Dia do idoso: interface entre a velhice e a psicologia

É possível perceber que demograficamente existe um processo de envelhecimento instaurado, e a ONU (Organização das Nações Unidas) aponta que o período de 1975 a 2025 é a Era do Envelhecimento. No que tange o Brasil, o IBGE aponta que em 1970 por volta de 4,95% da população do Brasil era idosa, e em 1990 esse número cresceu para 8,47%, o que aponta para que em 2020 a 2025  expectativa de vida do brasileiro suba de 66 anos em 1990, para 77 (SIQUEIRA; BOTELHO; COELHO, 2002).

A velhice é percebida por alguns autores como um fenômeno natural e social, que se mostra sobre o ser humano com limitações de ordem biológica, econômica e sociocultural. Para Beauvoir (1976) a sociedade aponta diversos clichês sobre a velhice, onde o idoso é descrito por outras pessoas e não por ele mesmo, e a autora defende que o idoso é um indivíduo que interioriza a própria condição e a ela reage.

Erik Erikson aponta que de acordo com cada fase do desenvolvimento surgem outras necessidades e determinações que são de origem do próprio indivíduo ou também do ambiente no qual ele faz parte, o autor ainda denota que às exigências e incentivos que existem em cada período do ciclo vital são diferentes e se complementam no que são chamadas de crises virtuais, que provém da modificação substancial de perspectiva (FORTES, 2012)

De acordo com Papalia e Feldman (2013), a identidade se constrói para Erikson com base na formação do self, que é composto por crenças e valores, e possui grande importância no desenvolvimento da adolescência que em breve formará um adulto mais dotado de capacidade para o enfrentamento dos embates da vida. Diante disso, verificamos como cada estágio é importante e como cada crise é essencial para o estágio seguinte e para que o indivíduo consiga elevar seu nível de maturidade e ser capaz de lidar com outras questões que possam surgir nas próximas fases do desenvolvimento psicossocial.

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Bordignon (2007, p.13) aponta que “cada estágio psicossocial traz consigo uma crise e um conflito centrado num conteúdo antropológico específico”, diante disso, a crise é uma chance que produz o desenvolvimento do indivíduo, uma situação que necessita tomada de decisão ou até mesmo uma situação de regresso e insucesso.

Conforme Fortes (2012), cada nova fase ou estágio do desenvolvimento, uma crise diferente surge para ser enfrentada e vencida pelo Ego que  está em processo evolutivo, e o desfecho para tal crise acarreta dois tipos que são o tipo positivo e negativo, que impactará na forma como a próxima fase será enfrentada, onde o indivíduo e o meio são fundamentais para solucionar às demandas que possam surgir.

Segundo Bordignon (2007),  no que tange o tipo positivo de resolver cada conflito ou crise entre as forças sintônicas e distônicas surge então uma força denominada como básica que origina uma potencialidade, que torna-se parte da vida do sujeito, porém quando não ocorre a solução da forma apropriada da crise surge uma patologia básica, que também passa a ser considerada como parte da vida do sujeito.

Quando após a finalização e quando a crise é entre a confiança e a desconfiança é resolvida, a consequência então é a esperança, e na crise entre autonomia e vergonha resulta na vontade, sucessivamente cada crise de cada estágio psicossocial consiste na sabedoria que surge através da resolução positiva entre a crise da integridade e o desespero (BORDIGNON, 2007).

Cada crise e cada conflito vivenciado em cada fase do desenvolvimento são fundamentais para que o sujeito consiga se desenvolver de uma forma mais apropriada, porém existem casos onde o insucesso em determinadas fases prejudica o andamento e a evolução das próximas fases. Todas as fases estão interligadas e co-dependem umas das outras.

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De acordo com Carpigiani et al (2014), o papel do ego é organizar às memórias do indivíduo e sintetizar suas experiências vividas na esfera emocional, e a partir disso, teremos a garantia de uma vida psíquica estável e saudável, pois é importante e fundamental que às três dimensões estejam integradas, sendo elas: dimensão biológica, social e individual. A dimensão biológica se refere ao desenvolvimento biológico, e a social tange as relações culturais que possuem enorme influência na formação da personalidade do sujeito desde quando ele ainda é um bebê, e a dimensão individual que corresponde a forma individual e única de como o sujeito irá constituir sua identidade, estando totalmente atrelada ao ego e no acoplamento das memórias e das percepções do indivíduo em relação ao que é real, ao que é fantasia e que contribuem para a construção intersubjetiva do indivíduo.

Cada dimensão possui suas características próprias, porém para Erikson as três são extremamente importantes para a constituição e formação da identidade do indivíduo, dessa forma, as peculiaridades de cada dimensão possuem influência e importância nas outras, geram algum tipo de impacto nas outras dimensões.

Conforme a teoria psicossocial, o desenvolvimento do ego se dá a partir da relação de interdependência entre o interno e o social (CARPIGIANI et al, 2014). O meio social possui grande influência no desenvolvimento do indivíduo, visto que desde a infância ele sofre com estímulos externos provenientes da cultura e que impactam diretamente na formação da identidade e da subjetividade do indivíduo.

