mulher

A esquizofrenia de ser mulher

A revista Saúde sobre a mesa, na clínica de estética e massagem, é um chamariz. Empolgada, a mulher lê com avidez a reportagem sobre apetite sexual. Até que, repentinamente, o silêncio da recepção lotada de corpos femininos à espera de atenção do atendimento especializado (e cheio de promessas) mas também de olho no relógio, é quebrado, pela voz alta:

– “O quê? Quer dizer que quem faz muito sexo tem mais saúde? “

Assustadas, as demais deixam suas leituras, entreolham-se sem entender com quem ou para quem a tal cliente está perguntando, e aguardam o que virá rapidamente a seguir:

– “Então, eu sou doente! Porque não tenho este apetite sexual todo!!!!”

Ninguém ri, apesar de, no íntimo, a maioria achar engraçado aquela mulher se questionar e responder sobre um assunto tão íntimo e particular, de forma tão espalhafatosa.  Certamente, todas, indistintamente, tenham pensado em suas próprias vidas sexuais, afetivas, cobradas pela estética obsessiva e a quase obrigação social de serem ideais, perfeitas.

E não é só esta a carga diária e esquizofrênica da mulher, na atualidade.

É fácil enumerar a lista de exigências. Difícil é atender a todos os itens: beleza, inteligência, feliz e boa de cama (e com muito apetite!!). E aí, poderia estender a lista: boa mãe, boa profissional, agradável nas redes sociais, desejada.

Por isso é melhor tratar por parte e ficar só nos quatro primeiros itens. Esquizofrenia ou não, no fundo, todas de alguma forma, perdem num ou noutro quesito(e fazem o máximo para esconder, claro).

Fundamental ou não a beleza é vista e exigida pela sociedade. Natural ou produzida, esta condição é perseguida, nos consultórios médicos(cirurgias plásticas), dentários(clareamentos e implantes de novos dentes), psicológicos(quando é difícil demais ser feio).

Inteligência, dote ou conquista? Tem um poço onde se retire este produto? Mulher inteligente quase sempre é o contrário de bonita? Ah, a tal da inteligência nos garante aprovação nos concursos públicos, mas pode nos impedir de ganhar o rapaz mais bonito do colégio. Inteligência nos faz alcançar postos no trabalho, mas pode ser razão para que deixemos de ter filhos. E nem é preciso mencionar a chamada inteligência emocional, que é outra história.

Feliz. Por que é cada vez mais difícil ser feliz? Depois de passar pela beleza e a inteligência, como ser feliz? Se tiver beleza, mas não for inteligente, será feliz? E o contrário? Sendo inteligente, mas feia, será feliz? Como ser feliz se não atender o próximo item?

Ah, depois de ser bonita o dia inteiro, tomar decisões inteligentes no trabalho, na família, na igreja, na rua, ainda resta fôlego para ser boa de cama? Apetite sexual depois de 16 horas de trabalho, de contas à pagar, de colegas que querem puxar o tapete, de filho que vai chegar à adolescência logo…quando só se quer a cama para dormir…

Não é fácil ser mulher. Quem disse que seria? Lotados estão os consultórios: atrás de inteligência, beleza, felicidade.

Mas no mesmo lugar se resolve tudo, pode dizer um homem cheio de humor.

– “Na cama”, é a resposta.

–  “Sim, pode até ser”.

O melhor sexo também precisa de preparo. Como uma refeição é preciso ‘preparar o prato’: limpar a panela, aquecer a chama, acrescentar os temperos. E ainda tem a mesa, de preferência, com boa iluminação. Com luzes especiais, toda mulher fica bonita, inteligente, feliz, e certamente terá muito apetite, para ser boa de cama.

Finalizo. Ainda é difícil ser mulher. Mas, vamos em frente. A mesa está posta:

– “Pode vir, estou cheia de saúde!”