O mito da mulher guerreira: uma análise da canção ‘’estou nervosa’’ filme Encanto

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Mais uma canção do filme Encanto (DISNEY, 2021), Como já vimos, o filme é rico em metáforas e reflexões, nos fazendo perceber que animação não é só coisa de criança. De fato é um verdadeiro encanto. Dessa vez vamos falar sobre a canção  ‘’Estou nervosa’’ no original ‘’surface pressure’’. Produzida por Lin- Manuel Miranda.

 

 

Antes de falar sobre a canção, cabe entendermos  um pouco da personagem Luísa, a qual  é marcada pelo arquétipo da mulher guerreira, tanto em sua aparência alta, com grandes músculos,  como o dom que ela recebeu da casita; força física. E é  através desse dom, que ela usa de estratégias e artifícios para ajudar as pessoas. 

fonte:http://encurtador.com.br/rtAZ4

As sociedades antigas e medievais, encontraram na transmissão dos mitos a forma de perpetuar, seus medos, anseios, verdades, e fantasias (DETIENNE,1992). O mito por trás da mulher  guerreira nos mostra que para tal  titulação uma mulher deve ser justa, disciplinada, corajosa, intrigante e competente, alguém que faz de tudo para atingir metas, e coloca o bem maior dos outros acima do seu. As mulheres guerreiras dos mitos e histórias, sempre causaram sentimentos contraditórios nos homens, ao qual desenvolveram um certo fascínio por elas, devido as suas habilidades no manejo de armas, e no campo de batalha, sendo vista com temor, ao mesmo tempo em que sua feminilidade desata e desafia a coragem e honra masculina. 

 A mulher guerreira, sempre muito forte mas ao mesmo tempo feminina, perpetua o imaginário de homens até hoje, alguém que consegue suportar tudo e ao mesmo tempo trazer a satisfação necessária. ‘’E, desta feita, a mitologia vai se adaptando e modificando ao longo dos tempos, pois “em cada imagem que cria e inventa, a mitologia se metamorfoseia e seu saber se desloca: ela toma a forma efêmera do espaço que habitou um dia.” (DETIENNE, 1992, p. 226)

Percebemos na canção  um desabafo de Luisa, frente ao seu papel ao revelar a sua sobrinha o quanto anda sobrecarregada dos diferentes afazeres em prol da vila e da família, mas que até então faz sem reclamar ou questionar.

fonte: http://encurtador.com.br/aexDU

Descartes (1596- 1650) na sua perspectiva do dualismo substancial, nos diz que somos constituídos de uma coisa extensa, o ccorpo, e uma coisa pensante; a mente, que vivem em constante interação e que formam um todo único.  Ele ainda aponta que quando estamos em uma emoção, significa  que possuímos um conhecimento intuitivo, direto, subjetivo não apenas sobre o que ocorre na mente, mas também no corpo. ‘’Cumpre notar que o principal efeito de todas as paixões nos homens é que incitam e dispõem a sua alma a querer as coisas para as quais elas lhes preparam os corpos; de sorte que o sentimento de medo incita a fugir, o da audácia a querer combater e assim por diante.’’ Descartes (1973a, p. 242).

Luisa é movida por esse misto de sentimentos ao mesmo tempo que se dispõe da audácia de querer combater,  da compaixão de querer ajudar, é cercada por um medo que enfraquece seus poderes e incita a fugir, mas ela não pode, pois quem iria fazer suas atividades? quem conseguiria estar no seu lugar? a pressão é tão grande que percebemos a ansiedade surgindo em seu desabafo. 

‘’ a pressão

é tanta por aqui-qui

que já me estressou, uou

e a pressão faz tic, tic, tic

meu limite chegou,uou, oh ,oh ‘’

Assim como Luisa, muitas mulheres compartilham dessa ansiedade, e sentem que já chegaram aos seus limites por  tantas cobranças e afazeres. As ditas ‘’mulheres guerreiras’’, não querem mais ”guerrear’’. Uma matéria  do buzzfeed intitulada: ‘’Precisamos parar de romantizar o termo “mulher guerreira” (Sofia Riccardi) Nos trouxe relatos de algumas mulheres, que estão cansadas de serem tratadas assim. Materia completa: http://encurtador.com.br/wHIPX

fonte:encurtador.com.br/wHIPX

Um paralelo entre esses desabafos e a canção, é a sobrecarga de afazeres, sociais, familiares e pessoais, a conciliação de tantas coisas chega a parecer impossível.  ‘’Se antes a “mulher perfeita” era a que cuidava bem do lar e da família, hoje ela precisa se destacar profissionalmente sem descuidar das questões anteriores e, ainda, ter um corpo modelo.’’( MORAES 2012, p.4).

