Passa amanhã

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66 anos, já estou velha, cadê a sabedoria?

Isso realmente me incomoda, pois me dou conta de que das duas coisas, não conquistei nada ainda; sim, porque a velhice não é uma conquista, a despeito da “nobreza” que se possa emanar disso, é apenas uma (con)sequência da vida; e a sabedoria, por mais que eu abra e feche os olhos, por mais que eu me belisque, não sinto em mim os eflúvios da danada.

Aliás, até por não ser uma sábia (ainda), preciso pesquisar um modelo ideal para mim. Hoje é bem mais fácil, com o advento da tecnologia, posso em segundos, estar ao lado do velho pescador que apenas do soprar do vento sabe o custo benefício de se colocar a jangada na água. Ou estar entre os monges tibetanos para conhecer a retumbância do silêncio, em horas incontáveis de concentração.

Resolvi seguir os passos de alguém a quem me serve de modelo, pela simplicidade e verdade que carrega em seus ensaios; Este modelo é Michel de Montaigne (1533-1592), pois bem, ele afirma que “É necessário conhecer a ti mesmo”, Reitera ainda que “É preciso que cada um construa uma sabedoria à sua própria medida. Cada um só pode ser sábio de sua própria sabedoria”.

Sobre sua primeira fala me parece uma tarefa que conseguiria fazer.  Sem querer fazer apologia a cerca dos meus saberes, penso que ao longo do tempo acumulei alguns poucos conhecimentos, mas seria o caminho certo e o suficiente?

“Sobre os saberes Montaigne escreve: “[c] proclamai a nosso povo, sobre um passante: ‘Oh, que homem sábio!’ e sobre outro: ‘Oh, que homem bom!’ […] Seria preciso perguntar quem sabe melhor, e não quem sabe mais.” (MONTAIGNE, 2002, p. 203).

Fonte: Imagem de Nato Pereira por Pixabay

É uma baita reflexão para mim e para quem está nesta busca em saber o quanto e como quer ser sábio. Eu sei, melhor, ou sei mais? Confesso que está questão é inacabada em meu pensar. Um dos grandes problemas que enfrentei foi me debruçar na compreensão desta construção da sábia que quero ser, como poderia eu, separar-me de mim e me ver dentro da sabedoria que doravante ousaria perseguir.

Adentrando mais no mundo deste notável homem, busco através dele salientar o quanto de sabedoria preciso, e se realmente preciso. É certo que alguma preciso, mas para me tornar sábia, daqueles de renome, tal qual o meu modelo, o que seria necessário?

Minhas indagações chegaram ao modelo de sábio para Montaigne. Sim, ele também o tinha, um sábio senhor de alcunha Sêneca um importante escritor e filósofo do Império Romano. Pois bem, conforme ele a  sabedoria carece de alma plena, e sobre isto ele afirma que,

“A alma do sábio é semelhante à do mundo supralunar: uma perpétua serenidade. Aqui tens mais um motivo para desejares a sabedoria: alcançar um estado a que nunca falta a alegria. Uma alegria assim só pode vir da consciência das próprias virtudes: apenas o homem forte, o homem justo, o homem moderado podem ter alegrias” (SÊNECA, 2009, Carta 59, p. 215).

Achei de extrema relevância, porém um tanto quanto profundo para uma iniciante. Porém ainda me acho inacabada em tanta virtude.

Fonte: Imagem de Gerd Altmann por Pixabay

Quero  ser uma sábia contente, satisfeita, feliz, mesmo sem os atributos que Sêneca propõe e também,  não que eu não veja isso no modelo de sábio que citei acima,  mas já que me ocorreu escolher, vou me preparar bem.

Escolha. Aí que tá, sinto que lá na frente isso pode ser um complicador do quadro final; isso para a sábia que quero para mim.

Veja bem, na música, por exemplo, não me machuca ouvir uma música erudita, mas e o sambinha, será que embaça a estirpe?

O jejum… Ih meu, e o xtudo, o escaldado com dois ovos, o mocotó, o pão com salame? É, sinto que aí vai dar problema.

A festa com os amigos, as madrugadas, isso tem que ser negociado.

O futebol, o desfraldar das bandeiras, o grito de gol, nada disso?

Sei que não é sábio criticar tudo, mas é muito importante botar as cartas na mesa; que tipo de sabedoria me compraz?

