Relacionamento amoroso pelo olhar da Terapia dos Esquemas

Viver o amor nem sempre foi privilégio dos casais, muitos confundem amor com paixão e muitos já se viram casados por impulso, por interesses familiares, por falta de opção, por caminhos que se perderam e por caminhos que se encontraram. Estudar o amor passou a ser um grande poder para ciência, visto que este sentimento é motivo de muitos comportamentos em sociedade, tanto para os que se amam, conseguem amar e sentirem-se amados. Poder este que trazem não apenas escolhas de convívio, mas poder para economia e para uma sociedade que se modela nas relações a cada dia (ANTON, 2012).

Os relacionamentos interpessoais , sem dúvida são fonte de significado na vida, afinal somos seres sociais, esses relacionamentos com ênfase nos amorosos são verdadeiras fontes de sentimentos e emoções, muitas vezes que lembram emoções e formas vividas na infância, onde se formam os esquemas adaptativos e desadaptativos, esquemas de confiança, abuso, inibição emocional, privação emocional, defectividade, vergonha, subjugação, podendo serem ativados em algum momento, pela mente, na relação (KLOSKO, WEIHAAR,2008).  

Compreender os motivadores da escolha dos parceiros pela ótica da Terapia do Esquema,  nos ajuda entender que o modo como enfrentamos nossos desafios, nossos esquemas adquirido a na infância, ressoa na nossa vida de adultos, compreendendo que um esquema é uma fonte de emoção, vivências, cognições e comportamentos que rege a maneira de ver o mundo e, em consequência, os relacionamentos. Logo os esquemas excluem quais dados serão rejeitados, aqueles que serão aprendidos e arquivados e o sentido atribuído a eles. Medeiam a realidade e atribuição de significado, impactando respostas emocionais, comportamentais e fisiológicas (BECK & ALFORD, 2000). 

 

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A importância real deste tema sobre escolhas de parceiros é um tema atemporal que ainda intriga a humanidade, ainda nos remete a mudanças e traz para sociedade informações que contribuem para escolhas mais assertivas, casais mais funcionais, e famílias mais estruturadas e o entendimento das parcerias amorosas que dão certo e as que não são tão funcionais. O que muito interessa a todos por se tratar de um tema de relevância atual, conhecer, refletir, entender e discutir este assunto, pelos formatos que já existira e pelos novos formatos que surgem a respeito desse tema. Uma mudança Bio-psico e social que não para de existir e rompe com vários paradigmas na história da humanidade. (ANTON, 2012)

Segundo Iara Anton (2012), achar o par perfeito é desafio para muitas pessoas, algumas encontram, não se encaixam tanto, mas persistem, outras encontram suas famosas tampas, vivem bem uma vida toda, como se até já tivessem vivido juntos em outra vida, há outras pessoas que vivem em busca, de encontrar o amor, essa busca, levam muitas pessoas a comportamentos nem sempre adequados, funcionais e ou saudáveis. Algumas trocam, trocam e trocam e continuam a trocar. Qual será a forma certa de escolher, como achar o amor verdadeiro?

Quando se trata da escolha de um par amoroso, o nome de Iara Camaratta Anton é uma referência. Tecendo, entre fios conceitos psicodinâmicos trazendo um entendimento para além das barreiras conceituais de abordagens particulares. Neste momento contemporâneo há que se considerar a diversidade de vínculos e relações, bem como seus resultados numa sociedade que se percebe adoecida em muitos momentos. Afinal como diz o poeta: a vida é a arte do encontro (GRANDESSO, 2012).

 

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Não há parceria que se forme sem uma intenção individual, profundamente arraigada e de grandes efeitos, ainda que parcial ou totalmente desconhecida para ambos os envolvidos. Somos levados a perceber que o relacionamento íntimo entre pessoas representa o fechamento de um círculo, cujo traçado se iniciou ao ser concebido cada ser humano. A trajetória de um ponto original a um ponto máximo, no qual o sujeito passa a estabelecer novas relações sumamente estreitas e a produzir seus próprios frutos, é longa e marcada por experiências, ao mesmo tempo, universais e únicas. O estudo do inconsciente coloca-nos diante de um paradoxo, pois mostra que o ser humano não tem o poder de decisão que imagina ter, mas também não pode inocentar-se, atribuindo seu sucesso ou insucesso a agentes externos. (PAIM, 2016)

Os relacionamentos interpessoais, sem dúvida, são fonte de significado em nossa vida, entre algum sofrimento e alegrias, afinal, somos seres sociais, um dos motivos que mais levam as pessoas para terapia, em meio a relações que nem sempre são funcionais, permeando confiança-abuso, inibição emocional, defectividades-vergonha e subjugação, abandono, rejeição, arrogo, são muitos esquemas que se pode observar (ANDRIOLA, REIS, 2019).

