Frivolidade cultural no liberalismo contemporâneo

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Este trabalho irá abordar um ensaio teórico entre dois autores, sendo o principal Vargas Llosa, trazendo o livro “Civilização do espetáculo”, e o autor de apoio Cláudio Novaes Pinto Coelho, com a obra “Indústria cultural e sociedade do espetáculo: a dimensão política da crítica cultural”.

De acordo com Coelho (2016, p.31) “política, sociedade do espetáculo e indústria cultural são conceitos inerentes ao capitalismo.”. Porém, até chegar à fase que predomina hoje, é necessário entender as nuances históricas. Já para Llosa, esse tipo de sociedade gera certas consequências, como a “banalização da cultura, a generalização da frivolidade e a proliferação do jornalismo irresponsável” (LLOSA, 2012, p.30).

A sociedade do espetáculo, que vigora atualmente, caracteriza-se pela busca desenfreada de diversão e entretenimento, através de recursos publicitários e midiáticos, nos quais foram criados com o intuito de vender e comercializar tais recursos. Em pleno século XXI, o valor supremo da civilização não é o fomento do intelecto muito menos a busca pela resolução dos problemas através do conhecimento, mas sim a diversão e lazer. O que é priorizado é a fuga dos problemas e causas de angústia através daquilo que proporciona prazer e conforto imediato, como por exemplo, as drogas.

Fonte: goo.gl/k9PKAP

Após a Segunda Grande Guerra, a economia dos países já desenvolvidos e emergentes cresceu exponencialmente e por consequência, a classe média também. Isto gerou maior mobilidade social. Além disso, os valores sociais se alargaram, pois se tornaram mais flexíveis com as transformações sociais e culturais.
Desse modo, o cenário formado com essas mudanças foi de uma sociedade com liberdade de costumes, com um bem estar social razoável e hipervalorização do ócio. Estas condições atraíram a publicidade e a mesma as tornou o foco de mercadorias, a fim de comercializar a própria cultura.

Llosa (2012) apresenta mais algumas causas para que essa realidade falsificada surgisse. Uma delas é a democratização da cultura. Afirma que antes desta etapa acontecer, a cultura era restrita a aristocracia. Quando a elite deixou de ter o monopólio do “bom gosto” e passou a compartilhar com a cultura popular, os conteúdos culturais passaram a ser produzidos apenas para fins comerciais, com alta superficialidade e mediocridade, sem sequer passar por uma avaliação crítica profissional e especializada. Fazendo um paralelo com o ensaio de Coelho (2016, p. 33), o mesmo afirma que ‘a indústria cultural unificou a cultura erudita à cultura popular.”. E isso põe em risco a democracia dos próprios consumidores.

Com a massificação da cultura, sendo esta apenas mais uma forma de passar o tempo, tudo o que se é produzido, é válido como elemento cultural, pois seu significado agora é amplo, não como outrora, onde era elitizado. A abrangência da ressignificação deste termo acarreta uma consequência nociva à cognição: estagnação intelectual. O indivíduo não busca mais fomentar seu conhecimento através da música, do teatro, das artes; ele apenas a “consome”, como um produto já moldado e preparado para ele.

Fonte: goo.gl/VLiwVe

Com isso, a publicidade age como um regime totalitário, onde as propagandas publicitárias trabalham com a repetição e consequentemente com a razão instrumental, devido à alta eficácia do elemento repetitivo. Desse modo, produz a redução do conhecimento racional, pois “tudo o que era vivido diretamente tornou-se uma representação” (Debord, 1997, p.13). Essa afirmação de Debord exemplifica a sociedade do espetáculo e ao mesmo tempo capitalista, pois as pessoas julgam que os objetos produzidos por elas mesmas tem um valor já próprio, antes da sua produção.

O indivíduo não compreende que os produtos são resultados das interações humanas, com isso, ele acaba atribuindo valores que não pertencem ao objeto, mas por se identificar com o mesmo, dão-se atributos aos produtos. Essa concepção é um traço de fetichismo. A formação da cultura “light” faz com que o indivíduo seja cômodo no que ele recebe das produções publicitárias, como os livros, músicas e até mesmo a culinária.

Antes, a crítica era crucial para que dado recurso cultural fosse aceito pela maioria ou não. Já hoje, apenas a publicidade é quem decide o que entra e sai da moda, o que se ouve ou se lê. Antes, as obras artísticas, sendo elas de cunho literário, musical ou teatral, eram carregadas de influências filosóficas, ou de crenças religiosas ou ideologias. Entretanto, hoje em dia, as agências de publicidade tem o domínio sobre o que se vai consumir.

Fonte: goo.gl/SfetZT

Há vários exemplos onde o indivíduo já não filtra mais o que é comercial e o que é pura arte; um exemplo disso são as músicas, como em shows e raves. Nessas situações os sujeitos perdem sua individualidade e se torna comum ao restante da massa. Assim acontece também no futebol, quando um dado grupo se reúne para praticar ações violentas ao time rival. E por fim as drogas, exemplo claro da fuga da sociedade dos problemas e angústias. Antes, este último recurso era usado pela boemia ou a classe produtora da arte, a fim de aprimorar sua visão e experiências. Hoje, o uso desse recurso causou a dependência de muitas pessoas no escape da realidade.

Por fim, essa sociedade do espetáculo, formada basicamente pelo consumo exacerbado e inconsciente de produtos fetichizados, causa a separação das experiências concretas com representação de imagens. Isso causa a perda do controle da dimensão simbólica no indivíduo, pois ele não sabe o porquê de fazer dado comportamento, apenas o reproduz.

Há uma notável diferença cultural se for comparado à cultura produzida hoje com a dos últimos dois séculos, onde o valor intelectual passou por uma desvalorização muito grande, e foi trocado por valores culturais mais específicos e de pouco conteúdo. E com isso é nítido uma regressão artística, política, e nas práticas religiosas também. Na sociedade em geral, o erudito, ou em outras palavras algo mais elaborado, e com certo nível de complexidade maior, não tem mais tanto espaço na atualidade.

REFERÊNCIAS:

COELHO, Cláudio Novaes Pinto. Indústria cultural e sociedade do espetáculo: a dimensão Política da crítica cultural.

DEBORD, G. Sociedade do espetáculo. Comentários sobre a sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.