Pesquisas feitas demonstram que mulheres são mais afetadas pelo estresse e esgotamento profissional, do que os homens. A  justificativa para isso são as inúmeras cobranças entre: trabalho, casa,filhos, saúde, conjugue, autocuidado. Essas mulheres são marcadas por um cansaço, falta de energia, desmotivação, desinteresse, irritação, mudanças de humor repentino, redução na concentração, esquecimento, desânimo, sentimento de fracasso e uma baixa autoestima. 

Sabemos que o stress é uma defesa natural do organismo, uma resposta fisiológica frente a agentes estressores. Quando existe a sobrecarga  dessas respostas, ocorrem consequências e danos à saúde. A sobrecarga da ‘mulher guerreira’ faz com que muitas mulheres de hoje desenvolvam o burnout e a ansiedade, pois estão tão empenhadas aos seus afazeres, que negligenciam a si mesmo. Podemos observar no trecho da canção:                                

‘’Não questiono se é pesado

O meu corpo suporta o fardo

Se me dão aço, eu piso, eu amasso

Com a força dos braços, eu faço estilhaço

Mas estou nervosa e ansiosa

Na corda bamba, sigo cautelosa

Estou nervosa

Como um herói que se cansou numa luta horrorosa’ Encanto (2021)

Essa sobrecarga ainda é marcada por julgamentos e críticas a si mesmo, quando não suportam mais e cedem a angústia, são por muitas vezes chamadas de surtadas.‘’É sempre um trabalho mental permanente, exaustivo e invisível, e portanto não reconhecido’’. Indiara leite (COMUNICA,2021)

‘Estou nervosa

Se eu não for generosa, me sinto ociosa

Não posso cansar, não posso falhar

Será que eu vou quebrar? o que me faz quebrar’’

Quanto a esse trecho da canção [..]

‘Estou nervosa, Eu fico ansiosa

Mas tento fingir ser corajosa

Estou nervosa

Ameaça é raivosa, fatal e silenciosa Encanto (2021)

Eu estou nervosa

Eu sei sou orgulhosa, a vida é perigosa

A casa vai cair, preciso agir

Eu uso a minha força, mas não sei como impedir ‘’ Encanto (2021)

 

Temos essa reflexão de Indiara Leite (COMUNICA, 2021)

” Infelizmente enquanto crianças, meninas frágeis e inocentes não sabíamos e ninguém nos disse que o mundo também é nosso por direito! Ninguém disse que a luta seria de igual para igual, ninguém dos falou de equidade e que por meritocracia conquistamos o que quer que seja, e por isso, corremos atrás do tempo, das oportunidades, das referências, do protagonismo, dos títulos e dos cargos, das migalhas e muitas vezes corremos contra outras mulheres para provar não sei o’que para não sei quem.

De acordo com a BBC (2021) especialista dizem que não existe uma única razão pela qual mulheres ficam esgotadas, mas que tem ligação com a forma com que as estruturas sociais e normais de gêneros se cruzam, ao causar desigualdades, um exemplo disso é o ambiente de trabalho.  Em geral, pesquisas ligam baixas rendas a altos níveis de estresse a uma saúde mental ruim.

No dia a dia vemos muitas mulheres como Luisa, sobrecarregadas, tendo que lidar com uma rotina exaustiva, equilibrando mil coisas, por isso precisamos repensar sobre o termo mulher guerreira, e as implicações que vem com tal ‘’estilo de vida’’.  É necessário entender que não está tudo bem, e poder proporcionar um espaço para que essas mulheres olhem para dentro de si, e se permitam sentir além dos julgamentos.  Precisamos ainda refletir e problematizar as questões de gêneros e combater o machismo tão estruturado ao qual coloca mulheres nessa posição. Ensinando as nossas garotas, que o lugar delas no mundo não é confortável, mas que lutamos para que seja, então está tudo bem sentir.

