Psicóloga aponta estratégias práticas para equilibrar o uso das telas e recuperar o bem-estar emocional
A disseminação das tecnologias digitais alterou expressivamente a interação social, afetando o equilíbrio emocional e psicológico dos indivíduos. O acesso contínuo à informação, característica marcante desta era, expôs as pessoas a níveis elevados de ansiedade e sobrecarga emocional, condições frequentemente relatadas em consultórios de saúde mental.
De acordo com diversos estudos recentes, a exposição prolongada às telas e o uso excessivo de redes sociais estão diretamente relacionados ao aumento da ansiedade. Esses fatores são capazes de duplicar os casos de distúrbios psicológicos em comparação a períodos anteriores ao avanço tecnológico.
A psicólogaMaria Klien, especialista em ansiedade e medos, destaca que a hiperconectividade influencia diretamente a saúde mental. Conforme ela explica, a exposição constante a notificações, mensagens e demandas virtuais gera um estado permanente de alerta, prejudicando o repouso mental necessário para o equilíbrio emocional.
“A ansiedade desencadeada pela vida digital deriva, frequentemente, da percepção distorcida de urgência imposta pelas plataformas. A mente humana não está adaptada para a incessante exposição a estímulos, resultando em quadros de estresse”, esclareceMaria Klien.
Além dos sintomas emocionais, o uso excessivo das telas pode resultar em distúrbios físicos, como alterações do sono e comprometimento da visão. Esses fatores se somam às consequências psicológicas, agravando o quadro geral de saúde do indivíduo.
Maria Kliensugere práticas específicas para minimizar os impactos negativos da vida digital. Entre as estratégias indicadas estão a definição clara de limites no uso das plataformas, a redução do tempo diário dedicado aos dispositivos eletrônicos, silenciar as notificações e a incorporação regular de atividades de atenção plena.
“Estabelecer limites rígidos para o uso de aparelhos digitais é crucial. Uma rotina que inclua momentos específicos para a verificação das plataformas online pode reduzir significativamente a ansiedade”, recomenda a psicóloga.
Outra orientação é evitar o contato com dispositivos digitais pelo menos uma hora antes de dormir, medida que favorece a qualidade do sono. O período de repouso livre de interferências tecnológicas auxilia na recuperação emocional e cognitiva do indivíduo.
Para auxiliar nesse processo, a prática demindfulnesstem se mostrado eficaz ao estimular a concentração no momento presente, proporcionando um descanso mental das tensões causadas pelo ambiente virtual. Tal técnica oferece uma abordagem eficaz para lidar com a sobrecarga emocional da vida contemporânea.
“O mindfulness é uma ferramenta essencial para reconectar as pessoas ao momento presente. Com a prática regular, se torna possível mitigar os efeitos negativos da hiperconexão”, finalizaMaria Klien.
Sobre Maria Klien
Maria Klien exerce a psicologia, se orientando pela investigação dos distúrbios ligados ao medo e à ansiedade. Sua atuação clínica integra métodos tradicionais e práticas complementares, visando atender às necessidades emocionais dos indivíduos em seus universos particulares. Como empreendedora, empenha-se em ampliar a oferta de recursos terapêuticos que favorecem a saúde psíquica, promovendo instrumentos destinados ao equilíbrio mental e ao enfrentamento de questões que afetam o bem-estar psicológico de cada paciente.
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Emoções Sintéticas – o futuro da conexão humana na era da tecnologia
No início da década de 2020, o campo das emoções sintéticas começou a ganhar força como uma possibilidade real de transformação em áreas como saúde, educação e interações sociais. A ideia de que máquinas possam reconhecer, interpretar e até replicar emoções humanas provoca tanto fascínio quanto receio. Enquanto alguns defendem que essas inovações podem melhorar a qualidade de vida e preencher lacunas emocionais, outros questionam se não estaríamos arriscando desumanizar ainda mais nossas relações interpessoais.
O artigo foi inspirado por uma questão levantada durante um seminário que ministrei sobre Big Data, Inteligência Artificial (IA) e Saúde. No decorrer da apresentação, alguém perguntou: “Até que ponto uma IA pode imitar um humano?”. Essa pergunta gerou uma discussão rica e multifacetada, abordando desde os avanços tecnológicos que aproximam a IA de características humanas até os limites éticos e sociais que cercam essas inovações.
Um dos pontos centrais do debate foi a importância dos dados. Como destacado pelo seminário, “dados são o limiar”. A capacidade de uma IA imitar emoções e comportamentos humanos depende diretamente da qualidade, quantidade e diversidade dos dados que ela pode processar. Desde padrões emocionais coletados por sensores em dispositivos até grandes volumes de informações textuais analisadas por algoritmos de aprendizado de máquina, os dados moldam não apenas as respostas das IAs, mas também as questões éticas sobre privacidade e consentimento.
Em relação à compreensão das emoções humanas, a inteligência artificial tem avançado em aplicações práticas, como a detecção de estados emocionais por meio de características faciais, entonações vocais e gestos. Estudos demonstram que esses sistemas estão sendo integrados em áreas como segurança, entretenimento, saúde e educação, permitindo interações mais personalizadas e empáticas [1]. Tecnologias semelhantes foram inspiradas por ficções como o robô Baymax de Operação Big Hero, enquanto na prática robôs como Paro e Pepper são utilizados em terapias emocionais e na interação com crianças e idosos.
Figura: Paro, um robô terapêutico utilizado na interação com idosos em contextos clínicos [2].
No entanto, os desafios éticos que acompanham essas tecnologias são significativos. Um ponto central é a humanização dos robôs, que pode gerar a falsa impressão de consciência emocional. Como destacam alguns estudiosos, a introdução de feições humanas em robôs pode criar conexões artificiais que confundem os limites entre tecnologia e humanidade [3]. Esse fenômeno levanta a questão: até que ponto os robôs devem ser programados para simular empatia?
Outro aspecto importante é a análise de sentimentos, uma técnica amplamente usada na inteligência artificial. Essa abordagem permite que sistemas interpretem e classifiquem emoções expressas em textos digitais, como postagens em mídias sociais. Estudos como o da IBM, que utilizou o modelo Big Five para analisar personalidades a partir de tweets, ilustram como dados emocionais podem ser utilizados em estratégias de marketing direcionado e atendimento personalizado [4][5].
Figura: Interface do software da IBM Watson [4].
Apesar do avanço dessas tecnologias, a privacidade emocional emerge como um tema crítico. A coleta de grandes volumes de dados emocionais, muitas vezes sem o devido consentimento, expõe usuários a riscos significativos. Como alertam especialistas, sistemas de IA devem ser projetados para proteger informações sensíveis, garantindo que apenas dados relevantes e autorizados sejam utilizados [6].
A robótica social, por sua vez, apresenta oportunidades e desafios na interação humano-máquina. Robôs como Sophia e Pepper exemplificam como a tecnologia pode ser aplicada para oferecer suporte emocional em lares, escolas e hospitais. No entanto, esses avanços também nos forçam a reconsiderar como definimos empatia e conexão em um mundo cada vez mais automatizado [7]. A ética desempenha um papel fundamental nesse contexto, destacando a necessidade de diretrizes claras para o uso responsável dessas ferramentas.
