Alta performance: atingindo sua máxima capacidade com saúde mental

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Muito se fala na atualidade sobre a alta performance, vemos nas mídias sociais diversas pessoas incentivando os seguidores a alcançar essa alta performance, falando sobre desempenho nas diversas áreas daquilo que nos cerca, como vida profissional, social, familiar, etc. Mas sabendo que falar muito sobre um assunto, nem sempre indica um conhecimento correto sobre o mesmo, apresentamos abaixo uma entrevista com o psicólogo Vitor Costa de Siqueira (CRP-09/17562) para falar um pouco sobre o assunto.

(En)Cena – Na visão de profissional da saúde mental, o que seria alta performance?

Bom, a primeira coisa que nós devemos entender, é que NÃO é alta performance. Durante muito tempo, e acho que até hoje, muitos acreditam que alta performance é dormir o mínimo possível para fazer o máximo possível, até mesmo para estudar e/ou atingir seus objetivos, e tem aquela frase que eu odeio “estude enquanto eles dormem”, isso é uma grande besteira. 

Muitas vezes a gente acha que dá pra performar sem ter um sono de qualidade, sem se conhecer, sem estar em um ambiente saudável, sem uma alimentação regulada. Nós somos seres integrais, ou seja, fisiológico, temos nossas cognições, ambiente e nossa parte de espiritualidade, então olhando por esse lado da integralidade, alta performance é atingir o máximo da sua capacidade naquilo que você se propôs.  

Olhando por exemplo para a vida de um atleta; se uma atleta e seu técnico focar só na área dos treinos físicos ele vai conseguir chegar a um preparo razoável, mas como saber se ele está se sentindo de fato seguro para o próximo jogo, se ele tá ansioso e saber até sobre suas necessidades básicas que o ser humano precisa para suprir, nós só iremos ver realmente suas falhas durante a sua performance na partida e após suas falhas técnicas, seu técnico irá puxar ainda mais do seu atleta até ele chegar a um nível de alto esgotamento, que é o burnout até ele ser descartado e outro jogar tomará seu lugar. Na clínica mesmo, com alguns pacientes meus que são atletas de alta performance, eu vejo uma ansiedade muito grande antes dos campeonatos, e a gente vai tentar sempre descobrir quais são as crenças e os traumas que estão por trás dessa ansiedade e as crenças desvalor são as primeiras barreiras ´para poder não atingir essa alta performance, também é bom entender o que está acontecendo nas outras áreas da vida, nos relacionamentos, amizades, estudos, família, esse ambiente pode ser um ambiente muito estressógeno para o atleta. Então, respondendo o que é a alta performance, seria atingir sua máxima capacidade com saúde mental olhando para o ser humano dessa forma integral. 

(En)Cena – Qual o impacto de se estabelecer uma rotina para o alcance da alta performance?

Nosso cérebro ama rotina, como todas as suas tarefas da semana que já estão pré-estabelecidas na agenda você diminui o gasto energético do seu cérebro então o primeiro impacto que a gente pode colocar é esse menor gasto energético do cérebro e com esse menor gato, consequentemente você ganha mais tempo e energia pro seu organismo, uma segunda coisa é que a rotina serve como um GPS pra você, lá tem todas as coordenadas para o seu dia, semana e/ou mês e até do ano, então você tem aquela sensação de estar sempre produzindo, e aquele sentimento de “não estou produzindo”, “não estou fazendo nada”, “tô atoa”, diminui, a sensação de estar perdendo tempo também diminui, e a melhor de todas é diminuição da procrastinação, você sabendo o que tem que fazer, no momento que tem que entregar, isso dá uma sensação de controle e autonomia. Terceiro lugar é que a rotina deixa nosso cérebro menos ansioso  e menos estressado. O que faz nosso cérebro tão ansioso é o futuro, a gente não sabe o que vai acontecer, e acaba pensando demais sobre o que pode acontecer e muitas vezes nada daquilo que a gente pensa acontece, então você tendo uma rotina o número de surpresas e novidades diminui, porque praticamente todos os dias começam a se tornar os mesmo, igual assistir o mesmo filme todos os dias, gerando menos ansiedade, menos estresse e menos variação de humor no seu dia, e por último existe aumento de foco e atenção, porque você tira as suas preocupações do futuro e tirando essas preocupações, você alivia o seu córtex pré-frontal que é o que ajuda mais ainda na performance, pois é ele que nos ajuda a tomada de decisões assertivas.

