Em 17 de março de 2020, por meio da Portaria nº 343, o Ministério da Educação (MEC) se manifestou sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais, enquanto durar a situação de pandemia da COVID-19, para instituição de Educação Superior integrante do sistema federal de ensino. Ademais, todas as instituições de ensino foram contempladas por essa decisão e assim a pandemia agravou a vulnerabilidade dos povos indígenas no que diz respeito ao acesso à Educação.
Assim, o ensino 100% remoto começou a fazer parte da realidade. O uso da internet, das tecnologias educacionais, das plataformas de vídeo aulas e redes sociais foram as técnicas mais utilizadas por todos os países que fizeram parte do acervo, mesmo com dificuldades de acesso e permanência entre educadores, escolas e estudantes (FARIAS & SOARES, 2021).
Apesar das aulas remotas terem sido uma alternativa, não contemplou a realidade dos povos indígenas, o estado brasileiro tem histórico de negligência dos direitos desses povos e os direitos educacionais foram negligenciados considerando o fato de que o acesso a internet não contempla comunidades tradicionais longe de centros urbanos sem recursos tecnológicos.
A emergência e o despreparo culminaram em problemas que deixaram marcas irreparáveis. No Brasil não houve diretrizes políticas que dessem suporte ao ensino público durante a pandemia, apenas a alteração do calendário escolar e permissão tardia para implementação do ensino remoto emergencial (CAETANO, et al, 2023).
Segundo Farias e Soares (2021), a forma como o estado se posicionou em relação às medidas tomadas a respeito da educação nas comunidades indígenas frente a pandemia está ligada a uma política social genocida, pois foram medidas consideradas etnocidas. Aqui, cabe ressaltar que existem poucas pesquisas no que tange a saúde mental dos estudantes indígenas que lidaram com diversos estressores para ter acesso ao que lhe é de direito.
Algumas medidas foram tomadas pelas próprias universidades para que seus alunos não ficassem desassistidos, como a UFMG que criou um projeto de extensão “Conectividade para indígenas e quilombolas”, que encontrou uma solução de levar internet via satélite aos universitário devido às demandas que surgiram após a pandemia.
Em relação às movimentações políticas, o Projeto de Lei 3903/23 que está em análise na Câmara dos Deputados, autoriza o governo a usar o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST) para levar internet a indígenas e quilombolas.
O acesso a internet por parte das comunidades indígenas e quilombolas lhe possibilitam muito mais do que estudar, pois através do acesso podem se conectar socialmente com o mundo, defenderem seus direitos e fortalecerem sua cultura, para isso, é de grande importância que projetos de lei sejam aprovados e executados.
REFERÊNCIAS
Caetano, A. P. L., de Souza , F. F., Brandão , A. C. B., & Avanci , J. Q. (2023). LIÇÕES APRENDIDAS EM TEMPOS PANDÊMICOS: REVISÃO DE ESCOPO SOBRE A ATUAÇÃO DOCENTE E OS IMPACTOS NA SAÚDE.Arquivos De Ciências Da Saúde Da UNIPAR, 27(8), 4351–4383. https://doi.org/10.25110/arqsaude.v27i8.2023-015. Acesso em: 02/12/2023.
Farias, C. G. de, & Soares, E. P. M. (2021). OS IMPACTOS DA COVID-19 NA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA DO SUDESTE PARAENSE. WEB REVISTA SOCIODIALETO, 12(34), 1–17. https://doi.org/10.48211/sociodialeto.v12i34.397. Acesso em: 02/12/2023.
Compartilhe este conteúdo:
A Máquina de Moer Mulheres: Política, Produção e Estética na Pandemia
11 de outubro de 2023 Vitória Cardoso Figueira
Livro
Compartilhe este conteúdo:
“A máquina de moer Mulheres – política, produção e estética na pandemia (2023)”é um livro organizado por Gleys Ially Ramos dos Santos, geógrafa, mestra em Desenvolvimento Regional. Doutora em Geografia. Organizadora do Livro Mulheres Emparedadas – Confissões da Pandemia. Professora do Curso de Relações Internacionais (UFT). Coordenadora do OUTRAS Observatório Transdisciplinar em Feminismo, Política e Métodos (CNPq-UFT) e Juliete Oliveira, mãe, poeta, educadora ambiental, ativista dos direitos humanos, parte da memória de um lugar chamado Araguaia. Escreve como um ato de subversão e para alcançar uma respiração possível em conjunto com outras mulheres. É um livro colaborativo escrito apenas por mulheres.