Figura: Sophia [8].
Finalmente, o cinema também explora como a tecnologia pode influenciar a forma como entendemos as emoções. Obras fictícias como o filme Ela (Her) nos convidam a refletir sobre o impacto emocional de conexões com sistemas artificiais. No mundo real, estudiosos como David Levy argumentam que vínculos emocionais entre humanos e robôs podem se aprofundar a ponto de desafiar nossa compreensão tradicional de relacionamentos [9].
Figura: Cena do filme “Ela” (Her)
Esses avanços mostram como as emoções sintéticas podem enriquecer interações humanas, mas também exigem atenção redobrada às questões éticas e sociais. Seja na personalização de experiências digitais, no uso terapêutico de robôs ou na criação de novas formas de conexão, é essencial equilibrar inovação tecnológica com a preservação dos valores humanos.
Referências:
[1] Inteligência Artificial Emocional (EAI): a IA que analisa sentimentos. Disponível em:eduka.ai [2] Paro: o robô terapêutico que transforma o cuidado com idosos. Disponível em:guardian.com [3] Feições humanas em robôs: entre a mercantilização e a dignidade humana. Disponível em:congressoemfoco.uol.com.br [4] Smile for the Camera: Privacy and Policy Implications of Emotion AI. Disponível em:arxiv.org [5] Simonite, T. (2013). Ads Could Soon Know If You’re an Introvert (on Twitter). MIT Technology Review. Disponível em:technologyreview.com [6] Implicações éticas da inteligência artificial: desafios e estratégias. Disponível em:meuartigo.brasilescola.uol.com.br [7] A revolução da robótica social: Humanos e máquinas em conexão. Disponível em:horizontes.sbc.org.br [8] Sophia: o robô que revolucionou a interação social. Disponível em:hansonrobotics.com [9] Levy, D. (2008). Love and Sex with Robots. HarperCollins Publishers.
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Relacionamentos Artificiais: um sentimento lógico (ou não)
A tecnologia tem avançado em um ritmo tão acelerado que parece ser capaz de tocar os aspectos mais íntimos da nossa existência: as emoções e os relacionamentos. Na sociedade contemporânea, na qual é marcada por mudanças rápidas e profundas nas dinâmicas sociais, começamos a nos deparar com um fenômeno que parecia ser exclusivo da ficção científica, vínculos emocionais sendo criados com máquinas. Como destaca Oliveira (2009), a globalização e o avanço das tecnologias de comunicação têm moldado não apenas nossos hábitos, mas também a maneira como nos relacionamos e compreendemos a nós mesmos[1].
Figura: Theodore segurando Samantha. Fonte: Her (2013)
Em um mundo cada vez mais isolado, onde a solidão parece ser o preço de uma vida hiperconectada, os relacionamentos artificiais vêm ganhando espaço devido a oferecerem conforto e interações sem os desafios e complexidades dos laços humanos. Segundo a Fast Company Brasil (2024), a OMS declarou em 2023 que vivemos uma epidemia de solidão e que pesquisas realizadas nos EUA mostram um enorme declínio no número médio de amigos que os jovens têm[2], apontando para uma sociedade que cada vez mais enfrenta dificuldades em cultivar conexões humanas. No Brasil, o cenário reflete essa mesma realidade. Conforme destacado pela Fast Company Brasil (2024), muitas pessoas que vivem sozinhas ou têm pouco tempo para conviver com a família acabam buscando por ‘alguém’ que escuta, está presente o tempo todo, que não julga, que demonstra ‘empatia’, guarda suas informações e conversa com você[2].
Mesmo que os relacionamentos artificiais possam parecer uma solução para a solidão moderna, é essencial questionar se eles realmente preenchem nossas necessidades emocionais ou apenas oferecem uma ilusão de companhia. Essas conexões digitais, apesar de convenientes, desafiam nossa compreensão do que significa criar laços autênticos, com isso, será que estamos nos adaptando a uma nova forma de vínculo ou apenas nos distanciando ainda mais da profundidade que as relações humanas podem oferecer? Enquanto a tecnologia avança, devemos olhar além da praticidade e refletir sobre os efeitos que ocorrem dessas interações em nossa saúde mental e no modo como nos relacionamos uns com os outros.
Figura: Representação da conexão entre humano e máquina. Fonte: Fast Company Brasil (2024)
Na busca por alternativas que mitiguem a solidão e ofereçam suporte emocional, surgem aplicativos que simulam interações humanas de maneira personalizada. Um exemplo é o Replika, uma plataforma de inteligência artificial projetada para atuar como um “amigo” ou até mesmo um “parceiro” digital. Utilizando aprendizado de máquina, o Replika evolui com base nas preferências e interações do usuário, criando a ilusão de um relacionamento genuíno.
De aplicativos como Replika até assistentes virtuais que simulam o companheirismo, estamos testemunhando um fenômeno de grande impacto psicológico e social. A introdução da IA como uma substituição para os relacionamentos humanos, incluindo amizades e até no amor, de acordo com Sahota (2024), marca uma mudança significativa em nossa sociedade como um todo[3]. Este artigo explora as implicações dessa nova forma de relacionamento, com base em estudos e artigos que investigam a ética, os perigos e as possíveis consequências deste avanço.
Plataformas como Replika têm atraído milhões de usuários ao prometerem uma interação personalizada e empática, simulando um “amigo” ou até mesmo um “parceiro” digital. Para grande parte dos usuários, como cita Rubio (2021)[4], o Replika acaba sendo uma oportunidade de ter coisas que não podem ter em seus relacionamentos na vida real. Muitos desses sistemas utilizam aprendizado de máquina para evoluir conforme as preferências e necessidades do usuário, criando a ilusão de um relacionamento genuíno.
Figura: Ilustração do avatar chamado Lucas. Fonte: EL PAÍS (2021)
No entanto, um artigo do The Guardian aponta que, essa dinâmica pode criar dependência emocional, especialmente para pessoas que enfrentam solidão ou dificuldades em construir conexões reais. “Essas tecnologias são projetadas para criar um vínculo aparentemente perfeito, sem conflitos, julgamentos ou desentendimentos, o que atrai pessoas em busca de conforto emocional rápido”[5].
De maneira similar, um artigo publicado na Psychology Today alerta sobre o impacto psicológico da substituição de interações humanas por artificiais. Relacionar-se com uma IA pode amplificar o isolamento social e comprometer habilidades interpessoais essenciais, como empatia e resolução de conflitos. De acordo com o estudo mencionado, “desenvolver muita dependência emocional em chatbots sociais de IA pode ter um lado negativo, potencialmente piorando suas habilidades sociais com as pessoas”[6].
Figura: Ilustração de um jovem interagindo com a IA. Fonte: O Globo (2023)
A popularização dos relacionamentos com IA destaca uma nova realidade: estamos utilizando a tecnologia como um substituto para a complexidade das relações humanas. Isso reflete um paradoxo moderno – quanto mais conectados estamos digitalmente, mais desconectados nos tornamos emocionalmente. Ao refletir sobre essa situação, Kimura (2023) afirma que é importante lembrarmos que a definição da nossa humanidade está justamente na capacidade de sentir emoções e estabelecer as relações humanas uns com os outros[7].
