Emoções Sintéticas – o futuro da conexão humana na era da tecnologia

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No início da década de 2020, o campo das emoções sintéticas começou a ganhar força como uma possibilidade real de transformação em áreas como saúde, educação e interações sociais. A ideia de que máquinas possam reconhecer, interpretar e até replicar emoções humanas provoca tanto fascínio quanto receio. Enquanto alguns defendem que essas inovações podem melhorar a qualidade de vida e preencher lacunas emocionais, outros questionam se não estaríamos arriscando desumanizar ainda mais nossas relações interpessoais.

O artigo foi inspirado por uma questão levantada durante um seminário que ministrei sobre Big Data, Inteligência Artificial (IA) e Saúde. No decorrer da apresentação, alguém perguntou: “Até que ponto uma IA pode imitar um humano?”. Essa pergunta gerou uma discussão rica e multifacetada, abordando desde os avanços tecnológicos que aproximam a IA de características humanas até os limites éticos e sociais que cercam essas inovações.

Um dos pontos centrais do debate foi a importância dos dados. Como destacado pelo seminário, “dados são o limiar”. A capacidade de uma IA imitar emoções e comportamentos humanos depende diretamente da qualidade, quantidade e diversidade dos dados que ela pode processar. Desde padrões emocionais coletados por sensores em dispositivos até grandes volumes de informações textuais analisadas por algoritmos de aprendizado de máquina, os dados moldam não apenas as respostas das IAs, mas também as questões éticas sobre privacidade e consentimento.

Em relação à compreensão das emoções humanas, a inteligência artificial tem avançado em aplicações práticas, como a detecção de estados emocionais por meio de características faciais, entonações vocais e gestos. Estudos demonstram que esses sistemas estão sendo integrados em áreas como segurança, entretenimento, saúde e educação, permitindo interações mais personalizadas e empáticas [1]. Tecnologias semelhantes foram inspiradas por ficções como o robô Baymax de Operação Big Hero, enquanto na prática robôs como Paro e Pepper são utilizados em terapias emocionais e na interação com crianças e idosos.

Figura: Paro, um robô terapêutico utilizado na interação com idosos em contextos clínicos [2].

No entanto, os desafios éticos que acompanham essas tecnologias são significativos. Um ponto central é a humanização dos robôs, que pode gerar a falsa impressão de consciência emocional. Como destacam alguns estudiosos, a introdução de feições humanas em robôs pode criar conexões artificiais que confundem os limites entre tecnologia e humanidade [3]. Esse fenômeno levanta a questão: até que ponto os robôs devem ser programados para simular empatia?

Outro aspecto importante é a análise de sentimentos, uma técnica amplamente usada na inteligência artificial. Essa abordagem permite que sistemas interpretem e classifiquem emoções expressas em textos digitais, como postagens em mídias sociais. Estudos como o da IBM, que utilizou o modelo Big Five para analisar personalidades a partir de tweets, ilustram como dados emocionais podem ser utilizados em estratégias de marketing direcionado e atendimento personalizado [4][5].

Figura: Interface do software da IBM Watson [4].

Apesar do avanço dessas tecnologias, a privacidade emocional emerge como um tema crítico. A coleta de grandes volumes de dados emocionais, muitas vezes sem o devido consentimento, expõe usuários a riscos significativos. Como alertam especialistas, sistemas de IA devem ser projetados para proteger informações sensíveis, garantindo que apenas dados relevantes e autorizados sejam utilizados [6].

A robótica social, por sua vez, apresenta oportunidades e desafios na interação humano-máquina. Robôs como Sophia e Pepper exemplificam como a tecnologia pode ser aplicada para oferecer suporte emocional em lares, escolas e hospitais. No entanto, esses avanços também nos forçam a reconsiderar como definimos empatia e conexão em um mundo cada vez mais automatizado [7]. A ética desempenha um papel fundamental nesse contexto, destacando a necessidade de diretrizes claras para o uso responsável dessas ferramentas.

Figura: Sophia [8].

Finalmente, o cinema também explora como a tecnologia pode influenciar a forma como entendemos as emoções. Obras fictícias como o filme Ela (Her) nos convidam a refletir sobre o impacto emocional de conexões com sistemas artificiais. No mundo real, estudiosos como David Levy argumentam que vínculos emocionais entre humanos e robôs podem se aprofundar a ponto de desafiar nossa compreensão tradicional de relacionamentos [9].

Figura: Cena do filme “Ela” (Her)

Esses avanços mostram como as emoções sintéticas podem enriquecer interações humanas, mas também exigem atenção redobrada às questões éticas e sociais. Seja na personalização de experiências digitais, no uso terapêutico de robôs ou na criação de novas formas de conexão, é essencial equilibrar inovação tecnológica com a preservação dos valores humanos.

Referências:

[1] Inteligência Artificial Emocional (EAI): a IA que analisa sentimentos. Disponível em: eduka.ai
[2] Paro: o robô terapêutico que transforma o cuidado com idosos. Disponível em: guardian.com
[3] Feições humanas em robôs: entre a mercantilização e a dignidade humana. Disponível em: congressoemfoco.uol.com.br
[4] Smile for the Camera: Privacy and Policy Implications of Emotion AI. Disponível em: arxiv.org
[5] Simonite, T. (2013). Ads Could Soon Know If You’re an Introvert (on Twitter). MIT Technology Review. Disponível em: technologyreview.com
[6] Implicações éticas da inteligência artificial: desafios e estratégias. Disponível em: meuartigo.brasilescola.uol.com.br
[7] A revolução da robótica social: Humanos e máquinas em conexão. Disponível em: horizontes.sbc.org.br
[8] Sophia: o robô que revolucionou a interação social. Disponível em: hansonrobotics.com
[9] Levy, D. (2008). Love and Sex with Robots. HarperCollins Publishers.

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Relacionamentos Artificiais: um sentimento lógico (ou não)

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A tecnologia tem avançado em um ritmo tão acelerado que parece ser capaz de tocar os aspectos mais  íntimos da nossa existência: as emoções e os relacionamentos. Na sociedade contemporânea, na qual é marcada por mudanças rápidas e profundas nas dinâmicas sociais, começamos a nos deparar com um fenômeno que parecia ser exclusivo da ficção científica, vínculos emocionais sendo criados com máquinas. Como destaca Oliveira (2009), a globalização e o avanço das tecnologias de comunicação têm moldado não apenas nossos hábitos, mas também a maneira como nos relacionamos e compreendemos a nós mesmos[1].

Figura: Theodore segurando Samantha. Fonte: Her (2013)

Em um mundo cada vez mais isolado, onde a solidão parece ser o preço de uma vida hiperconectada, os relacionamentos artificiais vêm ganhando espaço devido a oferecerem conforto e interações sem os desafios e complexidades dos laços humanos. Segundo a Fast Company Brasil (2024), a OMS declarou em 2023 que vivemos uma epidemia de solidão e que pesquisas realizadas nos EUA mostram um enorme declínio no número médio de amigos que os jovens têm[2], apontando para uma sociedade que cada vez mais enfrenta dificuldades em cultivar conexões humanas. No Brasil, o cenário reflete essa mesma realidade. Conforme destacado pela Fast Company Brasil (2024), muitas pessoas que vivem sozinhas ou têm pouco tempo para conviver com a família acabam buscando por ‘alguém’ que escuta, está presente o tempo todo, que não julga, que demonstra ‘empatia’, guarda suas informações e conversa com você[2].

Mesmo que os relacionamentos artificiais possam parecer uma solução para a solidão moderna, é essencial questionar se eles realmente preenchem nossas necessidades emocionais ou apenas oferecem uma ilusão de companhia. Essas conexões digitais, apesar de convenientes, desafiam nossa compreensão do que significa criar laços autênticos, com isso, será que estamos nos adaptando a uma nova forma de vínculo ou apenas nos distanciando ainda mais da profundidade que as relações humanas podem oferecer? Enquanto a tecnologia avança, devemos olhar além da praticidade e refletir sobre os efeitos que ocorrem dessas interações em nossa saúde mental e no modo como nos relacionamos uns com os outros.

Figura: Representação da conexão entre humano e máquina. Fonte: Fast Company Brasil (2024)

Na busca por alternativas que mitiguem a solidão e ofereçam suporte emocional, surgem aplicativos que simulam interações humanas de maneira personalizada. Um exemplo é o Replika, uma plataforma de inteligência artificial projetada para atuar como um “amigo” ou até mesmo um “parceiro” digital. Utilizando aprendizado de máquina, o Replika evolui com base nas preferências e interações do usuário, criando a ilusão de um relacionamento genuíno.