“A máquina de moer Mulheres – política, produção e estética na pandemia” é uma coletânea de escritos que reúne mulheres envolvidas no movimento feminista, bem como na produção literária e na teoria feminista. A teoria feminista, como seu foco central, aborda a presença das mulheres tanto como objeto de análise quanto como construtoras dessa análise, sempre considerando as complexas interações entre as mulheres e a produção intelectual. A ação de reunir mulheres para escrever e contribuir para essa coletânea é, em si mesma, uma prática que visa transformar a realidade atual.
O livro reúne as visões de autoras que, além de serem escritoras, também são pesquisadoras. Elas consideram a pesquisa como uma investigação prática que se baseia nas situações cotidianas que cercam as pessoas. A metáfora da “máquina de moer mulheres” é utilizada para discutir questões de política, trabalho e estética em meio à pandemia, uma realidade que se tornou ainda mais desafiadora devido à propagação do vírus. O foco do livro está na violência, abordando todas as suas manifestações perversas, como uma representação concreta do poder. Em outras palavras, o livro analisa como as mulheres estão sujeitas a diversas formas de poder opressivo e como a pandemia agravou essas situações, utilizando a metáfora da “máquina de moer mulheres” para ilustrar essa realidade.
No prefácio, Kassandra Muniz faz um resumo sobre a realidade das mulheres durante a pandemia, e em como ela deturpou os planos e consumiu o tempo de todas. E como tal fato foi intrigante, dada a questão que passamos muito tempo dentro de casa. Portanto, surge a questão: a pandemia é a causa disso, ou a máquina que desgasta as mulheres já estava em funcionamento há séculos? Preparar refeições, participar de reuniões e, ao mesmo tempo, cuidar das responsabilidades acadêmicas dos orientandos, enquanto auxilia na educação da filha, não é uma novidade.
Os textos apresentados abordam mulheres que perseveraram apesar das adversidades. Isso evidencia que existem inúmeras dificuldades e desafios, mas, ao mesmo tempo, uma multiplicidade de papéis protagonizados por mulheres. A habilidade de se reinventar destaca a influência e a presença das mulheres no mundo.
Os textos mencionados no livro tratam de mulheres que perseveraram apesar das adversidades. Isso evidencia que existem inúmeras dificuldades e desafios, mas, ao mesmo tempo, uma multiplicidade de papéis protagonizados por mulheres. A habilidade de se reinventar destaca a influência e a presença das mulheres no mundo.
O objetivo do livro e do nome é estreitar laços e estar mais em sintonia com os desafios que as mulheres enfrentam, desafios que poderiam ser resolvidos caso as instituições atuassem como parceiras comprometidas com a equidade e a justiça social. Nesse contexto, o livro parte da exposição de que esses espaços ainda não demonstram solidariedade com as diversas formas de opressão que as mulheres enfrentam simplesmente por serem mulheres.
No geral o livro fala sobre como o sistema de produção e reprodução social no capitalismo explora a mão de obra desvalorizada das mulheres. A ideia de que as mulheres conquistaram grandes cargos, mesmo que em proporções limitadas, é frequentemente apresentada como resultado da meritocracia, mascarando barreiras à mobilidade profissional feminina.
A máquina que mói as mulheres é a negligência para com as mulheres, principalmente aquelas afetadas pelo desemprego, subemprego, terceirização, sobrecarga de trabalho devido às jornadas triplas, aumento de mães solteiras e famílias solteiras por mulheres. É um sistema que destrói a existência de mulheres, e o livro detalha várias nuances que acontecem nesse sistema opressor.