  A partir de hoje, quando você lembrar de uma mulher e pensar o quanto ela  é guerreira, pense também nas implicações que atribuem a ele esse fato e de que forma você pode ajudar, seja estendendo a mão, seja trazendo conhecimento,  de forma a tornar seus  fardos  menos pesados.

 

REFERÊNCIAS

COX, Josie.Por que mulheres sofrem mais de síndrome de burnout do que homens. BBC. 2021 Disponivel em <https://www.bbc.com/portuguese/geral-58869558> acesso em 06 de maio de 2022

ENCANTO. ‘’Estou nervosa’’. EUA. Disney+ 2021. 1:14.

LEITE, Indiara. Burnout nas Mulheres:sobrecarregadas para a romantização da “mulher guerreira. COMUNICA. 2021. Disponivel em <https://comunicarh.com/burnout-nas-mulheres-de-sobrecarregadas-para-a-romantizacao-da-mulher-guerreira/> acesso dem 06 de maio de 2022.

O mito da mulher guerreira: uma análise da saga de Hervör. João Pessoa: Núcleo de Estudos Vikings e Escandinavos, 2021, 258 páginas. ISBN: 978-65-00-22255-5

MORAE, E. Ser mulher na atualidade: representação discursiva da identidade feminina em quadros humorísticos de maitena. In TASSO, I., and NAVARRO, P., orgs. Produção de identidades e processos de subjetivação em práticas discursivas [online]. Maringá: Eduem, 2012. pp. 259-285. ISBN 978-85-7628-583-0. Available from SciELO Books .  

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A aquisição de um novo hábito requer tempo, força de vontade e repetição

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Criar uma rotina mais saudável, alimentar-se melhor, ter sono de qualidade, cultivar laços sociais positivos, cuidar da mente, fazer uma atividade física, começar um curso novo sempre são metas colocadas no fim de ano para serem realizadas no ano novo que se inicia. As pessoas ficam mais propensas a mudanças de hábitos, o problema é que muitos objetivos ficam, somente, no papel, e o comportamento continua igual ao ano anterior.

O ato de mudar demanda uma quebra de paradigma para que reais transformações aconteçam na rotina do indivíduo. Ou seja, uma mudança de mentalidade que requer esforço para a inserção de novos costumes, para começar o dia com bons hábitos; mesmo encontrando na maioria das vezes dificuldades para a inserção desses novos hábitos, podendo ser vistos como comportamentos governados por regras, que sendo formuladas podem ser mais aceitáveis do que apenas seguidas.

Para muitos, a ideia de introduzir um novo hábito na rotina acaba sendo algo considerado difícil, e muitas das vezes, visto como praticamente impossível. No entanto, é importante lembrar que após o hábito existir, não é possível acabar com ele, e sim modificá-lo, e mudar um velho hábito, que, caso o estímulo para o mesmo volte como era a princípio, esse mesmo hábito ressurgirá imediatamente. Duhigg (2012) ao retratar as ideias de Claude Hopkins certifica que “para mudar um velho hábito, você precisa abordar um anseio antigo. Precisa manter as mesmas deixas e recompensas de antes, e alimentar o anseio inserindo uma nova rotina.”

Fonte: encurtador.com.br/hvwJK

Conforme Covery (2014), a mudança de hábito está relacionada a transformação do caráter, é preciso ser “de dentro para fora” para que realmente exista uma eficácia pessoal e interpessoal. “A abordagem de dentro para fora privilegia um processo contínuo de renovação baseada nas leis naturais que governam o crescimento e o progresso humanos”.

A força de vontade é um pontapé inicial para a formação de novos hábitos, mas para permanecer é preciso consistência e muito esforço diário. As histórias de pessoas bem-sucedidas, que servem de inspiração, ajudam até um certo ponto, pois quando a motivação acaba o que sobra é a disciplina.  Nesse contexto, que Goleman (2005) reforça a ideia de que a inteligência emocional ajuda traçar metas, desenvolver a inteligência intelectual, por meio do gerenciamento das emoções.  Ou seja, a administração das emoções pode ser um meio para a elaboração de novos hábitos, os quais não tenham uma memória volátil, mas sim duradoura.

Caso queira começar sua mudança hoje, segue algumas ideias para a construção de novos hábitos: Primeiramente, não tente mudar de uma só vez, um passo de cada vez, já que seu cérebro está recebendo novos estímulos. Anote tudo em um caderno, mas não o deixe guardado em uma gaveta, deixei- a vista para sempre lembrar de seu objetivo.

