influenciado pelas teorias de Goldstein devido os pacientes em estado de readaptação após a guerra que ambos tratavam. As ideias dos dois com este trabalho resultaram em um livro que apresenta as premissas da teoria organísmica.
Fonte: https://bit.ly/2Gck3ru
A Gestalt-Terapia compartilha do mesmo da Teoria Organísmica de que a repetição de padrões de comportamentos, a não exposição a novas situações, é uma esquiva para evitar situações de ansiedade gerada pelo desconhecido. Para a Gestalt isso seria um estado neurótico de comportamento que limita a vida do sujeito, pois para ambos o neurótico desistia muitas vezes da satisfação devido suas experiências negativas. Na Teoria Organísmica, Goldstein deu importância ao papel da criatividade para o indivíduo se auto-regular, evitando assim a ansiedade, e estimulando este indivíduo a ir em busca da novidade.
O filme aborda aspectos como os traços psicóticos da personalidade de serial killer, o reflexo dos traumas de infância no desenvolvimento e suas consequências na vida adulta
Considerado um clássico do terror psicológico, ‘O Silêncio dos Inocentes’, lançado no início dos anos 90, apresenta uma narrativa extremamente cativante, capaz de prender o espectador com maestria durante duas horas de filme. A história, permeada de suspense, se desenrola e ganha intensidade a cada minuto até atingir seu clímax. Vencedor de cinco prêmios Oscar em 1992, a obra é, sem dúvidas, um dos grandes marcos e uma das maiores contribuições do diretor Jonathan Demme para o cinema.
Muito além de apenas uma narrativa de suspense e terror, “O Silêncio dos Inocentes” convida o espectador a refletir sobre a natureza humana e suas infinitas peculiaridades, apresentando personagens com perfis psicológicos complexos e bem trabalhados. Acompanhamos a dura trajetória de Clarice Starling, a tímida, mas forte e determinada detetive do FBI, durante o desenrolar do caso Buffalo Bill. Seus encontros com o psiquiatra e temido assassino em série Hannibal Lecter não só a tocam profundamente como contribuem para o próprio processo de investigação criminal.
Fonte: https://bit.ly/2XYcDij
Esses encontros desempenham um papel importante na trama e formam uma peça chave para entender como se dá na prática a relação fenomenológica entre dois sujeitos totalmente inversos em valores e vivências. O encontro entre a doçura e determinação da jovem Clarice e a postura intimidadora do sagaz e analítico Hannibal Lecter é o eixo narrativo que deverá pautar a discussão ao longo do texto, de modo a tecer considerações a respeito da fenomenologia existencial como base filosófica para compreender as relações humanas.
Resumo do Filme
Clarice Starling é uma estagiária do FBI que é designada para desempenhar um grande papel nas investigações do caso Buffalo Bill, um serial killer de mulheres cujas motivações seguem desconhecidas pelas autoridades. Como parte da investigação, ela é também a estagiária escolhida por seu superior para exercer uma tarefa um tanto quanto assustadora: visitar o terrível assassino Hannibal Lecter em sua cela, de modo a obter informações a respeito do caso. Na sua primeira visita, Clarice é intimidada e confrontada pelo psiquiatra, que chega a provocá-la com comentários irônicos e ofensivos, mas a jovem detetive consegue manter sua postura e conduzir a investigação sem demonstrar estar se sentindo atacada.
O diálogo entre os dois segue permeado por uma atmosfera de tensão, e Hannibal cada vez mais demonstra interesse pelas particularidades da personalidade da jovem detetive. A expectativa quanto ao interesse de Lecter em ajudar nas investigações era baixa, mas ele decide colaborar a seu próprio modo: utilizando-se de enigmas, anagramas, pistas e jogos mentais, envolvendo Clarice em sua teia de manipulação. Dessa forma, ele rejeita o questionário investigativo proposto pela detetive e faz sua primeira jogada, dando a ela a primeira pista sobre o caso, escondida atrás de um anagrama.
Seguindo as orientações e pistas de Hannibal, Clarice chega a uma garagem e encontra o cadáver de um homem, tendo o primeiro êxito na investigação. Sua segunda visita à cela do psiquiatra é ainda mais reveladora, e o vínculo entre os dois começa a se desenvolver com mais propriedade. A vítima encontrada na garagem era conhecida por Hannibal, mas não havia sido assassinada por ele, mas sim pelo próprio Buffalo Bill, que já havia tido um laço amoroso com o homem. Enquanto isso, o serial killer segue atrás de vítimas. Ele consegue enganar e sequestrar a filha de uma importante senadora, o que moverá ainda mais as autoridades posteriormente na trama.
Fonte: https://bit.ly/2Cn02vM
Trazendo mais pistas para o caso, um dos corpos das cinco vítimas do assassino é encontrado. Durante a necrópsia, é identificado na boca da mulher um objeto um tanto quanto incomum: uma pupa de mariposa. Esse item torna-se um dos padrões observados em cada vítima, além do fato de serem mulheres de corpos grandes e de terem tido suas peles retiradas.
Quando o sequestro da filha da senadora torna-se de conhecimento público e surgem os primeiros indícios de que ela teria sido mais uma vítima de Buffalo Bill, as investigações ganham mais intensidade. Em uma das cenas mais memoráveis do filme, Hannibal concorda em ajudar Clarice com mais pistas, sob uma condição: que ela exponha o mais íntimo de sua alma a ele. Inicialmente hesitante, a jovem detetive acaba por revelar uma importante parte da sua história a Lecter, contando sobre sua difícil infância. Órfã de pai aos dez anos, Clarice foi morar na fazenda de seu tio, mas uma situação fez com que ela fosse encaminhada para um orfanato: uma criação de ovelhas estava sendo mantida em cárcere para que tivessem suas peles posteriormente retiradas. Os gritos dos animais levaram a jovem Starling a tentar resgatar uma das ovelhas, mas, infelizmente, ela foi encontrada com o animal após fugir dos limites da fazenda. Hannibal, fascinado com a história, faz um paralelo entre a situação e o comportamento atual da detetive, que se vê obrigada a ajudar as jovens sequestradas pelo serial killer. O encantamento do psiquiatra com Clarice torna-se ainda mais evidente, e o vínculo entre os dois ganha mais força.
Em outra visita a cela de Hannibal, a jovem propõe outro acordo a ele: caso seus esforços para colaborar com a investigação e o resgate da filha da senadora sejam frutíferos, ele será presenteado com regalias especiais, como poder passar momentos numa ilha sob escolta policial. É organizado um encontro entre ele e a senadora, e mais informações são passadas. Ainda não convencida das intenções do psiquiatra, Clarice o visita uma última vez e tenta retirar dele a verdade sobre a identidade do serial killer, mas seu tempo com ele acaba e ela é retirada à força do local. Numa cena envolvida em tensão, dois policiais visitam a cela do psiquiatra para trazer comida, e ele consegue traçar uma estratégia de fuga, matando ambos e retirando a pele do rosto de um deles, para logo após trocar de roupa com ele, de modo a enganar as autoridades e a ambulância. É encontrado no teto do elevador um corpo com as roupas de Hannibal, mas é revelado que, na verdade, se tratava do corpo de um dos policiais. Dessa forma, o possível sobrevivente levado na ambulância era o próprio Hannibal, disfarçado com roupas de policial e com o rosto retirado da vítima. Com essa estratégia, Dr. Lecter consegue mais uma vez enganar as autoridades e fugir.
