A romantização do uso de álcool no adulto jovem

A transição para a vida adulta marca o fim da puberdade e culturalmente encerra-se o período de adolescência, que geralmente é marcada por inúmeras descobertas, como o do próprio corpo, identidade sexual e uma maior busca pelas atividades sexuais. A expectativa e a experiência de conquista pela independência em todas as áreas da vida são libertadoras. Porém, a responsabilidade de sustentar as tomadas de decisões, o controle financeiro, a interação com os grupos sociais nem sempre é fácil e pode se tornar algo pesado. Este peso pode trazer muitos transtornos na vida do adulto jovem, e iremos analisar um destes: o uso problemático de álcool.

A literatura aponta que os estudos epidemiológicos no Brasil possibilitam a afirmação de que o álcool é um dos maiores problemas de saúde pública do país. Apesar de ser lícito, traz custos altos para a sociedade e o uso excessivo no país requer uma atenção maior nos projetos de saúde. Além de que o consumo do álcool abrange questões sociais, físicas, psicológicas, individuais e farmacológicas (VICTORA et al, 2011).

É muito comum no Brasil, encontrarmos lugares em que a bebida alcoólica é oferecida em bares, botecos, distribuidoras, pubs, e nos mais diversos eventos sociais. O consumo de bebidas alcoólicas atinge o auge no início da vida adulta. Nas faculdades é muito comum encontrar jovens que fazem o uso com mais frequência e assiduidade do que em jovens que não frequentam a faculdade (SAMHSA, 2004).

Alguns motivos que podem levar o adulto jovem a consumir bebida alcoólica com frequência estão na influência das amizades, na necessidade de se enquadrar em grupos sociais, distrair-se em momentos de tensão ou estresse, para fugir de problemas, por lazer e/ou para se sentirem mais seguros em situações com outras pessoas (SOARES et al., 2017).

Algumas questões a serem trabalhadas estão em quais medidas poderiam ser tomadas para que o consumo de álcool pudesse ter menor repercussão na sociedade e como esse consumo de álcool poderia ser desencorajado na população usuária.

O álcool além de ter o potencial de causar dependência, é responsável por inúmeros acidentes automobilísticos, suicídio, violência doméstica, comportamento sexual de risco, problemas de saúde, e se torna um grande potencializador para quem está passando por transtornos mentais. Pode agravar casos de ansiedade, desencadear distúrbios no sono e a probabilidade do usuário cometer agressões sexuais (BRECKLIN e ULTMAN, 2010).

Fonte: pixabay

O comportamento suicida é multifatorial, mas o uso de substâncias psicoativas é um fator de risco e pode ser também um fator decadente. O desejo de consumir as substâncias, como o álcool por exemplo, podem acarretar em uma ânsia e necessidade de consumo quando a mesma está em falta. A bebida pode causar o aumento da impulsividade, podendo ocorrer surtos psicóticos, e também gerar uma característica depressora no Sistema Nervoso Central, tornando-se um agravante para pessoas já deprimidas, sendo assim uma das possibilidades causadoras do suicídio (RIBEIRO et al., 2016).

 As autoras Papalia e Feldman (2013) citam que o consumo de risco de álcool é definido quando um indivíduo consome mais de 14 doses de álcool por semana ou de quatro doses em um único dia para homens; e para as mulheres são sete doses por semana e até três doses em único dia. Aproximadamente 3 em cada 10 pessoas são consideradas dentro da faixa de consumo de risco com grande probabilidade de se tornarem dependentes químicos ou de contrair problemas mentais, físicos e sociais e desenvolverem doenças hepáticas.

Dados de 2019 do Ministério da Saúde, apontam que 17,9% da população brasileira adulta faz uso de bebida alcoólica. Mesmo com um percentual menor, as mulheres (11%) tiveram um maior crescimento que os homens (26%) no período de 2016 a 2018. Pesquisas apontam ainda que o uso abusivo entre os homens é maior na faixa etária de 25 a 34 anos e entre as mulheres na idade de 18 a 25 anos e que o consumo frequente tende a diminuir com o avanço da idade em ambos os gêneros.

Este consumo excessivo principalmente na faixa do adulto jovem tende a ser muito romantizado principalmente com as consequências do uso, é comum as pessoas falarem sobre as ressacas, de beber até cair e dar os famosos “pt” como algo bonito ou descolado e até engraçado, gerando vários memes na internet ou assunto nas redes sociais e nas rodas de conversa.

Mesmo que as pessoas digam que fazem o uso social de bebida alcoólica, é importante enfatizar que não existe consumo de álcool isento de riscos, Importante mencionar que a Dependência Química é um transtorno mental, e como tal, há outros fatores envolvidos além do hábito de beber. Como por exemplo, predisposição genética e vulnerabilidade biológica. No entanto, mesmo que não preencha critérios diagnósticos para dependência química, o hábito de beber pode causar prejuízos psicossociais, assim como orgânicos.  “Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais” (DSM-5, 2014).

Faz-se necessário apontar que existem dispositivos que ofertam serviços para os usuários de álcool e drogas, os Centros de Atenção Psicossocial em Álcool e Drogas (CAPS-AD) do Ministério da Saúde, é um dispositivo de assistência e tratamento para os usuários, bem como trabalha com uma política de redução de danos em relação ao uso destas substâncias. É muito importante que os profissionais de saúde trabalhem para promover a facilitação de acesso ao tratamento, ampliando informações para os usuários e para os familiares de como buscar ajuda.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Ministério da Saúde, Consumo abusivo de álcool aumenta 42,9% entre as mulheres. Brasília, 2019.

Brecklin, L. R., & Ullman, S. E. (2010). The roles of victim and offender substance use in sexual assault outcomes. Journal of Interpersonal Violence, 25(8), 1503–1522. doi: 0886260509354584.

Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.

Papalia, Diane E. Desenvolvimento humano [recurso eletrônico] / Diane E. Papalia, Ruth Duskin Feldman, com Gabriela Martorell ; tradução : Carla Filomena Marques Pinto Vercesi… [et al.] ; [revisão técnica: Maria Cecília de Vilhena Moraes Silva… et al.]. – 12. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : AMGH, 2013.

Ribeiro DB, Terra MG, Soccol KLS, Schneider JF, Camillo LA, Plein FAS. Motivos da tentativa de suicídio expressos por homens usuários de álcool e outras drogas. Rev Gaúcha Enferm. 2016 mar;37(1):e54896. doi: http://dx.doi. org/10.1590/1983-1447.2016.01.54896.

SOARES, Fernanda de Jesus; OLIVEIRA, Daiana C.; OLIVEIRA, Paula R.; LIMA, Tatiane S.; ALVES, Adriana L.R.; SILVA, Matheus L.; DUARTE, Stênio Fernando P. Análise dos Motivos dos Jovens e Adultos consumirem Álcool. Id on Line Revista Multidisciplinar e de Psicologia, Maio de 2017, vol.11, n.35, p.554-566. ISSN: 1981-1179.

Substance Abuse and Mental Health Services Administration (SAMHSA). (2004b). Results from the 2003 National Survey on Drug Use & Health: National findings (Office of Applied Studies, NSDUH Series H-25, DHHS Publication No. SMA 04-3964). Rockville, MD: U.S. Department of Health and Human Services.

Victora, C. G., Barreto, M. L., Leal, M., Monteiro, C. A., Schmidt, M. I., Paim, J. et al. (2011). Health conditions and health-policy innovations in Brazil: the way forward. Lancet, 377(9782), 90-102.  https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60055-X.