LLOSA, M. V. (2013). A civilização do espetáculo: uma radiografia do nosso tempo e da nossa cultura. Objetiva.

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Pseudo-necessidades na cultura contemporânea

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Cultura é todo aquele complexo que inclui o conhecimento, os objetos de arte, as crenças, as regras sociais, os costumes, os tipos de relações interpessoais, os instrumentos e todos os hábitos e habilidades adquiridos pelo ser humano através das instituições do qual faz parte. Assim também podendo ser definida como um conjunto de ideias e práticas sociais. Além disso, estudar cultura é dar ênfase às atividades, aos objetos e aos símbolos compartilhados.

O termo citado acima é alvo de crítica e questionamento pela falta de contribuição da sociedade contemporânea para um avanço cultural pós-modernista. O ensaio “A civilização do espetáculo” de Vargas Llosa traz reflexões sérias sobre qual o caminho que a cultura está traçando atualmente.

A cultura, na contemporaneidade, perdeu o seu significado tradicional, está vazia de conteúdo e foi substituída por outro sentido. Para entender o conceito de cultura, Mario Vargas Llosa (2013) baseia-se em alguns ensaios que debateram sobre o tema. Apesar de terem perspectivas distintas, os autores concordam que a cultura está passando por uma profunda crise e entrou em decadência.

Segundo o modelo de T. S. Eliot, em 1948, a cultura está estruturada em três instâncias: indivíduo, grupo ou elite e sociedade em seu conjunto, na qual cada uma mantém certa autonomia e está em conflito com as outras, dentro de um contexto social coeso. Além disso, ele afirma que a alta cultura é patrimônio de uma elite e que deve ser assim. No entanto, a elite não deve ser vista como classe privilegiada ou aristocrática, em sua totalidade. Cada classe possui a cultura que produz e que lhe convém, havendo discrepâncias relacionadas à condição econômica de cada uma (LLOSA, 2013).

Ainda segundo o autor, a ideia sobre a transmissão da cultura à totalidade da sociedade, através da educação, está destruindo a “alta cultura”, pois o único modo de alcançar a democratização universal da cultura é deixando-a pobre e superficial. É necessário que na sociedade, haja culturas regionais que alimentem a cultura nacional, fazendo parte dela, mantendo sua própria característica e desfrutando de certa independência.

Fonte: https://goo.gl/uA16vS

A cultura é transmitida através da família, e logo após, a principal transmissora foi a Igreja. É importante ressaltar que cultura é diferente de conhecimento. Segundo Llosa (2013, p. 10), a primeira refere-se a “[…] uma propensão do espírito, uma sensibilidade e um cultivo da forma, que dá sentido e orientação aos conhecimentos”. Já o segundo, tem relação com uma evolução da técnica e das ciências.

É necessário lembrar que cultura e religião denotam significados distintos, porém a cultura nasceu dentro da religião, mesmo que a evolução histórica tenha se distanciado dela. T. S. Eliot, ao abordar sobre religião, refere-se ao cristianismo, que fez da Europa o que ela é. Além disso, a ideia de sociedade e de cultura remete a estrutura do céu, do purgatório e do inferno na Commedia de Dante, sendo que quem castiga o mal e premia o bem é a divindade, através de uma ordem intocável (LLOSA, 2013).

Após vinte anos dos escritos de Eliot, George Steiner, em 1971, trouxe algumas notas para a redefinição da cultura. Para ele, a religião mantém um estreito laço com a cultura, mas pouca dependência em relação à “disciplina cristã”. A vontade que objetiva a arte e o pensamento profundo nasce de “uma aspiração à transcendência, é uma aposta em transcender” (STEINER apud. LLOSA, 2013, p. 12). É esse o caráter religioso de toda cultura.

Ao falar sobre a cultura pós-moderna em seu ensaio, Steiner afirma que o homem culto precisa de um conhecimento básico de matemática e ciências naturais para poder entender as conquistas que a ciência realizou e que continua realizando em outros campos do saber. Além de suas aplicações que são surpreendentes quanto às criações da literatura (LLOSA, 2013). Além disso, “pode ser que a cultura já não seja possível em nossa época, mas não será por essa razão, pois a ideia de cultura nunca significou quantidade de conhecimentos, e sim qualidade e sensibilidade” (LLOSA, 2013, p. 14).

Um dos fatores que Llosa aponta como causadores da falta de qualidade e sensibilidade é o consumo excessivo de bens industriais, que leva a fabricação de produtos que muitas vezes não são necessários, mas que como a moda e a mídia colocam como algo importante, as pessoas adquirem e tentam de todas as formas se adequarem a esses padrões, a esse fenômeno dá-se o nome de  “reificação”. Tal fenômeno gera nas pessoas um distanciamento do outro, tornando-as vazias, sem preocupações com as relações sociais ou com qualquer outra forma de relação de caráter coletivo, fazendo com que vivam cada vez mais isoladas, levado-as a não conhecer o outro.

Fonte: https://goo.gl/ZAhRuQ

Ainda segundo o autor, o surgimento de uma cultura global seria uma aproximação dos continentes, fazendo com que crenças e valores culturais dos diversos países sejam levados em conta. A criação dessa cultura seria um artifício usado para uma venda de produtos em massa, para que o mesmo produto seja usado pelo maior número de pessoas, mesmo que essas pessoas sejam de países, de culturas e formas de viver distintas. Um exemplo usado pelo autor é o dos filmes, que são lançados em todo o mundo, atingindo todas as classes sociais, sem ter como pré-exigência uma formação intelectual elevada, fazendo com que qualquer pessoa consiga assistir. Llosa (2013, p. 16) diz que “não só a informação rompeu todas as barreiras e ficou ao alcance de todo o mundo, como também praticamente todos os setores da comunicação, da arte, da política, do esporte, da religião etc., sofreram os efeitos transformadores da telinha.” Isso mostra  como essa cultura de massas influência em todas as áreas de uma sociedade.

Uma das coisas que o autor mostra através no decorrer do texto são as consequências negativas dessa cultura-mundo, e como essa cultura condiciona as pessoas a viverem de forma submissa a esses padrões criados. “A cultura-mundo, em vez de promover o indivíduo, imbeciliza-o, privando-o de lucidez e livre-arbítrio, fazendo-o reagir à “cultura” dominante de maneira condicionada e gregária, como os cães de Pavlov à campainha que anuncia a comida” (LLOSA 2013, p. 16).