Fonte: https://bit.ly/2Favuz7
Enquanto isso, a jovem filha da senadora é atormentada por seu sequestrador, que a mantém presa dentro de um buraco. O serial killer, excessivamente maquiado e vestido com roupas femininas, faz uma grande pressão psicológica na vítima. Nas cenas que mostram seu esconderijo, entramos em contato com o fato de que Buffalo Bill é, na verdade, um transexual, ou que ao menos se enxerga dessa forma, e que o sequestro e assassinato das mulheres sempre teve como propósito usar suas peles para finalidades estéticas, de modo que ele conseguisse se sentir na “pele” de uma mulher. As pupas de mariposa, cuidadosamente alojadas na boca das vítimas, simbolizavam a transformação desejada pelo assassino e concretizada com a retirada das peles das vítimas.
As pistas dadas por Hannibal levam as autoridades a um caminho, mas Clarice, seguindo a sua intuição, decide continuar a investigação por si mesma. Ela visita a casa da primeira vítima do serial killer e descobre mais informações relevantes para o caso, inclusive o fato dele estar usando as peles para fazer suas próprias roupas. Reunindo pistas e informações, a detetive chega a casa do assassino, enquanto o FBI segue as orientações dadas por Hannibal e chega a outra casa. Clarice, sem ter ideia disso, conversa com o próprio Buffalo Bill buscando por mais informações, e só tem a certeza de que o homem em sua frente é o assassino que ela procura quando enxerga ao fundo uma mariposa exótica voando – a mesma espécie cujas pupas eram colocadas na garganta das vítimas. Inicia-se então o que pode ser classificado como o ápice do filme: a detetive persegue o homem dentro de sua própria casa e encontra a filha da senadora dentro do buraco.
Em um dado momento, as luzes são desligadas e somos levados a crer que o serial killer conseguirá matar Clarice, mas a jovem, com sorte, consegue mirar e atirar nele, encerrando de vez o caso e, finalmente, “silenciando as ovelhas”. Clarice consegue muito prestígio e reconhecimento pelo FBI e pela sociedade, e, no final do filme, Hannibal lhe faz uma ligação, parabenizando-a pelo seu sucesso, deixando evidente sua admiração e carinho pela jovem detetive.
Fonte: https://bit.ly/2TC2nxv
Análise
‘O Silêncio dos Inocentes’ é, sem dúvidas, um prato cheio para o estudo da psicologia. Repleto de nuances que trabalham a complexidade da psique humana, o filme aborda aspectos como os traços psicóticos da personalidade de serial killer, o reflexo dos traumas de infância no desenvolvimento e suas consequências na vida adulta, e questões para além do campo psicológico, como o machismo no ambiente de trabalho. Indo ainda mais além do que já foi citado, há presente no filme algo ainda mais delicado e complexo de se debruçar sobre: a relação entre Hannibal e Clarice.
O primeiro contato entre a detetive e o psiquiatra dá-se quando ainda há um grande distanciamento entre os dois, expresso não só pela cela que separa Hannibal da jovem, como também pela própria história, personalidade e universo de ambos. Os encontros, para Clarice, possuíam um único e claro objetivo: colher informações sobre o caso Buffalo Bill. Para Hannibal, a presença da detetive significava uma rotina já vivenciada por ele inúmeras vezes antes, repleta de interrogatórios, questionários e entrevistas. As percepções individuais de cada um dos polos envolvidos na relação, no caso, Hannibal e Clarice, refletem a história de vida de cada um, ou seja, seus modos de existir, o ser-no-mundo.
Para a fenomenologia existencial, o ser-no-mundo reflete a maneira de existir de cada ser humano, baseada em suas vivências e percepções (TEIXEIRA, 1997). As formas de existir estão atreladas a três tipos de relações: o homem com o meio que o cerca, o homem com o outro e o homem consigo mesmo. Trazendo para o contexto do filme, Clarice e Hannibal, com a soma de suas vivências individuais e suas vivências sociais com seus respectivos meios, se encontram na dimensão da relação eu-outro, construindo assim um vínculo inicial que se desenrolará ao longo da trama.
Conforme Teixeira (1997), o ser-no-mundo torna-se patológico quando as relações do indivíduo são infrutíferas no âmbito pessoal, ou seja, quando o ser é incapaz de adentrar seu mundo interno e estabelecer conexões saudáveis consigo mesmo. Partindo desse ponto, o indivíduo também seria incapaz de manter boas relações nas outras esferas (eu-outro e eu-meio). Essa dinâmica é observada em Hannibal, cujas atitudes e vivências no mundo foram conduzidas de modo a trazer sofrimento ao outro e satisfazer o próprio desejo.
Fonte: https://bit.ly/2HwMSjq
A incapacidade do indivíduo de tecer uma reflexão sobre as próprias atitudes ao relacionar-se consigo mesmo levaria à incapacidade desse mesmo indivíduo de se relacionar com o meio e com outras pessoas. Dessa forma, o primeiro encontro entre os dois personagens é permeado pelo fenômeno patológico de Hannibal, que se manifesta na relação através de comentários irônicos, sarcásticos e até mesmo ameaças contra a detetive. Essa dinâmica de relação pouco a pouco sofre alterações. De encontro a encontro, Clarice e Hannibal fortalecem o vínculo e passam a enxergar além dos rótulos de detetive e assassino para enxergarem a essência de cada um, o ser-no-mundo como ele é. Para isso, um elemento mostra-se indispensável.
De acordo com Silva (2013), o diálogo é a base para que a relação eu-outro seja construída e se desenvolva de maneira saudável. Sem a presença de uma relação dialógica, a dimensão eu-outro é ineficaz e não gera frutos. Como observado no filme, os diálogos entre Hannibal e Clarice, apesar de serem poucos e acontecerem em curtos períodos de tempo, servem como uma ponte entre o muro que os separa. A aproximação entre os dois personagens atinge o ápice quando o psiquiatra pede que a jovem conte sobre sua infância e seus traumas – dessa maneira, o rótulo “detetive” é substituído pela pessoa Clarice, e o foco da relação acontece no encontro entre duas pessoas, muito além do significado social da existência de ambos.
Feijoo e Mattar (2014) atentam para os preceitos filosóficos da fenomenologia de Sartre. Entre eles, as autoras citam um aspecto que norteia a visão fenomenológica como um todo: a importância de ver as coisas como elas são, para além da objetividade e subjetividade. O objeto, para a fenomenologia, deve ser apreendido pelo ser da maneira mais pura e reduzida possível, ou seja, sem um viés objetivo e prático e muito menos emocional, subjetivo ou individual. Enxergar o mundo dessa forma significa, em outras palavras, enxergá-lo como ele acontece – sem ideias pré-concebidas, sem o peso de uma análise. Em O Silêncio dos Inocentes, tanto Hannibal quanto Clarice sentem-se desafiados e até mesmo intimidados pela presença um do outro, e apreendem a realidade da relação entre eles de um modo carregado de análises, percepções e hipóteses.
A redução fenomenológica (epoché), ou seja, o ato de reduzir o fenômeno ao modo como ele acontece, puro e simplesmente, apresenta-se como um desafio durante a trama. O distanciamento evidente entre Hannibal e Clarice dificulta que a relação seja construída desprovida de estigmatizações e hipóteses. Entretanto, uma aproximação acontece entre os dois, ainda que tímida e com restrições, e nela o vínculo é formado. A curiosidade de Hannibal em conhecer a individualidade da jovem, mesmo servindo como uma forma de colher material para análise, o aproxima da essência de Clarice. Há, então, uma tentativa de chegar ao núcleo desse objeto (o outro), atravessando as inúmeras barreiras sociais entre os dois, a cela real e simbólica que os divide. É possível dizer que, após esse nível de percepção ter sido alcançado, Hannibal passa a enxergar Clarice como uma pessoa, humanizando-a. A relação do psiquiatra com o outro é baseada na desumanização.
