O manejo da ansiedade na abordagem EMDR

Vitor Costa de Ciqueira (CRP-09 / 17562) – @vitoralfs

Você já ouviu falar sobre o EMDR (Eye Movement Desensitization and Reprocessing)?

Essa é uma  nova abordagem da psicologia que tem como premissa básica que nossos comportamentos disfuncionais surgem de traumas não processados. A partir do trauma é utilizado as percepções originais daquela experiência ruim, relembrando as imagens, crenças e emoções negativas. Então é feito o reprocessamento tornando essas lembranças, crenças e emoções negativas menos válidas e menos perturbadoras para o cliente. Isso permite que o cérebro faça conexões adaptativas, saudáveis e sem distorções sobre si. Portanto, a terapia EMDR é usada para ajudar o paciente a aprender com as experiências negativas do passado, dessensibilizar gatilhos presentes que perturbam a pessoa de forma indevida e incorporar modelos para a ação futura que permitem ao cliente realizar-se individualmente e dentro do seu sistema interpessoal.

Essa abordagem reúne de forma integrativa conceitos de algumas terapias como as respostas condicionadas conforme descritas pela terapia comportamental, o conceito de crenças tal como formulado pela terapia cognitiva, as emoções identificadas pelas terapias experienciais, as sensações corporais discriminadas pelas terapias somáticas, as visualizações das terapias hipnóticas e a compreensão contextual trazida da teoria sistêmica.

Nosso cérebro se recupera de forma natural das memórias e eventos traumáticos. Essa recuperação natural acontece no nosso cérebro entre a amígdala cerebral, hipocampo e o córtex pré frontal. Porém, devido a forma como o indivíduo recebeu o fato pode acontecer de não processar o trauma e/ou processar de forma inadequada.

Existem 3 reações possíveis para o estresse – Luta, fuga ou congelamento. Durante o evento traumático a imagem, os pensamentos e emoções ficam gravados de forma original no seu hipocampo. O evento traumático, por não ter sido processado por seu cérebro, se torna uma memória congelada. Seu cérebro faz isso para se manter em e manter em alerta, para que na próxima vez que isso acontecer ele não precise gastar energia como da primeira vez.

Como nossa memória está instalada na  memória de trabalho ela começa a ativar a amígdala com outras imagens estressantes que fazem aumentar a produção de glucocorticóides no seu sistema límbico, aumentando o estresse e ativando o sistema de alerta.

Fonte: Pixabay

Essas novas experiências, que fazem você sentir e pensar da mesma forma que a primeira vez é, chamado de re traumatização.

Re traumatização – após o primeiro evento traumático (chamado de evento chave), seu cérebro cria uma nova forma de reação, sendo um mecanismo de adaptação para os próximos eventos estressantes. Uma nova experiência que faça sentir da mesma forma já se torna um disparador para que o cérebro reaja e se comporte conforme suas percepções.

De acordo com o modelo do processamento adaptativo de informações, que orienta  a prática do EMDR, diríamos que o evento foi processado de forma inadequada e que isso provoca pensamentos, emoções e sensações físicas involuntárias que acabam distorcendo nossas percepções e ações relativas às circunstâncias, semelhantes àquelas vividas. 

Estresse – O estresse é necessário para o bom funcionamento do nosso corpo. Essa funcionalidade do estresse é o que nos fez sobreviver e nos adaptar em meio aos diversos ambientes apresentados para nossa espécie. O estresse, então, foi um fator que contribui para a seleção natural.

Porém, o estresse em grande quantidade deixa de ser funcional quando ele ultrapassa os limites homeostáticos no nosso cérebro.

Nosso cérebro é neuroplástico, o que isso quer dizer? Quer dizer que ele possui circuitos neuronais maleáveis que adaptam-se e moldam-se a nível estrutural e funcional. Quando o estresse é recebido pelos receptores que estão na amígdala há um aumento fisiológico dessa região.

A amígdala cerebral é uma estrutura  situada no nosso sistema límbico e quando ativada por glucocorticóides, principalmente pelo cortisol (Hormônio do estresse), ela liga todo nosso sistema de alerta. Nesse alerta o sistema simpático é ativado e prepara todo nosso organismo para o perigo – aumentando a frequência cardíaca, e a pressão arterial, contrai os músculos, dilata os brônquios, dilata as pupilas e aumenta a transpiração.

Toda essa reação autônoma a um perigo acontece em milésimos de segundos, e essa é a função, nos deixar em alerta para fugirmos ou lutarmos pelo perigo. Essa situação de estresse e ansiedade torna nosso cérebro uma vítima de pesadelos, flashbacks, pensamentos intrusivos e altos níveis de agitação, isso pode ser visto como sinais de um mal processamento dos traumas.

Todo esse funcionamento disfuncional pode gerar ansiedade – que é a sensação de perigo. O que “sequestra” nossa mente a nos desligar do aqui e agora e desregulando nosso sistema nervoso causando sintomas fisiológicos como: aumento dos batimentos cardíacos, agitação, boca seca, sensação de perda de controle porque o seu corpo fica preparado para reagir a uma situação dificil real, porém que já passou. O nosso sistema límbico é atemporal, não faz distinção de passado, presente e futuro. Ele aprende a reagir de acordo como nós percebemos as nossas experiências, o que modela inconscientemente nossas reações a outros estímulos. 

A partir da compreensão do que é ansiedade e qual o caminho para chegar a um cérebro ansioso, como é feita a intervenção na terapia EMDR?

Os clientes podem relatar uma série de ansiedades e comportamentos que atualmente os estão perturbando. Na maioria dos casos a ansiedade do cliente não está relacionada a um trauma grave, geralmente é alguma experiência adversa que se acumula no dia a dia.

A Dr. Francine Shapiro desenvolveu e criou um protocolo para ansiedade atual, é um protocolo que auxilia o psicólogo a se concentrar no que de fato é importante no tratamento. Para iniciar é preciso identificar: 1 – a ansiedade a ser tratada, 2 – a causa inicial e a memória (se disponíveis) ou eventos perturbadores evocados, 3 – as situações atuais que desencadeiam transtornos e 4 – a resposta desejada. 

Antes de passar para o próximo estágio é necessário criar alguns recursos com o cliente para sua auto regulação, como exercícios de respiração, mindfulness, criação do lugar/estado seguro para alcançar o funcionamento adaptativo.

Após recursar o paciente com as técnicas de auto regulação é iniciado o procedimento clássico utilizando as medições (escalas SUDS/VoC) são feitas na medida em que o os alvos são reprocessados por meio dos movimentos bilaterais na seguinte ordem:

1 – Memória inicial ou mais antiga que alimenta a disfunção.

2 – A(s) pior(es) experiência(s) que alimenta(m) a disfunção.

3 – Exemplo mais recente ou mais representativo de uma situação atual que cause ansiedade. Situações diferentes, que desencadeiam a ansiedade, devem ser focadas separadamente.

4 – Projeção futura das respostas emocionais comportamentais desejadas. É útil incluir algumas situações desafiadoras para incorporar resiliência aos modelos futuros.