O autor frisa as diferenças culturais do passado para as diferenças dos dias atuais, que ele denomina “entretenimento”. Ele mostra que no passado as obras eram criadas para atravessar gerações, e serem apreciadas por diversas pessoas em vários momentos da história, enquanto as atuais são criadas para serem apreciadas momentaneamente, para suprir necessidades  imediatas, e que serão substituídas por outras obras diferentes, de grande sucesso, e da mesma forma como a antecessora ela será substituída por outra obra, e esse processo será contínuo, porque a cultura tem sido vista como entretenimento. O autor deixa claro como a ideia de cultura tem sido vista, quando ele diz: “Cultura é diversão, e o que não é divertido não é cultura” (LLOSA, 2013, p. 17).

Ele também mostra que no decorrer do seu livro a forma como a cultura tem sido transformada, deu lugar a uma nova cultura, cheia de produtos que se fizerem sucesso são vistos como bons, e que o único valor existente neles é o conferido pelo mercado.

Fonte: https://goo.gl/fz9NKK

Vargas Llosa e a cultura

A cultura está vinculada ao momento pós-moderno e globalizado. Desse modo, Gonçalves (2015) ao falar sobre a obra A civilização do espetáculo, diz que, o termo cultura, envolve conhecimentos preconcebidos pelo homem ao longo da história, através da crítica à sociedade do espetáculo. Além disso, o desenvolvimento cultural de uma população é mostrado pela civilização e pelas transformações que ocorrem nas relações sociais, nas técnicas manipuladas, nos fatores econômicos e na criação artística. Sendo assim, de acordo o autor, essa evolução culminou em uma civilização efêmera.

Ainda segundo o autor, essa civilização efêmera “pouco contribui para o avanço intelectual, sociocultural e econômico, interferindo sobremaneira na identidade cultural das sociedades modernas” (p. 561). É importante enfatizar que as civilizações transmitem culturas, que podem ser complexas, por meio de instituições como a família, escola, Igreja, Estado e grupo no qual se faz parte (GONÇALVES, 2015). Caso não cumpram esse papel de maneira efetiva, pode haver uma deterioração da cultura e a civilidade de um povo, prejudicada.

Para Llosa, sua obra está envolvida pela cultura, sendo uma realidade autônoma que é moldada por valores éticos e estéticos, ideias, arte e literatura. Além disso, todas influenciam a vida social. O autor também fala que a cultura e o processo de civilização também são formados pelas redes sociais, internet, televisão, cinema e jornalismo sensacionalista, alcançando todas as classes sociais de forma acessível e sem o requerimento de formação intelectual (GONÇALVES, 2015).

A autora ressalta com embasamento no livro Civilização do espetáculo, que a cultura deveria assumir o vazio deixado pelas outras áreas do conhecimento. E não é isso que tem ocorrido, de acordo com Llosa. Segundo ela, os avanços tecnológicos estão fazendo com que a cultura vise o entretenimento, sem se importar com a crítica, levando à superficialidade. Esses avanços deveriam contribuir para o aprimoramento da própria sociedade, exigindo dos seus membros um aperfeiçoamento maior, pois tudo está à disposição de todos, isto é, as informações estão à disposição de todas as pessoas. Dessa forma, ela conseguiria realmente ser uma sociedade do espetáculo.

 

Fonte: https://goo.gl/434PdU

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo permitiu obter um panorama de como a cultura perdeu o seu significado tradicional e para entender isso diferentes autores opinaram a respeito. Pode-se notar que a cultura é vista como patrimônio de uma elite e que cada classe possui a sua, havendo diferenças em relação à condição econômica. Além disso, ela também se refere a uma propensão de espírito, uma sensibilidade e um cultivo.

É percebido que a cultura e religião possuem significados diferentes, mas que ela nasceu dentro da religião. A cultura pouco depende da disciplina cristã, no sentido em que ela aspira à transcendência. Ela também não significa quantidade de conhecimentos, mas sim qualidade e sensibilidade. No entanto, o consumo excessivo faz com que as pessoas tentem adequar-se a esses padrões – fenômeno da “reificação”. Esse fenômeno gera um distanciamento entre as pessoas, deixando-as vazias e sem preocupações com relações de caráter social e coletivo.

É notado que o surgimento de uma cultura global vem para aproximar os continentes com o intuito de vender produtos em massa para diferentes pessoas do mundo com seus próprios estilos de vida e cultura. Além disso, o viés negativo dessa cultura-mundo priva o indivíduo de lucidez e livre-arbítrio, condicionando o indivíduo a reagir à “cultura” dominante.

Verificou-se também que a cultura e o processo de civilização são formados pelos valores éticos, arte, literatura, redes sociais, internet, televisão, cinema, jornalismo sensacionalista e outros. Dessa forma, as classes sociais podem ter acesso à cultura sem precisar de qualquer formação intelectual. Além disso, os avanços tecnológicos fazem com que a cultura vise o entretenimento, tornando-a muito superficial. Por isso, esses avanços deveriam colaborar para o desenvolvimento da própria sociedade, pois assim conseguiria ser uma sociedade do espetáculo.

Em suma, o ensaio de Mario Vargas Llosa se contrapõe a respeito da ideia de banalizar a arte, a literatura, a política e o jornalismo. Através de uma visão dura e detalhista, o autor faz uma análise da contemporaneidade e da degradação que ela vem causando para cultura, tornando-se assim, um tema crítico e de grande relevância para as esferas acadêmicas.

Fonte: https://goo.gl/ZpQNxf

 

REFERÊNCIAS

GONÇALVES, Andreia Santos. Vargas Llosa e a cultura. Revista sociedade e estado, volume 30, número 2, p. 561-564, maio/agosto, 2015.

LLOSA, Mario Vargas. A civilização do espetáculo. 1. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013. Livro em PDF.

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Espetacularização da cultura: fenômeno contemporâneo

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O Livro “A Civilização do Espetáculo”, de Mário Vargas Llosa, nos convida a fazer uma análise sobre a nossa atual cultura, levantando o suposto problema cultural da chamada “cultura de massa” ter dominado todo o âmbito social, percorrendo desde as classes mais ricas até as mais pobres.