Algum lampejo de sabedoria eu já tenho adquirido, por exemplo, nos vários momentos em que me sentei nas escadarias da praça, em aruanã, e vi a majestosa descida do rio Araguaia, acompanhado de arabescos avermelhados do sol se pondo; aprendi que beleza é unguento para a alma.

Aprendi que o mais gigantesco dos gestos é o perdão; talvez por isso, tantos sentem dificuldades em praticá-lo. Inclusive eu mesma.

Por outro lado, todo meu conhecimento (deveras pouco) de aritmética, matemática, física, não me permite calcular a intensidade de dor, no suspiro de uma mãe velando um filho.

Pronto, feito meu esqueleto de sábia, posso sentir que ainda estou muito presa aos velhos costumes (graças a deus!). De antemão já peço desculpas a Montaigne e Sêneca, os ensinamentos foram de grande valia, com certeza me servirão para o meu modelo; mas meu pão com salame, meu samba e, sobretudo meu futebol, no momento em que meu porco (Palmeiras) é tão soberano, trazem a resposta que preciso caso seja perguntado: “quer ser sábia hoje?”, ao que placidamente responderei:

Passa amanhã!

Referências

MELO, Wanderson Alves. (2009). A visão de Montaigne sobre o homem no mundo. Disponível em: https://pensamentoextemporaneo.com.br/?p=100. Acesso em 26/08/2022

THEOBALDO, M.C. Sêneca, Montaigne e a utilidade dos saberes. In: PINTO, F.M., and BENEVENUTO, F., comps. Filosofia, política e cosmologia: ensaios sobre o renascimento [online]. São Bernardo do Campo, SP: Editora UFABC, 2017, pp. 199-225. ISBN: 978-85-68576-93-9. https://doi.org/10.7476/9788568576939.0011.Acesso em 26/08/2022.

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Álcool, o frágil limite entre prazer e destruição

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Todos os anos o dia 20 de fevereiro é dedicado ao combate e conscientização da dependência do álcool, e é de suma importância que haja uma reflexão individual sobre o papel que a bebida exerce em nossas vidas e como ela pode impactar nossa realidade.

O álcool, diferente de outras drogas, pode estar presente desde muito cedo na vida das pessoas e a dependência que ele muitas vezes causa afeta milhões mundialmente. Socialmente muito bem aceito, e proposto em quase qualquer ocasião, a falta de controle no seu consumo às vezes está relacionado à busca de alívio da tensão e do estresse do dia a dia, entre outras razões. Seja para ser bem aceito num grupo, seja para perder a timidez, ou tantos outros motivos, a bebida é muitas vezes vista como uma boa alternativa.

O Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM), na sua última edição (DSM-5) atualizou o abuso e dependência de álcool que antes era chamado de alcoolismo, para Transtorno por Uso de Álcool (TUA), sendo uma condição na qual uma pessoa tem desejo ou necessidade física de consumir bebidas alcóolicas, mesmo que isso tenha um impacto negativo e traga consideráveis prejuízos em sua vida. É uma forma de extrema dependência em que a pessoa tem uma necessidade compulsiva de ingerir álcool para ser funcional nas suas atividades diárias.

Atualmente são identificados quatro padrões de consumo de álcool: o consumo moderado, sem risco; o consumo arriscado, que tem o potencial de produzir danos; o consumo nocivo, que se define por um padrão constante de uso já associado a danos à saúde; e o consumo em binge, que diz respeito ao uso eventual de álcool em grande quantidade.

Fonte: encurtador.com.br/syCT0

Alguns autores trazem este abuso como uma doença crônica, com fatores genéticos, psicossociais e ambientais influenciando seu desenvolvimento e suas manifestações, ou seja, as teorias levam em conta a complexidade do transtorno e reconhecem que geralmente é causado por uma combinação de fatores.

Mas porque referir-se a este assunto como um frágil limite entre prazer e destruição?

O álcool atua sobre o sistema de recompensa do cérebro, através da liberação de dopamina (entre outros neurotransmissores), trazendo a sensação de prazer e recompensa. Por ser uma droga lícita, difundida e muito usada até mesmo como ferramenta de aceitação e desenvoltura social, entender o mecanismo por trás deste sistema de gratificação que o cérebro produz e as consequências deste tipo de condicionamento, nos fazem perceber quão tênue é esta linha entre o prazer e o perigo.

Segundo o psiquiatra Dr. André Gordilho, “o paciente pode desenvolver tolerância, precisando de uma quantidade cada vez maior da bebida para sentir os efeitos que ele busca. Às vezes ocorrem sintomas físicos, como insônia, irritabilidade, e outros sintomas de abstinência”, completa.