Relacionamentos artificiais com IA são ferramentas poderosas que podem oferecer suporte emocional, mas é importante compreender suas limitações e riscos. O relacionamento online já é popular atualmente, de acordo com Wu (2024), boa parte acaba se frustrando e a IA assume um lugar importante no desenvolvimento do afeto para muitas dessas pessoas[8]. Estudos e análises, mencionados neste artigo, deixam claro que os laços humanos, com todas as suas imperfeições, são insubstituíveis, e que por mais que, pareça legítimo, se relacionar com algo que lhe entenda, é necessário entender que isso não passa de uma rede neural, que só replica o que aprendeu de uma forma mais natural.
Figura: Representação da relação humano-máquina.
O futuro da interação homem-máquina deve ser equilibrado, buscando sempre colocar na balança o que podemos delegar nesta relação. Que as inteligências artificiais sejam nossas aliadas, mas não um refúgio para evitarmos os desafios e as recompensas das relações humanas reais.
REFERÊNCIAS
[1] OLIVEIRA, Eloiza da Silva Gomes de. Construção da subjetividade humana e tecnologia da informação e comunicação – uma nova moralidade? Conhecimento & Diversidade, Niterói, n. 2, p. 45–55, jul./dez. 2009.
Os algoritmos de recomendação estão por toda parte, silenciosamente transformando nossa relação com o mundo digital. Eles não apenas facilitam nossas vidas, mas também influenciam profundamente como consumimos conteúdo e produtos. A personalização proporcionada por essas tecnologias tornou-se essencial para nossa experiência online, quase como se a internet “nos conhecesse” intimamente. Mas como, exatamente, isso funciona?
Pense na última vez que você abriu o Netflix ou rolou o feed no TikTok. Sentiu como se as recomendações fossem feitas sob medida? Isso não é coincidência. Essas plataformas utilizam sistemas de recomendação — aplicações de inteligência artificial que estudam nossas ações, interesses e até o tempo que passamos assistindo ou curtindo algo, para depois nos oferecer sugestões que parecem irresistivelmente precisas. Segundo o Netflix Tech Blog (2024), a análise detalhada de interações e padrões é o coração dessas tecnologias.
Figura 01: Fluxo da recomendação
O funcionamento desses sistemas se divide em dois tipos principais. Os modelos baseados em conteúdo analisam o que você já consumiu para sugerir itens similares. Por exemplo, se você assistir a um filme de ação, outros do mesmo gênero aparecerão na sua lista. Já os modelos baseados em colaboração observam comportamentos de outros usuários com gostos parecidos para indicar novos conteúdos. É aquela clássica abordagem do tipo “quem assistiu isso também gostou daquilo” (Resnick, 2024).
No entanto, essa conveniência não vem sem consequências. Embora seja fascinante encontrar algo que parece perfeito para você, esses algoritmos também moldam nossos hábitos. Eles criam ciclos de consumo em que ficamos presos ao que gostamos — ou ao que os sistemas acreditam que deveríamos gostar. Essa é a essência do “filtro bolha”, que limita nossa exposição a novas ideias e reforça nossos vieses, como apontado por O’Neil (2016).
Além disso, plataformas muitas vezes priorizam engajamento acima de qualidade, promovendo conteúdos polarizadores ou emocionais para capturar nossa atenção. Como destaca o Zendesk (2024), essa estratégia pode ser eficaz para manter os usuários conectados, mas levanta preocupações sobre seu impacto no comportamento e na saúde mental das pessoas.
Outro ponto crítico é a questão da privacidade. Para que essa personalização aconteça, as plataformas coletam grandes volumes de dados pessoais, como histórico de navegação, interações e até horários de uso. Como aponta Tera (2024), esses algoritmos processam tudo isso para criar perfis detalhados dos usuários, mas deixam dúvidas sobre até que ponto estamos confortáveis em trocar nossa privacidade por conveniência.
Figura 02: A tecnologia e os desafios da privacidade na coleta de dados.
Apesar desses desafios, a personalização tem seus méritos. Economiza tempo, facilita decisões e transforma experiências online em algo mais envolvente e prático. No entanto, como usuários, precisamos estar atentos. Como sugerido por O’Neil (2016), compreender o funcionamento dessas tecnologias e exigir mais transparência das plataformas são passos essenciais para usá-las de maneira consciente.
Mais do que aceitar passivamente o que nos é sugerido, podemos adotar uma postura de curiosidade e crítica. Por que fomos expostos a determinado conteúdo? Que alternativas poderiam estar ocultas? Ao entendermos os mecanismos por trás dessas recomendações, ganhamos mais autonomia e nos tornamos consumidores mais conscientes.
No fim, os algoritmos podem ser aliados, mas nunca substitutos para nossa capacidade de explorar, aprender e escolher de forma independente. A tecnologia é uma ferramenta, e o verdadeiro valor dela surge quando a usamos para ampliar nossos horizontes, e não para limitá-los. Em um mundo tão conectado, a melhor recomendação ainda é sermos protagonistas das nossas próprias decisões.
NETFLIX TECH BLOG. The evolution of the Netflix recommendation algorithm. Disponível em:https://netflixtechblog.com. Acesso em: 21 nov. 2024.
O’NEIL, Cathy. Weapons of Math Destruction: How Big Data Increases Inequality and Threatens Democracy. New York: Crown Publishing, 2016.
RESNICK, P. The effects of recommender systems. ACM Transactions on Computer-Human Interaction. Disponível em:https://dl.acm.org. Acesso em: 21 nov. 2024.
“Transformando paladares: A interseção entre tecnologia e seletividade alimentar.”
A relação que temos com a comida é complexa e, muitas vezes, cheia de nuances. Para alguns, escolher o que comer é um ato simples, mas para muitos, especialmente crianças e adultos que enfrentam a seletividade alimentar, essa escolha pode ser um verdadeiro desafio. Neste contexto, a tecnologia comportamental surge como uma aliada poderosa, oferecendo soluções inovadoras para ajudar a expandir os horizontes alimentares. Neste texto, vamos explorar como essas ferramentas digitais estão moldando comportamentos alimentares e trazendo novas possibilidades para aqueles que lutam com a seletividade.
O que é seletividade alimentar?
A seletividade alimentar refere-se à tendência de algumas pessoas, especialmente crianças, a preferirem certos alimentos e rejeitarem outros. Essa condição pode se manifestar de diferentes maneiras: algumas pessoas podem se recusar a experimentar novos sabores, enquanto outras podem limitar sua dieta a um número restrito de alimentos. Segundo o especialista em alimentação infantil, Dr. Carlos Gonzalez (2021), essa seletividade pode resultar em deficiências nutricionais e desafios sociais, como dificuldades em compartilhar refeições em grupo.
A tecnologia como aliada
Nos últimos anos, a tecnologia tem se mostrado uma aliada poderosa em diversas áreas, e a alimentação não é exceção. Aplicativos e plataformas digitais estão sendo desenvolvidos para ajudar a criar experiências positivas em torno da comida. Um exemplo é o uso de jogos e gamificação, que incentivam a experimentação de novos alimentos de forma lúdica e envolvente. A pesquisa de Hamari e Koivisto (2022) mostra que a gamificação pode aumentar a motivação e o engajamento, transformando a maneira como as pessoas se relacionam com a comida.