A partir da discussão se levanta o seguinte questionamento: será preferível manter a “alta cultura” (cultura denominada culta e presente somente nas classes mais ricas) voltada para si em detrimento do desenvolvimento do conhecimento e dar manutenção às desigualdades sempre existentes? (corroboradas por essa própria separação) ou valorizar a cultura de massa buscando o seu desenvolvimento, carregando consigo toda uma sociedade que pode se beneficiar com isso?

O livro apresentado passa um conhecimento muito importante: o efeito que o desenvolvimento da cultura de massa teve dentro da nossa sociedade, que não foi muito positivo. Porém, o autor apresenta uma visão de que a cultura de massa nada trouxe para a sociedade, e apresenta certo saudosismo aos tempos em que a alta cultura, que era culta, porém excludente, era mais valorizada e estava no centro da política, da mídia, religião e de outros pilares da sociedade.

Fonte: goo.gl/Wb8X1o

Com este pensamento, Mario Vargas demonstra certa supervalorização da alta sociedade por defender o retorno da valorização da alta cultura, podendo trazer uma perigosa justificativa para o retrocesso da sociedade, por colocar os pilares sociais ainda mais nas mãos da alta sociedade, que perdeu com o desenvolvimento da “tão odiosa” cultura de massa.

A partir desse perigoso pensamento, é importante que várias ressalvas não colocadas pelo autor sejam frisadas, evitando que esse discurso seja justificativa para a minimização dos adeptos a cultura de massa – que representa a maioria da sociedade – em detrimento da alta e culta sociedade podendo aumentar mais ainda o abismo social que há entre a classe rica e o restante da sociedade

Durante todo o desenvolvimento da sociedade pela historia, as classes mais altas estiveram sempre, como a própria palavra diz, num patamar mais alto, tiveram sempre o hábito de diminuir as classes “abaixo” dela. Isso se deve por inúmeros fatores, entre eles, está o fato dela sempre ter consigo mais conhecimentos teóricos.

Esse foi sempre um dos tantos fatores que aumentaram o abismo social entre classes. A partir disso, a possibilidade de uma aproximação cultural entre as classes, pode ser um susto para os adeptos a estratificação social, levando alguns destes, a procurarem motivos para justificar a manutenção das desigualdades sociais. Qual a melhor justificativa para isso do que dizer de forma culta e embasada que “estamos ficando mais burros”?

Fonte: goo.gl/dUFPfN

Levando em consideração que a alta cultura estava na mão de poucos, e as outras culturas estavam na mão de todo o resto da sociedade – que conta com muito mais de 80% da população – podemos partir para a reflexão básica sobre a mistura das culturas para a homogeneização em busca da cultura de massa. Ora, se colocarmos todos os poucos cultos entre o mar de “ignorantes culturais” (toda uma sociedade) e misturarmos, obviamente o que irá se mostrar é o que representa maioria em numero.

Com o desenvolvimento das democracias pelo nosso extenso globo, as classes mais baixas puderam ter mais acesso ao poder de escolha, como o voto. Com isso, os comandantes dos países tiveram que voltar seus olhos um pouco para a parte desbastada da sociedade. Ao longo dos anos, o povo começou a ter cada vez mais condições para consumir as artes e mídias, que antes eram voltadas apenas a quem tinha poder de compra (a classe alta). Obviamente sabemos qual o efeito disso: as mídias voltaram seus olhos para uma parte da sociedade que antes não era contemplada com informação e entretenimento.

As consequências disso são obvias, com o numero de consumidores maior entre as classes mais baixas, os repórteres, autores e artistas voltaram seu foco para pessoas com menos conhecimento, o resultado disso foi logicamente um reajuste nas formas de cultura em geral, já que agora focavam não só nas pessoas com alto nível de estudo e conhecimentos gerais.

As mídias agora se tornaram acessíveis a toda a sociedade, tendo consumidores desde semianalfabetos, ate grandes filósofos e intelectuais. As consequências disso foram rápidas, os cultos e nobres voltaram para si, em busca de continuarem consumindo obras, entretenimento e informações ainda equivalentes ao seu nível de conhecimento. Não demorou muito para que quase toda a arte e mídia em si fosse voltada para as massas, já que agora, seu publico alvo, se tornou apenas a massa, visto que a alta sociedade voltaram as costas para o mainstream.

Fonte: goo.gl/pCvwGL

A revolta da classe culta é válida, já que alguém que conhece e costuma apreciar a Oitava Sinfonia de Bethoven, obviamente não vai passar a apreciar uma música pobre em complexidade musical. Porém essa classe, deveria ver a beleza da diminuição das diferenças sociais, e que a expansão da cultura de massa, é apenas um reflexo disso. O papel dos grandes apreciadores de uma cultura complexa e cheia conhecimento, deveria ser de mostrar a toda a massa, a beleza de apreciar uma boa arte, mídia e informação.

A sociedade em seu engatinhar viu a necessidade de uma entidade liderante no qual teria acesso aos acontecimentos com uma amplitude de visão maior que os demais, para elaborar estratégias de acordo com as necessidades. Sendo assim a alta sociedade historicamente sempre teve mais acesso à informação,pois conhecimento é poder, e poder controla, controle esse que é almejado em qualquer tipo de governo, não só obtendo melhor acesso ao conhecimento, como limitando o acesso das classes inferiores. O problema disso é imbecilizar toda uma massa para que continue se contentando com tudo o que ative agradavelmente os seus sentidos.

Ao invés de limitar o acesso à informação, poderíamos através da educação, incentivar o pensamento crítico das massas, pois não é regra o mainstream ser fraco, e o cult rico. Isso acaba formando uma cultura de rejeição à própria cultura.

Não é de hoje que os governos usam a técnica da desinformação para manter o público inocente e desestimulado para questionar. Temos a ilusão de que o poder está em nossas mãos (democracia) porém somos influenciados pela própria mídia que através da publicidade, dita nossos comportamentos. Quem não se encaixa no padrão, é sutilmente excluído dos “privilégios” trazidos pela cultura implantada.