Para um diagnóstico eficaz, ele traz que a atenção ao histórico do paciente é essencial. Normalmente a pessoa começa a estreitar o intervalo dos dias em que bebe, passando a consumir álcool de forma cada vez mais frequente. Também pode passar a ter comportamentos inadequados, como beber em locais em que não deveria, como no trabalho.

Fonte: encurtador.com.br/ckmwN

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o abuso de álcool é responsável por 3,3 milhões de mortes todos os anos no mundo. Dentre outras consequências podemos listar algumas patologias como: cirrose e outras doenças do fígado, depressão, crises de ansiedade, tremores e etc.

O álcool pode piorar os sintomas de depressão e ansiedade já existentes, além de aumentar as explosões emocionais. Muitas vezes, os alcoólatras têm uma falta de controle emocional (autoregulação) e às vezes podem causar perturbação nos contextos onde estão inseridos se estiverem altamente intoxicados.

O vício em álcool é perigoso, e ele vai aumentando gradativamente sem que o indivíduo perceba. O usuário não pensa que tem um problema, e quando vai se dar conta já não consegue assumir o controle em relação ao comportamento de beber ou à quantidade consumida.

Esta prática, além de conduzir o indivíduo a sérios malefícios para a saúde, contribui para a deterioração das relações sócio familiares e de trabalho, causando sérios prejuízos para a pessoa tanto fisicamente, quanto psicológico, emocional e socialmente.

Fonte: encurtador.com.br/rvQX9

Alguns sinais e sintomas do transtorno incluem:

  • beber sozinho ou em segredo;
  • não ser capaz de limitar a quantidade de álcool consumida;
  • não ser capaz de lembrar alguns espaços de tempo;
  • ter rituais e ficar irritado se alguém comentar sobre esses rituais, por exemplo, bebe antes, durante ou depois das refeições ou depois do trabalho;
  • perder o interesse em hobbies que eram apreciados anteriormente;
  • sentir muita vontade de beber;
  • sentir-se irritado quando os horários de beber se aproximam, especialmente se o álcool não estiver disponível;
  • armazenamento de álcool em lugares improváveis;
  • bebe para se sentir bem;
  • adquire problemas com relacionamentos, leis, finanças ou trabalho que resultam da bebida;
  • precisa cada vez mais de mais álcool para sentir seu efeito;
  • sente náuseas, sudorese ou tremor quando não está bebendo;

O tratamento da dependência possui algumas características particulares, visto que o indivíduo precisa de um programa bem personalizado, específico para ele. As perspectivas trabalhadas são medicação, abstinência, psicoeducação e responsabilização, dentro de uma visão multidisciplinar, envolvendo profissionais como psiquiatras, psicólogos, terapeutas ocupacionais e quaisquer outras especialidades como hepatologistas por exemplo. Para cada uma dessas abordagens é realizado um tratamento específico que vai depender do estágio que o paciente se encontra.

O primeiro passo deve partir da pessoa e o desejo de mudar aquele comportamento, reconhecendo que o consumo excessivo, progressivo e abusivo de bebidas alcoólicas está causando problemas em sua vida. A rede de apoio (familiares, amigos) é essencial para o sucesso da restauração da saúde e bem estar do usuário.

Um retorno ao consumo normal de álcool é muitas vezes possível para indivíduos que abusaram do álcool por menos de um ano, mas, se a dependência persiste por mais de cinco anos, os esforços para retornar ao consumo social geralmente levam à recaída.

Fonte: encurtador.com.br/bjIO3

Existe uma negação muito grande em reconhecer a doença por causa do estigma que ela carrega. E por ser tão bem socialmente aceito, as pessoas demoram a reconhecer e a procurar tratamento. Existe também muita vergonha envolvida nesse processo, e acaba sendo em alguns casos uma situação velada, e muitas vezes nem os próprios familiares conseguem se mobilizar para ajudar a pessoa que sofre com isso, às vezes por falta de informação ou por falta de acesso a estes meios de assistência.

Algumas formas de abordar e reduzir os níveis de consumo nocivo de álcool podem vir da promoção de conhecimento sobre saúde na população, fornecendo evidências da relação do consumo de álcool e os danos causados pelo abuso. A conscientização precisa ser mais bem trabalhada na sociedade como um todo, e precisa haver uma quebra de paradigmas, e buscarmos desmistificar o processo de tratamento, para a não normalização da doença e como qualquer outro transtorno ou patologia, procurando ajuda, pois é possível com tratamento superar e melhorar a qualidade de vida significativamente dos indivíduos prejudicados, tanto o portador do transtorno quanto seus familiares, amigos e colegas de trabalho.