Para esta edição do CAOS (Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia), baseado no tema “Psicologia e Atuação Psicossocial em Situação de Emergência”, será ofertado o minicurso intitulado como “Isolamento, distanciamento e impactos psicossociais – Violência Doméstica e Familiar na COVID-19: Realidade no Município de Palmas”.
Contextualizado sob os altos índices de violência durante a pandemia da COVID-19 que está em vigência no Brasil desde meados do mês de março de 2020, o minicurso será apresentado pela psicóloga Fernanda Barreira Brito (CRP: 23/970), que atualmente é especialista em Gestão de Saúde Pública, atua como membra atuante da Comissão Especial de Psicologia na Política de Assistência Social, foi eleita em 2021 como vice-presidente do Conselho Regional de Psicologia no Tocantins e é psicóloga do Centro Flor de Lis, onde as mulheres vítimas de violência são acolhidas e recebem orientação jurídica, atendimento psicológico e social.
A convidada abordará como o cenário das violências de gênero do município de Palmas-TO tem se comportado frente à pandemia do COVID-19. Enfatiza-se a importância do tema e o compromisso ético que as profissionais de Psicologia tem com o combate às violências, destaca-se o segundo princípio fundamental do Código de Ética Profissional do Psicólogo “O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Além disso, a psicóloga que ministrará o minicurso irá abordar sobre a prevenção a esse tipo de violência.
O minicurso acontecerá online e remotamente no dia 4 de novembro, a partir das 19h via Google Meet. Ao se inscrever no CAOS 2021, o inscrito poderá participar tanto da programação dos minicursos como dos demais eventos do congresso. Para mais informações acesse o link.
Compartilhe este conteúdo:
A mulher que olhou o mundo com os olhos de criança
12 de outubro de 2018 Maria Eduarda Oliveira
Personagens
Compartilhe este conteúdo:
Júlia Albuquerque Araújo, (conhecida como Juh), acadêmica na área de serviço social, é uma jovem nascida em 6 de maio de 2000 na região de Ceilândia (DF). Sendo a terceira filha de seu pai, e a segunda de sua mãe. Até seus quatro anos de idade relata ter tido uma infância comum, com uma família tradicional, seus pais e irmãos. “Preta de quebrada” é como gosta de ser referida, já que durante sua vida sempre morou em periferias.
Por meio da realidade em que ela foi inserida, absorveu os problemas que a rodeava de forma árdua, por meio da vivência. Sendo preta, favelada e mulher, sua vida não se diferiu de tantas outras, que foram jogadas a mercê da sociedade a partir dos poucos privilegiados. Mas por amor, sua vida baseia-se em uma narrativa cheia de superação, pesares e força para construir um mundo com uma realidade diferente. Ela é o exemplo das minorias que conseguiram seguir um destino diferente do predisposto a partir do que é oferecido socialmente, em um contexto de desamparo em diversos âmbitos.
Júlia não se contentou em apenas sonhar alto. Dentro de si, sabia que outras crianças e famílias precisavam de ajuda, amparo, e o básico para viver com dignidade. Iniciou então um projeto chamado, Unidos Por um Mundo Melhor (U.P.M.M). Inicializado em sua terra natal quando tinha apenas doze anos. Arrecadava doações, como, roupa, comida, além de levar momentos de divertimento e lazer para as crianças periféricas. Tudo isso possível pelas pessoas que se voluntariavam pela causa, e as empresas que comovidas pelo seu gesto a patrocinava. Júlia explica:
Se hoje existe a U.P.M.M é porque um dia eu não tive nada do que ela oferece. Ofereço a oportunidade de terem um dia de lazer, brincadeiras(…) ter um dia diferente, e acreditar em algo diferente. Tento fazer com que as pessoas se sintam importantes, que é o que cabe a cada um de nós fazermos. Tornando-se e tornando-as pessoas melhores.