Gamificação e comportamento alimentar
A gamificação envolve o uso de elementos de jogos em contextos não-jogos, como na alimentação. Aplicativos que utilizam essa abordagem podem criar desafios e recompensas por experimentar novos alimentos. Por exemplo, um aplicativo pode oferecer pontos por cada novo vegetal experimentado ou criar desafios em que amigos podem se motivar mutuamente a expandir suas dietas. Essas estratégias não apenas tornam o processo divertido, mas também ajudam a criar novas associações positivas em torno da comida. Um estudo recente de Landers e Armstrong (2022) sugere que o uso de gamificação pode aumentar a aceitação de novos alimentos, especialmente entre crianças. Ao transformar a experimentação alimentar em um jogo, as crianças se sentem mais dispostas a provar novos sabores, reduzindo a pressão que muitas vezes acompanha a introdução de alimentos desconhecidos.
Aplicativos e tecnologias interativas
Além da gamificação, diversos aplicativos interativos têm sido desenvolvidos para apoiar a seletividade alimentar. Ferramentas que permitem o rastreamento de alimentos, a visualização de receitas e o compartilhamento de experiências culinárias podem ser especialmente úteis. Um exemplo é o aplicativo “Yummly”, que personaliza receitas com base nas preferências e aversões alimentares do usuário. Assim, a tecnologia oferece uma abordagem mais personalizada, ajudando as pessoas a se sentirem mais confortáveis e confiantes em suas escolhas alimentares. O especialista em nutrição, Dr. Rafael Moreira (2023), destaca que a personalização é um fator crucial para o sucesso dessas intervenções. Quando as escolhas alimentares são adaptadas às preferências individuais, as chances de aceitação e engajamento aumentam significativamente.
Fonte: www.freepik.com
Educação alimentar digital
A educação alimentar é outra área em que a tecnologia pode fazer uma diferença significativa. Plataformas digitais oferecem recursos educativos que ensinam sobre a importância da diversidade alimentar e como preparar refeições saudáveis de forma prática. A pesquisa de Costa e Almeida (2021) aponta que a educação alimentar digital pode ajudar a desenvolver habilidades culinárias e aumentar a conscientização sobre a nutrição, tornando os indivíduos mais autônomos em suas escolhas alimentares. Além disso, vídeos interativos e tutoriais de culinária podem desmistificar a preparação de novos alimentos, tornando-a uma atividade divertida e acessível. Ao integrar a educação alimentar com a tecnologia, é possível incentivar um relacionamento mais positivo com a comida.
O papel dos pais e educadores
A participação de pais e educadores é fundamental nesse processo. Eles podem utilizar as tecnologias disponíveis para apoiar crianças em sua jornada para superar a seletividade alimentar. Aplicativos que promovem o engajamento familiar, como “FamilyDinner”, permitem que os membros da família compartilhem suas experiências, receitas e desafios. Essa abordagem colaborativa não apenas promove a aceitação de novos alimentos, mas também fortalece os laços familiares. A psicóloga nutricional, Dra. Fernanda Sousa (2022), enfatiza a importância do suporte emocional nesse processo. Quando os pais e educadores se envolvem ativamente, criando um ambiente seguro e positivo, as crianças se sentem mais à vontade para explorar novos sabores e texturas.
Desafios e considerações éticas
Embora a tecnologia comportamental ofereça promessas empolgantes, também é importante reconhecer os desafios e as considerações éticas que vêm com sua implementação. A dependência excessiva de aplicativos e jogos pode levar à desconexão com a comida real, e é fundamental encontrar um equilíbrio saudável. A pesquisa de Rigby e Ryan (2021) alerta para os riscos de transformar a alimentação em um jogo, o que pode trivializar a experiência de comer. Além disso, é crucial que as intervenções tecnológicas sejam inclusivas e acessíveis a todos. A desigualdade no acesso à tecnologia pode limitar as oportunidades para algumas populações, tornando-se um fator que perpetua disparidades alimentares.
A relevância da personalização na alimentação
A personalização das experiências alimentares por meio da tecnologia é um fator-chave na superação da seletividade. Através de algoritmos que analisam preferências e aversões, aplicativos podem sugerir receitas adaptadas, levando em consideração não apenas o que o usuário gosta, mas também suas necessidades nutricionais. Isso permite que os indivíduos se sintam mais empoderados em suas escolhas, explorando novos sabores de maneira gradual e prazerosa. Essa abordagem não apenas melhora a aceitação de novos alimentos, mas também promove uma alimentação mais equilibrada e diversificada (FISCHER, 2019).
O impacto das redes sociais na alimentação
As redes sociais também desempenham um papel significativo na formação das preferências alimentares. Plataformas como Instagram e TikTok têm se tornado vitais para a promoção de novos alimentos e tendências culinárias. Influenciadores digitais compartilham receitas e experiências, criando uma cultura de experimentação e inovação. Isso pode encorajar a adoção de novos sabores e a diversidade alimentar, especialmente entre os mais jovens, que se sentem motivados a experimentar o que veem em suas timelines (DE VEGA, 2021).
Crianças e o Futuro da Alimentação
O papel da tecnologia é ainda mais crucial quando se trata de crianças. A infância é um período determinante para a formação de hábitos alimentares, e a introdução de ferramentas digitais pode ajudar a moldar uma relação positiva com a comida desde cedo. Estudos mostram que crianças que interagem com aplicativos educativos tendem a mostrar maior curiosidade e disposição para experimentar novos alimentos. Essa abertura pode não apenas melhorar sua alimentação atual, mas também estabelecer padrões saudáveis que perdurarão na vida adulta (LEWIS, 2020).
A Importância do feedback e da comunidade
A interação social e o feedback são elementos essenciais na jornada de superação da seletividade alimentar. Aplicativos que permitem o compartilhamento de experiências, como fóruns e grupos de suporte, podem criar um senso de comunidade entre os usuários. Esse apoio mútuo não só encoraja a experimentação, mas também ajuda a normalizar as dificuldades enfrentadas por aqueles que lidam com a seletividade alimentar. A troca de receitas, dicas e histórias de sucesso pode ser um poderoso motivador para muitos (WILLIAMS, 2018).
Ética e sustentabilidade na tecnologia alimentar
À medida que a tecnologia avança, a ética e a sustentabilidade também precisam ser consideradas. As intervenções digitais devem ser projetadas com a inclusão em mente, garantindo que todas as populações tenham acesso às ferramentas necessárias para melhorar sua relação com a comida. Além disso, a promoção de uma alimentação sustentável, que respeite o meio ambiente e valorize a agricultura local, deve ser integrada nas soluções digitais. Isso ajudará a criar uma consciência mais ampla sobre a alimentação, além de abordar questões de saúde e bem-estar (PATEL, 2021).
Perspectivas futuras na alimentação digital
O futuro da alimentação digital é promissor, com inovações constantes que buscam integrar tecnologia e comportamento de forma ainda mais eficaz. Com o desenvolvimento de inteligência artificial, por exemplo, poderemos ver soluções ainda mais personalizadas e adaptativas, capazes de se ajustar em tempo real às preferências e aversões dos usuários. Essa evolução poderá ajudar não apenas na aceitação de novos alimentos, mas também na promoção de hábitos alimentares saudáveis, contribuindo para o bem-estar geral da população (KIM, 2022).