Particularmente acreditamos que o conhecimento deve sim estar disponível para todos, sem exceção, pois se há algum tipo de restrição, não só as classes baixas se prejudicam, mas as classes altas também, já que (querendo ou não) fazem parte da massa. Restringir cultura é contra a ideia de diversificação, negar a diversificação é negar a evolução do pensamento.

Fonte: goo.gl/k9WrnV

Devemos nos desconstruir e nessa desconstrução cabe a obtenção de valores culturais diferentes dos nossos.
Tudo bem que hoje a mídia está banalizando a cultura, tornando-a simples e atraente, criando uma fórmula para produzir arte, nos entregando mercadorias. Não há como quebrar esse ciclo de oferta e demanda se as massas não tem o conhecimento necessário para se localizar nesse jogo fetichista da mercadoria. Se não há o conhecimento de como vivem, como irão se rebelar?

Considerações finais

Não faz sentido esperar que classes evoluam culturalmente sem acesso à conhecimentos específicos de política e controle. As massas continuam sendo alimentadas como cães famintos, que esperam ansiosamente o dono colocar qualquer coisa para enfim ter sua temporária satisfação. É interessante ao governo que permaneçam assim, pois assim não questionam e são facilmente controlados. Mas existem outras reflexões.

A alta sociedade cria novas tendências que são seguidas fielmente pelo mercado, isso acaba introduzindo as massas ao costume elitista, numa homogeneização cultural , supervalorizando os costumes da alta sociedade. Mas dando oportunidades das demais classes atingirem uma cultura padrão, padrão esse almejado pelo mercado, para facilitar sua produção.

É necessário que a informação chegue à todos , por uma questão de sobrevivência. Não é sempre que teremos heróis dotados de conhecimentos nunca acessados, para nos acudir. O que a mídia faz é pegar o que há de mais pobre em nossa cultura e devolver em uma embalagem atraente, criando assim um ciclo difícil de ser quebrado, pois ela nos vicia com o que apresenta. Um exemplo na música, é a organização de certos acordes que fazem com que tal música (mesmo não sendo do nosso agrado) fique se repetindo em nossas mentes. Isso não é servir à população, isso é servir à alta sociedade que se alimenta do ciclo vicioso em que as massas vivem.

Fonte: goo.gl/4jnhLA

Direta ou indiretamente todos contribuímos para o progresso técnico e científico. Com o passar dos tempos a tecnologia vem ocupando trabalhos em que nós somos capazes de executar (como aspirar ao chão) , com essa substituição de tarefas, podemos nos preocupar em outras coisas. O problema é que a tecnologia não tem limites e há o risco de não sobrar mais funções exclusivamente humanas, tornando desnecessárias as massas. É um risco num mundo onde se quer tudo muito rápido.

Tendências aparecem e tornam-se obsoletas numa velocidade enorme, isso acontece também com os meio de informação que se desesperam tanto em entregar logo o produto, que nem revisam para saber se de fato a informação está correta, assim como leitores, não se questionam se aquilo que leram é de fato verdade, correndo o risco de estarem replicando algo falso.

REFERÊNCIAS:

VARGAS LLOSA, Mário. A Civilização do Espetáculo. São Paulo: Objetiva, 2015.

Pequeno Ensaio da Civilização do Espetáculo. Disponível em < https://jus.com.br/artigos/26314/pequeno-ensaio-em-resenha-critica-da-civilizacao-do-espetaculo-de-vargas-llosa > . Acesso em 02 de mar. 2018.

Comentários sobre a Civilização do Espetáculo. Disponível em < https://eduardocabette.jusbrasil.com.br/artigos/121938031/comentarios-sobre-a-civilizacao-do-espetaculo-de-vargas-llosa > . Acesso em 02 de mar. 2018.

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A metamorfose de uma palavra

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Mario Vargas Llosa é um escritor, jornalista e político peruano, nasceu em 1936 na cidade de Arequipara, foi premiado em 2010 com o Nobel de literatura. Em sua obra “A civilização do espetáculo”, Llosa aborda um tema que vem sendo bastante discutido nas últimas décadas que é a cultura.

Fonte: encurtador.com.br/hxFZ5

O escritor fala que é provável que nunca na história tenham sido escritos tantos ensaios, teorias e análises sobre a cultura como em nosso tempo. Ensaios que muitas vezes provocam vários debates de grande importância intelectual e política. Debates estes que acontecem pelo fato de alguns dizerem que a cultura contemporânea não tem nada em comum com a cultura de uns 30 ou 40 anos atrás, alguns acabam dizendo até que não existe mais cultura. Vargas fala do ensaio de um escritor chamado T.S.Eliot que criticava o sistema cultural de sua época, segundo ele, esse sistema vem se afastando cada vez mais do modelo ideal que ele apresentou no passado.

Esse modelo ideal é aquele onde a cultura era dividida em três instâncias, o indivíduo, ou seja um ser humano inserido num ambiente social, a elite que é um grupo privilegiado minoritário composto por aqueles que são vistos por alguns como superiores por possuírem algum poder econômico e/ou domínio social e o último ponto que é o contexto social no geral. Embora haja intercâmbios entre as três, cada uma preserva certa autonomia e sempre está se confrontando com as outras, dentro de uma ordem graças a qual o conjunto social prospera e se mantém coeso.

Fonte: encurtador.com.br/DHJTY

T.S. defende que a alta cultura ou a cultura de elite deve ser preservada porque a qualidade da cultura no geral depende também da qualidade dessa cultura minoritária. Tal como essa realidade a classe social também é algo que deve ser mantido. Segundo ele cada classe social tem a cultura que produz e naturalmente aparecem várias diferenças entre elas, principalmente diferenças relacionadas com a condição econômica de cada uma. A civilização do espetáculo é caracterizada pelo entretenimento, onde o ato de se divertir-se é mais importante que qualquer outro valor cultural. É visto como puritanas fanáticas pessoas que reprovam essa prática da nossa sociedade que vê como um valor supremo o ato de se divertir.

A sociedade não percebe que essa prática acaba resultando em uma banalização da cultura.  Após a Segunda Guerra Mundial houve uma escassez na economia após essa etapa a economia teve um enorme crescimento. Os valores morais começando pela vida sexual da sociedade que até então eram pregados pela igreja e pela política foram tendo aberturas. Nessa época ocorreu um grande desenvolvimento nas indústrias de diversão sendo promovido pela publicidade.