Fonte: https://bit.ly/2u8Vl4m
Dessa forma, cria-se um distanciamento entre a sua pessoa e a pessoa da vítima, que é tratada por ele como um pedaço de carne, literalmente. Deve-se ao vínculo formado entre ele e Clarice e pela relação embasada no diálogo e na vivência real, sem interferência de elementos externos, o fato da jovem não se tornar um dos seus alvos no final do filme. A própria tem certeza de que não será perseguida pelo psiquiatra quando este consegue fugir.
Outro fenômeno relevante presente na trama, já mencionado anteriormente, é o modo como as vivências passadas de Clarice afetam seu aqui e agora. Barco (2012) conceitua o fenômeno da presentificação ou presentação como o ato de direcionar a consciência para o momento presente, agindo sobre o agora, ainda que os meios para chegar a esse estado sejam pela imaginação ou fantasia. Atrelada aos traumas de seu passado, é possível inferir, ainda que esse não seja o propósito de uma abordagem fenomenológica, que a detetive age no presente guiada por experiências de seu passado, como a morte do pai (por um assaltante) e seu insucesso em salvar as ovelhas que teriam as peles retiradas. Ambos os eventos podem estar diretamente relacionados com o contexto de sua vida adulta: sua atuação no FBI, guiada por um senso de justiça possivelmente despertado logo após a morte do pai e também dos animais, e sua atuação no caso Buffalo Bill, onde as vítimas tinham o mesmo propósito das ovelhas. A solução de seus conflitos do passado é presentificada e vivida na cena que conclui o caso, quando a detetive atira e mata o serial killer, fazendo justiça pelas vítimas e, em analogia, pelas ovelhas e seu pai.
Sem dúvidas, há uma complexidade de relações intra e interpessoais que são trabalhadas em O Silêncio dos Inocentes, e são inúmeras as possibilidades de interpretação dos personagens e eventos da trama. A aproximação de Hannibal e Clarice, inusitada pela diferença de valores e preceitos de cada um, convida o espectador a refletir.
O filme evidencia que, por mais diferentes que sejam os indivíduos, um encontro é possível – e a relação sempre terá como resultado um produto capaz de tocar a essência de cada sujeito que esteja em interação. Ser-no-mundo é individual e intrapessoal. Ser-com é um convite para o encontro, para o estabelecimento de relações interpessoais. E as duas maneiras de existir se completam para formar um produto que é dotado de possibilidades: o ser humano, com seus fenômenos e complexidades, capaz de transformar e de ser transformado.
FICHA TÉCNICA DO FILME:
Fonte: https://bit.ly/2TFfTR0
O SILÊNCIO DOS INOCENTES
Título original:The Silence of the Lambs Direção: Jonathan Demme Elenco: Jodie Foster, Anthony Hopkins, Ted Levine, Scott Glenn; País: EUA Ano: 1991 Gênero: Suspense; Terror
REFERÊNCIAS:
BARCO, Aron Pilotto. A constituição do espaço na
fenomenologia de Husserl. 109 f. Dissertação de Mestrado – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2012.
FEIJOO, Ana Maria; MATTAR, Cristine Monteiro. A Fenomenologia como Método de Investigação nas Filosofias da Existência e na Psicologia. Psicologia: Teoria e Pesquisa; Out-Dez 2014, Vol. 30, n. 4, pg. 441-447.
SILVA, Edna Maria. O ser na relação com o outro. Revista de Psicologia, Edição I. pg. 123-124, 2013.
TEIXEIRA, José A. Carvalho. Introdução às abordagens fenomenológica e existencial em psicopatologia (II): as abordagens existenciais. Análise Psicológica, 2 (XV). pg 195-205. 1997.
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A incrível história de Adaline: um olhar fenomenológico existencial
Adaline Bowman torna-se imortal, aos 29 anos de idade, após um acidente de carro combinado à uma descarga elétrica causada por um raio. Para muitos a imortalidade é vista como uma benção, porém para Adaline, ela é apenas um infortúnio. Devido a sua nova forma de vida, ela abdica-se de relacionamentos afetivos profundos, para que não sofra ainda mais e nem faça outras pessoas sofrerem também.
Apesar de tal privação, Adaline não deixa de aproveitar sua existência de outras maneiras. Percebe-se que ela passa a olhar a vida com mais valorização, com o objetivo de fazer dela a mais produtiva possível, já que será eterna. Dentre a sua gama de aprendizados, estão a capacidade de falar vários idiomas, ter lido livros a perder de vista, ter trabalhado nas mais variadas áreas de atuação, ter viajado para diversos lugares no mundo e ter visto culturas nascendo e desaparecendo.
Ao assistir a performance de Adaline, passa-se a experimentar um olhar mais poético do fenômeno da existência. Tal fenômeno vai muito além do que os humanos têm costumado perceber no dia-a-dia. O olhar diferenciado da protagonista é permeado de grande angústia na maior parte do tempo, porém isso não lhe impede de ressignificar cada momento da sua existência eterna.
Fonte: encurtador.com.br/eAKL1
Para Novaes de Sá e Barreto “Há na angústia um sentimento de estranheza, retirando o homem da aparente segurança e da experiência de bem-estar proveniente do nivelamento de seu ser a partir daquilo com que se ocupa no mundo ( 2011, pág. 5).” Esse sentimento de estranheza incentiva o indivíduo a se mover à favor dos seus desejos e ambições terrenos.
Adaline é uma personagem que provoca reflexão no mais profundo quesito da vida, que são “as escolhas feitas dia após dia na existência de cada ser humano”. Existem vários momentos no filme que exemplificam claramente a importância que ela dá a cada decisão e um deles é retratado na cena em que sua filha lhe faz uma ligação telefônica. Para muitas pessoas uma ligação de alguém querido pode ser um evento simples, no entanto, para nossa protagonista, aquele momento merecia a mais atenciosa resposta possível. Cada palavra trocada, cada evento externo ignorado que pudesse lhe fazer dividir o foco de atenção, era significativo para si mesma e para a demonstração de afeto prestada à filha.
A angústia vivenciada por Bowman perpassa o telespectador em todo o filme, e o questionamento constante é sobre a esperança de que ela consiga envelhecer novamente. Quando o telespectador sente esse desejo e percebe-o, passa a reconsiderar tudo aquilo que já tenha visto, sobre os benefícios de ser imortal. Esse momento é único, e faz com que você passe a olhar para o seu próprio ser no mundo e as relações que estabeleceu com as pessoas a sua volta, assim como as formas de existir definidas por si mesmo.
Ressignificar, é a palavra que define o filme A incrível história de Adaline Bowman! Para Gáspari e Schwartz (2005) ressignificar a vida, as relações, os laços, os comportamentos, os erros, os acertos, a história construída, é o passo para verdadeiro encontro de si mesmo. É olhar para além de um calendário que se traduz nos dias de vida, e sim, olhar para si como um ser inserido em um espaço-tempo com tantos outros seres e possibilidades, que podem ser exploradas da forma mais linda e autêntica possível!
FICHA TÉCNICA
A incrível história de Adaline Bowman
Título original: The age of Adaline
Direção:Lee Toland Krieger Elenco: Blake Lively,Michiel Huisman,Harrison Ford Ano: 2015 País: EUA Gênero:Romance, Fantasia, Drama
REFERÊNCIAS:
Novaes de Sá e Barreto, Roberto e Carmém Lúcia. A noção fenomenológica de existência e as práticas psicológicas clínicas. Estudos de Psicologia, vol. 28, núm. 3, julio-septiembre, 2011, pp. 389-394 Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas- SP.
GÁSPAR, Jossett Campagna de; SCHWARTZ, Gisele Maria. O Idoso e a Ressignifi cação Emocional do Lazer. Psicologia: Teoria e Pesquisa, São Paulo, v. 21, n. 1, p.69-76, abr. 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/%0D/ptp/v21n1/a10v21n1.pdf>. Acesso em: 03 dez. 18.