(En)Cena – E sobre as pessoas que não conseguem manter uma rotina? Exemplo: alguém que trabalha viajando bastante!

Primeiro precisamos entender que todos nós temos obrigações, responsabilidade e principalmente prioridades, uma analogia que eu gosto de fazer é que a vida é um jogo e cada parte da nossa vida é uma parte desse jogo. Quando a gente fala de jogo ele tem um objetivo e para atingir cada objetivo existe uma regra, e esses objetivos e regras é o que dá sentido ao jogo, então por exemplo, se eu pegar uma bola e chutar ela o mais forte pra ela ir o mais longe possível, não faz sentido nenhum, mas quando você faz isso dentro de uma quadra e existem delimitações, regras, e você chuta lá do meio do campo e faz um gol, você atinge um objetivo, só faz sentido se têm isso. Então se eu for pegar esse indivíduo que tem essa dificuldade de estabelecer rotina, primeiro eu perguntaria se ele quer performar, se ele deseja ser uma pessoa de alta performance na área dele e se ele responder que sim, a gente precisa que ele entenda quais são as regras para esse novo jogo que ele vai entrar e quais são o patamar dos jogadores que ele vai entrar, ele precisa entender o que ele precisa abrir mão, o que ele precisa fazer mais, ou seja conscientizar sobre esse novo jogo e a partir da compreensão dessas regras, criaríamos um plano pra ele, do ponto que ele está para o ponto que ele quer chegar. Criando um plano que dê a ele mais autonomia e uma rotina mais adaptativa, para que ele possa desenvolver novas formas de trabalhar. Uma coisa que eu sempre digo é que você só é livre quando tem esses limites, precisa-se entender aquilo que te limita e buscar então aprimorar-se dentro desses limites. 

(En)Cena – Quais são os pilares fundamentais para a alta performance?

A gente olha para as pessoas que têm muito sucesso e que até como consequência ficam famosas e são super reconhecidas, mas quando a gente olha para o resultado somos muito injusto com a pessoa que atingiu e com nós mesmos. Quando a gente começa construir uma casa firme, é necessário ter um fundamento e depois começa a construir com os pilares e tijolinho por tijolinho, e o que seriam esses pilares, fundamentos e tijolinhos para a alta performance…? O fundamento é o autoconhecimento, saber quem você é, qual a sua identidade, quais as suas paixões, é preciso entrar consigo mesmo e descobrir qual o seu propósito, usando aquela analogia do jogo, se você ama o jogo e é apaixonado pelo processo a chance de você desanimar com as falhas, erros e falta de conhecimento são bem menores comparado com aqueles que estão no jogo apenas pelo dinheiro e fama, e se autoconhecer é fundamental. Outra coisa, os pilares dessa casa, o pilar dessa casa deve ser o controle emocional, uma pessoa que não tem controle emocional está fadada se destruir e reconstruir, o controle emocional é uma sustentação, no meio das tempestades ela te dá segurança e isso faz  com que você não perca as coisas, e você ganha tempo, se torna menos reativo as dificuldades do dia a dia, te permitindo olhar para o futuro e mostrar pra você e pro seu sistema de recompensa que o prêmio final vale muito a pena e que não vai ser uma tempestade que vai fazer você desistir. Já que falamos de fundamentos e pilares vamos para os tijolos, esses tijolos são: rotina e disciplina, já falamos um pouco sobre rotina, mas a disciplina, eu costumo dizer que ela possui duas lentes, repetição e consistência, existe uma teoria que pra você ficar bom em algo, você precisa desprender dez mil horas naquela atividade, em termos práticos, isso significa que seriam necessários vinte horas semanais, em quinhentas semanas ou cerca de três horas por dia em dez anos de prática para poder alcançar o nível de expert. Se você ver o treino de um atleta de alta performance vai perceber essas duas lentes sendo usadas, fazem o mesmo treino inúmeras vezes no dia, durante todos os dias. Então agora você sabendo disso, de como funciona essa construção, os fundamentos, sabendo que é atingível, não é fácil, mas é atingível o melhor é ter consciência no que te dá tesão em fazer, no que realmente você é apaixonado, você ama o processo e gosta de estar fazendo e seguir esses passos fundamentais para alcançar a alta performance. 