O mais importante (e na verdade essencial) neste processo é que não se abra mão de um olhar psicossocial do indivíduo, que esteja ampliado e atento às relações deste sujeito, que ele seja protagonista nesta trajetória, e que haja este olhar nas interações entre os profissionais de saúde e o usuário e a sua rede de apoio, para um tratamento humanizado, que respeite as vontades do sujeito e busque sua melhora gradativa, de acordo com o seu caso e seu contexto.

REFERÊNCIAS

Transtorno do Uso de Álcool: uma comparação entre o DSM IV e o DSM – 5, NIH – National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism, outubro de 2021. Disponível em:  <https://www.niaaa.nih.gov/sites/default/files/publications/AUD-A_Comparison_Portuguese.pdf> . Acesso em: 15/02/2022.

O que é Transtorno por abuso de Álcool e qual é o Tratamento?, Seu Amigo Farmacêutico, 2019. Disponível em: < https://www.seuamigofarmaceutico.com.br/artigos-e-variedades/o-que-e-transtorno-por-abuso-de-alcool-e-qual-e-o-tratamento-/404#:~:text=O%20alcoolismo%2C%20agora%20conhecido%20como,era%20chamada%20de%20%22alco%C3%B3latra%22 >. Acesso em 15/02/2022.

Alcoolismo pode ser um inimigo invisível, Holiste, 27/05/2019. Disponível em: <https://holiste.com.br/alcoolismo-pode-ser-um-inimigo-invisivel/>. Acesso em: 15/02/2022.

Os cinco tipos de problemas com a bebida são mais comuns em diferentes idades, Third Age, 2019. Disponível em: < https://thirdage.com/the-five-types-of-problem-drinking-are-more-common-at-different-ages/>. Acesso em 16/02/2022.

Alcoolismo, Rede D’or, 2021. Disponível em: <https://www.rededorsaoluiz.com.br/doencas/alcoolismo>. Acesso em 16/02/2022.

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AME: a doença com o tratamento mais caro do mundo

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A atrofia muscular cerebral, mais conhecida como AME, é uma doença genética rara e sem cura. Ela leva a uma intensa fraqueza muscular em todo o corpo da criança desde o momento do nascimento, principalmente abaixo do pescoço. É considerada rara pois afeta 1 a cada 10 mil bebês. A efeito de comparação, a Síndrome de Down afeta 1 a cada 800. 

As características da doença estão na degeneração dos neurônios motores da medula espinhal, que podem evoluir para uma insuficiência respiratória, não permitindo a autonomia na hora da locomoção e dificultando qualquer tipo de movimento. Além disso, também pode gerar pneumonias de repetição, necessidade de suporte respiratório por fraqueza muscular intensa e atrofia muscular. 

Os sintomas da AME aparecem, geralmente, nos primeiros meses após o nascimento. Observa-se fraqueza intensa da musculatura global, especialmente abaixo do pescoço, de modo simétrico, levando a enorme hipotonia que é diminuição do tônus muscular e da força causando moleza e flacidez, além da atrofia muscular e contrações de língua e músculos em geral. 

Fonte: encurtador.com.br/cltC4

As consequências do AME ao longo da vida são que o bebê não vai conseguir adquirir autonomia para se locomover, poderá ter pneumonias de repetição, além de poder precisar de suporte respiratório por fraqueza muscular intensa e atrofia muscular. O diagnostico pode ser feito por meio de exames de sangue, eletroneuromiografia, biópsia muscular e testes genéticos, que traz um resultado específico e definitivo.

Mas a dificuldade na detecção é um dos fatores que prejudica o tratamento precoce. Isto porque existem diferenças no aparecimento dos sintomas em cada criança, que é definido em graus pela idade, podendo ser mais ou menos intensa. Os graus são definidos em tipo 1, quando manifestado até os 6 meses de vida; tipo 2, manifestado entre 6 meses e 18 meses; e tipo 3, que aparece após esse período.

Apesar de não ter cura, há tratamento e até a recente aprovação de um medicamento nos Estados Unidos – o Zolgensma. Basicamente, o tratamento consiste em cuidados paliativos e envolve fisioterapia, além de medidas preventivas para infecções. Já o remédio, apesar de revolucionário, não é de fácil aquisição, pois é um medicamento milionário, em resumo, o mais caro do mundo. Além disso, só pode ser administrado até os 2 anos de idade.