Fonte: Arquivo pessoal
Para que ela chegasse a ter essa visão ampliada de seu próprio sofrimento, Júlia teve de passar por uma série de momentos dolorosos e extremamente difíceis. Sendo eles a separação de seus pais durante a infância, aos quatro anos. O pai enriqueceu e cuidou de sua outra família. Sua mãe, com quem ela morava, tornou-se usuária de cocaína. Em meio ao desinteresse e descaso dos pais, ela e seus irmãos foram abandonados, e acabaram ficando com a avó e tia. Ela relata: “algo que eu jamais ofereceria a alguém é a questão do abandono”.
As condições em que ela se deparou com seus novos responsáveis, foi também uma de suas problemáticas. A precariedade existia, mas de alguma forma, foi preenchida emocionalmente, a partir da fé, seus credos, e o zelo recebido da avó. Ela descreve um momento feliz de sua trajetória:
Se eu puder falar ‘pra’ ti qual foi o melhor momento da minha vida, foi quando eu morava com minha avó e não tinha nada, porque o nada que eu tinha era tudo, ‘tá ligado?’ E se era tudo o que eu tinha, então eu deveria dar todo o valor do mundo. Até hoje eu tenho um vestido verde com umas manchas roxas que ela fazia a mão, porque nós não tínhamos condição de comprar roupa. Naquele tempo eu odiava aquele vestido, achava muito cafona. Mas hoje, é a lembrança mais linda que eu tenho (…) O pouco que eu tive foi muito, e o necessário, para que eu aprendesse a dar valor aos mínimos detalhes.
Após alguns anos, sua mãe voltou grávida para busca-la, entretanto, ela nunca foi bem recebida, por ser a única filha negra. Sofreu agressões físicas e verbais por diversas vezes. Apesar de tudo, o hospital em que sua mãe trabalhava bancava uma escola de alto padrão pra Júlia, porém, a desigualdade social, e a inadequação a esse ambiente, esteve presente durante todo o tempo.
“Eu convivia com pessoas que tinham tudo, e eu não tinha nada. Para uma criança conseguir diferenciar essa situação, foi muito complicado” ela relata. A falta da presença contínua de um andaime, fez com que ela amadurecesse antes do tempo, e assumisse responsabilidades pesadas e precoces. Júlia foi uma criança com a infância negligenciada. Ela relata detalhadamente sobre:
Minha mãe nunca ficava em casa, então a partir dos cinco meses do meu irmão, quem foi mãe, fui eu. De ensinar a falar, a andar(…) hoje meu ‘pivetinho’ é lindo, moleque maravilhoso. Fui mãe aos doze anos de idade. Eu aprendi o que era amor com meu irmão. Era muita responsabilidade, eu era a mulher da casa. Eu com doze, minha irmã com treze, mas eu que comandava tudo. Ela tinha cabeça de treze, mas eu tinha cabeça de quinze. Minha mãe voltava aos domingos, e ela não gostava de me ver mandando em tudo, isso a deixava com mais raiva.
Foi a partir de suas vivências, que sua vontade de mudança foi fomentada. Suas observações para as disparidades sociais ficavam a cada dia mais visíveis. Ela relata como analisou seu contexto:
Eu estudava em escola particular no centro da cidade. Eu comecei a ter um contato com a sociedade de uma forma totalmente diferente. Convivi com os moradores de rua; conversei com eles, e entendi que tudo aquilo estava errado. Mesmo não entendo o motivo, eu precisava fazer alguma coisa. Foi quando me veio a ideia de fazer a U.P.M.M. Não sei como, nem para que, mas foi o que me salvou. Vi que tinha pessoas piores que minha situação, e pude ajudar mesmo que eu estivesse na pior também. Comecei a ‘trampar’ com moradores de rua, conhecer suas histórias, e ver que cada um é um mundo diferente. A gente pode fazer pessoas rasas verem sua profundidade. Não através de roupa e comida, mesmo que isso fosse ofertando, mas sim, fazendo com que se sintam importantes, vistas e sentidas.
Um de seus primeiros projetos aconteceu no hospital de base, em sua região, no dia das crianças. Onde tentou levar alegria aos corpos adoecidos daqueles que ali estavam. Sua experiência mais marcante foi com uma das crianças que estava em estado crítico do câncer. “Através do sorriso dele, pude perceber: o material não é nada”, ela conta. Foi ali que sua história de luta pela alegria daqueles em sofrimento iniciou; e continua até hoje.