Conclusão
A tecnologia comportamental tem o potencial de transformar a maneira como abordamos a seletividade alimentar. Através da gamificação, aplicativos interativos e educação digital, é possível criar experiências positivas em torno da comida, ajudando indivíduos a expandir seus paladares e melhorar sua relação com a alimentação. No entanto, é essencial abordar essas intervenções de maneira ética e equilibrada, garantindo que todos possam se beneficiar das inovações disponíveis. Ao unir tecnologia e comportamento, podemos abrir novas portas para uma alimentação mais saudável e diversificada.
Referências
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DE VEGA, R. (2021). Influência das redes sociais na alimentação: Uma análise crítica. Journal of Food Marketing, v. 25, n. 2, p. 145-160.
FISCHER, J. (2019). Personalization in digital food applications: An emerging trend. Food Technology, v. 73, n. 4, p. 50-55.
GONZALEZ, C. (2021). A Relevância da Aceitação Alimentar na Infância. Jornal de Alimentação e Nutrição, 15(1), 45-52.
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RIGBY, S.; RYAN, R. (2021). Glued to Games: How Gamification Shapes Our Lives. American Journal of Psychology, v. 141, n. 6, p. 567-582.
SOUSA, F. (2022). O Papel dos Pais na Aceitação Alimentar das Crianças. Revista de Psicologia da Nutrição, 18(3), 89-97.
WILLIAMS, T. (2018). Community support and food choices: The role of social media. Journal of Community Nutrition, v. 29, n. 4, p. 249-258.
A pós-modernidade se apresenta como uma ruptura com as certezas da modernidade, trazendo à tona a fragmentação das identidades, a fluidez das relações sociais e a efemeridade das interações humanas. Quando digo que a pós -modernidade rompe com as certezas, quero dizer que é uma reação à modernidade, questionando suas certezas e trazendo a ideia de que não há uma verdade absoluta ou um caminho único para o progresso. Ela celebra a diversidade, a pluralidade de experiências e a liberdade de viver em um mundo mais “liberal”. Esses aspectos são discutidos e apresentados por David Harvey em sua obra O Mundo Pós-Moderno (2007), na qual o autor analisa o impacto das transformações econômicas e culturais no cotidiano contemporâneo. Meu intuito com este artigo é ter como objetivo realizar uma análise crítica das ideias de Harvey, correlacionando-as com as relações contemporâneas, marcadas pela pluralidade, pela transitoriedade e pela influência da tecnologia digital.
David Harvey (2007) caracteriza a pós-modernidade como um período de “compressão espaço-tempo”, onde o avanço tecnológico e a globalização encurtam distâncias e aceleram o ritmo de vida. Para o autor, a modernidade baseava-se em grandes narrativas que buscavam dar sentido ao mundo e garantir certa estabilidade às interações sociais. Contudo, com o advento da pós-modernidade, essas narrativas perderam força, dando lugar a uma pluralidade de perspectivas, o que, de acordo com Harvey (2007), gera uma fragmentação nas identidades e nas relações sociais.
A fragmentação pode ser observada em diversas áreas da vida contemporânea. Nas interações interpessoais, por exemplo, a identidade não é mais vista como um elemento estável e imutável, mas como algo fluido e constantemente renegociado. Essa pluralidade de identidades reflete a complexidade do contexto globalizado, onde culturas e valores se misturam de maneira contínua (HARVEY, 2007). O impacto dessa fragmentação nas relações contemporâneas é evidente, uma vez que as pessoas transitam entre diferentes papéis sociais e apresentam múltiplas versões de si mesmas, conforme o contexto e a plataforma social em que estão inseridas.
Essa fragmentação que caracteriza a pós-modernidade também afeta diretamente as relações sociais. Enquanto, na modernidade, as interações eram mais estáveis e ancoradas em instituições sólidas, como a família, o trabalho e a religião, na pós-modernidade essas instituições perdem parte de sua centralidade. As relações contemporâneas se tornam mais transitórias e menos dependentes de compromissos a longo prazo, um fenômeno que pode ser observado nas dinâmicas familiares e laborais (HARVEY, 2007).
No contexto das relações familiares, a estrutura tradicional da família nuclear, defendida por muitos como o pilar da sociedade moderna, é desafiada por novas configurações familiares, como famílias monoparentais e casais homoafetivos. Harvey (2007) afirma que essa pluralidade é uma consequência direta da fragmentação pós-moderna, que permite o florescimento de novas formas de convivência social. Além disso, no ambiente de trabalho, a flexibilidade e a informalidade predominam, refletindo o modelo da “gig economy”, no qual as relações de emprego se tornam mais instáveis e fluídas (HARVEY, 2007).
Outro aspecto importante destacado por Harvey (2007) é a aceleração do tempo, impulsionada pelo avanço das tecnologias digitais e pelas demandas do capitalismo tardio. Na pós-modernidade, as interações sociais são marcadas pela efemeridade, onde os laços entre as pessoas se formam e se dissolvem rapidamente. Esse fenômeno pode ser observado nas relações interpessoais mediadas pela tecnologia, onde plataformas digitais, como redes sociais e aplicativos de namoro, facilitam o estabelecimento de conexões rápidas, porém muitas vezes superficiais.
Harvey (2007) aponta que essa aceleração contribui para a superficialidade das relações contemporâneas, pois as interações humanas se tornam breves e desprovidas de profundidade emocional. Nas redes sociais, por exemplo, os indivíduos são incentivados a manter múltiplas conexões, mas essas conexões carecem de compromisso e continuidade, refletindo a natureza fragmentada e fugaz da pós-modernidade.
A mediação tecnológica nas interações sociais é um dos principais fatores que contribuem para a fragmentação e efemeridade das relações humanas, de acordo com Harvey (2007). A tecnologia digital, embora facilite a comunicação entre indivíduos em diferentes partes do mundo, também cria novas formas de alienação e distanciamento. As interações virtuais, apesar de rápidas e eficientes, muitas vezes não substituem a profundidade das relações face a face, resultando em um tipo de conexão desprovida de empatia e intimidade (HARVEY, 2007).
Harvey (2007) também destaca que a tecnologia reflete as lógicas do capitalismo tardio, onde o consumo rápido de informações e a busca por validação social se tornam centrais para as interações humanas. As plataformas digitais moldam as interações de acordo com essas lógicas, resultando em uma cultura de superficialidade e imediatismo nas conexões interpessoais. Assim, as relações contemporâneas são profundamente influenciadas pela tecnologia, mas também sofrem com a falta de profundidade e compromisso a longo prazo.
REFERÊNCIA
HARVEY, David. O Mundo Pós-Moderno: Condições Sociais, Culturais e Econômicas no Capitalismo Avançado. São Paulo: Loyola, 2007.
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
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Gamificação e Psicologia: como jogos digitais moldam comportamentos
13 de setembro de 2024 Lara Maria Moreira Gomes
Insight
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Explorar a influência dos jogos digitais e da gamificação no comportamento humano, destacando efeitos psicológicos positivos, negativos e a aplicação da gamificação em diversos contextos.