Fonte: encurtador.com.br/doCJQ

Outro fato que aconteceu para que a nossa civilização tenha se tornado desse tipo foi à democratização da cultura. Por nós sermos uma sociedade democrática e liberal não podemos aceitar uma cultura que seja um patrimônio apenas da elite, a cultura deve alcançar a todos por meio da educação, manifestações culturais, mas o que poderia ter sido uma ideia altruísta acabou se tornando uma forma de trivializar e mediocrizar a vida cultural. Pois para facilitar com que chegue à grande maioria se torna algo superficial, vai se perdendo a alta cultura e passa a ser vista apenas como uma forma de passar o tempo.

Segundo o autor a publicidade tem um papel decisivo na escolha dos nossos gostos desde a sensibilidade aos costumes. Este papel antes era desempenhado pelas religiões, sistemas filosóficos, doutrinas e ideologias Moebus (2008) afirma em seu artigo que: A publicidade desempenha aí um papel fundamental à medida que, através de seu discurso, reafirma a noção de indivíduo enquanto efetivo agente do processo social, transfigurado na imagem do indivíduo-consumidor”. Os indivíduos vão à busca de livros que sejam de fácil compreensão que os distraiam, as obras literárias e artísticas viraram um produto comercial onde o preço vale mais que o valor de uma obra de arte.

Fonte: encurtador.com.br/bvJ17

Ainda sobre a superficialidade estabelecida nesta sociedade o autor também pontua o fato de buscarmos coisas práticas, o que ele também chama de “literatura light, cinema light e arte light”, dando ao presenciador a impressão de ser civilizado, desenvolvido, na comodidade com um mínimo de “esforço intelectual” como o mesmo diz. Cada dia mais o uso de drogas é disseminado, pairando sobre a sociedade com a destinação artística ou científica. Se tornou algo cultural que impulsiona pessoas a buscarem prazeres fáceis e rápidos que os livrem de responsabilidades, preocupações, uma rotina anteriormente considerada comum e aceita por todos.

A religião tida anteriormente como essencial, na sociedade do espetáculo foi abruptamente substituída pelo laicismo por aparência. Pessoas se denominam católicos, evangélicos, algo dito de maneira superficial, pois as mesmas provêm de comportamentos contrários que abstraem a religião de algum modo. Na nova sociedade são hipnotizados por coisas hilárias. Músicos, atores, artistas em geral são colocados como seres de importância máxima não só em seus âmbitos de trabalho, mas na política que é algo que vem da opinião pública. Com tal observação o autor não exclui o mérito, capacidade que cada um pode ter, mas destaca que o motivo principal de tal admiração e conquistas no meio social vem pelo fato de sua presença midiática.

Fonte: encurtador.com.br/aenq2

Nada mais natural num mundo e numa cultura onde se prima pela busca da facilidade, do descompromisso, da liberação de obrigações, de reflexão e de aprofundamento. Não é possível ainda esperar muito de uma sociedade em que a Religião é superficializada quando não simplesmente substituída pela superstição, Naturalmente que, nesse quadro, a decadência e superficialidade religiosa somente podem conduzir à decadência moral. E isso não é um prognóstico, mas um evidente diagnóstico comprovado empiricamente no dia a dia.

Se tratando de sexo, após a quebra de tabus religiosos que pregavam o sexo como algo sujo e impuro quando realizado antes do casamento ou com dois ou mais parceiros, e com pessoas do mesmo sexo. Vimos então que tal ideia passou por transformações, houve a liberação dos antigos preconceitos, um avanço com a diminuição da discriminação, com o progresso da aceitação integrando as pessoas na sociedade.

Lembrando que nessa época presente, onde a liberdade sexual merece uma grande importância devido a existência dos preconceitos que ainda existem na sociedade, causando então a violência física, verbal, violência em relação à conjunção carnal por forçar sem que a outra parte permita. Mas temos as prevenções para evitar esses delitos no Direito, que permitem a punição contra aqueles que infringirem a dignidade da pessoa humana.

Fonte: encurtador.com.br/aqzH7

O autor reúne pautas críticas sobre o tema da cultura, sem quaisquer pretensões conceituais como a que vemos em Bauman, ao demonstrar que a solidez de uma era dá lugar a novas condições de existência e relações recíprocas em consequência de um movimento dialeticamente revolucionário. A burguesia, como classe revolucionária, não apenas revoluciona o modo de produção, mas também as relações sociais. Os compromissos perdem força. A mobilidade no mundo do trabalho leva à perda de laços de amizade. As histórias se constroem a cada novo posto de trabalho. Os colegas de trabalho são igualmente colaboradores com pequenos laços de comprometimento com a empresa.

Considerações Finais

Em A civilização do Espetáculo, livro escrito por Mário Vargas Luiza, faz-se refletir sobre o atual estado em que a sociedade se encontra, a cultura está em profunda crise. Há na atualidade uma banalização da cultura, onde os valores, e a essência das coisas não tem mais seu reconhecimento, cedendo lugar para a admiração de algo superficial. A postura que a sociedade adotou na pós-modernidade sobre como a “palavra” perdeu consideravelmente a importância em detrimento da “imagem”. O espetáculo ou alienação como é descrito no texto, assume um papel tão grande na vida das pessoas na atualidade que se torna mais importante os avanços industriais, bens materiais, e tecnologias, do que se ocupar de assuntos culturais, intelectuais, e políticos. Não é mais importante se ocupar desses assuntos.

Fonte: encurtador.com.br/juJY3

A ênfase dada na civilização do espetáculo, é que a moda atual compete na diversão, no entretenimento, na vulgarização da imagem, essas ações funcionam como um escape de uma vida tediosa. Houve um empobrecimento do pensamento, da ideia, dos valores culturais. Assim dando espaço para a evolução do cinema, televisão, internet, substituindo dessa forma livros, artigos, jornais, entre outras fontes de informação.

Esse tema tem sido bastante discutido por diversas áreas dos saberes na atualidade, como na antropologia, filosofia, psicologia etc. A forma como as pessoas encaram essa nova cultura, seja de uma forma saudável, ou patológica, é parte do objeto de estudos dessas áreas. De fato esse estilo de vida que tem dominado a pós-modernidade tem causado sofrimento seja físico ou psíquico. É necessário buscar compreender a visão das pessoas sobre a nova forma de enxergar o mundo, e que tal mudança interfere na vida das pessoas de forma geral, sejam elas pessoas que nasceram a três, quatro ou cinco décadas, ou crianças.