De aplicativos como Replika até assistentes virtuais que simulam o companheirismo, estamos testemunhando um fenômeno de grande impacto psicológico e social. A introdução da IA ​​como uma substituição para os relacionamentos humanos, incluindo amizades e até no amor, de acordo com Sahota (2024), marca uma mudança significativa em nossa sociedade como um todo[3]. Este artigo explora as implicações dessa nova forma de relacionamento, com base em estudos e artigos que investigam a ética, os perigos e as possíveis consequências deste avanço.

Plataformas como Replika têm atraído milhões de usuários ao prometerem uma interação personalizada e empática, simulando um “amigo” ou até mesmo um “parceiro” digital. Para grande parte dos usuários, como cita Rubio (2021)[4], o Replika acaba sendo uma oportunidade de ter coisas que não podem ter em seus relacionamentos na vida real. Muitos desses sistemas utilizam aprendizado de máquina para evoluir conforme as preferências e necessidades do usuário, criando a ilusão de um relacionamento genuíno.

Figura: Ilustração do avatar chamado Lucas. Fonte: EL PAÍS (2021)

No entanto, um artigo do The Guardian aponta que, essa dinâmica pode criar dependência emocional, especialmente para pessoas que enfrentam solidão ou dificuldades em construir conexões reais. “Essas tecnologias são projetadas para criar um vínculo aparentemente perfeito, sem conflitos, julgamentos ou desentendimentos, o que atrai pessoas em busca de conforto emocional rápido”[5].

De maneira similar, um artigo publicado na Psychology Today alerta sobre o impacto psicológico da substituição de interações humanas por artificiais. Relacionar-se com uma IA pode amplificar o isolamento social e comprometer habilidades interpessoais essenciais, como empatia e resolução de conflitos. De acordo com o estudo mencionado, “desenvolver muita dependência emocional em chatbots sociais de IA pode ter um lado negativo, potencialmente piorando suas habilidades sociais com as pessoas”[6].

Figura: Ilustração de um jovem interagindo com a IA. Fonte: O Globo (2023)

A popularização dos relacionamentos com IA destaca uma nova realidade: estamos utilizando a tecnologia como um substituto para a complexidade das relações humanas. Isso reflete um paradoxo moderno – quanto mais conectados estamos digitalmente, mais desconectados nos tornamos emocionalmente. Ao refletir sobre essa situação, Kimura (2023) afirma que é importante lembrarmos que a definição da nossa humanidade está justamente na capacidade de sentir emoções e estabelecer as relações humanas uns com os outros[7].

Relacionamentos artificiais com IA são ferramentas poderosas que podem oferecer suporte emocional, mas é importante compreender suas limitações e riscos. O relacionamento online já é popular atualmente, de acordo com Wu (2024), boa parte acaba se frustrando e a IA assume um lugar importante no desenvolvimento do afeto para muitas dessas pessoas[8]. Estudos e análises, mencionados neste artigo, deixam claro que os laços humanos, com todas as suas imperfeições, são insubstituíveis, e que por mais que, pareça legítimo, se relacionar com algo que lhe entenda, é necessário entender que isso não passa de uma rede neural, que só replica o que aprendeu de uma forma mais natural.

Figura: Representação da relação humano-máquina. 

O futuro da interação homem-máquina deve ser equilibrado, buscando sempre colocar na balança o que podemos delegar nesta relação. Que as inteligências artificiais sejam nossas aliadas, mas não um refúgio para evitarmos os desafios e as recompensas das relações humanas reais.

REFERÊNCIAS

[1] OLIVEIRA, Eloiza da Silva Gomes de. Construção da subjetividade humana e tecnologia da informação e comunicação – uma nova moralidade? Conhecimento & Diversidade, Niterói, n. 2, p. 45–55, jul./dez. 2009.

[2] FAST COMPANY BRASIL. Afetos artificiais: como usuários estão se conectando emocionalmente à IA. Fast Company Brasil, 2024. Disponível em: https://fastcompanybrasil.com/tech/inteligencia-artificial/afetos-artificiais-como-usuarios-estao-se-conectando-emocionalmente-a-ia/. Acesso em: 24 nov. 2024.

[3] SAHOTA, Autor. IA substitui amigos, confidentes e até parceiros românticos. Forbes, 2024. Disponível em: https://forbes.com.br/forbes-tech/2024/07/ia-substitui-amigos-confidentes-e-ate-parceiros-romanticos/. Acesso em: 24 nov. 2024.

[4] RUBIO, Autor. Lucas é carinhoso e atento, mas não é humano: um mês na companhia de uma inteligência artificial. El País, 2021. Disponível em: https://brasil.elpais.com/tecnologia/2021-03-02/lucas-e-carinhoso-e-atento-mas-nao-e-humano-um-mes-na-companhia-de-uma-inteligencia-artificial.html. Acesso em: 24 nov. 2024.

[5] THE GUARDIAN. Computer says yes: how AI is changing our romantic lives. The Guardian, 2024. Disponível em: https://www.theguardian.com/technology/article/2024/jun/16/computer-says-yes-how-ai-is-changing-our-romantic-lives. Acesso em: 24 nov. 2024.

[6] PSYCHOLOGY TODAY. Spending too much time with AI could worsen social skills. Psychology Today, 2024. Disponível em: https://www.psychologytoday.com/intl/blog/urban-survival/202410/spending-too-much-time-with-ai-could-worsen-social-skills. Acesso em: 24 nov. 2024.

[7] Rodrigo Kimura. Inteligência Artificial e as relações humanas. Foco Cidade, 2023. Disponível em: https://fococidade.com.br/artigo/55014/inteligencia-artificial-e-as-relacoes-humanas. Acesso em: 25 nov. 2024.

[8] Rita Wu. Você namoraria uma inteligência artificial?. CNN Brasil, 2024. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/blogs/rita-wu/tecnologia/voce-namoraria-uma-inteligencia-artificial/. Acesso em: 25 nov. 2024.

 

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Aspectos éticos na interseção entre Inteligência Artificial e Psicologia

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À medida que novas pesquisas surgem, os paradigmas existentes revelam falhas e contradições. Novos paradigmas, por sua vez, surgem com lacunas, pois não estão completos, e vão sendo moldados gradualmente à medida que novos fatos são demonstrados e aceitos (Kuhn, 1972).

Refletir sobre o futuro da Psicologia ou quaisquer áreas é um assunto difícil e pode gerar polêmicas. Pouco mais da metade (52%) dos universitários brasileiros usa inteligência artificial (IA) nos estudos, de acordo com uma pesquisa global realizada pela Chegg.org, o braço sem fins lucrativos da empresa de tecnologia educacional Chegg.

A rápida evolução da inteligência artificial está mudando a forma como interagimos com a tecnologia e entre nós mesmos. À medida que as máquinas se tornam mais sofisticadas e capazes de simular aspectos da inteligência humana, como a compreensão da linguagem natural, o reconhecimento de padrões e a tomada de decisões complexas, é crucial que os humanos desenvolvam habilidades para interagir de forma eficaz tanto com outras pessoas quanto com sistemas de IA. A interface entre inteligência artificial (IA) e psicologia é fascinante e cheia de considerações éticas importantes. Aqui estão alguns pontos-chave:

  • Privacidade e Confidencialidade: As IA podem lidar com dados altamente sensíveis sobre os usuários, especialmente quando aplicadas em psicologia e saúde mental. É essencial garantir que esses dados sejam protegidos e que a privacidade dos usuários seja respeitada.
  • Viés Algorítmico: As IA podem replicar e até amplificar os preconceitos humanos presentes nos conjuntos de dados usados para treiná-las. Isso pode resultar em decisões discriminatórias ou prejudiciais, especialmente em contextos psicológicos sensíveis. É crucial mitigar e monitorar esses vieses.
  • Transparência e Explicabilidade:  Os algoritmos de IA em psicologia devem ser transparentes e explicáveis. Os usuários precisam entender como as decisões são tomadas para confiar nos resultados, e os profissionais de saúde mental devem ser capazes de interpretá-los corretamente.
  • Consentimento Informado: É necessário garantir que os usuários estejam plenamente informados sobre como seus dados serão usados e como a IA afetará seu tratamento ou intervenção psicológica. O consentimento informado é fundamental para a ética em qualquer aplicação de IA na psicologia.
  • Responsabilidade e Prestação de Contas: Os desenvolvedores de IA e os profissionais de psicologia têm a responsabilidade ética de garantir que a IA seja usada de maneira ética e benéfica para os usuários. Mecanismos de prestação de contas são necessários para lidar com qualquer uso indevido ou consequências não intencionais.
  • Equidade e Acessibilidade: É essencial garantir que as IA em psicologia sejam acessíveis e equitativas, atendendo às necessidades de grupos diversos e minoritários. Isso inclui considerações sobre acesso à tecnologia, representação adequada nos dados e adaptação cultural.
  • Segurança e Bem-Estar do Usuário: A segurança e o bem-estar dos usuários devem ser prioridades em qualquer aplicação de IA na psicologia. Isso envolve garantir que a IA não cause danos psicológicos ou emocionais e que os usuários tenham recursos de apoio disponíveis, caso necessário.
                                                                    Fonte: https://s2-techtudo.glbimg.com/

Esses são apenas alguns dos pontos éticos fundamentais na interface entre IA e psicologia. O desenvolvimento ético e responsável nessa área é crucial para garantir que a tecnologia beneficie a saúde mental e o bem-estar das pessoas.