Fonte: encurtador.com.br/tCISZ

Uma dica de ouro para uma mudança real, comece a conviver com grupos sociais, os quais já possuem o hábito que deseja adquirir. Por exemplo, se deseja ser um corredor, procure um grupo de corrida. Por fim, mantenha um planejamento de metas, crie boas estratégias elaboradas, mantenha o foco e não desista, é possível mudar.

 

REFERÊNCIAS

Duhigg, Charles. O poder do hábito [recurso eletrônico]: por que fazemos o que fazemos na vida e nos negócios / Charles Duhigg ; tradução Rafael Mantovani. – Rio de Janeiro : Objetiva, 2012.

COVEY, Stephen R. Os 7 Hábitos das pessoas altamente eficazes. Rio de Janeiro: Bestseller, 2014.

GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: A teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005.

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Star Wars Os Últimos Jedi: John Williams estava com preguiça?

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Concorre com 5 indicações ao OSCAR:

Melhor mixagem de som, melhor edição de som, melhor efeitos visuais, melhor trilha sonora original, melhor montagem

Apesar de consagrado na esfera cinematográfica, com mais de 50 indicações ao Oscar, John Williams foi alvo de críticas como repetitividade temática, preguiça e pouca criatividade na produção de temas para os novos personagens de seu último trabalho para a saga Star Wars. Ainda assim, a trilha sonora de Os Últimos Jedi lhe rendeu mais uma indicação em 2018.

Para início de conversa “Os Últimos Jedi” abusa do recurso musical, que chega a ser mais explorado que os efeitos sonoros mesmo nos trechos de ação. Isto porque tema é o que não falta em Star Wars, e cada um conta uma história seja sobre um personagem, um objeto ou de uma circunstância.

O caminho do meio?

De fato, não há nenhuma nova composição que seja marcante como esperavam alguns, o que pode ser até mesmo proposital, visto que este último episódio parece focar muito mais na ação da Força do que em um personagem em si, e a Força não possui um tema tão marcante quanto o de Luke ou o de Vader, por exemplo. Isto porque a Força envolve tanto o bem como o mal, e pode ser usada por qualquer dos lados. Como a trilha sonora não está desconectada do contexto, o tema composto para a força também se encontra exatamente no meio de uma escala musical de sete modos (gregos), que vai do mais numinoso ao mais obscuro e tenso. Obviamente o que está localizado nos extremos é sempre mais marcante, a exemplo do tema da destruição da estrela da morte (no extremo numinoso, indicando vitória).

Olhando a partir dessa perspectiva, notamos que mesmo na ausência de uma novidade marcante os temas seguem uma coerência histórica e dramática que conferem o sequenciamento da saga cinematográfica.

Para se ter uma ideia desta coerência e sequenciamento, tomemos o fato de os temas de todos os personagens da família Skywalker estarem conectados entre si. Os temas de Luke e Léia, por exemplo, tem estruturas derivadas de seus pais Anakin e Padmé e, quando qualquer dos personagens transitam entre a luz e as trevas, mudanças no tom garantem a transição sem perder a originalidade.

O tema de Luke, por exemplo, sofre variações à medida que o personagem vai se tornando ambivalente, tomado por dúvidas e medo, ao longo dos episódios V e VI, pelo tema identifica-se Luke e suas variações emocionais, as variações sobre o mesmo tema traduzem desde um momento alegre até um menos esperançoso, marcando a ambientação do filme conforme muda o sentimento de seu personagem.

https://goo.gl/dXyFuu

Fonte: goo.gl/UzKEci

Dessa forma, cada tema segue o perfil psicológico de seu personagem, marcando ainda mais a identidade e personalidade de cada um, ressaltando a dualidade entre luz e trevas, bem e mal, tão marcantes na discussão filosófica de Star Wars.

Para entender o efeito emocional de cada escala basta observar o tema com escala mais intensa em luminosidade que marca, por exemplo, a destruição da estrela da morte, e também faz parte da composição dos personagens Yoda e Anakin criança, delineando suas posições superiores em relação aos demais personagens.

O tema de Luke Skywalker aparece na segunda ordem de grandeza de luminosidade, sendo marcado por um intervalo musical (5ª) que lhe confere um caráter heroico, o mesmo que aparece no tema de Superman, por exemplo, ou no tema de Gondor em O Senhor dos Anéis.