REFERÊNCIAS:

MOEBUS A. R.; 2008; A (re) construção do indivíduo: a sociedade de consumo como “contexto social” de produção de subjetividades. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69922008000100006> Acesso em 06 de setembro de 2017.

*Texto resultante da disciplina de Antropologia, ministrada pelo prof. Sonielson Sousa.

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A cultura na ‘Civilização do Espetáculo’

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O livro “A Civilização do Espetáculo” escrito por Mario Vargas Llosa no ano de 2012, relata a crise de conceitos ligados à cultura e como a mesma se tornou um espetáculo diante de uma civilização sensacionalista. Llosa deixa claro no início o objetivo do livro, que segundo ele é mostrar a transformação que a cultura teve ao longo do tempo. Ao decorrer do livro, o autor pontua também o conceito de cultura e questiona qual o verdadeiro papel da cultura na sociedade.

Llosa apresenta antes das suas considerações o trabalho de outros autores que também abordaram o tema cultura em diversas perspectivas ao longo do tempo. Foi verificado por ele que apesar das diferenças existentes entre os conceitos expostos por cada autor, encontra-se uma pequena semelhança. Todos acreditam que a cultura está percorrendo uma grande crise e tornou-se decadente.

O primeiro autor citado por ele foi T.S. Eliot, criador da obra Notas para uma definição de cultura, em 1948. Eliot além de conceituar o termo cultura, também critica o sistema cultural da época, afirmando que o modelo de cultura está mudando gradativamente. Logo após surge a obra de Guy Debord, A Sociedade do Espetáculo criada em 1967. Apesar da semelhança dos títulos, a obra de Debord refere-se a concepções diferentes da cultura do livro de Llosa. Debord acreditava que “espetáculo” seria tradução de “alienação” onde o ser humano é levado a crer em necessidades capitalistas.

Fonte: goo.gl/H6LU6L

A publicação de George Steiner, No castelo do Barba Azul: Algumas notas para a redefinição da cultura, de 1971, relaciona a cultura com a religião, onde o autor cita que a grande arte surge da transcendência. Próximo à obra de Llosa, foi publicado o livro Mainstream, de Frédéric Martel, mostrando a “nova cultura” relatada em tempos atrás por outros autores, que já foi deixada para trás com a velocidade do tempo.

Já a obra de Mario Llosa A Civilização do Espetáculo, apresentada neste trabalho, acredita que a cultura não é entendida como algo ligado a economia e ao social, mas sim feita de obras literárias e artísticas, de valores éticos e estéticos que se relacionam com a vida social do homem.

Diante disso, o que seria essa Civilização do Espetáculo, segundo Llosa? Para ele (2012), é a supervalorização do entretenimento, onde a sociedade busca incessantemente divertir-se e fugir do tédio. Somente uma pessoa muito rigorosa em seus princípios reprovaria essa população que busca relaxar e descontrair por terem vidas rotineiras e deprimentes. Mas, nem só de diversão vive o homem, colocar o entretenimento como supremacia acarretaria, segundo Llosa, na “banalização da cultura, generalização da frivolidade e, no campo da informação, a proliferação do jornalismo irresponsável da bisbilhotice e do escândalo.” (LLOSA, 2012, p. 30)

Fonte: goo.gl/5EgFuy

De acordo com Llosa (2012), há também outro fator importante para que essa realidade se tornasse duvidosa, a democratização da cultura. Tal fator surgiu de intenções altruístas, na qual, a cultura precisava estar ao alcance de todos, por meio da educação e das diversas manifestações culturais, e não somente pertencendo a um grupo, sendo patrimônio de uma elite. Entretanto, essa ideia de fazer com que a cultura chegasse a todos, tornou a vida cultural medíocre, devido a facilitação formal e superficialidade dos conteúdos.

Llosa (2012, p. 31) então define cultura como, “… todas as manifestações da vida de uma comunidade: língua, crenças, usos e costumes, indumentária, técnicas e, em suma, tudo que nela se pratica, evita, respeita e abomina”. A cultura logo, não pode ser entendida apenas como um passatempo agradável, visto que isso causará a sua desnaturalização e seu depreciamento. Tudo que pertence a ela se iguala ao extremo, de forma que uma apresentação de ópera e um espetáculo de circo, possuem o mesmo significado.

Na civilização contemporânea é perceptível que a culinária e a moda preenchem um espaço significativo nas seções que são destinadas à cultura, assim como chefs e estilistas se tornaram protagonistas, papel que antes era conferido à cientistas, filósofos e compositores. Dessa forma, fornos, fogões e passarelas, confundem-se com livros, concertos, laboratórios e óperas. Assim como artistas da televisão e jogadores exercem uma grande influência sobre os gostos e costumes, influência essa que antes era exercida apenas por professores, pensadores e teólogos (LLOSA, 2012).

Fonte: goo.gl/8d3WPC

Segundo Llosa (2012), algumas características dessa época são o vazio deixado pelo desaparecimento da crítica, a massificação aliada à frivolidade da cultura do nosso tempo, e o empobrecimento das ideias como força motriz da vida cultural. O desaparecimento da crítica proporcionou que a publicidade se tornasse um vetor determinante na vida cultural, exercendo influência significativa sobre os gostos e costumes. A massificação, corresponde ao culto do corpo ser maior que o trabalho para fortalecer o conhecimento intelectual. O empobrecimento é o ato de deixar-se os livros para trás, dando espaço para cinema, televisão e internet.

Para Llosa (2012), a civilização do espetáculo é cruel. A sociedade esquece rapidamente os acontecimentos, não guarda remorsos, assim não possuem consciência e passam sem perceber por cenas de morte e destruição. Estão sempre buscando novidades, não importa qual seja, mas que seja uma inovação, algo atual.
Ao longo da história foram atribuídos diferentes significados para a “cultura”, sendo esta considerada parte da religião e do conhecimento teológico. Mesmo com as várias mudanças, a cultura sempre significou uma soma de fatores e disciplinas, diante de um amplo consenso social que a construiu e que, por ela, era implicado.

