It – Uma Obra-Prima do Medo: o palhaço e os medos da infância

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“Crianças, a ficção é a verdade dentro da mentira, e a verdade desta ficção é bem simples: a magia existe.”
Stephen King

Stephen King e a obra-prima do medo

Este escritor é, talvez, a maior referência mundial no gênero terror/terror psicológico. Suas obras fazem jus ao sobrenome que soa tão assustador hoje em dia. Agora, imagine aos 19 anos, quando começou sua carreira como autor. Inspirado em obras como Hobbit, de J. R. R. Tolkien, o jovem King tentou criar o seu próprio universo, ser diferente, não se prender ao que havia lido e aprendido, por mais fascinante que fosse.

Uma curiosidade é que parte de suas histórias são ambientadas ou tem algum tipo de ligação com o estado do Maine, Estados Unidos, local onde nasceu. Por exemplo, as adaptações como Conta Comigo (1986), Cemitério Maldito (1989) e It: Uma Obra Prima do Medo (1990) se passam, de alguma forma, nesta localidade. Ou seja, não são apenas universos, mas ninhos, como se tudo tivesse acontecido com o próprio Stephen King.

O autor também tem a “mania” de criar personagens que o representam nos contos. Em “It”, o personagem William Denbrough (Jonathan Brandis) é um garoto que escreve contos de terror e sonha ser escritor. Já tinha feito isso com Gordie Lancaster (Wil Wheaton), em “Conta Comigo”. É uma forma mais enfática de mostrar a todos como funcionam seus pensamentos, como ele reagiu ou reagiria às situações que apresenta.

Curiosidades à parte, Stephen King é conhecido não só pelo talento em criar sensações de medo nos leitores/espectadores, mas por dar vida ou poder às coisas. Pennywise, por exemplo, é fruto da aversão coletiva instaurada após John Wayne Gacy ter assassinado mais de 30 crianças, em Chicago, se fantasiando de palhaço para atraí-las. E o filme aborda bem isso, já que “A coisa” também é um tipo de espírito maligno que se aproveita da inocência de indefesos.

Com o iminente lançamento do remake de It, King foi alvo de inúmeras críticas de palhaços profissionais. Para eles, o filme afeta o julgamento do público quanto à profissão, denegrindo suas imagens e, por consequência, influencia nos negócios. Em resposta, em seu perfil oficial no Twitter, o escritor disse:

Os palhaços estão com raiva de mim. Desculpem, a maioria (deles) são ótimos. Mas… crianças sempre tiveram medo de palhaços. Não matem os mensageiros pela mensagem

Stephen King.

Se pararmos para pensar, o autor tem razão. Em algum momento de nossas vidas sentimos medo de coisas ou seres de aparência amigável e que não deveriam representar um tipo de ameaça. Então, por que ainda sentimos medo?

O medo e as respostas emocionais condicionadas

Algo certamente curioso são os motivos pelos quais as pessoas sentem emoções, nesse caso o medo e aversão. Segundo Moreira e Medeiros (2007), os reflexos e respostas emocionais inatos são uma forma mínima de preparação para interagirmos com o ambiente que nos cerca, em relação de valor com a sobrevivência. As emoções não surgem “do nada”, precisam de um determinado contexto e interagem com nossa fisiologia, sendo em grande parte relações entre estímulos e respostas (comportamentos respondentes, ou seja, não controláveis).

Com os estudos Ivan Pavlov sobre os reflexos, atualmente sabe-se que os organismos podem aprender novos reflexos, e a isso se deu o nome Condicionamento Pavloviano. Desse modo, se os organismos podem aprender novos reflexos, também podem aprender a sentir emoções que não estavam em seu repertório comportamental quando nasceram (MOREIRA; MEDEIROS, 2007).

No filme, um grupo de amigos de infância é convidado a se reunir novamente em sua cidade natal, Derry, pelo único membro que permaneceu morando ali por todos esses anos, Mike Hanlon. Mike os convoca a cumprir uma promessa que fizeram quando crianças: regressar se “It” ou “A Coisa” voltasse a atacar. A partir desse ponto, o espectador passa a descobrir aos poucos quem é Pennywise e o que aconteceu em Derry.