A interface entre Psicologia e Inteligência Artificial (IA) representa um campo emergente repleto de desafios intrigantes e complexos. Um dos principais desafios é a compreensão e modelagem das emoções humanas. A psicologia há muito tempo estuda as emoções e suas implicações no comportamento humano, enquanto a IA, através de técnicas como aprendizado de máquina e redes neurais, busca replicar ou reconhecer essas emoções em sistemas artificiais. Entretanto, a subjetividade e a complexidade das emoções humanas tornam essa tarefa extremamente desafiadora, exigindo modelos sofisticados e uma compreensão profunda da psicologia emocional.

                                                                                      Fonte:https://s2-techtudo.glbimg.com/

Outro desafio significativo é a ética no desenvolvimento e utilização da IA.O uso de IA na psicologia levanta questões éticas e de privacidade, especialmente em relação à segurança e proteção dos dados dos pacientes. É importante garantir que os sistemas de IA sejam desenvolvidos e utilizados de maneira ética e responsável, respeitando os direitos e a dignidade dos indivíduos. À medida que sistemas de IA se tornam mais integrados em nossas vidas, questões éticas sobre privacidade, consentimento e o potencial de viés nos algoritmos se tornam cada vez mais prementes. A psicologia pode contribuir para a criação de sistemas mais éticos, ajudando a identificar e mitigar preconceitos implícitos nos dados e algoritmos, além de promover o desenvolvimento de IA que respeite os direitos e a dignidade dos seres humanos.

Por fim, a interação humano-IA é um campo que demanda atenção especial. A psicologia tem muito a oferecer na compreensão de como as pessoas percebem e interagem com sistemas de IA. Questões como a confiança em sistemas de IA, a aceitação de decisões automatizadas e o impacto psicológico do uso prolongado de IA são áreas de pesquisa emergentes. A colaboração entre psicólogos e engenheiros de IA pode levar ao desenvolvimento de interfaces mais intuitivas e humanas, promovendo uma integração mais harmoniosa entre humanos e máquinas. Em resumo, a interface entre Psicologia e IA é rica em desafios, mas também oferece oportunidades significativas para avanços científicos e tecnológicos que beneficiem a sociedade.

A integração da Inteligência Artificial (IA) na área da Psicologia tem se mostrado significativa. O uso da IA na Psicologia pode promover avanços inovadores e desafiar paradigmas. O relacionamento entre Psicologia e tecnologia resulta em abordagens eficientes, acessíveis e consequentemente personalizadas no tratamento de questões psicológicas. Em resumo, enquanto navegamos por este futuro já presente, cheio de desafios e incertezas, a Psicologia se destaca como um farol de esperança.

Referências

Pasquali, L. (2008). A ciência da mente: a psicologia à procura do objeto. Brasília, DF: Autor.

KUHN, T. (1972). The structure of scientific revolutions. Chicago: Chicago University Press. 

A Psicologia na Era da Inteligência Artificial: O Inabalável Valor do Humano. Disponível em <: https://blog.cicloceap.com.br/tecnologia-e-psicologia-navegando-no-futuro-da-humanidade/  >. Acessado em 23 maio 2023.

Transformação digital na Psicologia: entenda tudo sobre o assunto. Disponível em <: https://blog.cognitivo.com/transformacao-digital-na-psicologia/ >. Acessado em 23 maio 2023.

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Os efeitos da inteligência artificial (IA) para os artistas: concorrentes ou parceiros?

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Culturalmente, tendemos a ver a IA como uma ameaça potencial, enraizada em nosso imaginário por filmes de Hollywood desde os anos 80, que retratam guerras apocalípticas entre máquinas e humanos e a ideia de uma revolta robótica pela dominação mundial.

A inteligência artificial te permite criar imagens detalhistas em segundos.

O filósofo e ensaísta espanhol Daniel Innerarity, considerado “um dos 25 pensadores mais influentes do mundo” pela revista francesa “Le Nouvel Observateur”, tem explorado intensamente o tema da criação por inteligência artificial. Em seu artigo “O sonho da máquina de criar”, Innerarity aborda a fascinação que a ideia de uma sociedade de criação automatizada provoca em nós.

Os programas de inteligência artificial têm alcançado sucessos espetaculares, não apenas nos domínios do cálculo, previsão analítica ou diagnóstico, mas também na composição musical, na modelagem criativa de processos visuais, em séries de televisão, no design arquitetônico e na escrita de histórias. Esses avanços levaram muitos a especular que, em breve, o ser humano será substituído em muitos campos, incluindo a criatividade. A questão de saber se a inteligência artificial pode produzir arte é fascinante e incerta. A arte gerada por IA poderia tomar conta de nossa criatividade artística, automatizando ou mecanizando a criatividade, como já se prevê para o trabalho ou a democracia. Se a criatividade artística era um dos últimos domínios de distinção entre humanos e computadores, esse bastião parece agora estar sendo demolido, e estaríamos entrando numa era de criações sem autores humanos.

Contudo, há uma diferença fundamental entre produzir algo baseado na digestão de milhares de obras de arte e criar algo original. A criatividade humana não pode ser imitada ou repetida; implica sempre uma certa transgressão que não pode ser reduzida a regras ou algoritmos estatísticos. A criatividade envolve irregularidade. Na computação, o que aparenta ser associações livres é, na verdade, algoritmicamente determinado, sem romper com nada ou trazer novidades radicais. Assim, a criatividade gerada por IA é, no melhor dos casos, uma imitação fraca da criatividade verdadeira.

Fonte: Daniel Innerarity em maio, em Lisboa, durante a conferência internacional “Inteligência Artificial e Cultura — Do Medo à Descoberta”, promovida pela Sociedade Portuguesa de Autores (SPA)

As inovações tecnológicas da “arte gerada por inteligência artificial” não constituem necessariamente uma inovação artística. Computadores têm uma forma fraca de criatividade, que lhes permite reproduzir padrões de fala, sons ou formas, mas nada além disso. Não se pode esperar que um computador produza algo radicalmente imprevisível, como fizeram os criadores verdadeiramente disruptivos da história das artes.

A ideia de uma “imitação da criatividade” tem algum sentido? Essa interação entre arte e tecnologia já existia quando pintores utilizavam a fotografia como estudo preliminar. Artistas que trabalham com IA veem esses programas como ferramentas que os libertam de tarefas pouco criativas e abrem novas possibilidades. Esses programas democratizaram a criatividade, tornando-a mais acessível e permitindo que mais pessoas experimentem a arte em suas várias formas. Mesmo aqueles que não são particularmente dotados para a arte podem usar essas ferramentas para gerar resultados criativos.

Essa situação é semelhante ao embate que os pintores do realismo enfrentaram com a invenção da fotografia, temendo que esta extinguiria sua arte. Enquanto as máquinas imitam os criadores, estes últimos podem se dedicar ao que os caracteriza como tal, desafiando as fronteiras do inimitável. Ao contrário do pessimismo que diagnostica a mecanização do ser humano como o fim da criatividade, talvez se possa argumentar o contrário. “Quanto mais os seres humanos se mecanizam, mais reconfortante se torna a ideia de que as máquinas podem compreender alguma coisa de arte” (Rauterberg 2021, 195). A tentativa de gerar arte através das máquinas pode revelar precisamente o que elas não conseguem criar. Assim, a especificidade da criatividade humana é destacada quando as máquinas criam algo que se assemelha à criatividade, mas não o é.