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Co-relação da epilepsia, depressão e a tentativa de suicídio, à luz da Fenomelogia Existencial
O Ministério da saúde, junto à Secretaria de Atenção à Saúde, define a epilepsia como “a uma doença cerebral crônica causada por diversas etiologias e caracterizada pela recorrência de crises epilépticas não provocadas”, sendo uma alteração do Sistema Nervoso Central (SNC), e sua expressão clínica se inclui sintomas cognitivos psiquiátricos em concomitância com crises epilépticas. (MS, 2013 p.1). Essa condição traz implicações diretas à qualidade de vida do sujeito afetado, pois tem consequências neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e sociais. Diversas pesquisas apontam que a predominância de transtornos depressivos em pacientes com epilepsia é expressivo (MARTINS; GONÇALVES, 2017).
No que diz respeito aos aspectos psicossociais envolvidos como causa de depressão, a estigmatização e discriminação que perpetuam no contexto atual, o controle ineficaz das crises e as significativas mudanças nos hábitos, vêm se tornando fatores constantemente relacionados com a depressão. Deste modo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a estimativa é que mais de 350 milhões de pessoas vivem com depressão, e na pior das hipóteses, a depressão pode levar ao suicídio (OMS, 2016).
Fonte: encurtador.com.br/ivIMQ
O objetivo deste trabalho é identificar e reconhecer algumas contribuições da fenomenologia-existencial para trabalhar o contexto da depressão, a partir de publicações científicas sobre a relação com a epilepsia x depressão. Justifica-se o presente estudo diante da necessidade de se conhecer e acolher melhor tal patologia e transtorno depressivo, para que possamos tratá-la de modo mais eficaz. Depressão e epilepsia podem compartilhar mecanismos patogenético que facilitariam a ocorrência de um na presença do outro, sendo mais provável encontrar a depressão em pacientes com epilepsia quando comparado com sujeitos sem estarem.
Para a finalidade metodológica deste artigo foi utilizado à pesquisa bibliográfica. Utilizou-se da abordagem qualitativa com objetivo metodológico exploratório. A pesquisa se desenvolveu no levantamento bibliográfico, fundamentado em artigos científicos, dissertações e teses de mestrado em conformidade ao tema. Foram analisados artigos em periódicos e teses encontrados nas plataformas Scielo, BVS-PSI e PEPSIC. Tal escolha para o percurso metodológico se dá pela urgência de se abrir debates sobre este tema à luz da fenomenologia-existencial.
Um transtorno que requer atenção
O referido trabalho consiste em um estudo bibliográfico sobre a co-relação da epilepsia como fonte desencadeadora para a depressão, sendo estimulo para a ideação ou tentativa de suicídio, sob o enfoque da fenomenologia existencial. Diante disso, a prevalência mundial de epilepsia ativa foi estimada em torno de 0,5%-1,0% da população, dos quais, aproximadamente 30% continuam sofrendo crises, apesar do tratamento adequado com medicamentos anticonvulsivantes, ou seja, são pacientes refratários (MS, 2013). Sendo considerado o transtorno neuropsicológico de maior hegemonia, que pode trazer como consequência a morte súbita, lesões, transtornos mentais e disfunções psicológicas (MARCHETTI; DAMASCENO, 2000). Para ser diagnosticado com epilepsia, o indivíduo precisa apresentar um conjunto de convulsões que não podem ser provocadas por algum estímulo que seja facilmente tratável, ou seja, que não sejam por alterações da glicemia, por abstinência ou abuso de álcool e drogas, e não apresenta nenhuma alteração hidroeletrolítica tratável. É de suma importância compreender a diferença entre convulsão e epilepsia. A convulsão é um sintoma, e ocorre pela despolarização de uma área do cérebro.
O cérebro funciona a partir de estímulos elétricos, por isso quando pensamos, raciocinamos, movimentamos algum membro do corpo, etc, ocorre à despolarização, uma atividade elétrica em determinada região do cérebro, denominado hiperexcitabilidade, e um excesso de atividade elétrica da área ocorre à convulsão (MARTINS; GONÇALVES, 2017). Isso se dá pelo fato da diminuição da função serotoninérgica, noradrenérgica e GABAérgica que são identificados como neurotransmissores fundamentais no mecanismo patogenético da depressão, e formam a base do tratamento (OLIVEIRA; PARREIRAS; DORETTO, 2007).
Fonte: encurtador.com.br/jPU45
Os autores Kandratavicius, Hallak e Leite (2007), afirmam que há um encadeamento de acontecimentos comuns entre depressão e epilepsia, entre eles estão à redução da laboração serotoninérgica e noradrenérgica, além de anormalidades nas estruturas e funcionalidade no sistema límbico. Exames de neuroimagem funcional mostram que uma diminuição da atividade no lobo frontal é condição essencial para o desenvolvimento da depressão. Essa disfunção levaria a um hipometabolismo nas regiões do cérebro, aumentando a vulnerabilidade à depressão. Contudo, se considerarmos os sintomas devastadores que a depressão apresenta na qualidade de vida, de pacientes nesta patogenética, embora ainda seja difícil fazer uma correlação entre depressão e ansiedade, nestes casos clínicos, torna-se evidente e de suma importância o tratamento adequado de depressão a estes pacientes (OLIVEIRA; PARREIRAS; DORETTO, 2007).
Em pacientes com epilepsia ficam evidentes os principais sintomas como, modificações na capacidade de sentir prazer ou vivenciá-los, perda e/ou diminuição de interesse e concentração, cansaço físico ou mental acentuado. Todos estes sintomas são presentes em pacientes depressivos, como também vistos em epiléticos, juntando-se ainda a baixa autoestima, autoconfiança e sentimentos de indignidade e culpabilidade. Os autores Santiago e Holanda (2013) apontam que existem alguns principais fatores que se elucidam como fatores de risco para a depressão, acontecimentos que se elevam o estresse, uso abusivo ou perdas de drogas ou medicamentos, histórico familiar de depressão, episódios de depressão anteriores e doença física. OMS (2011) relata que se torna uma questão mais difícil tanto em países desenvolvidos mesmo que estes tenham uma atenção maior à saúde mental, como os em desenvolvimento, o fato de muitas pessoas não conseguirem se beneficiar dos serviços psiquiátricos ofertados. Pelo fato da relação preconceituosa existente aos sujeitos que são portadores de transtornos comportamentais e mentais.
Fonte: encurtador.com.br/fgjW4
Pesquisas apontam que esses estigmas são fatores que podem potencializar o sofrimento do sujeito acometido pela depressão, dificultando assim, o diagnóstico e adesão ao tratamento de maneira correta e eficaz. A complexidade em se elaborar e fechar um diagnóstico a partir das diversas manifestações da depressão acaba em confundir as expressões de depressão que não são clínicas, ou se assemelham com estados de tristeza. Aqui se julga necessário e pertinente não confundir o diagnóstico depressivo com sentimentos melancólicos e/ou de tristeza, haja vista que estes, acompanham o indivíduo por diversos momentos da vida, pois, são acontecimentos estressantes do dia a dia.
A depressão é um transtorno psicopatológico ao qual seu diagnóstico precisa ser coeso para que assim, se possa ofertar um tratamento adequado em conformidade com sua necessidade e gravidade. Como seus encaminhamentos para um completo tratamento. Os autores ainda teorizam que a nomenclatura correta a ser usada é “transtorno depressivo”, pois assim é possível diferenciar o sentimento normal de tristeza temporário da depressão clínica (PARKER; BROTCHIE, 2009). Desta forma, pacientes epiléticos, encontram-se em profunda tristeza, sem ânimo para seguir por vergonha da sua condição, enxergando somente como solução o suicídio, já que o suicídio é uma forma de agressão que o próprio sujeito faz a si, procurando por fim a dor e vergonha que sente, dando fim aos seus problemas, ou seja, fim à própria vida.