Assim como ocorre naturalmente durante o desenvolvimento, Os Sete Sortudos (Lucky Seven originalmente) também aprenderam seus medos. O medo de cada um deles possuí características diferentes, que foram exploradas por Pennywise. Sobre o aprendizado do medo, no ano de 1920, James B. Watson (1878 – 1958) ficou conhecido com o caso do pequeno Albert e o rato. Watson tinha a intenção de verificar se o Condicionamento Pavloviano (aprendizagem de novos reflexos) teria utilidade no estudo de emoções.

Watson realizou seu experimento com Albert, um bebê de dez meses, para o qual foi apresentado um rato, do qual ele não apresentava medo (MOREIRA; MEDEIROS, 2007).  Emparelhou-se então o estímulo do rato com um barulho alto, o que fazia com que Albert se assustasse e chorasse. Após emparelhamentos sucessivos, somente a presença do rato fazia com que Albert tivesse medo. Com isso, Watson provou que as emoções podem ser aprendidas e modeladas (MOREIRA; MEDEIROS, 2007).

Cada flashback para a infância dos personagens mostra ataques “personalizados” que Pennywise realizou: como o medo que Richie tinha de Lobisomens, devido a um filme de terror; o ataque contra Eddie nos chuveiros, envolvendo sua vergonha quanto ao seu corpo e biotipo; e a experiência que Bill teve com a perda de seu irmão, relembrada no ataque que sofreu. O medo e a aversão tanto de Albert, quanto das crianças do filme, possuem a mesma natureza: Experiências condicionantes.

Coulrofobia: o medo de palhaços

De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V), a Coulrofobia (fobia de palhaços) se encaixa na categoria de Fobias Especificas nos Transtornos de Ansiedade. A característica essencial das fobias específicas é medo ou ansiedade acentuados acerca do objeto ou situação (estímulo fóbico), nesse caso, envolvendo figuras que representem palhaços. “O medo, ansiedade ou esquiva causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo” (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 197).

Seu desenvolvimento pode ser ocasionado geralmente por eventos traumáticos, observação de outras pessoas que passam por um evento traumático, um ataque de pânico inesperado na situação que virá a ser temida ou ainda por transmissão de informações (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). Dessa maneira, a polêmica envolvendo tanto o filme de Tommy Lee Wallace, quanto o livro de King, se deu pelo aumento de casos de Coulrofobia, principalmente nos Estados Unidos.

“Eu sou todo pesadelo que você já teve.”

 

Essa série de elementos aversivos para os personagens também têm um apelo para o espectador (vale aqui uma menção à cena do bueiro, por exemplo), somado à aparência e comportamento de Pennywise, incomodam em um horror diferente do convencional. Ao invés dos sustos sucessivos comuns nos filmes do gênero, IT tem o poder de literalmente perturbar e afligir a quem assiste, algo que seria um ponto interessante a ser explorado no reboot de 2017, que infelizmente não contará com a empolgante atuação de Tim Curry.

REFERÊNCIAS:

MOREIRA, Márcio Borges; DE MEDEIROS, Carlos Augusto. Princípios básicos de análise do comportamento. Artmed Editora, 2009.

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V). Trad. Márcia Inês Corrêa Nascimento et. al. 5. ed.  Artmed, 2014.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

IT – UMA OBRA-PRIMA DO MEDO

Diretor: Tommy Lee Wallace
Elenco: Tim Curry, Richard Thomas, Annette O’Toole, Jonathan Brandis, Brandon Crane;
País: EUA
Ano: 1990
Classificação: 16

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Casa de Bonecas

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Definitivamente o grande espetáculo da vida começa às seis da manhã. Como cheguei a essa conclusão? Fazendo uma breve análise do meu cotidiano. E foi durante essa análise que tergiversei em alguns questionamentos. Será que alguém já parou para pensar em como os fatos do nosso dia a dia são repetitivos? No quanto perdemos tempo? Que estamos sempre correndo em defesa da próxima parada? Eu parei para pensar. Enquanto divagava, lembrei-me, assim do nada, ou quase acidental, do palhaço. Aquele mesmo do circo, que faz todos os dias as mesmas piadas num único quadro, e quando o espetáculo chega ao fim, ele tira a maquiagem e volta para a sua vida, onde boa parte de suas piadas não surtem o menor efeito nas suas tarefas diárias, e na sua missão de ser eternamente engraçado. Um iludido! É assim que eu defino o palhaço.