(En)Cena – Como a terapia pode ajudar na busca pela alta performance? 

 Voltando a falar sobre a integralidade do ser, nós não podemos nos esquecer das nossas contingências, e a terapia consegue abordar todas elas, principalmente a psique humana, uma coisa interessante que o Dr. Psicólogo William James fala é que o nosso corpo influencia nas reações psicológicas tanto quanto nosso psicológico influencia nas reações corporais, exemplo, se eu vejo um cachorro bravo correndo atrás de mim essa imagem vai acionar o sistema de alerta e liberar minha reação de luta, fuga ou congelamento através desse estresse, então meu coração vai acelerar, pupila dilatar, sistema digestivo trava, boca mais seca, então o que aconteceu foi que o medo do cachorro, que é um produto da nossa cognição modulou as reações do nosso corpo, mas também pode acontecer o contrário, você começar a ficar ansioso e por estar ansioso você começa a mandar comandos pro seu corpo se acalmar, como controlar sua respiração, faz um aterramento, bebe água fazendo com que essa ansiedade possa diminuir e até acabe, nesse caso a ansiedade que é o produto da nossa cognição foi modulada através do nosso corpo, então a terapia contribui visando toda essa parte integral, ela contribui para a alta performance encontrando todos os bloqueios, tudo que impede o cliente a atingir sua máxima capacidade, e essas coisas que bloqueiam são os traumas, esses traumas tiram a auto regulação do indivíduo, os fazem acreditarem naquelas crenças limitantes e tiram a autonomia de suas escolhas. Muitos jogadores não conseguem performar como performaram antes, não porque não treinam como antigamente ou porque o técnico está pegando leve com eles, mas são traumas decorrentes de uma vida cheia de estresse que geram disparadores para esses traumas antigos, gerando ansiedade e se não houver a terapia isso muitas vezes pode ser tratado como uma falha física e aí o técnico vai fazer com que o atleta treine mas ainda, chegando a exaustão, com mais intensidade, mas ele não atinge sua máxima capacidade e pior ainda, o treino pode fazer com que ele tenha mais lesões e fortaleça suas crenças negativas, olhando para isso podemos perceber que a alta performance só pode acontecer se houver saúde mental, por isso a terapia e faz tão necessária. 

Fonte: Pixabay

(En)Cena – Sabendo da importância da saúde mental para a alta performance e pensando nas pessoas que não tem condição de arcar financeiramente com um processo terapêutico quais seriam as formas da busca pela saúde mental?