O tema de Leia segue a mesma escala do de seu irmão Luke e, notadamente, são dois temas com ar de esperança que marcam a família Skywalker. Por falar em família, assim como os filhos trazem características de seus pais, a estrutura dos temas de Luke e de Leia derivam do tema de seus pais Anakin e Padmé.

Fonte: goo.gl/XjG82M

A Força em Ray e Kylo

Assim como a Força encontra-se exatamente no meio do caminho entre a luz e as trevas, a mesma escala compõe dramaticamente o tema de Ray, o que pode indicar que é desta personagem que se espera o equilíbrio da Força. Ao passo que Ray se mostra do lado da luz, Kylo Ren, seu antagonista, também tem seu tema derivado da Força, sendo, de forma curiosa, diametralmente oposto ao tema de Ray, como se fosse a mesma música executada de forma invertida, o que mostra dois personagens equivalentes, mas opostos, formando uma fusão perfeita nos momentos em que lutam.

O mesmo ocorre com os temas de Anakin e Vader, que se mostram inversões de um mesmo personagem, e mostram como o mal (Vader) sempre esteve presente em Anakin desde o início. A personalidade de Anakin com seus conflitos internos, também aparece na complexidade de seu tema, composto numa crescente que remete à própria história do personagem, que vai de escravo à homem livre e à jedi, mas que numa queda abrupta adquire uma característica maligna, uma queda da qual tanto o personagem quanto seu tema nunca voltam a se recuperar.

https://goo.gl/C4EqGF

A corrupção de Anakin ocorre com a variação do tema em acordes menores que se intensificam cada vez mais ao ponto de adquirir toda a intensidade de Darth Vader, com harmonias e melodias totalmente típicas do principal antagonista da saga, que também possui um dos temas mais lendários do cinema, com uma complexidade tão intensa quanto o próprio personagem. Sua melodia composta por três notas de acorde maior deveria soar feliz e amável, e este é o coração do tema que, no entanto se torna ameaçador a partir de sua utilização sobreposta a uma harmonia menor, que corrompe a intenção da melodia original, criando um super tema carismático e interessante para Vader, que traz em si tanto características do tema de Anakin quanto do Império.

A redenção de Vader ao final de sua história aparece nas variações harmônicas que correm quando este mata o imperador e resgata seu filho Luke, o tema caminha da escala menor (obscura) para o campo maior sem, no entanto, chegar à total luminosidade, ou “positividade”, que acompanha os acordes maiores. Por fim, a harmonia percorre o mesmo caminho de Vader, que se redime ao fim, sem com isso recuperar toda a luminosidade que poderia ter tido.

https://goo.gl/DnCfQn

Por sua vez, o tema de Kylo Ren é uma imitação do tema de Vader com uma harmonia menos interessante e com menos encanto, derivada de um fragmento da segunda parte do tema de Anakin quando este demonstra seu lado mal. Entretanto a inferioridade de um tema em relação ao seu predecessor é propositadamente utilizada para revelar a fragilidade de Kylo Ren, que teme, inconscientemente, nunca se tornar tão poderoso quanto Darth Vader.

Por fim, pelo menos para os fãs de Star Wars e John Williams, fica explicado o porquê da ausência de um novo tema tão marcante quanto os antigos da série, redimindo o compositor das acusações impostas diante do novo episódio da série e reforçando a torcida pela aquisição de mais uma estatueta para a saga.

FICHA TÉCNICA



                                 STAR WARS: OS ÚLTIMO JEDI

Diretor:  Rian Johnson
Elenco:  Daisy RidleyJohn BoyegaOscar Isaac
Gênero:  Ficção científicaAção
Ano: 2017

Referências:

ALTOZANO, Jaime. Análisis de la Banda Sonora de Star Wars. Los temas del BIEN | Jaime Altozano. Youtube. 16 dez. 2017. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=VEVIAF_2tUM >. Acesso em: 02 fev. 2018.

ALTOZANO, Jaime. Análisis de la Banda Sonora de Star Wars. EL LADO OSCURO | Jaime Altozano. Youtube. 21 dez. 2017. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=pobDlg_ShIw&t=109s>. Acesso em: 02 fev. 2018.