No mundo hiperconectado de hoje, os jogos digitais vão além do simples entretenimento, tornando-se um fenômeno cultural que influencia profundamente os comportamentos e a vida de milhões de pessoas. A gamificação, que envolve a aplicação de elementos típicos de jogos em contextos não lúdicos, emergiu como uma ferramenta poderosa em várias áreas, desde a educação até a saúde mental. Contudo, como qualquer ferramenta, seu impacto pode ser tanto benéfico quanto prejudicial. Neste texto, exploraremos como a gamificação e os jogos digitais influenciam a psicologia humana, destacando os benefícios, como o aumento da motivação e do aprendizado, bem como os riscos, como o vício e o isolamento social.
O Poder da Gamificação na Motivação e no Aprendizado
A gamificação tem mostrado ser uma estratégia eficaz para aumentar a motivação e o engajamento em diversos contextos. Elementos como recompensas, níveis e desafios são projetados para tornar as atividades cotidianas mais atraentes e envolventes. No ambiente educacional, o uso dessas técnicas tem demonstrado melhorar o desempenho acadêmico e aumentar a retenção de conhecimento (Clark et al., 2019). Quando recompensados por completarem tarefas ou atingirem objetivos, os alunos tendem a experimentar um aumento na motivação intrínseca, resultando em um aprendizado mais eficaz e prazeroso.
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Além da educação, a gamificação também está sendo utilizada em programas de saúde para promover comportamentos saudáveis. Aplicativos que incentivam a prática de exercícios físicos ou o controle da dieta, por meio de metas diárias e recompensas virtuais, têm mostrado resultados positivos em termos de adesão e persistência (Koivisto & Hamari, 2019). Esses exemplos mostram como a gamificação pode transformar atividades consideradas tediosas em desafios empolgantes que motivam as pessoas a alcançar seus objetivos.
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Outro aspecto relevante da gamificação é sua capacidade de promover a colaboração e o trabalho em equipe. Em ambientes corporativos, por exemplo, a implementação de sistemas gamificados pode estimular a interação entre colegas, criando um senso de comunidade e propósito compartilhado. Jogos que envolvem a resolução de problemas coletivos ou o cumprimento de missões em grupo podem fomentar habilidades de comunicação, cooperação e liderança, essenciais para o sucesso em ambientes de trabalho modernos (Liu et al., 2020). Essa abordagem não só melhora a produtividade, mas também contribui para a satisfação no trabalho, criando um ambiente mais dinâmico e engajador.
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O Lado Sombrio dos Jogos Digitais: Vício e Isolamento
Apesar dos benefícios, o impacto dos jogos digitais na saúde mental também pode ser prejudicial. O vício em jogos é uma preocupação crescente entre profissionais de saúde. A busca constante por recompensas instantâneas, uma característica comum nos jogos, pode levar ao desenvolvimento de dependência comportamental, onde o indivíduo sente necessidade de jogar continuamente, mesmo que isso interfira em sua vida pessoal e profissional (Kuss et al., 2019).
Além disso, o isolamento social é outro efeito colateral negativo do uso excessivo de jogos digitais. Jogadores que passam longas horas imersos em mundos virtuais podem começar a negligenciar interações sociais no mundo real, o que pode levar ao isolamento e à diminuição das habilidades sociais (Zhu et al., 2020). Esses impactos são particularmente preocupantes em crianças e adolescentes, cujas habilidades sociais e emocionais ainda estão em desenvolvimento.
A questão do isolamento torna-se ainda mais complexa quando consideramos os “jogadores solitários”, que preferem jogos single-player e acabam dedicando muito tempo a essas atividades, em detrimento de interações no mundo real. Embora esses jogos ofereçam experiências ricas e imersivas, eles também podem contribuir para um sentimento de desconexão com a realidade. Estudos indicam que a falta de interação social, combinada com o uso excessivo de jogos, pode aumentar os níveis de ansiedade e depressão, especialmente em indivíduos predispostos a essas condições (Bányai et al., 2019).
Outro ponto crítico é o impacto dos jogos competitivos online, que podem exacerbar comportamentos agressivos e aumentar o estresse. Em ambientes altamente competitivos, os jogadores podem sentir uma pressão constante para performar bem, o que pode resultar em aumento da agressividade e deterioração da saúde mental. Essa pressão pode gerar comportamentos tóxicos, como bullying virtual e abuso verbal, que afetam negativamente a experiência de jogo e têm consequências reais para a saúde mental dos jogadores (Anderson et al., 2020).
Gamificação em Diversas Áreas: Potencial e Preocupações
A gamificação está sendo aplicada em uma variedade de áreas, desde o marketing até a saúde mental, com o objetivo de engajar e motivar pessoas. No setor corporativo, por exemplo, empresas têm utilizado gamificação para melhorar a produtividade e o envolvimento dos funcionários, transformando tarefas monótonas em desafios que estimulam a competitividade saudável e o espírito de equipe (Koivisto & Hamari, 2019).
No entanto, é essencial que essas aplicações sejam feitas de maneira equilibrada e responsável. A busca incessante por engajamento pode levar ao esgotamento e ao estresse, principalmente se os desafios forem percebidos como inatingíveis ou se as recompensas não corresponderem ao esforço investido (Zhu et al., 2020). Portanto, a gamificação deve ser projetada de forma a promover o bem-estar e o desenvolvimento pessoal, sem sacrificar a saúde mental dos usuários.
Além disso, a gamificação tem potencial para ser explorada em áreas como a reabilitação física e mental. Em reabilitação física, jogos digitais e sistemas gamificados têm sido usados para motivar pacientes a seguirem regimes de exercícios que, de outra forma, seriam vistos como tediosos ou dolorosos. Ao incorporar elementos de jogo, como metas e recompensas, pacientes se sentem mais engajados e motivados a continuar com a terapia, o que pode resultar em melhores resultados de recuperação (Deutsch et al., 2021). Na saúde mental, técnicas de gamificação têm sido aplicadas para ajudar indivíduos a gerenciar condições como ansiedade e depressão, através de jogos que ensinam habilidades de enfrentamento e promovem o bem-estar emocional (Fleming et al., 2020).
Conclusão
A gamificação e os jogos digitais têm o potencial de moldar comportamentos de maneiras poderosas, tanto para o bem quanto para o mal. Quando utilizados de forma consciente e equilibrada, eles podem aumentar a motivação, melhorar o aprendizado e promover comportamentos saudáveis. No entanto, é crucial estar atento aos riscos associados, como o vício e o isolamento, e garantir que a gamificação seja aplicada de maneira a apoiar o desenvolvimento saudável e equilibrado. Ao compreender e gerenciar esses impactos, podemos aproveitar ao máximo o potencial positivo dos jogos digitais na vida moderna.
Referências
ANDERSON, C. A.; SHIBUYA, A.; IHM, J. W.; et al. Aggressive behavior in virtual environments and its relationship with real-world aggression: A meta-analysis. Personality and Social Psychology Bulletin, v. 46, n. 10, p. 1549-1565, 2020.
BÁNYAI, F.; ZSILA, Á.; KIRÁLY, O.; et al. Problematic social media use: Results from a large-scale nationally representative adolescent sample. PLOS ONE, v. 14, n. 6, e0217299, 2019.