Essa dica vai para todo mundo, para quem tem e para os que não tem condição também. Existem três grandes plataformas que contribuem para nossa saúde mental, a primeira é o sono regulado, o segundo é o exercício físico e a terceira a alimentação saudável. Isso parece uma coisa meio besta e até óbvia, mas todo paciente que eu inicio um processo, lá no nosso primeiro encontro fazendo anamnese eu já pergunto sobre seu sono, se ele tem um sono de qualidade, se ele dorme bem, se não dorme, porque isso é um grande indicador de sucesso para a nossa terapia. O sono regulado traz inúmeros benefícios para o nosso cérebro, trás maior concentração, maior foco intencional, aumenta nossa capacidade  de raciocínio, aumenta a capacidade de insights e atividades também, e tantos outros que vão contribuir para a sua performance. O exercício físico também, que é a segunda parte, é o melhor estresse que você pode dar para o seu corpo, ele ajuda na liberação de vários neurotransmissores benéficos para o seu cérebro, mas dois que são muito importantes a endorfina e serotonina, que são hormônios da satisfação, prazer e felicidade, e quando você libera esse estresse bom, isso ajuda na despolarização do estresse ruim que é o da rotina, do dia a dia, e essa despolarização é o que permite você dormir com mais facilidade, podemos ver então que um ajuda o outro. Temos também a alimentação saudável, que não tem como ficar separado dos outros dois, se fazemos exercícios físicos precisamos nos alimentar bem, nosso corpo e nosso cérebro vive com aquilo que ingerimos, se sua alimentação é só feita de hiper palatáveis, processados, cheia de açúcar, sódio, gordura trans, você não pode cobrar que seu cérebro seja super produtivo, inteligente, sem estresse, disposto e a alimentação saudável não precisa ser complicada. Essas três plataformas são bem básicas, mas se você conseguir regular tudo isso, vão te fazer melhor do que 80% da população, e talvez uma dica extra que eu possa contribuir para essa busca pelo autoconhecimento e atingir alta performance é a meditação. A meditação é praticada há milhares de anos e super difundida no oriente, mas agora há poucos anos atrás os cientistas começaram a pesquisar e conseguiram comprovar os benefícios que ela traz para o nosso cérebro e nosso corpo, então sabendo disso, eu sugiro que você também faça uso dessa prática milenar e usufrua desse benefício para sua saúde mental, pode fazer isso antes de dormir para seu corpo relaxar e ajudar a dormir, ou ao acordar para ter um dia mais disposto. 

(En)Cena – Qual a mensagem que você gostaria de deixar para os leitores?

A mensagem que eu gostaria de deixar pra quem chegou até aqui é: coloque sua saúde mental em primeiro lugar, aprenda a curtir o processo e ver os resultados apenas como consequências desse processo, conheça muito bem as regras do jogo e saiba jogar e com elas e NUNCA deixe de ser quem você é.

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Adaptação ao novo normal – O desafio de formar na pandemia

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Um dos grandes desafios que todo o mundo está enfrentando com certeza é a pandemia pelo coronavírus. Além de trazer uma nova realidade e um novo “normal”, tivemos que aprender a conviver com a distância, descobrir novos talentos e também nos reinventarmos diante deste novo cenário.

Como estudante de Psicologia, foi um grande susto vivenciar um fato como este, já estudamos várias pandemias que aconteceram no decorrer dos séculos e décadas, mas nunca esperei que eu pudesse viver algo do tipo. Inicialmente seria apenas uma quarentena, que começou a se estender por dois, quatro, seis meses e depois um ano.

Inicialmente quando as aulas pararam me senti assustado e sem saber o que poderia acontecer, mas a esperança de que as aulas voltassem e tudo normalizasse estava presente. Tivemos que nos adaptar a um novo contexto, as aulas não poderiam voltar de forma presencial e, portanto tivemos que aderir ao modelo de ensino remoto.

Fonte: Pixabay

No primeiro foi um pouco estranho, muitos colegas não conseguiram se adaptar e até trancaram o curso para esperar o retorno das aulas presenciais. Este retorno a cada semestre era adiado e então não tivemos escolha, a não ser nos adaptar a isto.

Cheguei ao último ano de curso e vi vários colegas que se formaram na modalidade online e foi tudo diferente. O sonho de estar no auditório com a família, amigos e a emoção comovendo todos, deu lugar a uma tela de computador onde tudo era transmitido através de uma videochamada.

Sinto-me privilegiado de mesmo diante deste cenário poder ter a oportunidade de continuar estudando e contribuindo para o meu sonho de me tornar um psicólogo. Mesmo tendo que me adaptar, eu me sinto confiante de não ter desistido. Não foi fácil, as aulas remotas muitas vezes eram pesadas e cansativas e chegava a pensar se estaria mesmo aprendendo.