SANTIAGO, Luiz. Crítica | Star Wars: Os Últimos Jedi (Trilha Sonora Original).16 dez. 2017. Disponível em: <http://www.planocritico.com/critica-star-wars-os-ultimos-jedi-trilha-sonora-original/>. Acesso em: 02 fev. 2018.

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Mad Max: Estrada da Fúria – o (re)nascer do herói

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Que raízes são essas que se arraigam, que ramos se esgalham nessa imundície pedregosa?
Filho do homem 
não podes dizer, ou sequer estimas, porque apenas conheces
um feixe de imagens fraturadas, batidas pelo sol, e as árvores mortas já não mais te abrigam,
nem te consola o canto dos grilos, e nenhum rumor de água a latejar na pedra seca.
Apenas uma sombra medra sob esta rocha escarlate.
(Chega-te à sombra desta rocha escarlate),
E vou mostrar-te algo distinto de tua sombra a caminhar atrás de ti quando amanhece
ou de tua sombra vespertina ao teu encontro se elevando;
Vou revelar-te o que é o medo num punhado de pó”.
Wasteland, de T. S. Eliot por Ivan Junqueira.

O fosso da queda

Max Rockatansky não é um louco, como os títulos da franquia do personagem pressupõem. Ao menos esta não é sua estirpe essencial no início de sua concepção, nos idos de 1979, com o longa-metragem Mad Max (sabiamente não traduzido, o que manteve a força da pronúncia) de George Miller, também idealizador do argumento da obra; o que há diante de nós é um policial, já assolado pela cruel realidade vivenciada por ele e sua família, se perguntando qual a diferença entre usar ou não um uniforme nas estradas combatendo o crime. Ao final deste primeiro filme, e ao longo das duas sequências Mad Max 2: a caçada continua (Mad Max 2: The Road Warrior, 1981) e Mad Max: além da cúpula do trovão (Mad Max: Beyond Thunderdome) é que Max se tona Mad, sendo possuído por sua dor, agonia, arrependimento e ódio do mundo que lhe tirou tudo.

Max, início do filme de 2015.

Estas considerações são fundamentais para entendermos o que é, ou ao menos esboçar, a significância por trás do road movie Mad Max, Estada da Fúria (Mad Max, Fury Road do original) lançado em 2015. Nas investidas originais da franquia, Mel Gibson deu corpo, força e profundidade ao ex-policial de um mundo cada vez mais decadente e, três décadas depois, após inúmeros problemas de produção e adiamentos, Tom Hardy assume o posto deixado por Gibson, e a mudança conseguiu dar vitalidade e novas facetas para personagem, o apresentando e modernizando para nossa época, linguagem e público.

Este novo Max nem que quisesse seria o mesmo do longa inicial de 1979, muito menos o guerreiro implacável dos dois filmes posteriores. Estrada da fúria é um conto sobre alguém perdido em si mesmo, quase uma negação de estudo sobre o personagem título, já que pouco dele nos é apresentado, justamente pela vontade de esquecer-se da própria vida: “Eu era um policial. Um guerreiro da estrada, em busca de uma causa justa” (Max Rockatansky), uma sombra do passado, caminhando num presente sem sentido.

Mel Gibson e Tom Hardy como Max, respectivamente. Fonte: www.imdb.com

Nas telas da obra de 2015 vemos a penumbra do herói que um dia viveu nas infindáveis estradas do deserto que se tornou o mundo. O que vemos nesta versão do personagem é a sua mais profunda condição de fuga, sobrevivência e introspecção, agregados ao peso de seu passado, ações e decisões: “Eu sou aquele que foge tanto dos vivos quanto dos mortos. Caçado por saqueadores. Assombrado por aqueles que não consegui proteger” (Max Rockatansky).

Mas, ao mesmo tempo, o roteiro não nos entrega uma versão anti-heroica de Max, o que seria uma via tentadora, algo reincidente na atual indústria cinematográfica. Desta forma, não uma vendeta ou grande catarse na qual o protagonista trilha seus passos, dos cenários, objetos pessoais e trejeitos não emanam pomposidade ou luminescência moral. O instinto de sobrevivência prevalece como causa e condição para seguir alimentando o andarilho das terras desoladas em Estrada da Fúria.