Segundo Andriola e Reis (2019) este é o palco da terapia de esquema (TE), entendendo que os relacionamentos não apenas são imprescindíveis para o ser humano, como uma força potente de transformação, para os esquemas iniciais desadaptativos (EIDs), por meio de estratégias terapêuticas e uma reparentalização limitada.

 

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Um esquema é fonte de emoções, vivências cognições e comportamentos, que rege a maneira de ver o mundo e em consequência, os relacionamentos. Influenciam e escolhem, rejeitando dados que serão aproveitados e quais serão rejeitados, os dados que serão aprendidos e os que serão arquivados, atribuindo graus de sentido a cada um. Esses dados medeiam a realidade e a atribuição de significado, servindo de gatilho para repostas emocionais, comportamentais e fisiológicas (BECK, ALFROD, 2000).

Para a TE os cuidadores primários têm valor sem medida na vida de uma criança, considerando o desenvolvimento saudável dependente desta relação advinda das necessidades emocionais básicas de cada etapa evolutiva supridas por estes cuidadores. Para tal considera-se importantes cinco etapas evolutivas, sucessivas e fundamentais no processo de desenvolvimento da personalidade do indivíduo. Crenças e regras que regem a vida, fazem parte de todo o sistema. Na primeira etapa, fase inicial o cuidado, empatia, amor, estabilidade e segurança são as necessidades. Na segunda etapa espera-se que as relações gerem independência. Na terceira etapa, o papel dos vínculos deve trazer aprendizagem e limites adequados e relações recíprocas. Na quarta etapa, gerar liberdade para a criança-adolescente escolher suas inclinações. Na quinta e última a autoexpressão, o relaxamento, e o estabelecimentos íntimos devem ser estimulados (YOUNG et al. 2008). 

  As relações existem por meio do encontro, do envolvimento, das vinculações pela história de vida de cada pessoa gerando expectativas positivas e negativas, trazendo em algum momento conteúdos esquemáticos segundo Balwin (1992). Podem acontecer nas relações da infância e vida, muitas situações de rejeição que se repetem e se esbarram nas primeiras rejeições, onde a criança não teve o amor que merecia e que precisava. A partir de tantas rejeições pode-se pensar que não se é digno do amor, crenças de as que as pessoas não são rejeitadoras e que não estão disponíveis, trazendo a possibilidade de interpretações ambíguas, desconectadas as vezes da realidade. Estar sempre conectada à emoção lembrada e marcada pelo seu esquema primário. Não apenas esses esquemas trazem repostas de interação, mas também uma variável importante é a forma de enfrentamento dessa criança vulnerável que precisa sobreviver e dessa forma trás modos de viver e enfrentar os caminhos, sendo muito comum a reedição de vínculos desadaptativos, pautados pela química esquemática, cuidando aqui para não negligenciar sobre o fato de que os esquemas desadaptativos são frutos de relacionamentos nocivos (YOUNG et al. 2008).  

 

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Para Young esta reedição pode se repetir com cuidadores, parentes em geral amigos, sociedades, em qualquer tipo de relacionamento.