Fonte: encurtador.com.br/gruI7

Com o avanço da vacinação, fico mais alegre de ver que as matérias de estágios voltaram de forma presencial, mas tenho muitas saudades de andar pelos corredores da Ulbra, encontrar os amigos, professores, dividir uma sala de aula, reclamar do frio do ar condicionado e vivenciar a experiência de estar em uma sala de aula. Ainda não é o momento de voltarmos ao total, mas a alegria de ver que as pessoas estão conseguindo ficar imunizadas, me deixa mais tranquilo de fazer a minha parte tomando todos os cuidados.

Com o início do estágio, essa confiança retornou com mais força e me sinto mais próximo de alcançar o meu objetivo. Confesso que ainda tenho a esperança de que quando for a minha vez, eu esteja no auditório para conseguir me formar. Acredito que o grande êxito da faculdade além de poder exercer a profissão, é ver as pessoas que amo celebrando comigo a vitória de conseguir finalizar uma parte da vida acadêmica, pois sei que um psicólogo nunca deve parar de estudar.

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Os papéis que se formam no grupo à luz de Pichon-Rivière

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Pichon-Rivière era um psicanalista francês, teve suas primeiras experiências com grupo em Rosário na Argentina, onde por volta de 1958, dirigiu grupos heterogêneos através de uma didática interdisciplinar. Onde seguia os conceitos da psicologia social, afirmava que o homem desde seu nascimento encontrava-se inserido em grupos, o primeiro deles a família, podendo ampliar esse raciocínio a amigos, escola, trabalho e sociedade. Pensava ser impossível conceber uma interpretação de ser humano sem levar em conta seu contexto, ou a influência do mesmo na constituição de diferentes papéis que se assume nos diferentes grupos pelos qual os indivíduos passam (CASTANHO, 2012).

Fonte: encurtador.com.br/duvLX

Pichon estabeleceu inicialmente que, ao se pensar o que ocorre em um grupo, deverá se ter em mente duas perspectivas nomeadas e definidas da seguinte forma: a) vertical: assinala tudo aquilo que diz respeito a cada elemento do grupo, distinto e diferenciado do conjunto, como, por exemplo, sua história de vida e seus processos psíquicos internos; b) horizontal: refere-se ao grupo pensado em sua totalidade.

Ao apresentar os dois eixos propostos por Pichon, Castanho (2012) enfatiza que em sua experiência didática, o eixo horizontal descrito acima, cria estranheza e muitas dúvidas aos profissionais ou alunos que se iniciam no campo dos estudos grupais pela primeira vez.

O autor entende que não é fácil introduzir esse paradigma fora da dimensão individual, e que o grupo é diferente da soma das partes dos indivíduos que o compõem. Continua explicando que os pesquisadores do campo, sem dúvida alguma, encontraram um “achado” (grifo do autor) com essa noção de horizontalidade; a concepção de que o grupo é diferente da soma dos seus membros, é tão contundente que teorias psicanalíticas de grupo incorporaram em seus estudos esse conceito.

Adentrando ao contexto dos estudos de Pichon, foi desenvolvida a técnica do “grupo operativo” (grifo nosso), concebendo grupo operativo como aquele centrado em uma tarefa de forma explícita, como: aprendizado, cura, diagnóstico etc.; além de outra tarefa implícita à primeira, ou seja, inconsciente, conforme Castanho (2012).

Dentro desta concepção, acima descrita, esse conceito foi se desenvolvendo de forma a possibilitar a compreensão do campo grupal como estrutura em movimento, o que deixa claro o caráter dinâmico do grupo, que pode ser vertical, horizontal, homogêneo, heterogêneo, primário ou secundário, segundo Baremblitt (1986).

O objetivo da técnica é abordar, através da tarefa, da aprendizagem, os problemas pessoais relacionados com a tarefa, levando o indivíduo a pensar; o indivíduo “aprende a pensar” (grifo do autor), passando de um pensar vulgar para um pensar científico. Sendo assim, a execução da tarefa implica em enfrentar alguns obstáculos que se referem a uma desconstrução de conceitos estabelecidos, desconstrução de certezas privadas adquiridas (zona de conforto), conforme Baremblitt (1982).