E, este estado em que se encontra o novo/velho Max é que intrigou boa parte do público que assistiu aos longas clássicos. Apesar da riqueza e espetacularidade – há muito não vistas nas maçantes computadorizações do cinema contemporâneo – do filme apresentado por Miller, a impressão que se teve em muitas pessoas foi de estranhamento em relação ao herói título, muito mais por resistência em mergulhar na proposta de seu renascimento do que na incontestável qualidade do filme, um dos mais premiados e elogiados dos últimos anos.

A viagem pela Estrada da Fúria

O realismo e discussões propostas por Miller só encontraram tamanho eco na indústria cinematográfica a alguns anos, com o Cavaleiro das Trevas (The Dark Night, 2008) de Christopher Nolan. Não há transparência da virtualidade nos cenários e ambientações, vemos o sangue, a ferrugem, a areia e o sol de uma maneira crível e temível, como um mundo distópico suporia ter.

O filme inicia sua jornada com uma das aberturas mais intensas já registradas por Hollywood e que, certamente, ecoará por muitos anos em obras similares. Desde a concepção de sua distopia arenosa Miller viu sua maior criação ser objeto de diversas investidas plagiosas e por vezes falíveis, como O livro de Eli (2010), O Justiceiro (2004) e o brasileiro Reza a Lenda (2015). Mas o filho pródigo retornado às mãos do seu genitor atinge um patamar ainda a ser debatido em sua totalidade.

Os temas trazidos direta e indiretamente ao longo de suas duas horas de duração não temem as reações que possam causar inquietude ao público, como o feminicídio e exploração sexual e corporal das mulheres; a crítica aos extremismos religiosos em torno de Immortan Joe (Hugh Keays-Byrne) e seus seguidores; toda a crítica ao armamento nuclear, causador do apocalipse que devastou o mundo; e a raridade, distribuição e consumo de petróleo e água; a adoração aos objetos acima de qualquer coisa, neste caso os carros e suas corridas representando este argumento crítico, dentre tantas outras nuances sobrepostas nas camadas de Mad Max, Estrada da Fúria.

Immortan Joe (Hugh Keays-Byrne).

E não menos importante que todos os pontos já levantados, há a questão do papel de coadjuvante destinado a Max em seu próprio filme, uma consequência e resultado de todos os elementos supracitados. A depreciação corporal, moral, sexual e natural do mundo em Mad Max: Estrada da Fúria é o ponto de sustentação da essência do seu protagonista, um homem que lutou até as últimas forças contra tudo e todos, mas no momento apenas se arrasta como um ser inerte à própria existência.

Era preciso dar força à desgraça de Rockatansky, e a atuação internalista e brutal de Hardy interligada à visceralidade e camadas da Furiosa de Charlize Theron para aumentar toda a potência dos momentos em que estão juntos, em lados contrários ou como aliados. Furiosa é todo o que Max foi um dia e deixou de ser, sua crença, luta e persistência remete à versão oitocentista do herói caído e, não por coincidência, a partir dela o filme se estrutura e desenvolve, aos poucos mostrando a Max uma nova chance, ou ao menos, algum propósito em seus dias terrenos. A relação dos dois é intensa, bruta, real, talvez, por estas razões, não foram poucas as notícias de conflitos entre os dois atores durante as filmagens, devido a vontade mútua de transparecer em máximo realismo possível os sentimentos e contextos de seus personagens.

Furiosa (Charlize Theron) e Max.

E lembremos, é Furiosa quem apresenta a Max uma chance dele buscar algo, um propósito, um sentido para sua caminhada na estrada. Porque se ela é, no contexto do filme, o que Max deixou de ser, portanto, faz todo sentido que nela seja encontrada a rota para sua identidade.

“Furiosa: Você nunca vai ter uma chance melhor.
Max: Em quê?
Furiosa: Redenção.”

Theron/Furiosa é forte, convicta, justa, emocional, profunda e, assim como o personagem título, carrega consigo um peso do tempo em que viveu e vive neste mundo devastado e, mais do que isto, em meio às cores cruas do mundo em que vivem: vibrante e pulsante no cinza, amarelo e sombras, seu sonho, sua almejada redenção reside na busca pelo Vale Verde (menção intertextual à esperança).

Esperança esta também apresentada e dividida, a pós o embate inicial com Max, que passa a acreditar na chegada a este lugar. O vai e vem da história não deixa de ser uma reminiscência ao eterno retorno nietzschiano, pois mesmo negando-nos nossa essência, ela estará lá, mesmo esquecida ou relegada ao ostracismo por muito tempo. O arco envolvendo Furiosa remete a esta alegoria numa linguagem criativa e adequada para este reinício da franquia.