Os relacionamentos interpessoais e conjugais são regados pelos esquemas e pela personalidade de cada envolvidos. Neste ponto a TE se aproxima da Psicanálise, quando ressalta que a tendência humana de recriar familiares do passado na vida atual, confirmam os Esquemas Desadaptativos da Infância, trazendo um olhar apurado nos relacionamentos em geral e principalmente nos amorosos. Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais, como canta Belkior em sua música. (PAIM e CARDOSO org.  2016)

Para falar de relações amorosas em TE, é preciso falar de apego, apesar de um rápido avanço nas ideias de Freud no início do século XX, é intensa a revisão desta teoria especialmente no pós-guerra mundial, pela fragilidade dos conceitos, controvérsias e disputas. Nesse turbilhão de ideias que John Bowlby iniciou seus estudos na psiquiatria infantil e psicanálise e com certa superficialidade de Behaviorismo da época. Bowlby procurou construir uma nova teoria para os explicar os vínculos entre as crianças e suas mães-cuidadores, utilizando de uma perspectiva sistêmica, associando a psicanálise e o behaviorismo a outras perspectivas teóricas, como a etologia e a psicologia cognitiva (BOWLB, 1984).  

A Teoria do apego e seus modelos internos de funcionamento é considerado um sistema comportamental que regula o comportamento de aproximação e contato, tendo como função original a proteção contra predadores. Quando há sinal de desconforto e quebra de equilíbrio no ambiente o bebê sente-se ameaçado, como fome, frio, calor, barulho alto, ruídos graves, ativando assim o sistema de apego. A aproximação da figura de apego, geralmente a mãe, ou outro cuidador central, sendo ativado a regulação fisiológica da criança, sendo assim a natureza selecionou não apenas a amamentação, mas o olhar, o toque, receber limites, o cuidado com a exploração em lugares de perigo, como fontes fundamentais de apego e desenvolvimento saudável (MENDES, MAIA, 2019).

 

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Entende-se que muitas das escolhas nos relacionamentos sofrem interferências da dinâmica esquemática de cada pessoa envolvida, tanto que a base da Terapia de Esquema parte de que seu tratamento se dá nas relações paciente-terapeuta como potencial reparador. Acredita-se fortemente que as relações são cruciais tanto na origem dos esquemas como na manutenção destes (YOUNG, 2008).

Segundo os estudos de Gungor (2015), os esquemas formados na primeira etapa evolutiva, associam-se as dificuldades no estabelecimento do vínculo, podendo dificultar a satisfação em uma relação. A falta de assertividade e estima relacional associada aos Esquemas Desadaptativos da Infância, mostra dificuldades em acreditar em si e posicionar-se numa relação. 

O que pode comprovar esse fato são as formas de enfrentamento de cada um, as crenças de não merecimento e de não afeto são bastante comuns.  Assim o conceito de modelos internos de funcionamento (MIFs) é considerado o componente central de toda teoria de apego, contribuindo para as buscas constantes registradas em nossas memórias para serem reeditadas e assim seguimos em busca e ao encontro do amor. (ANDRIOLA, 2019).

A tabela 1. a seguir nos mostra sobre como cada esquema está ligado às necessidades emocionais das pessoas adultas em seus relacionamentos, imprimindo assim a cor dessas relações e o modo de enfrentar os esquemas 

 

Tabela 1. Necessidades emocionais de pessoas adultas X Esquemas Internos Desadaptativos

Necessidades AdultasEsquemas Relacionados
Encontrar e manter relacionamentos com pessoas e com quem possam contar quando precisoAbandono-instabilidade
Encontrar relacionamentos em que a confiança, a honestidade e o senso de lealdade estejam presentes sem situações de abusoDesconfiança-abuso
Formar relações íntimas, incluindo compartilhar sentimentos, pensamentos, amor e afeto.Privação emocional
Autoaceitação e autocompaixão, sentir-se amável e genuinamente transparente com o outro.Defectividade-vergonha
Procurar e conectar-se com os outros, encontrar, encontrar semelhanças e sensação de pertencimento.Isolamento social
Saber lidar com tarefas, problemas e decisões diárias por si mesmo, mantendo a conexão com os outros e solicitando auxílio quando necessário.Dependência-incompetência
Ter um senso realista de segurança e preocupação razoável com gerenciamento de riscos e ações apropriadas.Vulnerabilidade ao dano ou doença
Ser aceito em suas convicções e direcionamentos por pessoas significativas, que respeitam seus limites e diferenças.Emaranhamento – self subdesenvolvido
Obter apoio e orientação no desenvolvimento da competência em áreas de realização pessoal.Fracasso
Considerar empaticamente e respeitar a perspectiva dos outros, com igualdade de valor entre suas necessidades e direitos.Arrogo-grandiosidade
Ser capaz de adiar a gratificação imediata na conquista de seus objetivos e limites na expressão impulsiva de emoções.Autocontrole e autodisciplina insuficientes
Liberdade de expressão e assertividade ao demonstrar necessidades, opiniões e sentimentos, sem temer ser punido ou rejeitado.Subjugação
Equilibrar a importância do atendimento a suas necessidades e às dos outros, com cuidados balanceados e direcionamentos.Autossacrifício
Expressar e falar sobre emoções livremente e se comportar de forma espontânea.Inibição emocional
Desenvolver padrões e expectativas realistas, com equilíbrio entre desempenho e outras necessidades na vida.Padrões inflexíveis

