A Psicologia é uma ciência de grande relevância social, histórica e política. De acordo com Bock et al (1999) ela particulariza-se das outras especialidades da área de humanas por estudar a subjetividade, contribuindo para a compreensão da totalidade humana. Ainda, a mesma ramifica-se de acordo com abordagens que possibilitaram a formulação do seu saber e, também, conforme suas áreas que o profissional psicólogo pode operar. Dentre tais conhecimentos (ciências) psicológicos, destaca-se a relevância da Psicologia da Educação ou Psicologia Educacional na construção do indivíduo.
Entende-se como Psicologia Educacional, segundo Antunes (2008, p. 469), os conhecimentos científicos que alicerçam a educação e a prática da pedagogia. E difere-se da Psicologia Escolar que, por sua vez, refere-se num tipo de atuação profissional que age no processo de escolarização, direcionando-se à escola e as demais relações que nela são constituídas (idem). Desse modo, é necessário ressaltar que tais se distinguem, onde a primeira é mais ampla e engloba a segunda, que é mais específica.
Nesse contexto, o objetivo do presente trabalho é abordar as possibilidades de atuação do profissional psicólogo educacional, diferenciando o trabalho deste profissional em relação ao do psicopedagogo no contexto brasileiro. A psicologia Educacional tinha sua visão voltada para a “classificação” dos alunos, isso estabelecendo sua atuação basicamente em nortear a escola entre a “seleção” e “divisão” dos discentes em “normal” e “anormal”. Surge então os serviços de Higiene Mental, onde o seu interesse era voltado para as “crianças problemas” das instituições, o que nos dias atuais chamamos de ”Crianças especiais” (BARBOSA E SOUZA, 2012). Essa área da psicologia vem sendo ressignificada, as amplas possibilidades das atuações desse profissional vêm trazendo um novo olhar para exercício dessa profissão no campo da educação.
Ainda que a escola (e suas ramificações) seja vista como uma instituição de controle, assim como instituições religiosas, a família e o governo, é cabível dizer que nela enfatiza-se e trabalha-se a questão educacional. Antunes (idem) – que se opõe a este conceito, para ela a escola é uma contingência e necessidade que construirá uma sociedade igualitária e justa – compreende a “educação como prática social humanizadora, intencional, cuja finalidade é transmitir a cultura construída historicamente pela humanidade”.
Diante do exposto, é complacente a importância do profissional psicólogo educacional no desenvolvimento teórico relativo a este tema e contribuindo para que as ações de educadores, educandos e sociedade ressignifique tal visão do contexto escolar no que tange a educação. O psicólogo educacional deve ter sua prática voltada para interdisciplinaridade, focado em buscar soluções para os problemas que envolvem os fenômenos educacionais, levando em consideração os aspectos sociais, culturais e religiosos que cercam o contexto do processo de educação. Como destaca Maluf e Cruces (2008, p. 98):
Agora é tempo de mostrar como pode a Psicologia Educacional estar a serviço do bem-estar da comunidade escolar, do desenvolvimento psicológico de todos os envolvidos no processo educacional, da aprendizagem significativa que produzirá no aluno as condições individuais e sociais necessárias para o pleno exercício da cidadania.
Esse profissional é agente transformador, com seu olhar minucioso aos processos de formação do indivíduo por meio do ambiente educacional, ele tem a possibilidade de trazer uma nova realidade para a sociedade, de forma, a transformar e colaborar para o exercício da cidadania, por meio do contexto onde se dá o ambiente educacional. Esse saber psicológico deve dar condições necessárias para se construir uma prática pedagógica realmente inclusiva e transformadora. A psicólogo educacional deve estar comprometido em promover ações efetiva que propicie mudanças e que ajude na compreensão dos processos de constituição do sujeito tornando-o participativo na construção dessas práxis.