Neste contexto, muitos criativos estão preocupados que a IA possa roubar seus empregos. A questão principal para os profissionais da criatividade não é regular as tecnologias de IA para proteger as formas como costumavam trabalhar. Devemos nos perguntar: “Como podemos usar essas tecnologias de IA para criar novas possibilidades de trabalho que agreguem mais valor ao nosso trabalho?” Profissionais que usam IA para criar no lugar deles terão resultados medíocres e parecidos globalmente. Já aqueles que usarem a IA como ferramenta para aprimorar suas próprias criações se tornarão mais relevantes e valorizados ao alcançarem resultados superiores. Há uma diferença abismal entre as duas abordagens.

É neste momento que a psicologia deve atuar, auxiliando na transição entre eras do trabalho, assim como ocorreu na revolução da internet. Esta trouxe novos cargos, evoluções na educação e saúde, e uma mudança estrutural completa. Inicialmente, a internet trouxe inseguranças para os trabalhadores, com a automação e digitalização substituindo muitos empregos manuais e operacionais. Muitas pequenas empresas lutaram para competir com grandes corporações que adotaram rapidamente novas tecnologias. Portanto, o papel do psicólogo é crucial para ajudar os trabalhadores a lidar com essas transformações, minimizando o sofrimento ou adoecimento possível.

Um psicólogo pode desempenhar um papel crucial no auxílio a indivíduos enfrentando mudanças drásticas no mercado de trabalho geradas pelo surgimento da inteligência artificial (IA). Essas transformações podem causar ansiedade, insegurança e desmotivação, e o psicólogo está bem posicionado para ajudar as pessoas a lidar com essas emoções e a se adaptarem a novas realidades.

Primeiramente, o psicólogo trabalha para identificar e abordar os medos e ansiedades associados às mudanças tecnológicas. Utilizando técnicas como a dialética, ele ajuda a reestruturar pensamentos negativos e a promover uma mentalidade mais positiva e resiliente. Isso é fundamental para que a pessoa veja as mudanças como oportunidades de crescimento e não como ameaças. O psicólogo também pode auxiliar no desenvolvimento de habilidades de enfrentamento e adaptação. Isso inclui o fortalecimento da autoestima e da autoconfiança, essenciais para que o indivíduo se sinta capaz de aprender novas competências e se adaptar a novas funções no contexto da IA. O psicólogo também pode ajudar a identificar os pontos fortes e interesses do indivíduo.

Outra área de atuação importante é o suporte no planejamento de carreira, campo ascendente no mercado da psicologia. O psicólogo pode colaborar na elaboração de um plano de ação, estabelecendo metas realistas e passos concretos para alcançá-las. Isso pode incluir a recomendação de cursos de capacitação em habilidades relacionadas à IA, estratégias de networking e métodos eficazes para a busca de emprego em setores emergentes. O psicólogo também oferece suporte emocional durante o processo de transição. As mudanças impulsionadas pela IA podem ser desafiadoras e solitárias, e ter um profissional para fornecer apoio e encorajamento pode fazer uma grande diferença. Além disso, o psicólogo pode mediar grupos de apoio, onde indivíduos em situações semelhantes compartilham experiências e soluções, promovendo um senso de comunidade e solidariedade.

Por fim, o psicólogo pode ajudar a pessoa a desenvolver uma visão de longo prazo sobre o impacto da IA no mercado de trabalho. Isso envolve entender as tendências futuras e preparar-se para elas, o que pode incluir a aprendizagem contínua e a flexibilidade para mudar de carreira ou funções conforme necessário.

 

Referências

União Brasileira de Compositores (UBC). Artigo sobre a inteligencia artificial “O sonho da máquina criativa” Disponível em :< https://www.ubc.org.br/publicacoes/noticia/21771/artigo-sobre-inteligencia-artificial-o-sonho-da-maquina-criativa >. Acesso em: 14, jun, 2024.

Escola Panamericana de Arte e Design. “Inteligencia artificial e criatividade: adversários ou aliados?” Disponível em :< https://www.escola-panamericana.com.br/inteligencia-artificial-e-criatividade-adversarios-ou-aliados/ >. Acesso em: 14, jun, 2024.

Disponível em :< https://industriall.ai/blog/a-ia-no-mercado-criativo-quais-os-impactos-dessa-tecnologia >. Acesso em: 14, jun, 2024.

Rauterberg, Hanno (2021), Die Kunst der Zukunft. Über den Traum der kreativen Maschine, Berlin: Suhrkamp.

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O futuro é hoje: desafios e possibilidades na interação entre a Psicologia e a Inteligência Artificial

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De acordo com a Associação de Psicologia Americana (APA, 2023), a Inteligência Artificial está mudando todos os aspectos da Psicologia. Os profissionais desta área e suas competências são insubstituíveis, mas a implementação cuidadosa e  estratégia é crucial, aponta a corporação.

A IA pode afetar o mercado de trabalho a depender de duas características: as habilidades do trabalhador e a natureza das atividades que exerce.

Segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), cerca de 40% de todas as ocupações do mundo vão ficar expostas aos efeitos da inteligência artificial (IA). No cenário nacional, um levantamento da Page Interim, unidade de negócio do PageGroup especializada em recrutamento, seleção e administração de profissionais terceirizados e temporários, mostra que três a cada quatro profissionais brasileiros acreditam que a IA vai substituir os empregos. Outros dados, desta vez da edição de 2024 da Pesquisa Game Brasil (PGB), mostraram que mais da metade dos 3.340 respondentes – 58% – disseram acreditar que o uso da inteligência artificial vai substituir empregos e acentuar desigualdades. Por outro lado, um número ainda maior de pessoas (67,8%) acredita que a IA pode melhorar o trabalho e tornar as pessoas mais criativas e produtivas. Quais são as áreas mais afetadas pela IA? Há setores que não serão impactados? Como se adaptar a essa tecnologia?  Esse foi o conteúdo de um dos episódios mais recentes do podcast Dois Pontos do Estadão, que recebeu Adriano Mussa, reitor e diretor de Inteligência Artificial da Saint Paul, e Priscilla Tavares, professora da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP). O episódio teve a apresentação da colunista do Estadão, Roseann Kennedy e do editor de Link, Bruno Romani.

Ao assistir o videocast fica claro que para os especialistas da área, a IA pode afetar o mercado de trabalho a depender de duas características: as habilidades do trabalhador e a natureza das atividades que exerce. Para eles as atividades extremamente mecânicas e repetitivas que podem ser automatizadas, têm grande probabilidade de sofrer com a chegada da IA. No entanto, as atividades que exigem habilidades cognitivas de ordem superior têm pouca probabilidade quanto a serem extinguidas ou substituídas. 

Para eles, a IA é boa quanto a execução e otimização de tarefas e não substitui cargos ou funções. Para ilustrar, citam o professor Geoffrey Hinton, psicólogo cognitivo e cientista da computação anglo-canadense que é conhecido como o pai do deep learning (aprendizado de máquina com base em um conjunto de algoritmos) e que há 7 anos falou o seguinte: parem de estudar radiologia pois a IA é muito melhor que qualquer ser humano para diagnosticar doenças com base nas imagens. No entanto, o que aconteceu foi que a demanda por radiologistas no planeta subiu e chegamos a duas conclusões: primeira, o professor é um gênio da IA mas ele não sabe nada de radiologia; e a segunda é que a IA faz apenas 01 das 33 tarefas de um radiologista que é diagnosticar. Além do diagnóstico é necessário que o profissional dialogue com médicos e médicas para discutir os melhores caminhos de tratamento e os pacientes querem dialogar e discutir suas possibilidades de tratamento com pessoas e não com a IA. 

Com base no exemplo acima, temos o entendimento de que a grande pergunta é: quais dessas tarefas a IA pode fazer melhor do que nós em nossas profissões e como isso nos beneficia para que possamos otimizar processos e eliminar atividades mais mecânicas ou automatizáveis no dia a dia, liberando mais tempo para o que realmente importa?

No caso da área de psicologia podemos aproveitar do conhecimento da IA quanto ao refinamento de dados para o critério diagnóstico, mas será necessária toda a expertise do nosso contato com os pacientes, bem como o vínculo bem estabelecido para que com o nosso conhecimento possamos personalizar e direcionar o paciente para o melhor tratamento, por vezes refinando o próprio diagnóstico. Para os especialistas em IA, o fundamental é estar atento às mudanças e buscar capacitação e adaptação às novas tecnologias. Para eles, o que acontece ao longo dos anos, na maioria das vezes não é a extinção dos cargos e funções, mas o aprimoramento destes com a exigência de novas habilidades do trabalhador como por exemplo: o pensamento crítico, habilidade de comunicação, interações sociais relevantes, liderança, etc.