Fonte: goo.gl/f1YzLq

Nos tempos atuais, é possível verificar ainda a ocorrência de mudanças que ampliaram a noção de cultura. Antropólogos estabeleceram que “cultura” é a soma de crenças, conhecimentos, linguagens, costumes e sistema de parentesco, sendo assim considerada tudo aquilo que o povo diz, faz, teme ou adora.  O livro “À Cultura na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais” de Mikhail Bakhtin propunha raciocínios sutis sobre a “cultura popular” que teve como foco se contrapor a cultura oficial. Esta última, nasceu de salões, palácios, conventos e bibliotecas, e, já a popular, nasce e vive nas ruas, nas tabernas e em festas. A cultura popular diferencia-se da cultura oficial por mostrar o que estava oculto na mesma, como o sexo, funções excrementícias, a descortesia, e opunha-se ao “mau gosto”, e ao suposto “bom gosto” das classes dominantes.

É válido mencionar que além das concepções de Bakhtin sobre a cultura popular e a oficial, existem várias outras no mundo, o que implica na não consideração de uma única como verdade absoluta, mas sim considerando um “mix” de cultura, pois cada povo possui um tipo de conhecimento e não se pode saber sobre tudo. Depreende-se então que a cultura é de suma importância para que se possa compartilhar conhecimentos.

Nesse interim, a cultura precede e sustenta o conhecimento, pois o orienta e confere-lhe uma função precisa, podendo ser entendida como um preceito para a dissociação do conhecimento para outros povos distintos que não partilham do mesmo. A cultura pode e deve ser uma experimentação para que se ampliem os horizontes, mediante as experiências de vida, a fim de que se revelem os segredos e consequentemente, se revolucionem as sensibilidades diante da condição humana. É necessário que se tenha pensamentos, sonhos, paixão, e além de tudo, que se tenha uma revisão crítica profunda de todas as certezas, convicções, teorias, crenças, sem que se afaste a vida da vida, para que assim, a cultura também possa ser um processo de reflexão.

Fonte: goo.gl/FXzhwA

Para o autor, não há maneira de saber o que é cultura, tudo é cultura e nada é cultura. Ainda que alguém questione o fato de que, nunca na história houve acúmulo tão grande de descobertas científicas, realizações tecnológicas, nunca foram publicados tantos livros, abertos tantos museus nem oferecidos preços arrebatadores pelas obras de artistas antigos e modernos. O mesmo enfatiza a diferença de cultura e especialização, já que se discute a época em que as naves espaciais construídas pelo homem e a porcentagem de analfabetos é a mais baixa de toda a história, mas isso não é obra de pessoas cultas, e sim de especialistas. Explicando que o número de alfabetizados é um aspecto quantitativo e a cultura não tem relação com a quantidade, mas com a qualidade.

A cultura é ou era, quando existia, a conexão entre povos diferentes que, com o avanço dos conhecimentos, eram obrigados a especializar-se, distanciando uns dos outros e deixando de comunicar-se. A cultura também era uma bússola possibilitando os seres humanos a orientação dos conhecimentos sem perder a direção.
Na era da especialização e da derrubada da cultura, as hierarquias desapareceram numa mistura monstruosa. A confusão que iguala as inumeráveis formas de vida batizadas como culturas, onde todas as ciências e técnica se justificam , não havendo maneira de distinguir o que é belo em artes e o que não é.

O texto afirma que a especialização, que existiu desde os primórdios da civilização, foi aumentando com o avanço dos conhecimentos. As elites,eram as minorias cultas, que, além de estender pontes entre os diferentes campos do saber, ciência, letras, artes e técnicas, exerciam influência, religiosa ou leiga, carregada de conteúdo moral, para que a evolução intelectual e artística não se afastasse demais da finalidade humana, garantindo melhores oportunidades e condições materiais de vida.

Fonte: goo.gl/ZJDpQy

Eliot enxergava nos valores da religião cristã a base do saber e da conduta humana, que ele chamava de cultura. Mas para o autor, a fé religiosa não é o único suporte possível para que o conhecimento não se torne vago e autodestrutivo. Nesse processo, seria confuso atribuir funções iguais à ciências, às letras e às artes. Sendo exatamente o esquecimento de discrimina-las, o que contribuiu para a confusão presente no campo da cultura atualmente.

As letras e as artes se renovam, mas não progridem, não destroem o passado, constroem sobre ele. Por esse motivo, as letras e as artes constituíram até agora o denominador comum da cultura, o espaço no qual era possível a comunicação entre seres humanos, apesar das diferenças de línguas, tradições, crenças e épocas.

Segundo o texto, a cultura pode ser experimentação e reflexão, pensamento e sonho, paixão e poesia e uma revisão crítica constante e profunda de todas as certezas, convicções, teorias e crenças. Mas para o autor a impressão é de que a cultura foi sendo construída de forma tão frágil, assim como os castelos de areia, que desmancham como a primeira ventania.

A partir do exposto, foi possível observar uma diferença relevante na cultura do passado e no entretenimento dos dias de hoje. Antes tudo que era produzido tinha o intuito de permanecer presente para as futuras gerações, até começarem a ir perdendo espaço para outras coisas novas e mais vantajosas. O autor afirma aqui “A cultura é diversão, e o que não é diversão não é cultura” (LLOSA, 2012, p. 27).

Vive-se, então, a civilização do espetáculo, onde tudo é entretenimento, é diversão, é a busca pela evitação do tédio, da tristeza. Em consequência ocorre a democratização da cultura. Esta deixa de pertencer a elites e passa a fazer parte da realidade de todos, gerando, assim, uma cultura medíocre e superficial. Entendendo que a mesma define-se como qualquer “manifestação da vida de uma comunidade” (LLOSA, 2012, p. 31).

* Trabalho resultante da disciplina de Sociedade e Contemporaneidade, ministrada pelo prof. Sonielson Sousa

FICHA TÉCNICA DO LIVRO

Fonte: goo.gl/36ibjp

Título: A civilização do espetáculo
Autor: Mario Vargas Llosa
Editora: Objetiva
Ano: 2013
Páginas: 208

 

REFERÊNCIA:
LLOSA, Mario Vargas. A Civilização do Espetáculo: Uma radiografia do nosso tempo e da nossa cultura. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

 

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