Em vista disso o Conselho Federal de Psicologia (CFP) criou as Referências Técnicas para Atuação de Psicólogas (os) na Educação Básica em 2013, para auxiliar profissionais e estudantes de psicologia a compreender como se dá atuação do psicólogo em tal área.Consoante com o Eixo 3, incluso nas referências técnicas supracitadas, há cinco possibilidades de atuação do psicólogo na educação básica, são elas: tralhando com o projeto político-pedagógico; intervindo no processo de ensino-aprendizagem; trabalhando na formação de educadores; trabalhando com a educação inclusiva; e trabalhando com grupos de alunos (CFP, 2013, p. 56-63). Estes serão apresentados adiante.
O Projeto Político Pedagógico (PPP) se faz presente na área educacional designando como serão desenvolvidas as práticas no âmbito escolar. E, o profissional psicólogo deve colaborar na elaboração, avaliação reformulação do mesmo, de forma que ressalte a subjetividade ou o aspecto psicológico no contexto escolar (CFP, 2013, p. 54). Além disso, é de responsabilidade do psicólogo um trabalho interdisciplinar, de forma que este precisa ter conhecimento sucinto sobre o funcionamento da organização escolar, como decorre a prática pedagógica, por exemplo; e, também, sobre os funcionários que a compõem.
Outra possibilidade de atuação é a intervenção no processo de ensino-aprendizagem. De acordo com o CFP (2013, p. 56): O conhecimento da psicologia na compreensão dos processos de ensino e aprendizagem se constitui, historicamente, desde concepções higienistas até àquelas que analisam esse processo como síntese de múltiplas determinações: pedagógicas, institucionais, relacionais, políticas, culturais e econômicas. As práticas de intervenção, portanto, decorrem dessas concepções.
Mediante o exposto, infere-se que psicólogo deve utilizar o seu aparato teórico acerca dos fenômenos de ensino-aprendizagem sob a óptica sócio histórica, atuando em práticas sociais de modo crítico, não somente com variáveis que estão dentro do ambiente escolar, como também com os ultrapassam essa instituição, como as relações familiares e seus respectivos componentes, no objetivo de auxiliar no processo de escolarização e sempre ressaltando o valor do docente. Ademais, é válido lembrar que esse profissional usufrui de recursos artísticos que permitem a expressão da subjetividade (CFP, 2013).
No que se refere ao trabalho na formação de educadores, o papel do psicólogo inclui a despatologização do sujeito, de forma que consiga considerá-los e mostrá-lo de forma totalizante aos docentes, ajudando-os numa prática pedagógica humanizada através da formação continuada (FACCI, 2009 apud CFP, 2013), pois são eles os mediadores entre os conhecimentos (históricos e científicos) e os educandos (CFP, 2013). Destarte, a partir das relações, o objetivo final de todo este processo consiste em relacionar o psiquismo, subjetividade e a metodologia educacional.
Com a educação inclusiva o psicólogo deve estabelecer métodos e práticas que possibilite esse indivíduo com necessidades especiais a participar ativamente do espaço educacional. Sendo assim, o profissional deve se valer de práticas sociais que potencialize e auxilie no desenvolvimento psicossocial desse educando. De acordo CFP descrito no eixo 3, o psicólogo educacional do âmbito da educação inclusiva, deverá ajudar este estudante estabelecer meios de enfrentamento para superar a deficiência, tornando-o cada vez mais participativo e incluindo-o nas atividades do ambiente, (CFP, 2013).
Também é preciso que o psicólogo identifique aspectos de concepções de sociedade conforme afirma CFP (2013, p 59) “É importante considerar que na intervenção na escola é preciso que a (o) psicóloga (o) identifique, primeiramente, concepções “de sociedade, de educação, de grupo, de indivíduo, de coletividade” dos professores, estudantes e familiares, assim como as suas próprias concepções”.
E por último, mas não menos importante o CFP destaca uma outra possibilidade de atuação desse profissional, o trabalho com grupos de alunos. Neste campo de atuação se faz necessária a participação do psicólogo nas práticas que auxiliem o aluno no processo de escolarização, acompanhado os educandos nos conselhos de classes, e ficando atento as dificuldades que surgir. Pode-se desenvolver trabalhos como os de orientação profissional, propor oficinas ou momentos de discussão de temas de interesse da escola e do corpo discente, direcionando o ambiente educacional para uma socialização do conhecimento e manutenção do interesse de todos, (CFP, 2013).