E como defino o ser humano no espetáculo da vida diária? Um enforcado na trama cotidiana! É assim que defino o ser humano, especialmente aquele como eu, que tem por obrigação acordar todos os dias às seis da manhã e encarar uma dura jornada de trabalho. Eu sou um desses. Há quem diga que somos cidadãos respeitáveis e trabalhadores. Pura poética. Dispensaria esses adjetivos numa boa para cairmos uma infinita discussão sobre poesia, mas outra hora, pois agora preciso trabalhar e garantir o meu sustento.

E assim, às seis da manhã, eu acordo. O dia me sorri meio sem graça, com reticências, e eu lhe devolvo um sorriso mais sem graça ainda. Levanto-me e começo a minha feliz rotina. Tomar banho, escovar os dentes, tomar café, uma bela maquiagem para disfarçar o cansaço e finalmente, rua.

Todo dia é a mesma coisa, saio de casa correndo. Sempre me atraso, atrapalhada na escolha da sombra na paleta de cores do estojo de maquiagem. Pego um ônibus lotado e vou à luta. Não fosse por um detalhe, juro que gostaria de ser simplesmente teletransportada de casa para o trabalho, mas é esse pequeno detalhe faz toda a diferença no meu dia.

Todos os dias quando estou a caminho do ponto de ônibus eu me deparo com uma cena um tanto quanto curiosa. Passando pela rua onde moro, as seis e quarenta e cinco da manhã, vejo duas meninas construindo uma casa de bonecas. É simplesmente fantástica a maneira com que elas começam a construção, uma disposição invejável, e lembra – toda essa disposição, as seis e quarenta e cinco da manhã – num horário onde as crianças costumam estar dormindo, mas elas não, elas estão lá, construindo uma casa de bonecas.

De repente, como num passe de mágica as bonecas saem voando das caixas e ganham vida. Nesse momento eu paro e indago: e nossas vidas? Comparo-me com aquela boneca e de fato eu sou aquela boneca, e não só eu, todo ser humano pode ser comparado àquela boneca, pois vivemos todos na grande casa do universo manipulados pela menina Deus que todos os dias tira-nos da sua caixa e nos faz viver. Simples assim.

Admirável é a vida das bonecas, tudo acontece num passe de mágica. Bem que nossa vida poderia ser assim. É tudo tão alucinante na vida do ser humano que às vezes desejamos estar sonhando, ou que tudo não passasse de um engano, que vai acabar num piscar de olhos. Tá vendo? Já passou. Nada é perfeito.

O que mais me chama atenção é a maneira com que as meninas constroem a vida de suas bonecas, as meninas aparentam ter de seis a sete anos de idade, e já sabem manipular a vida como se tivessem toda experiência do mundo. Elas brincam de seriedade. E Deus? Será que é assim que Deus manipula nossas vidas? Decidindo nossos destinos num simples uni-duni-tê?

E eu fico lá, completamente abobalhada diante da cena, esqueço até que estou atrasada e preciso ir trabalhar, preciso correr para pegar o ônibus. As bonecas esperam as meninas, mas meu ônibus não. Com muita tristeza me despeço das meninas e vou ao trabalho.

Dia desses, uma das bonecas estava atrasada para uma reunião no trabalho, saiu às pressas, tomou o primeiro ônibus que passava lotado. Equilibrando-se entre um passageiro e outro, ela tentava terminar a maquiagem. Tão distraída estava que nem percebeu quando o ônibus chegou a sua parada. Desceu rápido, e como se estivesse no automático foi seguindo as pessoas que estavam em sua frente. Ouviu um barulho, gritos, desespero e foi na onda. Gritou, sofreu, perdeu-se em meio ao tumulto sem nem ao menos saber o que acontecia.