Portanto, devemos entender, ou tentar compreender, que Max não luta ou compete contra Imperatriz Furiosa, Immortan Joe ou Nux, até porque nenhum destes – principalmente a líder da fuga da Cidadela – precisam de outro personagem para se impor, cada qual possui sua história e complexidade. A luta de Max, o seu enfrentamento é consigo próprio, e com isto, e somente e partir disso, a força, fúria e potência de suas convicções e motivações tomam ainda mais importância para sua regeneração, após anos em meio ao seu breu pessoal.

Novos Aliados, pontes para a reificação de si.

O herói renascido de suas cinzas

Após a alucinante sequência inicial, orquestrada de maneira crível e sufocante por Miller, é possível observar, aos poucos, a maneira como o herói morto em Max começa a se reerguer, combatendo o ceticismo dele mesmo ao longo do desenvolvimento do longa. Alguns sinais desta (re)descoberta de si podem ser vistas em momentos-chave e elementos que compõem a mitologia construída ao longo da herança oitocentista de Mad Max.

Por exemplo, as aliadas, lideradas pela Imperatriz Furiosa em sua fuga; a preocupação com os mais novos e inexperientes neste mundo, sendo Nux (Nicholas Hoult) e as pariedeiras seus principais representantes; a recuperação de sua vestimenta, tal como as botas e sua icônica jaqueta, além de suas armas; por fim, mas ainda de maneira subjetiva o embate com seu carro, parte fundamental da construção da identidade do andarilho da terra devastada.

Finalmente a última consideração, não necessariamente sobre Mad Max, Estrada da Fúria, mas sob o personagem título da obra. Os pré-julgamentos e desprendimento da carga iconográfica e sígnica das atuações originais de Mel Gibson construíram uma cortina de fumaça, um velamento analítico sobre este Max do século XXI, e assim como ocorre ao novo Homem de Aço de Zack Snyder ou o Cavaleiro das Trevas de Christopher Nolan, neste filme temos não necessariamente o herói que queremos, mas o que merecemos. Um alguém humano, assolado por seus erros e, mesmo que relutante, em busca de um fio de esperança em meio às cinzas, sombras e derrotas.

A contemporaneidade é mais fria, descrente e hipócrita que a 30 anos atrás, no período de lançamento das primeiras obras do universo megalomaníaco de Miller. A chegada do Max de Hardy não poderia, nem deveria, ser de outra maneira. Um homem carregado pelas cicatrizes de anos a fio num deserto de decepções, enfrentamentos e sobrevivência. No fim das contas, Mad Max Estrada da Fúria é um filme de (re)começos, Furiosa e Max, representam este plot do roteiro, e todo o percurso de ida e volta que assistimos demonstram isso explícita e cruamente.

Mas não nos esqueçamos, o Max que em certo porto da fuga na estada da fúria profere sua sentença de erro sobre a esperança, é o mesmo que a mantém para o grupo de pessoas que decide ajudar. No fim da loucura e maldição do sangue e sal em que estão afundados, o herói renascido do seu fosso assume seu papel de mantenedor de uma crença no possível, uma via de desconstrução para sua realidade distópica e esquizofrênica. Este é o Max que o público, em sua maioria, deixou de apreciar, (re)ver e deixar-se (des)envolver.

Pelo menos assim nós vamos ser capazes de,  juntos,
se deparar com algum tipo de redenção.”
Max Rockatansky

FICHA TÉCNICA DO FILME:

MAD MAX: ESTRADA DA FÚRIA

Diretor: George Miller
Elenco: 
Tom Hardy, Charlize Theron, Nicholas Hoult, Hugh Keays-Byrne
País:
Austrália e EUA
Ano:
2015
Classificação:
16

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Ilustração: Hudson Eygo

 


Nota: Homenagem a Baggio, o belo cão que por sete anos só nos fez encher de alegria, demonstrando em gestos um amor enorme. Assim como muitos outros cães, foi ceifado pela Leishmaniose. 

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Diario das Forcas

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Por Narubia Werreriá
Iny (Karajá) da Ilha do bananal, representante indígena e estudante de Direito da UFT.

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