Fonte: encurtador.com.br/pxPVZ

Até então, o medicamento que pode ser um alívio para a vida de várias famílias, possui apenas o registro de uso da Anvisa, o que, apesar de ser um passo a mais, ainda não trouxe grandes expectativas. Isso, porque o Zolgensma não é produzido nem comercializado no Brasil, o que impossibilita a incorporação ao SUS e faz com que bebês do país inteiro percam a oportunidade de um tratamento.

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Em seu novo livro, Mirian Goldenberg investiga por que muitos homens preferem as mulheres mais velhas

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Em suas pesquisas, a antropóloga constatou que os casamentos mais felizes  e equilibrados são justamente aqueles em que a mulher é mais velha que o marido. Leia e entrevista com a autora no blog da Record: http://bit.ly/2qQ6BBS

Há quase 30 anos, a antropóloga Mirian Goldenberg pesquisa sobre os diversos tipos de arranjos conjugais no Brasil. Outro tema que vem sendo alvo da escritora nos últimos anos é o envelhecimento.  Seu novo livro trata justamente de uma questão que envolve a interseção dos dois assuntos: o fato de alguns homens preferirem se casar com mulheres mais velhas.

Como a própria autora explica na obra, o título é uma provocação. Na verdade, o número de homens que se relacionam com mulheres mais jovens é muito maior. No entanto, uma de suas descobertas após entrevistar 52 casais é que a união de mulheres mais velhas com homens mais novos minimiza os jogos de dominação, conflitos e disputas muito comuns nos casamentos “convencionais”.

 “Por mais estranho que possa parecer, apesar de este tipo de relação ser considerada desigual, encontrei uma situação bastante equilibrada para os homens e mulheres pesquisados. Aparentemente, elas são percebidas como dando muito mais do que eles, em termos de posição social, situação financeira, maturidade, experiência, cuidado, carinho, atenção, compreensão. No entanto, eles dão aquilo que muitas mulheres desejam: o reconhecimento de que elas são superiores. Elas recebem a prova constante de superioridade em relação às outras mulheres, especialmente as mais jovens.”, afirma Mirian.

Ao constatar a felicidade e satisfação dos casais pesquisados, Mirian descobriu que, em vez de perguntar por que determinados homens casam com mulheres mais velhas, é preciso questionar os motivos que levam a maioria dos homens a continuar preferindo casar com mulheres mais jovens. Descobriu também que é necessário questionar as razões que levam grande parte das mulheres brasileiras a aceitar e fortalecer, com seus medos, inseguranças e preconceitos, o tabu da idade.

“Por que os homens preferem as mulheres mais velhas?” chega às livrarias neste mês de maio pela Editora Record.

Mirian Goldenberg nasceu em Santos (São Paulo) e mora no Rio de Janeiro desde 1978. É doutora em Antropologia Social e professora titular do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. É autora de mais de 30 livros, que, juntos, já venderam mais de 100 mil exemplares. Entre eles estão: Toda mulher é meio Leila Diniz, A Outra, De perto ninguém é normal, A arte de pesquisar, Infiel, Intimidade, Por que homens e mulheres traem?Coroas, A bela velhice e Velho é lindo! É colunista, desde 2010, da Folha de S. Paulo.

POR QUE OS HOMENS PREFEREM AS MULHERES MAIS VELHAS?
Mirian Goldenberg
128 páginas
R$ 32,90
Editora Record
(Grupo Editorial Record)

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A descoberta do brincar como ferramenta terapêutica

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Atualmente, a separação entre o ser adulto e o ser criança parece tão normal para todos nós, mas nem sempre foi assim. As transformações da sociedade, cultura e economia foram fundamentais para esta divisão. Segundo Ariès (1981), o sentimento de infância que se aproxima mais da modernidade se deu a partir do século XVIII, onde houve uma segmentação do mundo adulto com o da criança. Até então, na família medieval, a infância não tinha um foco significativo. As crianças eram consideradas como miniadultos, o que é possível ver na forma de representá-las nas artes da época. Na sociedade medieval, o público e o privado fundiam-se nas relações familiares, no trabalho, nas relações sociais. As brincadeiras não eram distintas, mas comum aos dois mundos. Não havia espaços destinados às crianças, assim, logo que desmamadas, eram inseridas nos afazeres do dia a dia dos adultos, ou seja, não havia clareza quanto aos espaços e papeis de cada um.