Quando caiu em si, percebeu que tudo não passava de uma simulação, era um falso acidente, um falso salvamento apenas para mostrar os perigos do trânsito. Foi na valsa, deixou-se levar. Refeita do susto, desafinou no coro dos contentes, saiu do mar gente e voltou à vida real, seguindo para o trabalho, apenas tentando entender aquele quadro diante de seus olhos.

Quando a boneca está atrasada ela sai voando nas mãos da menina e chega onde quer. E eu? Quem vai me fazer voar até o ponto onde preciso chegar? E a menina? Pobre menina. O que vai ser dela quando cair na real e descobrir que sua vida é um verdadeiro atraso? O que vai ser dela quando ela resolver sair voando, literalmente, se jogando da janela de um prédio? O que vai ser? A menina Deus não nos ensinou a voar, que pena. Mesmo assim, o que vai ser da pobre menina? A boneca não pode chorar por ela num momento de dor. Eu não posso chorar por ela assim como ninguém pode chorar por mim nos meus momentos de loucura. O que será de nós? Qual será o resultado de nossas vidas?

Seria tão fácil ser como as bonecas, não ter preocupações, não ter dor, não ter fome, não ter morte, nada. E de quando em quando, ter amor. Ledo engano. Elas têm preocupações sim.

Aí chega a hora do almoço, meu Deus, que felicidade! Parar no meio de tudo e comer. Corro pra casa e, quando passo pela casa de bonecas, tomo um susto daqueles. Lá estão elas, as minhas queridas bonecas, completamente soterradas no grande monstro chamado rotina.

Incrível. Em apenas algumas horas tudo mudou, o local onde antes se iniciava o projeto da casa agora se tornou uma grande cidade, cheia de casas, ruas, vizinhos, lojas, tem de tudo. O mais surpreendente foi ver a quantas anda a vida das bonecas. Alucinante. Uma das bonecas está casada, tem dois filhos e vive reclamando de dores nas costas, acha até que será necessário fazer fisioterapia. Anda de um lado para o outro sem saber se leva à filha caçula para a aula de dança ou sai para fazer as compras do mês, pois precisa lavar roupas e acabou o sabão. Liga a TV e uma novidade lhe conforta, finalmente a mocinha vai descobrir que sua grande amiga não passa de uma mulher má que a todo custo quer roubar-lhe seu grande amor. Ah, o que seria da vida não fossem as novelas! E mais, após a grande notícia, outro alento lhe conforta a alma, dez por cento de desconto no preço da faca de cerâmica. Ela corre até a gaveta do armário e indaga-se: pra que tanta faca meu Deus? Gaveta lotada, coração apertado, mas ainda tem espaço, cabe sim mais uma. Toma a filha caçula em uma mão, na outra o celular e enquanto manobra o carro na garagem liga para o número milagroso que irá resolver todos os seus problemas. Ela agora terá sua faca de cerâmica também. Opa. E aula de dança da filha caçula que já começou e ela nem saiu de casa? Ah, pequena boneca, esse problema não há zero oitocentos que resolva. Já outra boneca é solteira, trabalha em uma grande empresa, não ganha muito nem pouco, apenas o suficiente para viver em conforto. Foi mãe aos dezessete. Casou-se, separou-se e ainda lembra bem daquela noite de primeiro encontro, só não lembra mesmo qual era a música que tocava na boate. Detalhe. Mero detalhe, seu foco agora é outro. Nesse momento ela esta realizando um sonho antigo, caminhando com os pés descalços pelas areias da linda praia de Copacabana. Sim, a boneca esta no Rio de Janeiro. Comprou passagem após inscrever-se para um simpósio sobre Marketing e Propaganda, onde um grupo seleto discutia por três proveitosos dias, a obsolescência programa imposta pelo mercado, onde os produtos precisam ser renovados todos os dias, o novo nascendo velho, o grande museu de novidades cantado pelo poeta há alguns anos atrás. E lá estava ela, na cidade maravilhosa, num hotel de luxo, discutindo temas importantes não só para ela, mas também para uma plateia com sede de novas teorias de justificassem aquela ideologia de mercado. Foi esse o resultado da vida das bonecas enquanto eu estava no trabalho. Que vida!