Conforme Rabello e Passos (2008), Erikson em sua teoria percebe o ser humano como um ser social, e esse ser social está inserido em grupos e está sujeito à influências destes grupos, e o desenvolvimento humano é dado por fases onde que ocorrem de maneira ininterrupta e as anteriores sempre impactam e influenciam nas outras fases, nas próximas fases. Quando o sujeito enfrenta as crises presentes em cada fase, ele irá se tornar mais fortalecido para conseguir enfrentar as próximas crises nas próximas fases que virão, ou também pode acontecer que o indivíduo se fragilize nessas fases e esteja mais enfraquecido e vulnerável nas próximas fases, diante disso, o desenvolvimento do sujeito possui ligação direta com o contexto social onde ele está inserido.

Com base no contexto do qual o indivíduo faz parte, ele sofrerá alguns impactos no seu processo de desenvolvimento, dessa forma, para Erikson, o contexto social possui uma forte influência na formação identitária do indivíduo, desde os grupos dos quais ele participa quanto da cultura como um todo, ambos possuem relação com a construção da identidade e com o desenvolvimento do indivíduo.

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Segundo Nascimento et al (2016), as crises que o ego enfrenta levam à maturação no que tange o meio social, e esse processo está relacionado à determinantes culturais, às condições e à personalidade. De acordo com as vivências do ego, a maturação ocorrerá de modo diferente em cada sujeito, mas a influência da cultura e do meio social é de grande importância.

Ao decorrer do processo evolútico, a personalidade passa por transformações e modificações que visam a reestruturação e adaptação da mesma de acordo com as experiências passadas que ocorreram de forma adequada ou nos insucessos das fases antecedentes, e tal preceito qualifica-se como epigenético (FORTES, 2012).

Para Veríssimo (2002), a Velhice no desenvolvimento psicossocial de Eriksson corresponde a um momento de relações significativas, onde há a modalidade de relacionamento pautado em ser na medida em que se foi e o enfrentamento do não ser. Para o autor, existe também a crise psicossocial com a manifestação do sentimento de integridade x desesperança, onde pode haver a presença da virtude associada renúncia e sabedoria, e psicopatologias relacionadas como alienação extrema e desespero.

É na velhice que o indivíduo sente o final do ciclo vital se findando e sente não ter muitas coisas pela frente, é o momento onde ele se vê obrigado a olhar para o passado e orgulhar-se do que fez ou não, e não somente o que fez, mas como o seu próprio ego se constituiu ao longo da vida, e esse momento pode dar origem a um sentimento de integridade e satisfação, ou até mesmo amargura e inaceitação do confronto com a morte (VERÍSSIMO, 2002).

Conforme o modo como cada fase do desenvolvimento foi enfrentada e vivenciada pela pessoa idosa, a fase da velhice será um momento de pensamentos mais calmos e satisfatórios ou de dor, pois é bastante comum que o idoso passe bastante tempo rememorando suas vivências, e tais lembranças podem trazer o sentimento de dor ou de alegria, depende de como cada fase anterior foi enfrentada.

Na velhice é o momento de reflexão acerca do que se foi, acerca do que o indivíduo foi e fez durante a vida, pouco se é pensado sobre o que ainda fazer, geralmente não existem grandes planos a longo prazo nesse momento da vida. Se as crises ao longo da vida foram resolvidas, o saldo da reflexão será positivo. Para Erikson (1964, p. 133): “a sua preocupação face à morte vira-se para a vida em si mesma”.

Diante disso, as crises que não foram resolvidas nas fases anteriores podem se manifestar como amargura, visto que o tempo é menor e mais escasso agora para tentar novamente ou para começar do zero, pois o indivíduo vê-se sem alterativas ou possibilidades com tempo suficiente para refazer algumas coisas. É comum que a inevitabilidade da morte traga quadros oscilantes de depressão e agressividade deslocada.

Referências:

BEAUVOIR, Simone. A velhice: realidade incômoda. (2a ed.). DIFEL, São Paulo 339pp. 1976

BORDIGNON, Nelso AntonioO desenvolvimento psicossocial do jovem adulto em Erik Erikson, Revista Lasallista de Investigación, vol. 4, núm. 2, 2007, pp. 7-1

CARPIGIANI, Berenice. Erik H. Erikson – Teoria do Desenvolvimento Psicossocial. Disponível em: http://www.carpsi.com.br/Newsletter_7_ago-10.pdf. Acesso em: 28 nov. 2019.

ERIKSON, Erik. O ciclo de vida completo.(trad.) Maria Adriana Veríssimo Veronese. Porto Alegre: artes Médicas, 1998.

NASCIMENTO, Isabela Ribeiro Villares; ALVES, Edvânia dos Santos, JÚNIOR, José Policarpo. Contribuições do pensamento de Erik Erikson à ideia de formação humana à educação. Disponível em: http://www.editorarealize.com.br/revistas/conedu/trabalhos/TRABALHO_EV045_MD1_SA6_ID2022_0 9092015150858.pdf. Acesso em: 28 nov. 2019.

PAPALIA, Diane E.; FELDMAN, Ruth Duskin. Desenvolvimento Humano. 12 ed. Porto Alegre: AMGH, 2013.

RABELLO, Elaine. Personalidade: estrutura, dinâmica e formação – um recorte eriksoniano. Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2001. (monografia).

VERISSÍMO, R. Desenvolvimento psicossocial (Erik Erikson). Porto: Faculdade de Medicina do Porto, 2002.