Fonte: encurtador.com.br/yMV57
Não podemos esquecer que existem vários outros meios de autoagressão, aos quais não podemos classificar como ato suicida, porém, nos revelam particularidades no tocante as tentativas de suicídio, ao passo que nos demonstra completo desinteresse pela vida. Pois quando não se tem um sentido pela própria vida, ou seja, falta deste sentido, isso se torna um aliado importante para a tomada de decisão ao ato violento de se matar (ROCH; BORIS; MOREIRA, 2012). Logo, Santiago e Holanda (2013) teorizam que pesquisas mostram a eficácia na utilização de psicoterapia no tratamento de pacientes/clientes com depressão, seja ela em grau leve, moderado ou mais grave. Neste contexto, a psicologia fenomenológico-existencial compreende e diferencia os fenômenos psicopatológicos, se comparados aos outros modelos focados ao biológico e fisiológico. Torna-se necessário para o psicoterapeuta existencial, saber reconhecer que cada ciclo da vida acarreta suas dificuldades, para que assim a psicoterapia possa atender com total competência não apenas as queixas explícitas do seu cliente, mas sim acolhê-lo em sua completude existencial. Ou seja, o foco da psicoterapia existencial seja que o cliente experimente sua existência como real, tornando-se apto para suas potencialidades e assim saber agir sobre elas (GOMES; CASTRO, 2010).
Assim, fundamenta-se a tomada de consciência, o insight na psicoterapia. Conclui-se que ajustamentos depressivos por dado paciente, são ajustamentos criativos, onde se configura um padrão depressivo de contato, ou seja, barreiras de contato conflituosas, onde não se percebe as disfunções, mas que se torna importante para um ajustamento em várias situações da vida.
Fonte: encurtador.com.br/bnsGH
Define-se que o ajustamento depressivo, nada mais é que uma maneira encontrada para economizar a regulação, para se evitar tomadas drásticas pelo indivíduo acometido pela depressão (YANO, 2016). Logo indivíduo se torna capaz para lidar com as frustrações da vida que surgem, presentificar e tomar compreensão de maneira a usufruir destas para fazer um ajustamento criativo e a partir dessas frustrações adquirindo conhecimento, e crescer com tais demandas (ROCH; BORIS; MOREIRA, 2012). Rogers (1961/1997, p. 196), “é apenas quando vivencia um aspecto de si mesmo negado até então, num clima de aceitação, que a pessoa pode tentar assumi-lo como parte de si mesmo”. Tal experiência é dolorosa, mas somente desta maneira se possibilita aceitação genuína de maneiras a lidar com a nova percepção antes não cogitada, ou até mesmo enxergada.
Ainda para Rogers (1961/1997), é a partir da experiência humana na autenticidade de se tornar quem se é que ao mergulhar por inteiro neste processo de autoconhecimento, provocando mudanças, somente aí se encontra de forma fácil quem verdadeiramente se é. Só a mudança diante deste processo, diante de novas escolhas, de forma criativa e autentica, permite-se uma avaliação organísmica de tal experiência. Ao se tornar pessoa, consideramos nossas experiências em possibilidades existenciais, passamos a ser responsáveis por nossas atitudes e escolhas, e isso tem significado potencializador.
Partindo das considerações expostas sobre a epilepsia, a depressão e a tentativa de suicídio, é notório o efeito negativo na qualidade de vida dos indivíduos acometidos de tal sintomatologia. Para tanto, percebe-se a importância de um tratamento adequado a estes pacientes, buscando um vínculo de empatia e autenticidade para com estes. Nesta relação terapêutica se torna essencial entender à subjetividade de cada indivíduo quanto ao processo de saúde/doença na fenomenologia, pois nesta abordagem evidencia-se o próprio fenômeno e o indivíduo quanto sua consciência, como seus sentimentos, fantasias e memórias. Desta forma, torna-se necessário a aceitação do indivíduo como ele se mostra no aqui – agora, acolhendo o seu modo de se expressar.
REFERÊNCIAS:
OLIVEIRA, Bruno Lucio Marques Barbosa de; PARREIRAS, Mariane Santos; DORETTO, Maria Carolina. Epilepsia e depressão: falta diálogo entre a neurologia e a psiquiatria? Journal Of Epilepsy And Clinical Neurophysiology, Porto Alegre, v. 13, n. 3, p.109-113, set. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-26492007000300004>. Acesso em: 05 set. 2018.
SANTIAGO, Anielli; HOLANDA, Adriano Furtado. Fenomenologia da Depressão: uma Análise da Produção Acadêmica Brasileira. Revista da Abordagem Gestáltica – Phenomenological Studies, Paraná, v. 1, n., p.38-50, jul. 2013. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rag/v19n1/v19n1a06.pdf>. Acesso em: 05 set. 2018.
ROCH, Marcio Arthoni Souto da; BORIS, Georges Daniel Janja Bloc; MOREIRA, Virginia. A Experiência Suicida numa Perspectiva Humanista-Fenomenológica. Revista da Abordagem Gestáltica, Fortaleza, v. 1, p.69-78, jun. 2012. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rag/v18n1/v18n1a10.pdf>. Acesso em: 06 set. 2018.
Organização Mundial de Saúde. (2011). Relatório sobre a saúde no mundo. Genebra: Organização Mundial de Saúde. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rag/v19n1/v19n1a06.pdf. Acesso em: 06 set. 2018.
PARKER, Gordon; BROTCHIE, Heather. Depressão maior suscita questionamento maior. Revista Brasileira de Psiquiatria, Austrália, v. 31, p.53-56, jan. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbp/v31s1/a02v31s1.pdf>. Acesso em: 06 set. 2018.
YANO, Luciane Patrícia. A CLÍNICA EM GESTALT-TERAPIA: A GESTALT DOS ATENDIMENTOS NOS TRANSTORNOS DEPRESSIVOS. p.67-85, abr. 2016. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rnufen/v7n1/a05.pdf>. Acesso em: 07 set. 2018.
ROGERS, C. R. (1997). Tornar-se pessoa (5ª ed.). São Paulo: Martins Fontes (Original publicado em 1961)
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Ligas Acadêmicas de Psicologia: aberta as inscrições!
19 de setembro de 2018 Laryssa Nogueira dos Anjos Araújo
Notícias
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As inscrições vão até o dia 30 de setembro de 2018.
Nesta quarta-feira, dia 19 de setembro de 2018, teve a abertura das inscrições das Ligas Acadêmicas do curso de Psicologia (2018/2), o encerramento está previsto para o dia 30 do mesmo mês. As ligas são uma iniciativa do Centro Acadêmico (C.A.) de Psicologia com parceira com a coordenação do curso de Psicologia e professores orientadores de cada abordagem.
Lanusse Guimarães, diretora de pesquisa e extensão do C.A. de Psicologia, diz que as ligas têm como objetivo o fortalecimento dos saberes científicos, bem como o desenvolvimento das atividades de extensão voltadas as suas respectivas abordagens. Assim, os encontros acontecerão semanalmente nos meses de outubro e novembro, com direito à certificação com as horas extracurriculares concernentes às atividades realizadas de cada liga.
Neste semestre, na inscrição, serão oferecidas ligas nas seguintes abordagens: Psicanálise, Análise do Comportamento, Fenomenologia Existencial, Sistêmica e Cognitivo-Comportamental. É válido lembrar que para abertura de cada liga é necessário que haja no mínimo 10 inscritos.
Acadêmicas de psicologia, Evelly Silva e Isaura Rossatto. Foto: Laryssa Araújo.