Nessas horas eu queria ser mesmo uma daquelas bonecas. É essa a matéria que move os sonhos.

Revolto-me. E enquanto revoltada estou, lá estão elas, as meninas Deus manipulando suas pequenas pessoas, num ir e vir de momentos. E a menina Deus que manipula os homens, onde está? Equilibrada, certamente, em alguma nuvem rindo de tudo isso.

Eu poderia ficar a vida inteira ali, olhando tudo aquilo, mas preciso ir. Almoço e volto para meu trabalho, só mais quatro horas, já vai passar, acredite, tudo passa.

No fim de mais um longo dia de trabalho volto pra casa com a certeza de mais um dever cumprido. É este o ciclo da vida, acordar, viver, trabalhar, amar e voltar pra casa. E assim eu volto e choro diante da cena que vejo. Lá estão elas, as minhas bonecas, tristes e chorosas, despedindo-se de suas meninas. O dia acabou como tudo sempre acaba.

A casa não existe mais, nem a rua, nem a loja, nem a cidade, está tudo guardado. As bonecas então beijam suas meninas e saem voando para suas caixas. A cena é triste, mas tem uma ponta de alegria que vem da certeza que as bonecas têm de que, amanhã bem cedo, as meninas irão acordar e tirá-las das caixas para viverem mais um dia.

Que sorte tem essas bonecas. Que sorte tenho eu de ver aquela cena mágica. Que despedida!

E assim vão as meninas, guardando suas bonecas, filhos, casas e coisas dentro da caixa.  Elas guardam a vida.

Queria eu ter a certeza daquelas bonecas. A certeza de que amanhã suas meninas vão acordá-las. Com os seres humanos não é bem assim que a banda toca. Ficamos muitas vezes assombrados quando vamos dormir e por isso todas as noites, antes do sono, imploramos para que a menina Deus não se esqueça de nos tirar da sua grande caixa chamada universo e, nos permita viver mais um dia na sua casa de bonecas intitulada vida. Rezamos todas as noites para que possamos ver a vida por mais um dia.

E assim, entre fantasia e realidade o homem vive. Sonhando estar numa casa de bonecas à espera dos caprichos de Deus.

Que ele tenha bons pensamentos!

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Minha experiência como “Anjo da Enfermagem”

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Participar dos anjos da enfermagem foi uma escola da vida pra mim. Um ano muito emocionante, onde eu aprendi que o amor é capaz de curar. No início, ao nos explicar a nossa função como anjo, o coordenador tentava nos mostrar a grandeza do projeto, mas deixava claro que só saberíamos vivendo esse momento.

Nas primeiras visitas eu tive bastante dificuldade em me apresentar para as crianças. Muitas vezes a emoção falava mais alto e eu não conseguia permanecer por muito tempo no local. Com o passar dos dias fui me habituando às várias situações difíceis com que eu me deparava.

Cada dia uma surpresa, uma demonstração de carinho, o esforço ao se levantar da cama só para nos dar um abraço, a gratidão nos olhos daquelas mães e a satisfação de arrancar sorrisos e proporcionar um minuto que seja de diversão.

A publicação da imagem foi autorizada pelos familiares cfe. a resolução CNE num. 196/96.

Para nós, “adultos”, é muito difícil lidar com o câncer. É revoltante pensar que teremos que abrir mão de tudo o que nos faz sentir útil, mas é muito mais doloroso ver uma criança que teve sua infância boicotada por uma doença que ela não compreende. Toda criança tem direito de viver sua infância. Nós estávamos ali para mostrá-las que aquele tratamento apesar de “chato” era necessário, eque com força de vontade poderia se tornar um momento alegre também.