Fonte: Arquivo pessoal
Antes de Júlia vir para a cidade onde mora atualmente, Palmas- (TO), ela abasteceu toda a comunidade de onde morava. Acabou por ser expulsa de casa pela sua mãe, e foi morar com o pai, que havia falido. Dessa forma vieram para a cidade mais nova do Brasil, em busca de melhorias de vida. Brevemente ela diz como se sentiu diante dessa mudança: “Aqui foi a nova oportunidade da tia Juh ser tudo o que ela queria ser (…) Hoje a Juh, é o sonho de uma menina de doze anos, que nunca achou que seria o que ela é hoje”.
Fonte: Arquivo pessoal
Seu psíquico foi fortemente conturbado durante toda sua vida. Teve de lidar com abandono, falta de suporte emocional e psicológico. Além das condições precárias e inadequadas. Viveu em lugares de pobreza e extremo risco, lidou com o racismo dentro de seu próprio lar, mas resistiu. Não teve tempo de ser criança, mas sonhou alto e além de sua realidade, assim como uma.
O desfecho de seu curso, foi controverso a todo seu estado de vulnerabilidade social e econômico. Talvez tenha vivido um fim diferenciado para sonhar um mundo melhor, e dessa forma, tornar as fantasias das crianças carentes uma realidade mais afável diante de tantas mazelas. Com suas atitudes de amor que vão muito além do imaginário infantil, ela transforma vidas com suas próprias mãos. Põe em rostos sofridos, um sorriso de gratidão. Júlia, é uma grande mulher. Júlia, é uma mulher negra brasileira, é um exemplo de ser humano. Seus olhos transbordam esperança, assim como o das crianças que tiveram a sorte de encontrá-la em seu caminho.
Hoje o mundo amanheceu mais triste. A tragédia que aconteceu na boate em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, estampou todos os noticiários desde ontem, abalando o país. Por todos os lados, não se fala em outra coisa. O incêndio que matou mais de 240 pessoas e deixou centenas feridas, física e psicologicamente, foi uma catástrofe, humana, de grandes proporções.
Diferentemente das catástrofes naturais, o incidente foi um fenômeno que combinou as marcas do capitalismo voraz com um liberalismo econômico e político. Um capitalismo que prioriza os valores, financeiros, que fique claro. As portas da boate foram fechadas, mesmo sob o conhecimento de que havia um incêndio. Esperavam que os clientes pagassem a conta antes de sair. E centenas deles pagaram, com a vida.
Um capitalismo que prioriza o lucro, em detrimento das pessoas, e de sua segurança. Não haviam saídas de emergência. Por onde esperavam que as pessoas saíssem em caso de força maior? Isso não era importante. O mais importante é que a casa estivesse cheia, e o bar funcionasse a todo vapor.
Os disciplinadores, na porta da boate, que serviam para manter todos na fila, dóceis e organizados, ao bel prazer dos proprietários do estabelecimento, se tornaram mais um obstáculo para que as pessoas pudessem se salvar.
Marcas de um capitalismo que privilegia o espetáculo, a despeito das suas consequências. Como não supor que o uso de fogos de artifício poderia não terminar bem? Mas todo e qualquer recurso era útil para tornar o show mais atrativo. Quanto mais animado o público estivesse, melhor.
Aliado a este aparente caos, para reforçar a ideia de que tudo está sem controle, há um liberalismo, sobretudo político. O governo fecha os olhos. Não só para as casas de show, mas todo tipo de entretenimento. Como o alvará de funcionamento estava vencido desde agosto? Não só em Santa Maria, mas por todo o país, há uma ausência de total de fiscalização e legislação.
Fica claro que o acontecido, ainda que se trate de um “acidente” foi fomentado pela lógica capitalista baseada no consumo e na produção de desejos, e pela negligência, sempre crescente, do poder público. É evidente que quando a produção e a direção da economia não são planejadas, quando não há regulação por parte do governo, muitas incoerências e contradições internas se criam. Às vezes com efeitos devastadores.