O autor enfatiza que o grupo implica em trabalhar sobre o objeto-objetivo (tarefa explícita) e sobre si (tarefa implícita), buscando romper com estereótipos e integrar pensamentos e conhecimentos. Assim, entrar em tarefa significa o grupo assumir o desafio de conquistar o desejo na produção e a produção no desejo.

Fonte: encurtador.com.br/dyKUY

Antes de entrar em tarefa o grupo passa por um período de “resistência”, chamado por Pichon (1988) de Pré-tarefa, onde o verdadeiro objetivo, da conclusão da tarefa, não é alcançado. Essa postura paralisa o prosseguimento do grupo, realizam-se tarefas apenas para passar o tempo, o que acaba por gerar uma insatisfação entre os integrantes.

Geralmente ocorrem neste período tarefas sem sentido, onde fica faltando a revelação de si mesmo. Para o autor, somente passado este período, o grupo, com o auxílio do coordenador, entra em tarefa, onde serão trabalhadas as ansiedades e questões do grupo.

A partir dessa primeira etapa, elabora-se o que Pichon (1988) chamou de “projeto”, onde aplicam-se estratégias e táticas para produzir mudanças. A intersecção entre a verticalidade e a horizontalidade, elencada em parágrafo anterior, permite aparecer os primeiros diferentes papéis que os indivíduos assumem no grupo.

Os papéis se formam de acordo com a representação que cada um tem de si mesmo que responde as expectativas que os outros têm para com o indivíduo. Constata-se a manifestação de vários papéis no campo grupal, destacando-se: porta-voz, bode expiatório, líder e sabotador, conforme enunciado pelo autor (PICHON, 1988).

Porta-voz: é aquele que expressa as ansiedades do grupo, a qual está impedindo a tarefa; Bode expiatório: é aquele que expressa a ansiedade do grupo, mas diferente do porta-voz, sua opinião não é aceita pela grupo, pode-se entender que esse papel  assume caráter depositário de todas as dificuldades do grupo, sendo culpado de cada um de seus fracassos; Líder: A estrutura e função do grupo se configuram de acordo com os tipos de liderança assumidos pelo coordenador, apesar de a concepção de líder ser muito singular e flutuante. O grupo corre o risco de ficar dependente e agir somente de acordo com o líder e não como grupo; Sabotador: é aquele que conspira para a evolução e conclusão da tarefa podendo levar a segregação do grupo (PICHON, 1988).

Fonte: encurtador.com.br/fpJWX

Portanto a observação e análise dos papéis e a forma em que se configuram, constitui uma das operações básicas, tendentes à constituição de um “ecro grupal”, conforme Pichon (1998). Cada um dos participantes de um grupo constrói seu papel em relação aos outros; assim, de uma articulação entre o papel prescrito e o papel assumido, surge a atuação característica de cada membro do grupo.

O que tem que ser observado é que este papel se constrói baseado no grupo interno, representação que cada um tem dos outros membros, onde se vai constituindo o outro generalizado do grupo. O autor enfatiza que na relação do sujeito com este “outro generalizado” ocorre a constituição do rol operativo diferenciado, que permitirá a construção de uma estratégia, tática, técnica e/ou logística para a realização da tarefa (PICHON, 1988).

No início do grupo, os papéis tendem a ser fixos, até que se configure a situação de lideranças funcionais. Na maior parte das vezes, todo grupo denuncia, mesmo na mais simples tarefa, um “emergente grupal”, isso é aquilo que numa situação ou outra se enche de sentido para aquele que observa, para quem escuta (PICHON, 1988).

O observador observa o existente segundo a equação elaborada por Pichon: EXISTENTE >> INTERPRETAÇÃO >> EMERGENTE >> EXISTENTE.

O existente só ocorre se fizer sentido para o observador, a partir de uma interpretação, se tornando o emergente do grupo. Assim este novo emergente leva à um novo existente, o qual por sua vez, requer uma nova interpretação, que levará à outro emergente, conforme Bastos (2010).

O coordenador toma um papel muito importante, à medida que é dele que faz a mediação das interpretações, dando sentido ao grupo, orientando para a comunicação intergrupal para evitar se possível a discussão frontal. É esse sentido todo que mobilizará uma aprendizagem, uma transformação grupal segundo Bastos (2010).