Também é possível acessar o formulário de inscrição através da arte de divulgação abaixo, pela leitura do qwerty code feita na câmera ou aplicativo de celulares:
Arte: Laryssa Araújo
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Acadêmicos de TTP3 realizam Café Literário e evento de Prevenção ao Suicídio para simulação de venda de Livro
Nesta quarta-feira, 09 de maio, os acadêmicos da disciplina de TTP3, ministrada pela Professora Me. Carolina Cótica, realizaram um café literário para simular a venda do livro “Do desabrigo à confiança”, da autora Bilê Tatit Sapienza.
Fonte: encurtador.com.br/noGKQ
O café literário aconteceu em um cenário muito lindo, montado pelas acadêmicas Jéssica Neres, Elma Barros e Eva Isenhargen. Com direito à café da manhã, lembrancinhas personalizadas com o nome do evento, sorteio de brinde ao público presente, as acadêmicas conquistaram a atenção dos alunos.
Fonte: encurtador.com.br/txBJ3
As acadêmicas Adrielly Martins, Risodalva Matsumura, Nayara Marques, Paula Beatriz e Marisa Armudi, trouxeram para a sala de aula o próprio escritor do livro (representado pela aluna Nayara). A apresentação contou com uma encenação de uma caso clínico retratando a tentativa de suicídio de uma paciente, seguido de comentários do autor embasados teoricamente em seu livro.
Fonte: encurtador.com.br/txBJ3
A iniciativa de propor essa forma dinâmica e criativa de apresentações partiu da Professora Me. Carolina Cótica, que pautada na fenomenologia existencial têm instigado a turma a pensar/atuar para além das idéias/práticas engessadas. Para isso ela tem buscado meios de fazer os alunos explorarem seu potencial criativo, com o objetivo de estarem cada vez mais preparados para suas futuras práticas profissionais. Tal atitude tem sido percebidas também em outras disciplinas que a professora ministra.
Ao se utilizar o termo awareness, faz se necessário a busca por seu “significado”, no qual os textos descrevem de diversas formas tais como: presentificação, tornar-se presente, concentração, conscientização, tomada de consciência entre outros. No entanto este termo é de suma importância dentro da Gestalt terapi apois para Yontef (1998, p. 234) a awareness é um dos princípios que define a Gestalt Terapia. “A Gestalt Terapia é fenomenológica; seu objetivo é apenas awareness e sua metodologia é a metodologia da awareness”. Baseado nessa premissa pode-se conferir que awareness é a metodologia e o alvo da G.T.
Quando se refere a awareness é importante ressaltar que esta não se limita somente a tomada de “consciência mental”, pois envolve outros aspectos do organismo como um todo. Dessa forma a Gestalt Terapia privilegia uma nova maneira de abordar o cliente e utiliza-se de perguntas tais como: o que você está sentindo? O que você se dá conta nesse momento? Entre outras, formas de questionamento com o firme propósito de proporcionar a pessoa uma reflexão acerca do que ele sente naquele momento, ou seja, no aqui agora.
Fontes: https://bit.ly/2JQVlMw
Assim, awareness é uma forma de experienciar o “aqui agora”, ou seja, de se dá conta dos fenômenos recorrentes no atual momento. Na Gestalt Terapia awareness é de suma importância, pois nesta abordagem sem a toma de consciência é praticamente nulo atingir as metas deseja das dentro de uma psicoterapia.
É através da awareness, que o cliente se dá conta de possíveis gestalt abertas e começa a trabalhar consigo mesmo as possíveis soluções para estes fenômenos, e consequentemente fechar as gestalt que estão “encobertas”, ou mesmo as esquivas de contato, ou seja, ele precisa da awareness para descobrir em si seus “déficits” e suas potencialidades para haja um desenvolvimento saudável.
Vale ressaltar que trabalhando dessa maneira se possibilita, que, não somente o terapeuta haja de maneira fenomenológica, mas também o cliente vai agir de maneira fenomenológica.
Deflexão
Existem dois tipos de deflexão, a modal e a objetal. A modal é o ato de entrar em uma conversação com uma pessoa e não investir energia necessária para se conectar com aquele outro indivíduo, de forma a: evitar contato direto, desviar o olhar, desviando do assunto ou até debochando do que o indivíduo diz, por exemplo quando um casal está brigando e algum dos indivíduos fica revirando os olhos e desdenhando de tudo que o parceiro fala. E a objetal é a que o indivíduo expressa algo que queria dizer para uma 3ª pessoa e não para quem ele realmente quer direcionar aquele conteúdo, por exemplo quando um aluno reclama de algo da matéria com o amigo ao invés de reclamar com o professor.
Fonte: https://bit.ly/2HWsuo9
Existem também casos em que a deflexão pode ser útil, KAETEL 2015 cita POLSTER 2001 (p.103) “Se eu o insulto com palavrões no auge de minha raiva, isso não caracteriza necessariamente meus sentimentos permanentes a seu respeito. Confiança, tempo e conhecimento íntimo entre as pessoas farão uma ponte sobre esses momentos, mas sob circunstâncias em que eles não estejam disponíveis, pode ser sábio e necessário defletir a raiva.” Ou seja, alguns comportamento que aparentam ser deflexão modal, na realidade são uma forma de defletir algum sentimento, como no exemplo foi citado a raiva.
Organísmica: Auto-Regulação
A ideia de auto–regulação é advinda da Teoria Organísmica do neurologista alemão Kurt Goldstein, de quem Fritz Perls, o criador da Gestalt–terapia, foimédico–assistente. Perls foi bastante influenciado pelas novas teorias de Goldstein sobre o processo de readaptação de pacientes que haviam sofrido lesão cerebral na guerra, formuladas a partir da sua experiência no contato direto com este tipo de paciente no entanto as premissas básicas da teoria organísmica serão discutidas a seguir.
Kurt Goldstein, tratou da auto–regulação como uma das características fundamentais do funcionamento de qualquer organismo definia a auto–regulação organísmica como uma forma do organismo interagir com o mundo, segundo a qual o organismo pode se atualizar, respeitando a sua natureza do melhor modo possível. Segundo as palavras do próprio Goldstein (1995, p. 162): “Esta tendência a atualizar sua natureza e a si mesmo é o impulso básico, o único impulso pela qual a vida do organismo é determinada”, para que a auto–regulação aconteça, é fundamental que o organismo possa ter respostas novas para as situações pelas quais ele passa na sua permanente interação com o meio ambiente. Entretanto se pensarmos desse modo, nos parece que ser criativo é uma condição fundamental ao processo de auto–regulação, que é o principal critério para se considerar se o modo como uma pessoa está se relacionando com demandas do meio está sendo harmônico ou satisfatório.
Fonte: https://bit.ly/2JV5smJ
Conforme citação de Kurt Goldstein (1995, p. 50): “O meio–ambiente de um organismo não é absolutamente algo definido e estático, pelo contrário, está em metamorfose contínua, comensurável com o desenvolvimento do organismo e sua atividade”. Portanto que os indivíduos se auto–regulamdando prioridade para a execução de ações que visem à satisfação das suas necessidades emergentes, e quando uma necessidade é satisfeita, esta deixaria de ser figural.
REFERÊNCIAS:
GOUVÊA, Graça. PSICOPATOLOGIA – MECANISMOS DE DEFESA E RESISTÊNCIAS. Disponível em: <http://www.gestaltemfigura.com.br/gestalt-terapia/psicopatologia-mecanismos-defesa-resistencias>. Acesso em: 19 out. 2017.
Goldstein, K. The Organism. Nova York: Zone Books, 1995.