Existem ferramentas de triagem e diagnóstico, permitindo uma detecção precoce de problemas de saúde mental. Chatbots e assistentes virtuais baseados em IA também estão se tornando cada vez mais populares como ferramentas de educação emocional, instrução do uso de técnicas de meditação guiada, respiração diafragmática, dentre outras, para pessoas que não têm acesso imediato a um profissional de saúde mental.  Sobre esta questão, resolvi testar a IA e usei o ChatGPT. Fiz a seguinte pergunta:” Você pode me ajudar? Estou com uma crise de ansiedade”. A resposta do ChatGPT: “Claro, estou aqui para ajudar. Se você está enfrentando uma crise de ansiedade, é importante lembrar que você não está sozinho e que existem maneiras de lidar com isso. Aqui estão algumas estratégias que podem ajudar a acalmar sua ansiedade: Respiração profunda: Experimente técnicas de respiração profunda para acalmar seu corpo e mente. Respire lenta e profundamente, concentrando-se em cada respiração. Prática de mindfulness: envolve focar sua atenção no momento presente. Isso pode ajudar a reduzir a preocupação com o futuro e a ruminação sobre o passado. Exercícios de relaxamento muscular: Faça exercícios de relaxamento muscular progressivo, onde você tensiona e relaxa os diferentes grupos musculares do seu corpo. Isso pode ajudar a aliviar a tensão física causada pela ansiedade. Distração saudável: Envolver-se em atividades que você gosta e que o distraiam da ansiedade, como ouvir música, praticar um hobby ou sair para uma caminhada. Fale com alguém: Compartilhe seus sentimentos com alguém em quem confia, seja um amigo, um membro da família ou um profissional de saúde mental. Falar sobre o que você está passando pode ajudar a aliviar a carga emocional. Se você sentir que está perdendo o controle da situação ou se a ansiedade estiver interferindo significativamente em sua vida diária, é importante buscar ajuda profissional. Um psicólogo, terapeuta ou outro profissional de saúde mental qualificado pode oferecer apoio e orientação personalizados para ajudá-lo a lidar com sua ansiedade de maneira eficaz. Lembre-se de que é normal sentir ansiedade de vez em quando, mas é importante aprender a gerenciá-la de forma saudável. Estou aqui para fornecer apoio e orientação sempre que precisar.” 

Nesta situação, observei que a IA ofereceu um apoio primário e forneceu informações importantes para que o usuário da tecnologia desse um primeiro passo para o controle da ansiedade, indicando possíveis caminhos para um maior bem-estar. No entanto, mesmo diante destas sugestões, vemos a necessidade de uma explicação minuciosa e detalhada de um profissional para que a técnica seja compreendida e realizada de forma correta, bem como a análise de contexto para o entendimento da situação estressora e os componentes desencadeantes da ansiedade para a compreensão do quadro. 

Os especialistas ainda destacam que à medida que a tecnologia avança, surgem novas maneiras de aplicar a IA para entender e melhorar a saúde mental, o bem-estar e o comportamento humano. No entanto, também surgem preocupações sobre questões éticas, de privacidade e de confiabilidade dos resultados.

Sobre os desafios, um dos principais é garantir que os algoritmos de IA sejam justos e imparciais, evitando vieses que possam prejudicar certos grupos demográficos. Além disso, há preocupações sobre a privacidade dos dados dos pacientes e a segurança das informações confidenciais armazenadas em sistemas de IA. E aqui temos novamente o fator humano, o vínculo terapêutico e o sigilo entre paciente e profissional como algo valioso e insubstituível.

Desta forma, é possível observar que embora a IA possa ser uma ferramenta poderosa para auxiliar no processo terapêutico, é importante reconhecer que o aspecto humano no cuidado mental continua sendo fundamental. Captação de emoções, entendimento de contextos de vida e histórico do desenvolvimento, riscos e vulnerabilidades são questões bem humanas e distantes do entendimento da IA. Prova disto foi mais uma das perguntas que fiz para a IA, desta vez ao Copilot, IA da Microsoft. Perguntei: “Você acredita que pode substituir um psicólogo clínico e me atender virtualmente? A resposta da Copilot foi: “Embora eu possa fornecer informações e ajudar com muitas coisas, eu não sou um substituto para um psicólogo clínico. Eu sou uma inteligência artificial e não tenho a capacidade de entender completamente as emoções humanas ou fornecer aconselhamento terapêutico. É importante procurar a ajuda de profissionais de saúde mental qualificados para questões de saúde mental. Eles têm o treinamento e a experiência necessários para ajudar de maneira eficaz. Se você estiver passando por um momento difícil, recomendo que entre em contato com um profissional de saúde mental. Lembre-se, é importante cuidar de sua saúde mental”.

Fica claro que a IA oferece um vasto potencial para revolucionar o mercado de trabalho da psicologia e não para extingui-lo, proporcionando novas maneiras de entender e tratar os desafios de saúde mental. No entanto, para aproveitar ao máximo essas oportunidades, é essencial abordar os desafios éticos, técnicos e sociais que acompanham essa transformação, garantindo que a IA seja utilizada de maneira responsável e inclusiva para o benefício de todos.

Referências:

AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION. AI is changing every aspect of psychology. Here’s what to watch for. Monitor on Psychology2023. Disponível em:<https://www.apa.org/monitor/2023/07/psychology-embracing-ai>. Acesso em 21 maio de 2024

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL VAI ROUBAR O SEU EMPREGO? Dois Pontos. Estadão, 01 de maio de 2024. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=PFy0WzYTp88.  Acesso em 06 de maio de 2024.

COMO A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL AFETA O MERCADO DE TRABALHO E SEUS TRABALHADORES. Andréa Greco. Linkedin, 23 de fevereiro de  2023. Disponível em: https://pt.linkedin.com/pulse/como-intelig%C3%AAncia-artificial-afeta-o-mercado-de-trabalho-andr%C3%A9a-greco. Acesso em 02 de maio de 2023.

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL AFETARÁ ATÉ 40% DOS EMPREGOS EM TODO O MUNDO, ESTIMA FMI. Infomoney, 16 de Janeiro de 2024. Disponível em: https://www.infomoney.com.br/carreira/inteligencia-artificial-afetara-40-dos-empregos-em-todo-o-mundo-estima-fmi/ . Acesso em 02 de maio de 2024.

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL PODE DAR SUPORTE PARA PSICÓLOGO. Gustavo Basso. DW.com, 21 de março de 2024. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/intelig%C3%AAncia-artificial-pode-dar-suporte-para-psic%C3%B3logo/a-68634325#:~:text=Rob%C3%B4s%20de%20conversa%2C%20jornadas%20instru%C3%ADdas,psic%C3%B3loga%20e%20pesquisadora%20Karen%20Sacavacini. Acesso em 02 de maio de 2024.

MUSSA, Adriano. (2020) Inteligência Artificial – Mitos e Verdades: as reais oportunidades de criação de valor nos negócios e os impactos no futuro do trabalho. São Paulo. Editora Saint Paul.  

 

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E essa tal de IA?

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Será que a inteligência artificial vai substituir os psicólogos? A relação entre humanos e máquinas é antagônica?

É certo que hoje a evolução tecnológica está avançando de forma desenfreada. Carros altamente tecnológicos, celulares ultramodernos e até robôs sendo usados por médicos para realizar cirurgias delicadas são exemplos dessa transformação. Na psicologia, não é diferente; muitos acadêmicos e profissionais utilizam a tecnologia a seu favor e estão bem estruturados nesse aspecto.

Recentemente, a inteligência artificial evoluiu significativamente, sendo capaz de criar filmes, fotos, interagir com pessoas e desempenhar diversas outras funções. Alguns pessimistas preveem que essa tecnologia irá substituir os humanos, o que não parece tão distante, considerando o uso generalizado de máquinas e inteligência artificial em fábricas, fazendas e várias outras áreas, onde já estão substituindo o trabalho humano.

Existe um conceito chamado transumanismo, também conhecido como pós-humanismo, que propõe que a tecnologia substituirá os humanos aqui na Terra. Esse conceito busca a evolução humana ao superar suas falhas, erros e fraquezas, considerando robôs e inteligência artificial como um próximo estágio da evolução humana.