CLARK, D. B.; TANNER-SMITH, E. E.; KILBURN, C. M. Digital games, design, and learning: A systematic review and meta-analysis. Review of Educational Research, v. 89, n. 3, p. 385-418, 2019.
DEUTSCH, J. E.; BORBNIK, A.; KOPRIVA, G. Self-guided game-based rehabilitation for individuals with spinal cord injury: A pilot study. Games for Health Journal, v. 10, n. 3, p. 172-180, 2021.
FLEMING, T.; BOWIE, C.; ALPASS, F.; et al. The effectiveness of a gamified online intervention at improving youth mental health: A randomized controlled trial. Journal of Medical Internet Research, v. 22, n. 4, e13705, 2020.
KUSS, D. J.; GRIFFITHS, M. D.; PONTES, H. M. Internet addiction: the end of the road? In: Internet Addiction. Palgrave Macmillan, Cham, 2019. p. 353-375.
KOIVISTO, J.; HAMARI, J. The rise of motivational information systems: A review of gamification research. International Journal of Information Management, v. 45, p. 191-210, 2019.
LIU, D.; LIU, M.; ZHANG, X. How gamification motivates: An exploration of the theoretical mechanisms of gamification. Computers in Human Behavior, v. 107, p. 106313, 2020.
ZHU, Y.; LAMPERT, T.; GUTWIN, C.; et al. Exploring the impact of competitive games on stress, social connection, and motivation. In: Proceedings of the 2020 CHI Conference on Human Factors in Computing Systems. 2020. p. 1-14.
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A solidão na Era Digital: como a hiperconectividade pode isolar
12 de setembro de 2024 Lara Maria Moreira Gomes
Tecnologia
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“Conectados, Mas Sozinhos: O Impacto da Hiperconectividade Digital na Solidão e na Saúde Emocional”
Vivemos em uma época em que a conectividade digital está em seu auge. Com a facilidade de se conectar com amigos e familiares em todo o mundo através de redes sociais e aplicativos de mensagens, poderíamos esperar que a solidão fosse coisa do passado. No entanto, a realidade parece ser bem diferente. Em um mundo cada vez mais digital, a sensação de isolamento emocional e social está se tornando uma preocupação crescente. Como é possível que, apesar de estarmos constantemente conectados, ainda nos sintamos tão sozinhos? E o que podemos fazer para lidar com isso?
O Paradoxo da Conexão Digital
A tecnologia trouxe uma nova forma de comunicação, permitindo que estejamos sempre em contato com outras pessoas. No entanto, essa conectividade não tem se traduzido em um aumento genuíno de interação social significativa. Sherry Turkle, professora do MIT e autora do livro Alone Together (2011), explora como, apesar da promessa de maior proximidade, as interações digitais muitas vezes são superficiais. Turkle argumenta que as conexões digitais não substituem as interações humanas profundas, mas frequentemente oferecem apenas um contato rápido e impessoal (TURKLE, 2011). Esse fenômeno é conhecido como o “paradoxo da conectividade”, onde a facilidade de comunicação não se traduz em profundidade emocional.
Além disso, o conceito de “conexões fracas” — aquelas interações que são superficiais e não contribuem significativamente para o bem-estar emocional — está cada vez mais prevalente. Turkle observa que, enquanto a comunicação digital facilita a manutenção de um grande número de conexões fracas, ela não oferece a mesma qualidade de conexão encontrada em interações face a face. O resultado é uma rede social expandida, mas emocionalmente rasa, que pode acentuar a sensação de solidão (TURKLE, 2011).
A Solidão e Seus Efeitos na Saúde
A solidão não é apenas um sentimento passageiro; ela pode ter impactos significativos na saúde. Julianne Holt-Lunstad, psicóloga da Universidade de Brigham Young, tem conduzido pesquisas importantes sobre os efeitos da solidão. Em seus estudos, ela aponta que a solidão pode ser tão prejudicial à saúde quanto fumar 15 cigarros por dia. Holt-Lunstad (2020) destaca que a solidão crônica está associada a uma série de problemas de saúde, incluindo doenças cardíacas e comprometimento do sistema imunológico, além de afetar negativamente a saúde mental, contribuindo para depressão e ansiedade.
Um estudo adicional de Holt-Lunstad e sua equipe também revela que a solidão pode aumentar o risco de mortalidade prematura, tornando-a um problema de saúde pública significativo. Esse risco é amplificado pela falta de suporte social e pela incapacidade de construir e manter relacionamentos significativos em um ambiente digitalizado. A solidão, portanto, não é apenas um estado emocional, mas um fator crítico que afeta a longevidade e a qualidade de vida (HOLM-LUNSTAD, 2020).
Fonte: www.freepik.com
O Papel das Redes Sociais
As redes sociais, projetadas para conectar pessoas, muitas vezes acabam criando um ambiente propenso a comparações sociais prejudiciais. Um estudo conduzido por David L. P. (2021) revelou que o uso intenso de plataformas como Facebook e Instagram pode intensificar sentimentos de inadequação e solidão. Essas plataformas muitas vezes mostram uma versão idealizada da vida dos outros, levando os usuários a se sentirem insatisfeitos com suas próprias vidas.
Essas comparações são alimentadas pela “economia da atenção”, onde a busca por engajamento e visibilidade pode levar a uma competição constante para exibir uma imagem perfeita. Nancy Etcoff (2019) sugere que esse ciclo de validação pode criar um vazio emocional, uma vez que a gratificação instantânea proporcionada pelas redes sociais não se traduz em uma satisfação duradoura. Em vez disso, a necessidade constante de aprovação online pode reforçar sentimentos de inadequação e solidão.
A Falsa Sensação de Proximidade
A sensação de proximidade oferecida pela comunicação digital pode ser ilusória. Embora possamos trocar mensagens instantaneamente, isso não garante que essas interações sejam emocionalmente satisfatórias. Estudos mostram que as interações digitais podem carecer de aspectos essenciais da comunicação, como o tom de voz e a linguagem corporal, que são fundamentais para o entendimento e a empatia (DAVID, 2021). Esses elementos ausentes podem contribuir para mal-entendidos e uma sensação de desconexão, mesmo quando estamos tecnicamente conectados.
A falta de profundidade nas interações digitais pode resultar em uma comunicação menos eficaz e em uma maior dificuldade para resolver conflitos e construir relacionamentos significativos. Isso reforça a ideia de que, apesar das vantagens tecnológicas, a comunicação face a face ainda é essencial para manter relações saudáveis e satisfatórias.
Estratégias para Mitigar os Efeitos da Solidão
Para enfrentar o paradoxo da solidão na era digital, é importante adotar estratégias que promovam interações mais significativas. Aqui estão algumas sugestões baseadas em pesquisas recentes:
Limitar o Tempo de Tela: A pesquisa realizada por Smith et al. (2022) sugere que reduzir o tempo gasto nas redes sociais pode melhorar a sensação de solidão e aumentar a satisfação com a vida. Estabelecer limites claros para o uso de dispositivos e buscar momentos para desconectar pode beneficiar o bem-estar emocional.