Um dia quando visitávamos a UTI, conhecemos um garoto de 13 anos que estava ali há alguns dias aguardando uma transferência.  Ele tinha um carinho excepcional conosco, falava com muita dificuldade pelo fato de estar intubado. Nesse dia ele fez um esforço e conversou conosco, disse que a fé dele o fazia ter certeza que tudo isso era passageiro e que ele venceria essa batalha, pois o problema dele era muito pequeno diante de sua fé.  Então com muito esforço cantou um hino de sua igreja que ele escutava sempre que tinha dúvidas de sua melhora. Tomadas por uma forte emoção terminamos nossa apresentação, fizemo-lo sorrir um pouco e fomos embora. Foi aí que entendemos a nossa função.

É incrível a sensação de vestir aquela fantasia, colocar a maquiagem. É como se outra pessoa surgisse. A timidez dá espaço para uma alegria contagiante, capaz de arrancar sorrisos de quem há muito tempo não sorria.

Foi um ano de alegrias, boas notícias, mas também de despedidas dolorosas. Conheci “pessoinhas” que já nascem lutando pela vida, e mesmo com tão pouca idade nos ensinavam que nada faz sentido se não existir vontade de vencer.

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Em um domingo qualquer

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Era um domingo qualquer…

Acordei cedo como de costume em dias de visita, quase madrugada se comparado a outros domingos que o sono se prolongava por mais alguns instantes.

Não era um dia qualquer, seria o dia em que usaria meu poderoso nariz vermelho, e que a partir daí, nunca mais esqueceria, e mais que isso, perderia meu coração naquele hospital.

A maquiagem, o espelho, aquele leve cheiro de óleo de amêndoas que o nariz vermelho provoca em nossos sentidos, muito mais que sentidos. Aquele nariz vermelho faz milagres, faz surgir um sorriso onde reside dor.

Quer milagre maior que esse?

Eu perderia meu coração naquele dia! Tudo ocorria na mais anormal normalidade: a canção de entrada no hospital, a visita nos quartos, os sorrisos, o cheiro, as paredes brancas e as pessoas que pediam sem qualquer palavra um pouco de atenção, com o direito de sorrir. Ali eu estava com o meu poderoso nariz vermelho!

Até que surge um carismático camarada em meu campo de visão. Ele residia em um quarto sozinho, com um curativo no peito e seu mais fiel soro, acoplado em seu braço, que o seguia por toda parte. A criança, de sorriso fácil, encheu de alegria meu coração.

Mal sabia ele do que era capaz.

Em um momento de descontração, acreditando que seria uma resposta convencional, lhe perguntei:

– O que gostaria de ganhar de presente no dia das crianças?

Então, sem hesitar, me respondeu eufórico, como se fosse um dos mais simples desejos:

– Eu quero ganhar um coração!

Naquele momento o chão se abriu perante meus pés. Aquela resposta ainda ecoa em minha memória.

E mal sabia ele que seu pedido havia sido atendido, pois havia ganhado o meu coração.

Nem todo final é feliz! Onde esteja aquele pequeno herói, espero que ele cuide bem do coração que ganhou de um humilde palhaço.

Quanto a mim, suporto apenas ver meu coração batendo em cada outro peito, que reside em qualquer lugar, trazendo um pouco mais de alegria a quem realmente precisa.


Nota: O autor faz parte do grupo de Humanização Hospitalar UTI da Alegria

Saiba mais:

O trabalho de humanização no hospital através do palhaço hospitalar começou quase que por um acidente, com Michael Christensen, que na época era diretor do Big Apple Circus de Nova York, em uma apresentação do Dia do Coração no Columbia Presbyterian Babies Hospital, onde envolvia simulações da rotina do hospital, porém agregadas a realidade lúdica do palhaço.

Michael optou por retornar ao hospital para visitar o quarto das crianças que não haviam tido oportunidade de comparecer na sua primeira apresentação, a estratégia deu uma resposta muito positiva, então o hospital resolveu investir na continuidade do projeto, nascendo assim o Clown Care Unit e posteriormente diversos outros projetos semelhantes espalhados pelo mundo.

http://utidaalegria.blogspot.com.br/

http://www.doutoresdaalegria.org.br/

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