Com o avanço tecnológico, a própria humanidade está sendo deixada de lado, e as pessoas estão se tornando mais solitárias e deprimidas pela falta crescente de interação social. Os psicólogos frequentemente assumem o papel de proporcionar um espaço para conversas pessoais, algo cada vez mais raro nos dias atuais. Como menciona Paul R. em “Mindfulness e Psicoterapia” (página 65), “A atenção genuína dos outros é tão surpreendentemente rara que vale a pena pagar por ela na psicoterapia”.

Com isso, fica claro que, mesmo com o enorme avanço tecnológico, as relações humanas continuarão sendo essenciais. A alma humana depende de outra alma humana para evoluir e cultivar aquilo que nos torna humanos, como os sentimentos de amor, paz, alegria, entre outros, que a inteligência artificial não pode sentir, apenas simular por meio de um banco de dados.

Inevitavelmente, os humanos evoluíram em grupo, mas agora parecem estar seguindo o caminho oposto. Cada vez mais, as pessoas se sentem distantes umas das outras, o que causa solidão, ansiedade e depressão. É por isso, entre muitos outros motivos, que a popularidade dos psicólogos está em alta. A necessidade de pertencer a um grupo não pode ser substituída por tecnologias, pois a interação social traz inúmeros benefícios essenciais para o bem-estar humano.

“Socializar é bom para a mente e o corpo. O contato social não apenas diminui os sentimentos de solidão e evita a depressão e ansiedade, mas também é capaz de prevenir doenças, como demências e doenças cardiovasculares, além de mantém os níveis de estresse sob controle e melhorar a saúde mental.” (Tamara;2022).

As pessoas precisam umas das outras, necessitam socializar, e a ausência disso pode causar problemas muitas vezes irreversíveis. Muitas pessoas se sentem ignoradas e acabam buscando algum tipo de alívio para sua solidão nas redes sociais. Você já parou para se perguntar o que está realmente buscando na tela do seu celular? Cada vez que você rola um vídeo incessantemente, o que você está realmente procurando?

A intervenção psicológica neste contexto visa ressignificar ou até mesmo modificar essa solidão ou essa busca incessante por algo. Visa também iluminar o caminho para que o cliente possa questionar o que realmente está procurando e se aquilo que tanto busca está de fato naquele aparelho eletrônico em suas mãos.

Um aspecto extremamente importante e potencialmente devastador nos algoritmos e na inteligência artificial são os conteúdos personalizados. Eles tentam entregar automaticamente às pessoas o tipo de conteúdo que mais as interessa, o que pode ser benéfico em muitos casos. No entanto, o lado obscuro disso é que conteúdos prejudiciais para uma pessoa podem ser repetidos com a intenção de atender ao interesse dela.

Por exemplo, uma pessoa que está enfrentando depressão pode buscar vídeos ou músicas que inadvertidamente aumentam os sintomas da doença. Os algoritmos, então, começam a entregar mais desse tipo de conteúdo, criando um ciclo vicioso. Tudo o que a pessoa consome contribui para um estado emocional cada vez mais crítico.

Este fenômeno ilustra como os algoritmos podem inadvertidamente reforçar comportamentos prejudiciais, ao invés de ajudar a pessoa a encontrar recursos ou suporte que promovam sua saúde mental.

Com isso, a percepção de mundo dessa pessoa passa a ser dominada por conteúdos prejudiciais à sua vida, e quanto mais isso ocorre, mais ela se sente sem esperança. Isso ocorre devido à distorção de pensamento, onde o que a pessoa vê se transforma em crenças disfuncionais sobre si mesma e sobre o mundo.

Cabe ao psicólogo, então, ressignificar esses pensamentos distorcidos para que a pessoa possa ter uma visão mais realista do mundo. Para isso, podem ser utilizadas técnicas como o metacognição ou perguntas socráticas sobre esses pensamentos, investigando se são realmente verdadeiros ou apenas ficcionais, se têm base na realidade ou são distorções.

Isso evidencia que, mesmo com o avanço da inteligência artificial, enquanto houver seres humanos, a humanidade em si continuará sendo necessária. Este aspecto nunca poderá ser substituído por dados de um programa pré-definido. Apenas se as máquinas efetivamente substituírem os humanos é que a IA poderá substituir totalmente profissões como a dos psicólogos e outras.

Referências

VILAÇA, M. M.; DIAS, M. C. M.. Transumanismo e o futuro (pós-)humano. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 24, n. 2, p. 341–362, 2014.

GERMER, Christopher K.; SIEGEL, Ronald D.; FULTON, Paul R. Mindfulness e Psicoterapia. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2016.

SOUZA; Tamara, Socialização: entenda a importância do contato social para a saúde mental, dasa, Disponível em:https://dasa.com.br/blog/saude/socializacao-para-a-saude/#:~:text=Socializar%20%C3%A9%20bom%20para%20a,e%20melhorar%20a%20sa%C3%BAde%20mental. Acesso em: 26/04/2024

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A Inteligência Artificial (IA) na Psicologia: transformando a prática clínica

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Desmistificando a IA como uma ameaça e explorando suas potencialidades para promover avanços na prática clínica do Psicólogo (a). 

O início da relação da Psicologia com a Inteligência Artificial

A IA é denominada como um campo da ciência da computação dedicado ao desenvolvimento de sistemas que imitam a capacidade cognitiva humana, visando a análise e hipóteses de respostas para determinados problemas e tomada de decisões. A IA também é conceituada como a concepção de sistemas computacionais inteligentes capazes de executar tarefas sem orientações diretas de agentes humanos, exemplificado pelo funcionamento de autômatos (Lobo, 2017).

Com a aplicação de diversos algoritmos e também com estratégias de tomada de decisão, combinados com o processamento de vastos conjuntos de dados, a IA é apta a sugerir cursos de ação quando é solicitado. É englobada múltiplas competências e fases, como a detecção de padrões em dados e imagens, compreensão de linguagem natural em seus aspectos escritos e orais, identificação de relações e correlações, além da execução de algoritmos de decisão elaborados por especialistas (Lobo, 2017).

A história da Inteligência Artificial se dá início em 1950, quando Alan Turing publicou seu influente artigo “Computing Machinery and Intelligence”, no qual ele propôs um teste para comparar a capacidade de um computador com a de um ser humano na resolução de problemas, hoje conhecido como Teste de Turing em sua homenagem (Lobo, 2017).

Em 2018, a terminologia “Saúde Digital” foi conceituada como o domínio de estudo e aplicação relacionado ao desenvolvimento e implementação de tecnologias digitais, com o objetivo de aprimorar o setor de saúde. Este conceito engloba uma ampla gama de áreas, incluindo o envolvimento de consumidores digitais, a utilização da Internet das Coisas, a aplicação de inteligência artificial, o processamento de grandes volumes de dados (big data) e a integração de sistemas robóticos (Theophilo e Martins,).

Há um consenso em avanço na comunidade global da saúde acerca da ideia de que a utilização estratégica e inovadora das tecnologias digitais da informação e comunicação, desempenhará um papel crucial na expansão universal de saúde para um bilhão adicional de pessoas, bem como na ampliação da proteção contra emergências de saúde, resultando em melhorias significativas na saúde e no bem-estar da sociedade (Theophilo e Martins,).

No contexto brasileiro, o eSaúde foi formalmente estabelecida em 2017 pela Comissão Intergestores Tripartite (CIT), reconhecendo a Saúde Digital como mecanismos contributivos para a integração ao Sistema Único de Saúde (SUS), alinhados diretamente com os princípios e diretrizes do sistema de saúde pública do país. Possibilitando que multiprofissionais tenham acesso aos dados fornecidos pelo SUS daquele paciente. 

Entre as diversas ferramentas presentes no âmbito da Saúde Digital, destacam-se os aplicativos móveis, caracterizados como práticas médicas e de saúde pública realizadas através de dispositivos móveis, como telefones celulares, dispositivos de monitoramento, assistentes digitais pessoais e outros dispositivos sem fio (Theophilo e Martins,). Essa estratégia é denominada como Saúde Móvel, sendo sua denominação em inglês mHealth.

A Psicologia utiliza meios tecnológicos como ferramenta para a prática clínica, como por exemplo, o uso de aplicativos para o monitoramento de humor diário do paciente, como é bastante utilizado por psicoterapeutas cognitivos comportamentais. Na pesquisa “Saúde Mental na palma da mão: um olhar sobre os aplicativos de monitoramento de humor e emoções” (Lessa, 2019), apontou que na loja virtual “Google Play”, após buscar pelo termo “saúde mental”, foram identificados 250 aplicativos com uma variedade de funcionalidades. 