Fonte: encurtador.com.br/mzMZ1

Adentrando a teoria do vínculo, ela é concebida em forma de espiral contínua, no contexto clínico, o que se diz ao paciente, determina uma certa reação desse paciente, que é assimilada pelo terapeuta, que por sua vez a reintroduz em uma nova interpretação. Para Pichon (1998), isto constitui um aprendizado, tanto do ponto de vista teórico, como do ponto de vista objetivo, pois à medida que conhece se conhece, ou à medida que se ensina, se aprende.

Esta série de pares dialéticos deve ser considerada para qualquer operação. Neste sentido, todo vínculo é bicorporal e tripessoal, ou seja, em todo vínculo há uma presença sensorial corpórea dos dois, mas há um personagem que está interferindo sempre em toda relação humana, que é o terceiro (PICHON, 1998).

Seguindo adiante com os conceitos de Pichon (1998), é necessário compreender teoricamente o “cone invertido” (grifo nosso), constituindo-se em um esquema formado pôr vários vetores na base dos quais se fundamenta a operação no interior do grupo. A partir da análise inter-relacionada destes vetores se chega a uma avaliação da tarefa que o grupo realiza. A explicitação do desenho do cone invertido (figura 01), diz respeito em sua parte superior, aos conteúdos manifestos e, em sua parte inferior, as fantasias latentes grupais.

Pichon (1998) propõe que o movimento de espiral que vai fazer explícito o que é implícito, atua ante os medos básicos, permitindo enfrentar o temor à mudança. Para tanto os vetores envolvidos no processo, são:

  1. Filiação e Pertenência – a filiação se pode considerar como um passo anterior à pertenência, é uma aproximação não fixa com a tarefa. Seriam aqueles que estão interessados pelo trabalho grupal, sendo exemplificado da seguinte forma: “os torcedores e não os jogadores”. Pertenência é quando os participantes entram no grupo, na cancha (em campo). Na dinâmica grupal, tradicionalmente é medida em relação à presença no grupo, à pontualidade do seu início, às intervenções, etc.
  2. Aprendizagem – se faz existir através da tarefa, permite novas abordagens ao objeto e o esclarecimento dos fantasmas que impedem sua penetração, permitindo a operação grupal. Para Pichon (1998), o indivíduo nos momentos de intensa resistência à mudança, voltaria regressivamente mais que a comportamentos próprios da etapa libidinal onde está predominantemente fixado (os chamados pontos de fixação da psicanálise), a repetir atitudes mal aprendidas, ou infantilizadas, que dificultaram sua passagem a uma etapa posterior.
  3.  Pertinência – é um terceiro vetor que surge da realização dos dois anteriores. Se mede pela quantidade de suor que tem a camiseta ao final da partida, é a realização da tarefa estratégica. O autor utiliza a metáfora do gol contra, seria o cúmulo da falta de pertinência. Cabe explicar que o alcance da pertinência grupal não é proposta como um ato de vontade, mas sim, como a expressão do desejo grupal, revelado na análise dos medos básicos.
  4. Comunicação – o lugar privilegiado pelo qual se expressam os transtornos e dificuldades do grupo para enfrentar a tarefa. Na medida em que cada transtorno da comunicação remete-se a um transtorno da aprendizagem, veremos os sujeitos grupais tratarem de desenvolver velhas atitudes, em geral mal aprendidas (infantilizadas), com a intenção de abordar os objetos novos de conhecimento. Este objeto pode ser nos grupos operativos, indistintamente, desde a compreensão de um conceito ao desenvolvimento de um processo terapêutico. Entendendo a aprendizagem, então, como a ruptura de certos estereótipos de comunicação e a obtenção de novos estilos, o que implica sempre reestruturações e redistribuirão dos papéis desempenhados pelos integrantes do grupo.
  5. Cooperação – é dada pela possibilidade do grupo fazer consciente a estratégia geral do mesmo. No movimento grupal, se manifesta pela capacidade de se colocar no lugar do outro.
  6. Tele – este vetor se refere ao clima afetivo que prepondera no grupo em diferentes momentos. É um conceito tomado da sociometria de Moreno, para assinalar o grau de empatia positiva ou negativa que se dá entre os membros do grupo. A fundamentação deste conceito parte da base de que todo encontro é na realidade um reencontro, ou como gostava de dizer o próprio Pichon (1998): “Todo amor é um amor à primeira vista” (grifo nosso). Isto quer dizer que o afastamento e a aproximação entre as pessoas de um grupo, não tem que ver com essa pessoa real presente, más, com a recordação de outras pessoas e outras situações que ela evoca.