 

 

Para Young e colaboradores (2003) assim como existem os esquemas, existem quatro categorias amplas para identificar os modos que cada pessoa funciona pelos seus esquemas: 1. Modo Criança, 2. Modos pais disfuncionais internalizados, 3. Modos de enfrentamento desadaptativo e 4. Modos adaptativos, visto na tabela 2.

 

Tabela 2.  Categorias de agrupamento e os principais modos esquemáticos

Modos CriançaModos pais disfuncionais internalizadosModos de enfrentamento desadaptativosModos Adaptativos
  1. Criança vulnerável

Criança abandonada-abusada

Criança solitária-inferior

Criança dependente

  1. Criança zangada
  1. Criança enfurecida
  1. Criança impulsiva-indisciplinada
  1. Pais punitivos
  1. Pais exigentes
  1. Capitulador complacente
  1. Hipercompensador

Autoengrandecedor

Provocador e ataque

Desconfiado-supercontrolador

Perfeccionista

Predador

E manipulador

  1. Modos evitativos

Protetor desligado

Protetor autoaliviador

Protetor zangado

Protetor evitativo

  1. Adulto saudável 
  1. Criança feliz

Fonte: Artnz (2012), Simeone-DiFrancesco e colaboradores (2015), van Genderem, Rijkeboer e Arntz (2012). PAIM & CARDOSO, 2016

 

Conclui-se conforme os estudos anteriores que quanto mais conscientes estiverem de seus esquemas e modos de enfrentamento, mais assertivas serão suas escolhas. Percebendo as reais motivações e necessidades de cada um, em cada relacionamento. Para terapia do esquema é possível lidar com esta química e desenvolver estratégias novas de enfrentamento, sendo seu principal objetivo a identificação dos esquemas na memória emocional e nas memórias infantis, sensações corporais, cognições e reconhecimento deste Modos de vida. Os esquemas podem interferir nas relações sexuais  assim a aprendizagem de uma forma nova cognitiva, para lidar com os ciclos que tendem a se repetir, ajudam cada pessoa a ser melhor consigo mesma nas suas escolhas e nas suas relações. Isso traz um novo modo de vida através do adulto saudável, e a criança feliz. Deixando fraco o modo da Criança abandonada, desamparada, dependente, zangada, enfurecida, impulsiva e indisciplinada. (PAIM & CARDOSO org, 2016)

 

REFRÊNCIAS 

ANTON, I. L. C. A escolha do cônjuge: um entendimento sistêmico e psicodinâmico 2. ed. versão ampliada, Porto Alegre: Artmed, 2000

FREUD, S. Introdução ao Narcisismo, ensaios de metodologia e outros textos Trad. Paulo César de Souza São Paulo: Cia das letras, 2010.

PAIM, K; CARDOSO, B. C. (Org.) Terapia do esquema para casais: base teórica e intervenção. Porto Alegre: Artmed, 2019.

WAINER, R. et al. Terapia Cognitiva focada em esquemas. Integração em psicoterapia Porto Alegre: Artmed, 2016.

YOUNG, J. E.; KLOSKO, J. S.; WEISHAAR, M. E. Terapia do Esquema. Trad. COSTA, Roberto C Porto Alegre: Artmed, 2008.

Administradora. Master Coach e Mentora de Mulheres, Executivos e Casais. Analista Comportamental e Competências. Especialista em Gestão e Saúde. Formação em Terapia do Esquema. Formanda em Psicologia pelo Ceulpl/Ulbra. Colunista na Revista Cenarium TO, no Universo Feminino.