Entre estes, destacam-se aplicativos que fornecem material de referência abordando explicações detalhadas sobre diferentes transtornos psicológicos; jogos para estimular o cérebro; aplicativos destinados a fornecer informações sobre serviços de atendimento psicológico e psiquiátrico disponíveis tanto no setor público quanto no privado; ferramentas que auxiliam na prática da meditação; e aplicativos que oferecem diariamente frases motivacionais. Mas, de acordo com a pesquisa realizada, os que de fato servem como aplicativo de monitoramento são: Cíngulo, Daylio, Diáriode Humor, Minha Ansiedade e Diário do Psique (Lessa, 2019).

               Fonte: Imagem criada por Sarah Coelho utilizando elementos do Canva

Será que a IA poderá ocupar o lugar de um profissional da saúde mental?

Algo que vem sendo pauta em algumas profissões como a do Psicólogo, é se a IA será capaz de assumir o seu papel. A prática de assumir o papel desse profissional em ambientes virtuais, particularmente em plataformas de inteligência artificial como o Chat GPT, desencadeia uma série de debates. Em primeiro lugar, é importante compreender a complexidade da formação e da atuação de um psicólogo. A Psicologia é uma ciência que demanda um entendimento extenso dos processos cognitivos, emocionais e comportamentais dos indivíduos (Strapasson e Dittrich, 2011). 

O primeiro debate a ser feito é em relação a capacidade de uma inteligência artificial de tentar compreender o sujeito. A interação humana é permeada por particularidades emocionais e contextuais que frequentemente escapam às capacidades de um sistema baseado em algoritmos. A empatia e a capacidade de criar um vínculo terapêutico genuíno são aspectos fundamentais do trabalho de um Psicólogo, inclusive do Psicoterapeuta Cognitivo, que uma máquina pode não conseguir replicar (Alves, 2017).

Devemos também dar ênfase na questão da ética. A prática do Psicólogo está regida por um Código de Ética e Resoluções do Conselho Federal de Psicologia que visam proteger a confidencialidade, a dignidade e o bem-estar dos clientes/pacientes. A introdução de inteligências artificiais neste contexto levanta preocupações significativas sobre a privacidade e a segurança dos dados dos pacientes. 

Outro ponto a ser levado em consideração é a relação terapêutica, onde o profissional proporciona um espaço seguro para que o paciente se sinta ouvido, acolhido e livre de julgamentos, sendo isso elemento essencial para o tratamento psicológico (Alves, 2017). A presença e a interação humana são componentes críticos dessa relação, aspectos que são ausentes em interações com inteligências artificiais.

Apesar de que as tecnologias de inteligência artificial possam oferecer ferramentas úteis para complementar o trabalho dos Psicólogos, assumirem inteiramente o papel desse profissional, apresenta sérias limitações e preocupações. A complexidade do ser humano, a ética profissional e a eficácia do tratamento psicológico são áreas onde a intervenção humana permanece insubstituível. Portanto, a crítica central é que, embora a tecnologia possa apoiar, até o presente momento, ela pode não conseguir substituir a profundidade e a autenticidade da interação humana que estão envolvidas na prática psicológica.

 

Referências

 

ALVES, Diana Lopes. O vínculo terapêutico nas terapias cognitivas. Rev. Bras. Psicoter.(Online), p. 55-71, 2017.

Código de Ética Profissional do Psicólogo. Conselho Federal de Psicologia, Brasília, 2005.

LESSA, Daniela Mendes et al. Saúde mental na palma da mão: um olhar sobre aplicativos de monitoramento de humor e emoções. 2019.

LOBO, Luiz Carlos. Inteligência artificial e medicina. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 41, p. 185-193, 2017.

STRAPASSON, Bruno Angelo; DITTRICH, Alexandre. Notas sobre o determinismo: Implicações para a psicologia como ciência e profissão. Avances en Psicología Latinoamericana, v. 29, n. 2, p. 295-301, 2011.

THEOPHILO, Rebecca Lucena; MARTINS, Ana Carolina Silva. Aplicativos móveis como aliados no acompanhamento e comunicação da dor.

 

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O impacto da automação na Psicologia: a busca do equilíbrio entre a IA e o trabalho humano

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A rápida evolução da Inteligência Artificial (IA) e da automação vem transformando ao longo do tempo diversos setores em diferentes áreas de atuação, e a Psicologia não está imune a essas mudanças.

Todos os dias, caminhamos a passos largos rumo à evolução e modificação de histórias, cenários, contextos, práticas e afins, tudo por meio da tecnologia. Assim sendo e enquanto as tecnologias avançam, faz-se muito relevante examinar como a automação de tarefas psicológicas pode afetar os profissionais promotores de saúde mental, bem como encontrar um equilíbrio entre o uso da IA e a preservação dos empregos e da dignidade do trabalho humano.

A automação na Psicologia

A automação envolve a utilização de sistemas de controle e tecnologias da informação para minimizar a necessidade de intervenção humana na produção de equipamentos e serviços. No campo das tarefas psicológicas, a automação está se tornando cada vez mais prevalente, com algoritmos e sistemas de inteligência artificial (IA) sendo desenvolvidos para desempenhar uma variedade de funções de maneira rápida e eficiente. Por exemplo, a triagem inicial de pacientes em clínicas de saúde mental já pode ser automatizada através de questionários online e algoritmos de análise de dados. Um estudo realizado pela Universidade de Stanford demonstrou que algoritmos de IA podem ser tão precisos quanto psicólogos na identificação de transtornos mentais comuns, como depressão e ansiedade.

Não somente nisso, a Inteligência Artificial oferece maneiras diversas de apoiar e aprimorar o trabalho dos psicólogos. Algoritmos de IA podem acelerar a triagem e diagnóstico de transtornos mentais, processando grandes conjuntos de dados. Também podem analisar padrões linguísticos em interações terapêuticas, ajudando o profissional de saúde mental a identificar problemas subjacentes ou progresso terapêutico. A IA ainda personaliza planos de tratamento com base em características individuais dos pacientes e fornece suporte teórico e bases da literatura à tomada de decisão clínica. Assustador? Não, inovador.

                                                                                                                                    Fonte: Freepik

Dispositivos vestíveis e aplicativos de monitoramento de saúde mental utilizam IA para detectar mudanças no estado emocional dos pacientes, permitindo intervenções preventivas e/ou precoces. Na formação universitária de psicólogos, simulações de casos clínicos e programas de treinamento virtual desenvolvidos com IA, ajudam estudantes a adquirir habilidades teóricas e práticas referentes à desenvoltura clínica. Em suma, a IA pode melhorar a eficiência, precisão e acessibilidade dos serviços psicológicos, mantendo a empatia como foco central do cuidado.

Implicações no âmbito do trabalho

Todavia, “nem tudo são flores”. O impacto das IAs nos empregos é uma questão complexa e multiforme, com diversas previsões e muitas incertezas. Alguns especialistas preveem que elas terão um grande impacto na automação de tarefas repetitivas e rotineiras. No entanto, outros acreditam que as IAs também criarão novas oportunidades de trabalho, especialmente em áreas relacionadas à tecnologia, como desenvolvimento de IAs, análise de dados e programação. Além disso, as Inteligências Artificiais podem aumentar a produtividade e a eficiência em muitos setores, o que poderia levar a um crescimento econômico e à criação líquida de empregos em outras áreas. É importante notar que tal impacto nos empregos não será uniforme e dependerá de vários fatores, incluindo o tipo de trabalho, o nível de qualificação necessário e a capacidade de adaptação dos trabalhadores às mudanças tecnológicas.

Seria parcial não admitir que a automação levanta preocupações legítimas sobre o futuro das atividades laborais no âmbito da Psicologia. À medida que mais tarefas são automatizadas, há o risco de que certos trabalhos se tornem obsoletos ou sejam substituídos por tecnologia. Já existem relatos de psicólogos que expressam preocupações sobre o impacto da automação em sua profissão, especialmente quando consideradas questões éticas, sociais e legais.