Fonte: https://reproarte.com/images/stories/virtuemart/product/bruegel_pieter_d_a/0233-0114_bauerntanz.jpg

Partimos de um mundo de representações onde a infância é desconhecida: os historiadores da literatura (Mgr. Calvé) fizeram a mesma observação a propósito da epopeia, em que crianças-prodígio se conduziam com bravura e a força física dos guerreiros adultos. Isso sem dúvida significa que os homens dos séculos X-XI não se detinham diante da imagem da infância, que esta não tinha interesse, nem mesmo realidade (Ariès, 1981, p.52).

 Já na família nuclear, a preocupação com a criança era mais de cunho econômico. Mesmo com o surgimento do “sentimento de infância”, este era direcionado para a qualidade de mão de obra que emergiria desta família.

Paralelamente, a criança adquire um novo valor e importância; percebe-se que ela é, potencialmente, riqueza econômica – o trabalhador do futuro. A partir daí, surge a necessidade de cuidar mais dessa criança e principalmente, de educá-la. Assim, precisa ser alvo de todo cuidado e atenção na medida em que ela é vista como tesouro das nações em formação. (Aguiar, 2005,p.27).

Neste momento, com aquisição deste novo olhar, agora seria possível ver a diferença entre ser adulto e o ser criança. E esta pode ser vista mais frágil, dependente e inocente e com uma afetividade peculiar, típico da infância. Com isso, surge a educação formal, o sentimento materno, maiores cuidados com a higiene e a separação dos espaços, que antes eram comuns aos dois universos. Nascem então, a Pediatria, a Pedagogia e a Psicologia, ciências que auxiliariam no zelo deste ser, agora em foco.

Em 1990, no Brasil, se consolida os direitos das crianças através da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), concedendo direitos a estas à educação, segurança, lazer e saúde.

A Diversidade de Olhares Sob o Ato do Brincar

Quando se pensa em crianças, logo vem à lembrança momentos da infância e, consequentemente, a diversidade de brincadeiras que circundam tal mundo. Porém, o brincar nem sempre foi visto como algo pedagógico e muito menos terapêutico. O olhar para as atividades infantis foi encarado com maior relevância, ou seja, como algo benéfico a partir de uma experiência de Freud ao observar uma criança.

Freud, em busca da etiologia para as neuroses, descobre que a origem dos adoecimentos psíquicos era gerada na infância. Segundo Aguiar (2005), Freud evidencia a importância da infância para a construção da personalidade e identificação das patologias. Foi com o caso Hans, onde ele aconselhava um pai em relação aos cuidados com o filho, que Freud pode observar a influência do adulto no comportamento da criança. Mesmo sabendo da influência de seu discurso no agir desta, esse pai não mudou completamente suas atitudes, porém esta observação possibilitou Freud a visualizar que havia benefício terapêutico em tal prática, como pode ser constatado na visão de Aguiar

descobrir que elas eram afetadas pelo que os adultos diziam ou faziam não fez que estes mudassem totalmente seu comportamento com relação à criança, porém legitimou a possibilidade de determinado adulto, o psicoterapeuta, agir e falar de modo específico com ela afim de que isso trouxesse algum benefício terapêutico. A forma que esse agir e falar adquiriu ao longo do desenvolvimento da psicoterapia infantil é congruente com as perspectivas de ser humano e de funcionamento não saudável, próprias de cada abordagem (AGUIAR, 2005, p.29 ).

Em outra observação de Freud, em uma brincadeira de carretel com uma criança, ele viu, segundo Luciana Aguiar (2005), o brincar como representação e elaboração de frustrações e conflitos. Para Anna Freud (1971) apud Aguiar (2005) o ato de brincar tinha como função apenas a criação de um forte vínculo entre a criança e o psicoterapeuta, ou seja, era apenas estabelecer o rapport- que significa relação de harmonia em um processo comunicativo, no qual a pessoa fica mais receptiva à interação.

Melanie Klein (1981) foi a primeira a sistematizar o trabalho clínico com criança e viu no brincar uma linguagem não verbal que possibilitaria esta a se expressar desde muito pequena. Ao utilizar o brincar como um substituto da verbalização, visto que as crianças podiam se beneficiar da interpretação, percebeu que não era possível conduzir a sessão terapêutica como a de um adulto deitando-as no divã e conduzindo-as à associação livre , Klein concluiu que a linguagem predominante da criança é a linguagem do brinquedo e era sobre essa perspectiva que a interpretação deveria acontecer (AGUIAR, 2005).