CONE INVERTIDO E SEUS VETORES

Fonte: encurtador.com.br/wJW08

REFERÊNCIAS

BAREMBLITT, G. Grupos: Teoria e Técnica. Rio de Janeiro: Editora Graal, 1986.

BASTOS, Alice Beatriz B. Izique. A técnica de grupos-operativos à luz de Pichon-Rivière e Henri Wallon. Psicol inf., São Paulo,  v. 14, n. 14, p. 160-169, out.  2010. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-88092010000100010&lng=pt&nrm=iso>. Acesso: 12.09.2018.

CASTANHO, Pablo. Uma Introdução aos Grupos Operativos: Teoria e Técnica. Vínculo, São Paulo,  v. 9, n. 1, p. 47-60, jun. 2012. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806-24902012000100007&lng=pt&nrm=iso>. Acesso: 12.09.2018.

PICHON-RIVIÈRE, E. Teoria do vínculo. São Paulo: Martins Fontes, 1988.

__________________. O processo grupal. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

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Profissional do coach visita turma de Psicologia nas Organizações

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Nesta segunda-feira 30, a turma 0847 de Psicologia nas Organizações, sob docência de Carolina Santin Cotica, recebeu a visita do profissional do coach Sonielson Luciano Sousa. O convite foi feito por um grupo de acadêmicos da turma, como trabalho na disciplina, proposto pela sua docente. A visita ocorreu na sala 221 do Ceulp e contribuiu para o conteúdo trabalhado em aulas.

Turma 0847 de Psicologia nas organizações

Sonielson é mestrando em Comunicação e Sociedade; bacharel em Comunicação Social; sócio-fundador do jornal e site O GIRASSOL; professor universitário (Ceulp/Ulbra) nas disciplinas de Filosofia, Antropologia, Sociedade e Contemporaneidade; licenciado em Filosofia; graduando em Psicologia pelo Ceulp/Ulbra, personal Coach, editor e colaborador do portal (En)Cena, colaborador do Portal Educação, além de outros.

Ele inicia sua fala apresentando a origem do coach, que está atrelada à educação física, a qual buscava proporcionar um alto rendimento para os interessados. Segundo Sonielson, o profissional do coach auxilia uma pessoa não adoecida a criar estratégias para atingir seus objetivos, não se utilizando da denominação “paciente”, mas “cliente”. Essas estratégias são criadas depois de se identificar o perfil da pessoa e onde ela direciona mais seu investimento.

Apresentação de coach

Para o acadêmico e componente do grupo que fez o convite, Eduardo Busquets “foi um prazer convidá-lo, pois além de coach, é sociólogo, filósofo, antropólogo e tem excelente didática pedagógica. Estamos felizes por ele ter aceitado realizar a visita. Agora entendemos e compreendemos o assunto”.

Segundo a acadêmica e também componente do grupo que fez o convite, Lôrrane Araújo “ouvir um profissional do coach e futuro psicólogo, além de outras formações, foi esclarecedor, pois no meio profissional e acadêmico, o coach era ‘malvisto’, já que acreditava-se que ele queria fazer um trabalho que cabia apenas ao psicólogo. Esse pensamento é um grande equívoco, é uma questão ideológica. São trabalhos que podem andar juntos, independente da abordagem. As áreas se complementam”.

A visita de Sonielson fez parte de um ciclo de apresentações de trabalhos na disciplina em questão, os quais continuarão na próxima semana.

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