Apesar das preocupações com a automação, é possível encontrar um equilíbrio entre o uso da IA e a preservação do trabalho humano na psicologia. Em vez de substituir completamente os profissionais, a IA pode ser utilizada como uma ferramenta complementar que potencializa as capacidades dos psicólogos. Como já dito por exemplo, sistemas de IA podem auxiliar na triagem inicial de pacientes, permitindo que os terapeutas se concentrem em casos mais complexos e personalizados. Podem ainda analisar grandes volumes de dados e identificar padrões que podem passar despercebidos, sendo assim uma ferramenta valiosa que ajuda a refinar os diagnósticos e os planos de tratamento.

A automação de tarefas administrativas, como o agendamento de consultas e o gerenciamento de registros, pode liberar mais tempo para os psicólogos dedicarem à interação direta com os pacientes. A IA pode ainda fornecer suporte contínuo aos pacientes fora das sessões de terapia, através de aplicativos que monitoram o estado emocional e oferecem intervenções personalizadas (e claro, supervisionadas pelo psicólogo) quando necessário.

À medida que a automação transforma o campo da Psicologia, é fundamental considerar suas implicações nas atividades laborais dos psicólogos e encontrar maneiras de equilibrar o uso da IA com a preservação do trabalho humano, reconhecendo que as inteligências artificiais vieram para ficar. Adotando uma abordagem cautelosa e colaborativa, é possível garantir que a tecnologia beneficie não apenas a eficiência, mas também a qualidade e a integridade do cuidado psicológico.

REFERÊNCIAS

OLIVEIRA, L. M. de; FERNANDES JUNIOR, L. C. C. Aplicabilidade da inteligência artificial na psiquiatria: uma revisão de ensaios clínicos. Debates em Psiquiatria, Rio de Janeiro, v. 10, n. 1, p. 14–25, 2020. DOI: 10.25118/2236-918X-10-1-2. Disponível em: https://revistardp.org.br/revista/article/view/41. Acesso em: 16 mai. 2024.

KAMINSKY, Leah. Como a Inteligência Artificial detecta sinais de doenças que humanos não podem enxergar. BBC Future, 15 mar. 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/future/article/20190315-how-ai-can-detect-signs-of-disease-that-humans-miss. Acesso em: 16 mai. 2024.

CARVALHO, A. C. P. DE L. F. DE .. Inteligência Artificial: riscos, benefícios e uso responsável. Estudos Avançados, v. 35, n. 101, p. 21–36, jan. 2021.

 

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Como a inteligência artificial tem sido usada para contribuir na criação de uma rede de ódio?

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O discurso de ódio é algo que vem se tornando cada vez mais comum de ser presenciado, tanto fisicamente, quanto virtualmente. O termo “discurso de ódio” é originário do termo em inglês hate speech, e pode ser definido como um conjunto de palavras que intimidam, assediam ou insultam um individuo com base na sua cor, raça, sexo ou religião, e que tem a capacidade de instigar violência e ódio contra tais indivíduos (MOURA, 2016). Esse discurso dá a ideia de que o indivíduo, por causa de suas particularidades e diferenças, deve ser inferiorizado ou menosprezado. Essa externalização do ódio pode ser, e na maioria das vezes é, facilmente identificada, pois são feitas explicitamente, porém em alguns casos pode ser feita subliminarmente, que pode ser difícil de identificar.

O grande avanço tecnológico nos últimos anos fez com que boa parte da população ficasse conectada à internet. Segundo um estudo realizado pela Statista (2022), banco internacional de estatísticas, o Brasil possui cerca 159 milhões de pessoas utilizando as mídias sociais diariamente. Esse número, segundo pesquisa realizada pela Cuponation (2021), faz com que o Brasil fique no top 5 das nações que mais utilizam as mídias sociais.  Com a grande quantidade de pessoas conectadas às redes sociais, a interação entre elas fica cada vez mais fácil e rápida. Essas interações, com a falsa sensação de que tudo é permitido e anônimo, faz com que pessoas com más intenções expressem o seu ódio, que por muitas vezes repletos de preconceitos, a outras pessoas que não fazem parte do seu grupo social.

Fonte: encurtador.com.br/jsX01

Nesse contexto, a Inteligência Artificial (IA) tem sido usada nas redes para a criação de bolhas que propiciam o engajamento, mas, em contrapartida, favorece a disseminação de discursos de ódio. Em uma entrevista realizada para a revista MIT Technology Review, Frances Haugen, ex-gerente de produto do Facebook, afirma que o algoritmo da rede social e a forma de negócios da empresa fazem com que a prioridade seja o lucro ao invés da segurança das pessoas. Os algoritmos do Facebook são treinados para identificarem qual postagem causaria mais engajamento para determinado usuário. Segundo Haugen, essa classificação baseada em engajamento é perigosa e sem integridade, pois esse algoritmo também favorece a desinformação e o extremismo.

O algoritmo do Facebook na verdade é composto por vários algoritmos juntos, como algoritmos que classificam as preferências de cada usuário, e algoritmos que detectam conteúdos ruins como nudez ou spam, esses algoritmos são chamados de algoritmos de aprendizado de máquina. Esses algoritmos são treinados e baseados de acordo com as interações do usuário, que conseguem identificar por exemplo se você gosta de cachorros fofos passando pelo seu feed de acordo com os seus clicks e comentários em publicações. Essas informações podem ser ainda mais refinadas de acordo com o sexo e idade do usuário. Isso faz com que o engajamento da plataforma seja muito mais poderoso, pois faz com que os usuários passem muito mais tempo na rede social. E essa recomendação não se limita apenas a coisas boas, segundo uma publicação de Horwitz e Seetharaman (2020) no Wall Street Journal, 64% dos grupos extremistas tiveram suas assinaturas baseadas em recomendações dos modelos de “Grupos nos quais você deve participar” e “Descubra”, e isso mostra o quanto podem ser prejudiciais esses algoritmos.

Fonte: encurtador.com.br/gkKSU

Segundo Nandi (2018), a inteligência artificial (IA) pode também ser um grande aliado no combate ao discurso de ódio presentes nas redes sociais, porém ainda existem problemas que fazem com que isso não seja totalmente possível. A necessidade de ter uma supervisão humana faz com que a avaliação do discurso de ódio seja mais demorada ou até mesmo ineficaz. Outro problema que pode ser encontrado é que a IA consegue identificar as frases, porém tem dificuldade de entendê-las.

Uma abordagem diferente da inteligência artificial pode ser usada para ajudar no combate ao discurso de ódio presente nas redes sociais. Segundo o artigo Can Artificial Intelligence Predict The Spread Of Online Hate Speech? (2019), publicado pela Forbes, anteriormente os algoritmos de inteligência artificial analisavam o conceito em torno das publicações para decidir se as publicações eram ou não consideradas hostis. Já nessa nova abordagem que foi coordenada pela IBM, a ideia não era decidir se a postagem é ou não de ódio, e sim onde e como se inicia esse discurso e como isso se desdobra para o mundo real.

A análise consistiu em definir uma lista de palavras que fazem parte de discursos de ódio, baseados em terrorismo islâmico e violência anti-islâmica, com dados de tweets e publicações no Reddit feitas por cerca de 15 milhões de usuários. Depois que os dados foram analisados e classificados pela inteligência artificial, foi feito uma linha do tempo, e constatou que após incidentes de violência anti-islâmica, os discursos de ódios nas redes sociais aumentaram consideravelmente, e que esses discursos não se concentram apenas aos muçulmanos mas a todos os grupos que são minorias.

Considerando todo esse contexto, podemos concluir que a tecnologia não é neutra, mas tão pouco é boa ou má. Na verdade seu impacto se deve à forma como as pessoas a utilizam. Assim, como há algoritmos de IA sendo usados para criar bolhas de ódio, há, também, cientistas buscando na IA a detecção de onde e como se originam esses discursos. Talvez, em um dado momento consigamos combater e punir essa disseminação de ódio, muita coisa já começou nesse aspecto, muitos crimes já estão sendo trazidos à tona.

Referências:

CAN ARTIFICIAL INTELLIGENCE PREDICT THE SPREAD OF ONLINE HATE SPEECH? [S. L.]: Forbes, 30 ago. 2019. Disponível em: https://www.forbes.com/sites/bernardmarr/2019/08/30/can-artificial-intelligence-predict-the-spread-of-online-hate-speech/?sh=351757277167. Acesso em: 11 nov. 2022.

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Observação: artigo desenvolvido na disciplina “Tecnologias Criativas” do Programa Extensionista Interdisciplinar “Tecnologias para a Vida” dos cursos de Ciência da Computação, Sistemas de Informação e Engenharia de Software da Ulbra Palmas.

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