Bart Simpson sob a lente da Psicanálise

Com o objetivo abordar as concepções da psicanálise freudiana, tais como: associação livre, catarse, insight, autoanálise, resistência; dando ênfase em transferência e contratransferência será utilizado o episódio 14 da 18ª temporada da série “The Simpson”, o qual retrata uma visita de Bart a uma terapeuta. As teorias são relacionadas com o episódio de acordo com a ordem cronológica das cenas no setting terapêutico.

Neste episódio Bart Simpson é levado pelo pai à terapia, este foi encaminhado pela escola após contar uma história de terror amedrontado seus colegas. Já no trajeto ele demonstra resistência e relembra ao pai que já foi ao psicólogo anteriormente e que isso não resultou em nada. Essa resistência se perdura no primeiro contato com a terapeuta, ele retrata que já passou por diversas técnicas terapêuticas e nenhuma obteve êxito, fomentando sua postura relutante de aderir ao tratamento.

Segundo Freud (1914), a resistência é uma força que impede o acesso consciência, ou seja, o material inconsciente fica impossibilitado de ser conduzido até a consciência. De acordo com o texto “Recordar, repetir e elaborar” entende-se que a resistência consiste em uma arma que o indivíduo se utiliza para não confrontar seus medos e traumas. O terapeuta, por sua vez, deve desarmá-lo, tirando essas armas uma a uma.

Bart vira-se para o lado, demonstrando desinteresse, a terapeuta se mostra neutra, ela fala para o mesmo “pode ficar à vontade”, pois a escola pagou cinco sessões. Partindo do pressuposto de que ele é uma criança e gosta de vídeo games, ela utiliza um jogo para facilitar o vínculo entre eles, e assim passa a observar a sua postura e começa a traçar um esboço de sua personalidade. A profissional toma nota da postura de Bart, ele se diverte durante o jogo violento, pode-se interpretar então, que ele sublima sua energia psíquica: a raiva que tem do pai (algo inaceitável) é descarregada durante uma atividade socialmente aceitável. Percebe-se que ela se utiliza da Associação Livre ao conversar com Bart sobre o jogo e como o mesmo se porta diante do entretenimento

Segundo Cloninger, a Associação Livre “consiste em pedir que o paciente que lhe diga tudo que vier a cabeça” (1999, p. 63) visto que o menino fala palavras desconexas, o papel do terapeuta é interpretá-los; ao perguntar o que isso significa para ele, pretende-se chegar ao insight. Seu inconsciente opera, quando ele fala de forma condensada sobre o parque de diversão. Nota-se que após este evento ele tem uma catarse, ou seja, seus sentimentos vem à tona, rememorando com angústia o fato do pai não o levar o carrossel e agredi-lo fisicamente com um martelo da marca Stanley, revelando um possível trauma.

Após isso ele relata um sonho, que segundo Freud (1910), é a forma mais fácil de acessar o inconsciente, pois quando dormimos, as forças inconscientes relaxam, permitindo que o material que está no inconsciente passe para a consciência, no entanto, de forma camuflada e transvertida para que a consciência não se dê conta do material que originou o sonho.

No fim das cinco sessões, ele descobre que é a última, Bart fica abalado emocionalmente com sentimento de perda, nesse momento ficou evidente a transferência, pois o mesmo desenvolveu uma relação com a terapeuta baseada em projeções inconscientes do início da sua vida, ou seja, ele a percebe erroneamente e experimenta emoções antes reprimidas (CLONINGER, 1999).

Após este processo psicoterápico o êxito não foi alcançado, visto que, vivenciar a catarse não significa a elaboração do trauma.  A mãe ao observar a tristeza de Bart, o leva novamente a uma sessão, na qual ocorre o insight, que é o indivíduo se dar conta, ou seja, se conscientizar do seu sofrimento e ocorre então a elaboração, é possível observar que ele foi direcionado pela terapeuta ao seu primeiro trauma.

No primeiro trauma atua a repressão originando os complexos psíquicos (FREUD, 1910), percebe-se que o fato do Bart amedrontar os colegas é um derivado, o que originou esse derivado foi a agressão física que o pai lhe inferia, a raiva que desenvolveu para com o mesmo é o material que foi jogado para o inconsciente, agora ao invés de bater no pai, por medo projeta nos seus colegas esta raiva, passando a contando histórias de terror, na quais o personagem tem o mesmo nome da marca do martelo com o qual apanhava.

Na última cena percebe-se a contratransferência, que é a totalidade das emoções despertadas durante o setting terapêutico no profissional, sendo o paciente fator desencadeante (CLONINGER, 1999).   Observa-se que a terapeuta não quer a partida de Bart, visto que desenvolveu sentimentos por ele, na supervisão é possível compreender que a mesma não relaciona tal sentimento como sendo seu. Então o seu supervisor esclarece a relação existente entre Bart e seu filho morto através do “misterioso” Stanley. Interpreta-se por fim, que esta matou o filho com o mesmo martelo, e possivelmente o seu terapeuta já relacionou isso, a mulher diz não estar preparada para confrontar esse assunto.

REFERÊNCIAS

CLONINGER, S. C., Freud: Psicanálise Clássica, Tipos de Personalidade, São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 35-75.

SIGMUND, F. Cinco Lições de Psicanálise, 1910, p. 13-51.

SIGMUND, F. Obras Completas, Vol. XII, Recordar, repetir e elaborar, 1914, p.1-9.