Partindo dos pressupostos da psicanálise infantil kleiniana, Donald Winnicott estudando tal relação terapêutica desenvolveu a importante teoria do brincar, expandindo a compreensão da função do brinquedo no desenvolvimento infantil e introduziu a noção de espaço transicional, termo essencial para a compreensão do processo de diferenciação da criança com o adulto bem como dos recursos que ela utiliza para tal, ele distingue o espaço terapêutico como sendo unicamente do brincar e sugere que o terapeuta deve ir ao encontro do brincar da criança, tornando-se ativo e engajado não só na análise, mas também na relação paciente-analista, valorizando o contato entre ambos. (AGUIAR, 2005).

[…] Winnicott propõe uma vivência da experiência clínica ao lado da criança e critica os terapeutas que nunca sentaram no chão para acompanhá-la no atendimento, por exemplo, (OUTEIRAL, 2010; NEWMAN, 2003a). Para ele, o brincar possibilita a construção e vivência do espaço transicional, ou seja, intersubjetivo. Além de ser um meio de comunicação, tal gesto estaria inserido no contexto psicoterapêutico, pois auxilia a constituição e fortalecimento do self, caracterizando o viver criativo (LEHMAN, 2012; FRANCHIN et al, 2006).  (CARNEIRO, SILVA, 2013, p.343)

Fonte: http://www.cuiaba.mt.gov.br/upload/imagens/20121011173656.jpg

Já Para Virginia Axline (1972), a ludoterapia pode ser guiada de forma diretiva, ou seja, pelo psicoterapeuta, e não diretiva. No caso, não diretivo a terapia é conduzida pela criança, por meio do brincar, oportunizando a esta a expressão de seus sentimentos e suas angústias. A autora define ainda que o jogo é o ambiente espontâneo de auto expressão da criança, onde se torna possível que esta cresça em melhores condições, pois nesse ambiente ela tem a possibilidade de manifestar seus sentimentos mais comuns, frustração, insegurança, agressividade, medo entre outros, e o fato de ela poder se expressar proporciona a tomada de consciência, o esclarecimento e enfrentamento da situação conflitiva.

Demonstrando a importância do brincar para elaboração dos conflitos e promoção de saúde, (SOUZA, MITRE, 2009, p.4, apud CARNEIRO, SILVA, 2013, p.345), relata a experiência hospitalar com crianças

certa tarde, atendemos outro menino de 5 anos. Ele estava restrito ao leito por conta de um acesso profundo na virilha. Tendo que usar luvas de gaze para impedir que tirasse o acesso, estava, portanto, com a movimentação ainda mais limitada. Além disso, estava em dieta zero há cerca de dois dias. Quando nos aproximamos dele, começou a chorar sinalizando que estava com fome, e que não queria brincar com nenhum dos brinquedos que tínhamos levado. Propusemos, então, brincar de comidinha de faz-de-conta. Ele aceitou. Preparávamos a comida, perguntávamos se ele gostava, se ele queria provar, e a levávamos até a sua boca. Depois de um tempo, ele sinalizou que já tinha comido muito e queria dormir. Com a brincadeira ele conseguiu expressar sua necessidade, elaborar de alguma forma aquela situação desprazerosa e relaxar.

Fonte:http://www.nossagente.net/wordpress/wp-content/uploads/2015/02/sua_saude_sandra3.jpg

Segundo Luciana Aguiar (2005), a inserção do psicoterapeuta no espaço lúdico da criança é de fundamental importância para a realização das possíveis intervenções. Muitas vezes, ele precisará mediar algo durante a brincadeira, utilizando a linguagem lúdica da criança. Isso nos remete a outro ponto importante: a disponibilidade para brincar. Embora algumas crianças prefiram não envolvê-lo em suas brincadeiras, fazendo com que ele seja um mero observador, verificou-se que a maior parte delas precisa da interação do psicoterapeuta.

brincar com a criança não é tornar-se criança no espaço terapêutico. Brincar com a criança não é reagir como se fosse uma criança. Brincar com a criança é poder compartilhar da importância e da magia daquela linguagem sem perder de vista a tarefa terapêutica. ( AGUIAR, 2005, p.198.)