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CAOS: Autoabandono é abordado em seminário clínico
22 de agosto de 2017 Laryssa Nogueira dos Anjos Araújo
Mural
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Na manhã desta segunda, 21/08, aconteceram os Seminários Clínicos, dentro do Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia – Caos, tendo como foco a exposição de casos clínicos de violência. Na programação, foram abordados dos temas como violência psicológica, violência autoinfligida, violência física, violência sexual, dor crônica e autoabandono.
Este último tema foi apresentado por Ulisses Franklin Carvalho da Cunha, psicólogo em formação do CEULP/ULBRA, sob supervisão da Profª Me. Carolina Santin Cótica, com o título “Carrasco de mim mesmo: a ressignificação da vida após anos de autoabandono à luz da fenomenologia existencial”.
Ulisses Franklin apresentando caso de violência autoinfligida
Para a fenomenologia existencial, abordagem utilizada nesse caso clínico, o ser humano possui vastos recursos dentro de si mesmo. Nisso, o acadêmico evidenciou alguns termos da psicologia que são adaptados a essa teoria, como a troca da expressão “tratamento psicológico” por “acompanhamento”; é preferível falar “encontros” ao invés de “sessões ou atendimentos”; pois antes de “psicoterapeuta e paciente”, as duas pessoas que vão a este encontro são “sujeitos”, ou melhor, “pessoas”.
O caso clínico apresentado foi de um sujeito de 34 anos, servidor público, que tem um histórico de drogadição, de diversos tipos de substâncias lícitas e ilícitas, desde os seus 15 anos de idade. Nisso, passou por diversas internações em casas de recuperação; suas relações familiares são marcadas por rompimento e fragilização de vínculos; e no que tange ao tempo que não mantêm contato com as drogas, há três meses sem recaídas, após 2 anos. Sendo que a demanda apresentada pelo sujeito era de conseguir não retornar a ser um drogadito e, consequentemente, recomeçar uma nova vida.
Nessa perspectiva, Ulisses explanou as estratégias utilizadas no caso clínico, as quais eram concordantes com as premissas da visão rogeriana, como o estabelecimento de vinculo; a relação genuína; a compreensão empática; a autenticidade; a aceitação positiva incondicional. Assim, o processo terapêutico se deu com a não rotulação do cliente, acolhendo-o, facilitando o esclarecimento de sua existência e desenvolvendo-lhe a habilidade de autoaceitação.
Por fim, o acadêmico expôs a dificuldade do manejo clínico dos encontros quando estes não são diretivos, mas que a flexibilidade exigida por sua abordagem o auxiliou a assumir uma postura profissional. Além disso, juntamente com a professora Carolina, foi ressaltado o quão importante tal processo de promoção autonomia e auto responsabilidade resultou na vida do cliente supracitado.
O Congresso
A edição de 2017 do Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia – CAOS, tem como tema “As Faces da Violência – Psicologia, Mídia e Sociedade”. Será uma semana para refletir sobre o exercício da psicologia nos mais diversos campos de atuação, frente as mais diversas formas de expressão da violência, para além das fronteiras da saúde, da segurança pública e das ciências humanas. O tema se configura como objeto perene de investigação científica e profissional, sobretudo na Psicologia, com foco na emancipação das subjetividades.
Serviço:
O que: Palestra e mesas-redondas
Quando: 21 a 25 de agosto de 2017 Onde: Auditório Central do Ceulp/Ulbra
Realização: Curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra
Apoio: Conselho Regional de Psicologia – CRP-23, Prefeitura de Palmas, Jornal O Girassol, Psicotestes, GM Turismo, Coordenação de Extensão do Ceulp/Ulbra, Coordenação de Pesquisa do Ceulp/Ulbra.
Mais informações:
Coordenação de Psicologia: Irenides Teixeira (63) 999943446 Assessoria do Ceulp/Ulbra: 3219 8029/ 3219 8100 Programação e Inscrições:http://ulbra-to.br/caos/
No sentido de conhecer os princípios básicos na construção do psicoterapeuta embasados na fenomenologia-existencial, torna-se necessário compreender e refletir as principais influências dessa abordagem para o processo psicoterapêutico. A fenomenologia surgiu no final do século XIX, sendo esta considerada um método e uma filosofia, tendo como principal precursor Edmund Husserl (ARANHA; MARTINS, 2003).
A fenomenologia origina-se da palavra fenômeno, palavra grega, que significa o manifesto, o que se torna evidente, sendo assim fenômeno pode ser considerado como o que é aparente, como se mostra à consciência (ARANHA; MARTINS, 2003, RIBEIRO, 1985). Nesse contexto, as psicoterapias de natureza Fenomenológicas-existenciais, a Fenomenologia de Husserl é uma das mais importantes colaborações filosóficas (RAFFAELLI, 2004), sendo esta uma “ciência descritiva das essências da consciência e seus atos, uma vez que a correlação sujeito-objeto só se dá na intuição originária da consciência” (RIBEIRO, 1985, p. 44). Nessa conjuntura, Aranha e Martins (2003), afirma que a consciência é “ doadora de sentido, fonte de significado ( p. 150).
Para Husserl para que se faça fenomenologia é necessário deixar posturas “ontológicas” e conhecimentos empíricos, nessa perspectiva não se tem a intenção de chegar ao mundo e a realidades tomadas em si mesmas, mas a relação que se estabelece entre o homem e mundo (REHFELD, 2013). Nesse ínterim, Ribeiro (1985, p. 44), aponta que: “não se trata de uma sumária descrição da realidade, pois a consciência é muito mais ampla do que ela própria, nela nós percebemos a essência daquilo que ela não é, o sentido mesmo do mundo em direção ao qual ela não cessa de ‘explodir’ […]”.
Fonte: http://3.bp.blogspot.com
De acordo com Aranha & Martins (2003), na fenomenologia busca a experiência que cada ser humano vivencia, sendo que a realidade torna uma descrição individual do sujeito. Nesse sentido, “a fenomenologia é uma filosofia da vivência”, sendo indispensável às experiências de cada pessoa na compreensão do fenômeno (ARANHA; MARTINS, 2003, p.150, RIBEIRO, 1985).
No processo psicoterapêutico, o cliente se apresenta muitas vezes com contato voltado ao mundo externo das situações, vendo o que acontece, não percebendo o modo que ver, ou o fenômeno deste. Sendo que estas aparências vistas pelo cliente, ocultam o verdadeiro significado do ser. Nesse sentido, a psicoterapia busca separar a aparência do fenômeno, trabalhando com o quê e o como, indo ao encontro com o fenômeno (RIBEIRO, 1985).
O psicoterapeuta humanista-existencial
A relação entre psicoterapeuta e cliente constitui uma ferramenta fundamental no processo psicoterápico. Para Carl Rogers, o processo de desenvolvimento da “pessoa plena” é facilitado por uma relação terapêutica na qual torna possível a emergência de questões subjetivas do cliente, o que não seria possível através do método objetivo e empírico das ciências naturais (BARRETO, 2002).
O poder é retirado das mãos do psicoterapeuta, e a relação estabelecida é permissa e livre, ocasião em que “o próprio contato terapêutico é uma experiência de desenvolvimento” (BARRETO, 2002, p. 173). Dada a importância dessa relação, compreende-se que as características e a postura do psicoterapeuta são variáveis que influenciam esta relação. Neste sentido Rogers (1988) definiu três elementos fundamentais para esse processo, denominados de “atitudes psicológicas facilitadoras”: a) autenticidade, sinceridade ou congruência; b) aceitação incondicional; c) compreensão empática. Antes de esmiuçar tais conceitos, faz-se necessário primeiro compreender alguns aspectos filosóficos envolvidos.
