O espaço escolar e acadêmico se torna um ambiente comprometedor e adoecedor, por fatores sociais, que pode trazer à tona uma “atmosfera” competitiva
Neste 11/08 se comemora o dia do estudante. A data foi sugerida em 11 de agosto de 1927 para homenagear os primeiros cursos de ciência jurídica implementados no Brasil. Relembrar e repercutir o dia do estudante é uma maneira de não olvidar importantes pesquisas científicas que surgem das universidades, assim como a construção do conhecimento que molda um futuro mais abrangente para a realidade de crianças, adolescentes e adultos.
Mais que nunca a educação se encontra sucateada, assim como desvinculada como prioridade. O governo demonstrou seu descaso ao anunciar corte de R$ 5,8 bilhões nas verbas destinadas às universidades públicas e programas de fomento à pesquisa, com a desculpa de que tais recursos seriam investidos na educação básica, entretanto, além de não cumprir, retalhou investimentos em programas de apoio a educação em tempo integral, construção de creches, alfabetização e ensino técnico. Os dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) e Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento do Governo (Siop) (REDAÇÃO RBA, 2019).
Além dos problemas externos resultantes do cenário político, realidades internas, ou melhor, estados psíquicos, também estão em evidência. A psicóloga Karen Graner, atualmente, participa de projetos de pesquisa em Psicologia da Saúde e Saúde Coletiva com enfoque na saúde mental de estudantes universitários (sofrimento psicológico e uso de substâncias, e fatores associados). Ela dirigiu uma pesquisa que levanta dados sobre o adoecimento psíquico, sendo que 30% dos brasileiros encontram-se nessa realidade; em escala mundial, os números aumentam em 49,1%, sendo que em cada dois estudantes, um se encontra afetado por questões diretamente relacionadas com a saúde mental (REDAÇÃO G1, 2018).
Em 2016, a “Pesquisa Censo e Opinião Discente” na Universidade Federal do ABC (UFABC) mostrou que 17,92% dos trancamentos durante o ano foram por “questões psicológicas” (REDAÇÃO G1, 2018). De alguma maneira a saúde dos estudantes vem sendo comprometida por fatores em comum.
Quando se abre brechas para a fala desses alunos, percebe-se que o espaço escolar e acadêmico se torna um ambiente comprometedor e adoecedor, por fatores sociais, que traz à tona uma “atmosfera” competitiva, pela qual não estar na frente, é perder um status, uma boa nota, e até um futuro promissor. “É muito complicado, porque existe uma cobrança da sociedade e da gente mesmo”, relatou uma ex estudante do ensino superior, que não quis ser identificada, que pausou os estudos por estar lidando com premissas que a fizeram entrar em adoecimento psíquico.
Por vezes esses alunos se cobram como se fossem uma “máquina de resultados”, e aos poucos não mais é necessário que alguém os pressione, pois a autocobrança se torna um pensamento constante e excessivo, como defende Eliane Brum, do jornal El País, “Exaustos-e-correndo-e-dopados”. Na mesma linha, segundo Han: “somos ao mesmo tempo prisioneiro e vigia, vítima e agressor. Assim, acabamos explorando a nós mesmos. Com isso, a exploração é possível mesmo sem senhorio”. Sobre uma suposta liberdade de conhecimento, sucesso, estabilidade financeira, os indivíduos acabam por se tornar escravos de seus objetivos, e o custo em nossa atualidade, de tantos desdobramentos em torno de esforços que por vezes nem sequer passam pela nossa consciência, é o adoecimento.
Em poucas culturas se incita o autoconhecimento e autocontrole, as esferas emocionais acabam sendo “deixadas de lado” quando na verdade, se conhecer profundamente e saber lidar com questões internas acaba reverberando de forma positiva nas relações sociais. Os indivíduos não teriam de adoecer para perceber o quão a saúde mental é importante para esferas do trabalho, da família, e das demais relações. A realidade de muitos se insere em uma compreensão de mundo que não compete o criticismo, tornando os seres altamente manipuláveis, fazendo com que se tornem uma peça que move a engrenagem que ajudará nesse contexto competitivo, que ignora fatores emocionais, a mercê de um “futuro brilhante”.
Para mudar as alarmantes estatísticas, é preciso trazer à tona a necessidade de olhar para dentro de si, compreender limitações, feridas passadas, inserir no contexto infantil a importância da frustração para o desenvolvimento da autoestima, assim como a criticidade social. Tudo isso para se contrapor a uma sociedade narcísica, com uma positividade tóxica, que por vezes não valoriza a internalização e o entendimento dos sentimentos negativos. A marginalização desses sentimentos se somatizam no corpo em forma de dores e doenças físicas, tornando estudantes, e futuros trabalhadores, adoecidos.
REFERÊNCIAS:
BRUM, ELIANE. Exautos-e-correndo-e-dopados (2016). Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2016/07/04/politica/1467642464_246482.html Acesso em: 05 ago. 2019.
GRANER, Karen Mendes. Biblioteca virtual Da FAPESP. Disponível em: https://bv.fapesp.br/pt/pesquisador/104707/karen-mendes-graner/ . Acesso em: 05 ago. 2019.
QUERO BOLSA. Saúde Mental é Problema Frequente em estudantes no Brasil (2018). Disponível em: https://g1.globo.com/sp/vale-do-paraiba-regiao/especial-publicitario/quero-bolsa/bolsas-de-estudo/noticia/2018/08/31/saude-mental-e-problema-frequente-entre-estudantes-no-brasil.ghtml Acesso em: 05 ago. 2019.
REDAÇÃO RBA. Governo Bolsonaro Corta Recursos Da Educação Básica (2019). Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/educacao/2019/07/governo-bolsonaro-corta-recursos-da-educacao-basica/ Acesso em: 05 ago. 2019.