Priorizar Conexões Autênticas: Em vez de focar em números de seguidores ou curtidas, é mais saudável buscar interações reais e profundas. Participar de atividades sociais presenciais pode ajudar a fortalecer laços genuínos e oferecer suporte emocional mais robusto.
Praticar Mindfulness: A prática de mindfulness pode ajudar a aumentar a consciência sobre como a tecnologia afeta nossas emoções. Kabat-Zinn (2020) sugere que a atenção plena pode ajudar a equilibrar o uso da tecnologia com interações significativas, reduzindo a sensação de solidão.
Buscar Suporte Profissional: Se a solidão se tornar um problema sério, é fundamental procurar o apoio de um terapeuta. A terapia pode fornecer ferramentas para construir e manter conexões significativas e oferecer suporte para lidar com os impactos emocionais da solidão.
Conclusão
Embora a hiperconectividade digital ofereça várias vantagens, ela também traz o paradoxo da solidão. Interações digitais, embora convenientes, muitas vezes não substituem o contato humano genuíno e podem contribuir para sentimentos de isolamento. Reconhecer esses desafios e adotar estratégias para promover conexões autênticas pode ajudar a mitigar os efeitos negativos da solidão. Em última análise, apesar das constantes conexões digitais, a importância das relações humanas reais e significativas permanece fundamental para nosso bem-estar.
Referências
ETCOFF, Nancy.Happiness: The Science Behind Your Smile. HarperCollins, 2019.
HOLM-LUNSTAD, Julianne. The benefits of social connections for health and longevity. American Psychologist, v. 75, n. 7, p. 752-764, 2020.
KABAT-ZINN, Jon.Wherever You Go, There You Are: Mindfulness Meditation in Everyday Life. Hachette Books, 2020.
SMITH, Aaron; PERRIN, Andrew; TURNER, Emily. The impact of social media use on well-being: A systematic review. Journal of Digital Health, v. 8, n. 4, p. 123-139, 2022.
TURKLE, Sherry.Alone Together: Why We Expect More from Technology and Less from Each Other. Basic Books, 2011.
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Modernidade líquida: uma análise do episódio “Nosedive” da série Black mirror
11 de setembro de 2024 Melissa Fernandes Magalhães
Série/Programa
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A cada momento que passa, as tecnologias sofrem diversos avanços e trazem novas formas de se conectar com o mundo, formas mais acessíveis e rápidas. O processo de globalização trouxe também uma grande ironia para o atual contexto que vivemos, onde cada vez mais parecemos nos afastar e nos individualizar em nossa existência. Isso é o que pode ser descrito como modernidade líquida.
Zygmunt Bauman em seu livro “Modernidade líquida” publicado em 1999, descreve como vivemos em mundo moderno de relações líquidas, utilizando uma analogia entre os relacionamentos as ligas formadas pelos átomos em seus diferentes estados. O estado líquido sugere uma ligação mais distante, enquanto o sólido sugere a maior proximidade entre os átomos para levarem tal forma. Nesta obra ele também fala sobre uma “modernização da modernidade”, onde acontece uma desintegração ou modificação de padrões de relacionamentos, além da liquefação dos padrões de dependência e interação. Quando pensamos em uma obra que trazia essa temática em 1999 sobre o distanciamento das pessoas e o aumento dos processos de individualização devido aos novos padrões estabelecidos na modernidade, nos faz pensar se agora, 25 anos de tecnologias depois, nós não estamos vivendo uma nova fase nas relações: a modernidade gasosa.
Atualmente a temática da liquidez das relações colocada por Bauman, é amplamente retratada em filmes e séries. Entre elas destacamos a série antológica Black Mirror, que busca contar várias histórias independentes entre si que retratam um futuro não tão distante, onde a tecnologia se transforma em um “vilão”, causando impactos a nível mundial. Cada episódio retrata isso de uma forma diferente, em como nós humanos podemos ser facilmente corrompidos e como nós somos capazes de abrir mão até mesmo daqueles mais amados em nossas vidas pessoais.
Em um de seus episódios mais famosos é o primeiro episódio da terceira temporada, chamado de “Queda Livre” ou “Nosedive”, que narra sobre a queda da protagonista Lacie, em uma realidade que avalia uns ao outros por meio da tecnologia, podendo elevar ou descer a posição de um membro da sociedade. Apesar de ser retratada como uma pessoa “louca” durante o episódio, Lacie é uma pessoa comum, que busca não apenas uma validação em meio a sociedade, mas uma aproximação de sua amiga Jayne.
Lacie demonstra ir além de tudo que a sociedade retratada avalia como “bom” ou “aceitável” desde que isso signifique poder comparecer ao casamento de sua amiga, deixando sua máscara cair durante o processo e resgatando sua humanidade a cada vez que caia de posição e classificação.
Em dado momento, a protagonista Lacie publica uma foto de um brinquedo que possuía grande afeto e relação com a amizade com Jayne, mostrando uma busca por validação. Alguns podem pensar que a busca seria por uma validação em meio e a sociedade e boas avaliações, mas eu particularmente vejo que a felicidade de Lacie ao ver que Jayne deu a melhor avaliação possível para a foto, se dá pelas “migalhas de afeto” que busca em meio a uma modernidade líquida.
Ao contrário do que os demais prezavam ser importante, Lacie demonstra um real desespero para reatar ou estreitar laços de uma amizade antiga com Jayne, que revela para Lacie que sua intenção ao convidá-la não era uma demonstração de afeto e consideração, mas sim uma tentativa de elevar sua própria classificação. Quando Jayne vê que a classificação de Lacie caiu drasticamente, ela imediatamente desconvida de seu casamento, jogando a fora com apenas uma ligação. Jayne não faz ideia e sequer quer saber as distâncias que sua amiga foi para poder comparecer no casamento, porque os laços não significam nada sem uma boa avaliação da sociedade.
O desfecho do episódio se dá com um breve diálogo entre Lacie e um homem, ambos na prisão. No primeiro momento Lacie se mostra irritada com a situação e troca “ofensas” com o homem na cela da frente, o que nos leva de volta ao conceito de avaliar uns aos outros de forma negativa mesmo que seja a primeira impressão sobre alguém que não conhecem profundamente. A cada “avaliação ruim”, tanto Lacie quanto o homem da cela na frente parecem se divertir com a ideia de falarem o que quiserem sem precisar temer uma “má reputação”, finalizando com os dois sorrindo e rindo um para o outro enquanto desbravam sua angústia e raiva pela sociedade com um “vá se foder”.
Fonte: Reprodução Netflix
A história de Lacie e Jayne nos coloca para pensar sobre como os valores que cada um de nós colocamos em nossas relações em uma sociedade que a cada dia que passa se torna mais tecnológica e líquida. O que Lacie poderia ter feito de diferente, diante um contexto que se nega a ouvi-la e acolhê-la por suas qualidades? Se Lacie se sentisse sozinha e abandonada, a solução seria tentar subir de classificação? Ou deveria Lacie jogar fora completamente a ideia de classificações, buscando pessoas que valorizem mais relações do que ser “bem” avaliado e visto na sociedade? Teria Lacie finalmente encontrado uma verdadeira conexão mesmo que talvez breve com seu parceiro de cadeia? Isso tudo podemos apenas imaginar.