Verifica-se que há uma relação significativamente influente da filosofia fenomenológica-existencial sobre a abordagem criada por Rogers. Considerando isto, analisa-se que ao tomar a experiência prática, vivida, como ponto de partida para formular sua teoria e método psicoterapêutico, ao incluir a subjetividade do terapeuta e do cientista e ao se interessar pela compreensão dos significados atribuídos pela própria pessoa às suas vivências e pelos modos de experienciação dos mesmos, Rogers assume, em seu modo de trabalho, a prática de uma atitude humanista e fenomenológica (BEZERRA; BEZERRA, 2012, p. 23).
Fonte: http://zip.net/bntL4V
Sob o prisma da fenomenologia-existencial, o indivíduo é compreendido como um ser capaz de criar condições para se lançar para frente rumo ao desenvolvimento e liberdade. Esta perspectiva de homem vai ao encontro do que Rogers (1983) definiu como a hipótese central de sua abordagem: a tendência atualizante, na qual “os indivíduos possuem dentro de si vastos recursos para autocompreensão e para a modificação de seus autoconceitos, de suas atitudes e de comportamento autônomo” (ROGERS, 1983, p. 38).
Compreende-se que o terapeuta humanista-existencial trabalha com a concepção dialética de ser humano envolvido na inter-relação entre a filosofia fenomenológica-existencial e a Abordagem Centrada na Pessoa. Embora não seja possível afirmar que Rogers foi direcionado por essa filosofia (BEZERRA; BEZERRA, 2012), uma vez que a conheceu tardiamente, a postura do psicoterapeuta defendida por ele, revela possibilidades de contribuir para o autodesenvolvimento livre.
O primeiro elemento facilitador do processo de crescimento do sujeito é a autenticidade, sinceridade ou congruência, que diz respeito à transparência do psicoterapeuta na relação com o cliente, sendo o que se é verdadeiramente, removendo barreiras profissionais e pessoais (ROGERS, 1983; ARAÚJO; FREIRE, 2014). O segundo elemento é a aceitação positiva incondicional, representada por uma postura de consideração genuína pelo cliente e de suspensão de valores (BARRETO, 2002). Não diz respeito a aprovar ou desaprovar, pois nesta direção ainda caberia um juízo de valor por parte do psicoterapeuta.
Por fim, o terceiro elemento descrito por Rogers (1983) é a compreensão empática, ocasião em que o psicoterapeuta é hábil em captar sentimentos e emoções do cliente e, assim, comunicar isto à ele. Mais do que isto, a empatia envolve o entendimento de que considerar a alteridade é abrir-se para ela, procurar “ouvi-la” com todos os sentidos e acolhê-la com portas e janelas abertas […] o valor do cliente convoca o psicoterapeuta a oferecer uma escuta qualificada, procurando perceber seu campo fenomenológico e compreendendo-o sem distorções, o máximo possível (ARAÚJO; FREIRE, 2014, p. 100).
Fonte: http://zip.net/bltLxL
Para além, Rogers (1983) considera que o processo de comunicação na relação terapêutica é de suma importância, pois o compreende como um processo complexo que diz respeito desde às reações mais íntimas do organismo até os pensamentos, sentimentos e a emissão de palavras. Rogers relata, ainda, que a experiência de se dispor ao processo de comunicação, exercendo a escuta das demandas do outro, favorece o crescimento individual.
Rogers (1997) traz a reflexão de que as demandas nas psicoterapias concernem às falhas nos processos de comunicação. Quando determinado organismo possui dificuldades de adaptação e necessita de trabalhos psicoterápicos, em primeiro plano, houve uma ruptura da comunicação do sujeito com si próprio e que consequentemente influenciaram de forma direta na dificuldade de estabelecimento de comunicação com outros sujeitos. Ao relatar sobre a capacidade de escuta, Rogers (1983) afirma que o ato de ouvir o outro traz consequências, pois quando há uma escuta apurada em um processo de comunicação, não se ouve apenas as palavras que são emitidas, mas todos os significados que são atribuídos em suas experiências, isto é, a pessoa como um todo.
Amatuzzi (2008, p. 68) diz que “não há palavra viva que seja sem emoção, pois ela interfere com a realidade, cria um mundo novo, mais do que simplesmente retrata a realidade. Se ficarmos na mera palavra, então estamos matando sua vida”. Desta forma, o autor traz a reflexão de que o papel do terapêuta concerne em criar mecanismo que favoreçam a expressão da palavra e de seu pleno significado. Desta forma, a construção do ser e tornar-se psicoterapeuta humanista-existencial é dialética, envolve um conjunto de perspectivas filosóficas existenciais aliadas às contribuições das experiências vivenciadas e relatadas por Rogers. Considerando isto, será descrito algumas características inerentes ao psicoterapeuta humanista-existencial.
Psicoterapeuta não seleciona o caminho que o cliente deve percorrer.
Através de uma postura não-diretiva, o psicoterapeuta confia na capacidade de autorregulação da pessoa, entendendo que é inerente à natureza humana possuir condições de autodesenvolver-se, tendo habilidade para decidir sobre a própria vida. Na atitude psicoterapêutica, apresenta-se condições psicológicas facilitadoras para propiciar o processo de autodesenvolvimento do cliente. “Se posso proporcionar certo tipo de relação, a outra pessoa descobrirá dentro de si a capacidade de utilizar esta relação para crescer, e mudança e desenvolvimento pessoal ocorrerão” (ROGERS, 2009, p. 37).
Fonte: http://zip.net/bttMKx
O cliente é um ser-no-mundo.
A natureza humana é relacional. O homem é compreendido como pessoa em inter-relação com o mundo, entrelaçado à ele, cuja experiência não pode ser fragmentada do ser que a vivencia (CORREA; MOREIRA, 2016). Esta noção vai ao encontro da perspectiva de ser-no-mundo, uma visão ontológica desenvolvida pelo filósofo Heidgger. Nesta perspectiva, o indivíduo é “homem na exata medida de seu ser-em, isto é, na exata medida em que possui um mundo ou abre o sentido de um mundo” (BARBOSA, 1998, p. 4).
O psicoterapeuta não é neutro em relação ao seu cliente
Psicoterapeuta se permite afetar e ser afetado pela experiência do cliente, percebendo-o não um como um objeto a ser estudado, mas como um ser relacional e digno de respeito. No processo relacional ocorrido no setting terapêutico, o psicoterapeuta apresenta-se ativo e comprometido com o seu cliente a medida em que divide a carga com o ele. Sobre isto, Moreira (2009) afirma que este processo tem uma grande importância para o cliente que se sente sozinho, mesmo que esteja cercada por muitas pessoas. “Sua solidão é, frequentemente, fruto da sensação de não ser compreendido em sua dor. Dividir a carga desta dor passa a ser, então, um primeiro momento na psicoterapia tendo um grande significado” (MOREIRA, 2009, p. 64).
Perpassando destas atitudes fenomenológicas, o papel do terapeuta será assim o de, “partir do ponto de vista fenomenal do cliente, procurar a compreensão da consciência vivencial da experiência de si e do mundo” (SANTOS, 2004, p. 19). Para tanto, Rogers (1947) propõe, que o terapeuta deve “ver através dos olhos da outra pessoa, perceber o mundo tal como lhe aparece, aceder, pelo menos parcialmente, ao quadro de referência interno da outra pessoa”.
Fonte: http://zip.net/bhtL9N
Uma relação terapêutica estabelecida através dessas premissas (empatia, congruência aceitação) implica uma importante redefinição do seu papel. Mais do que as técnicas ou os instrumentos utilizados, o terapeuta constrói-se por meio de atitudes que trazem para a relação e que compõem o verdadeiro fator impulsionador da mudança. Tendo em conta os princípios que justificam e dão sentido a essas atitudes, o terapêuta humanista torna-se um verdadeiro facilitador do processo de autoconhecimento do cliente, pois sabe que ninguém melhor que ele mesmo para interpretar, construir e modificar sua própria realidade.
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