Melanie Klein (1964) apresenta o brincar como a personificação da criança não apenas de seu ego, mas também de conteúdos do Id e do Superego, distribuídos pelos diversos personagens pertencentes ao enredo de uma brincadeira. Esta personificação pode ocorrer de diversas maneiras com o uso de objetos inanimados como carrinhos, animais e bonecos entre outros, oportunizando assim a expressão dos conflitos e fantasias do mundo infantil.

É possível constatar que o ato de brincar acompanha o ser humano em todas as fases do seu desenvolvimento, inclusive na fase adulta, onde se abandona os brinquedos infantis e projetam-se as suas angústias e anseios por meio das artes visuais, do cinema, da literatura. Segundo o escritor Nelson Rodrigues (1986), se não fosse o seu oficio de escrever, teria enlouquecido, pois com sua obra exorcizava seus demônios, seus fantasmas, já que sua vida foi uma sucessão de tragédias.

Fonte: http://imagem.vermelho.org.br/biblioteca/nelson-rodrigues59771.jpg

Conclui-se, então, que o ato de brincar como benefício terapêutico é fundamental em todas as etapas da evolução humana. Para Oklander (s\a) apud Goiânia-itgt, (2012), o organismo se desenvolve através de um processo de auto regulação organísmica, ou seja, ele fará o que tiver que fazer para alcançar a tão desejada homeostase – que é o processo pelo qual o organismo satisfaz as suas necessidades e interage com o seu meio buscando o equilíbrio, a fim de adquirir saúde física, mental e espiritual. E o brincar como recurso terapêutico se torna uma via eficaz para esta estabilidade.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, L. Gestalt-terapia com crianças: teoria e prática. Livro Pleno. Campinas, 2005.

ARIÈS, P. História Social da Criança e da família. LTC-Livros Técnicos e Científicos Editora S.A. Rio de Janeiro-RJ, 1981.

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A loucura de se comemorar aniversários

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Não sinto falta do mundo quando olho as páginas passadas do calendário, mas sim dos óculos escuros que eu usava aos treze anos. O mundo de lá pra cá, a cada virar de páginas transformou-se apenas um amontoado de produtos a custo benefício. Vender, comprar, revender, jogar fora e depois comprar mais uma vez.

É sempre assim, a gente nunca sabe o que virá depois dos dezoito, ou dos vinte, trinta, quarenta, sabe-se lá, qualquer ano, qualquer aniversário. Ficamos apenas idealizando, quando tiver tal idade faço isso, em tal idade faço aquilo, aí quando a tal idade chega tudo o que queremos mesmo, de verdade, é voltar pra página vinte do livro da vida. Então para que avançar no calendário? Para que comemorar?

Óculos como aquele dos treze anos, eu jamais terei. Eles eram a ilusão de um mundo perfeito, todo encaixado, feito pra você, igual à propaganda, mas aí agente olha no espelho e já não tem mais aquela cara, não vai combinar. Escrever um livro? Plantar uma árvore? Ter um filho? Alguém ainda faz esse tipo de conta ano a ano enquanto espera o bendito calendário virar e mais uma ruga nascer em sua face? Se fosse realmente escrever o tal livro, o que contar? Algumas histórias tristes de quem não teve sorte alguma no amor e em outras coisas a mais? Uma vida e um trabalho que não te levaram a lugar algum, mas pagaram as tuas contas? Ou uma vida que te levou para qualquer lugar, menos de volta a página vinte.

Falar que o tempo passa é fácil, difícil mesmo é ver que ele realmente passou e não se emocionar, ou se revoltar com as fotos comprovando o fato. Em tempos de redes sociais então, onde está tudo lá estampado na sua timeline. Aí nos resta lembrar, e da forma mais nostálgica possível de que no meu tempo, nos anos oitenta, na época em que refrigerante tinha rolha e não tampinha, e por aí vai, tecendo um corolário de lamentações como se o tempo bom para se viver não fosse agora, esquecendo que a cada comemorar de uma nova data, você queria mesmo era o tal futuro.

O futuro é agora! E agora? Mais um ano chegou, mais uma rede social explodiu, mais uma chance que passou. Falar do hoje, bem agora olhando a data de feliz aniversário rindo da sua cara, sem esboçar uma expressão de insatisfação ou de preocupação, é uma tarefa pra lá de difícil, quem sabe daqui uns dez anos, quando olharmos para aquela selfie daquele aniversário cheio de esperança, agente não para frente e diga que aquele olhar de ontem enxerga exatamente tudo o que se é agora.

 

 

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