Diante o conteúdo evidenciado sobre a atuação do psicólogo educacional, é de suma importância destacar que há sutis diferenças entre essa atuação e o fazer da psicopedagogia. Na psicopedagogia, o Psicopedagogo promove a possibilidade de mudanças, em processos cognitivos, e pedagógicos que pode está atrapalhando a aprendizagem do indivíduo, isto é, o problema de aprendizagem torna-se se objeto de estudo. Scalzer & Silva (s/d, p.3) afirmam que é de incumbência do Psicopedagogo: […] possuir habilidades para diagnosticar e propor soluções assertivas às causas geradoras de conflitos entre o aluno e o professor, ter habilidades e competências para a escolha de ferramentas e técnicas que possibilitem a melhor aprendizagem com o melhor aproveitamento do tempo, promovendo ganhos de qualidade e melhorando a produtividade do aluno e do professor.
E, é nesse contexto que as atuações se assemelham, uma vez que em relação à intervenção do psicopedagogo, este tem como a prevenção em sua atuação, inclui orientar os responsáveis do aluno, auxiliar os professores e outros profissionais relacionados em questões pedagógicas, contribuindo com a aprendizagem do educando. Segundo Nascimento (2013) o psicopedagogo também tem capacidade de subsidiar informações sobre os problemas de aprendizagem que não se restringem à alguma deficiência do aluno, mas que de fato é decorre de falhas no próprio ambiente escolar. Infere-se que tal fato se estende ao ambiente familiar. Nisso, a autora ainda acrescenta para tal profissional que “seu papel é analisar e assinalar os fatores que favorecem, intervêm ou prejudicam uma boa aprendizagem em uma instituição. Propõe e auxilia no desenvolvimento, visando evitar processos que conduzam às dificuldades da construção do conhecimento” (idem).
No entanto, Jucá (2000) contrapõe tal ideia ressaltando que a atuação do psicopedagogo é focalizada em aspectos individuais no processo de ensino aprendizagem. Esta afirmação reverbera a posição do CFP (1999) quanto à psicopedagogia de que a mesma trabalha com o fracasso escolar e procura a causa deste no aluno, utilizando métodos e técnicas da psicologia e pedagogia de modo inadequado (formando uma nova teoria).
Além disso, o Conselho assegura que a psicopedagogia é apenas uma especialização, não devendo ser regulamentada como uma profissão, pois não há como obter base teórica, orientação de atuação e técnicas suficientes durante o pouco período de formação especialista comparando-a com a formação universitária. Desse modo, nos cabe observar que essa forte oposição da Classe de Psicólogos não se restringe à defesa de suas teorias e técnicas, mas também defendendo seu espaço no mercado de trabalho.
Portanto, a atuação do psicólogo educacional e do psicopedagogo, são de fundamental importância no processo de aprendizagem do educando, contribuindo significativamente com todos envolvidos, pois trabalham com parcerias, pois se dá o processo de se unir, construir, integrar, fazer relações, afim de contribuir para uma aprendizagem duradoura e eficaz, gerando uma bola qualidade de ensino. Porém, na realidade educacional brasileira é insustentável financeiramente mantê-los ao mesmo tempo numa única instituição. Ademais, perante o conteúdo exposto sobre a atuação do psicólogo educacional e do psicopedagogo, cabe um questionamento ao leitor (principalmente acadêmico e profissional de psicologia): estes profissionais executam a mesma função ou trabalham de modo diferente? Boa reflexão!
REFERÊNCIAS
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ANTUNES, M. A. M. Psicologia Escolar e Educacional: história, compromissos e perspectivas. Revista ABRAPEE, Campinas, v. 12, n. 2, Dez. 2008. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-85572008000200020&lng=en&nrm=iso>.Acesso em 10 de março de 2017.
BARBOSA, Deborah Rosária; SOUZA, Marilene Proença Rebello de. Psicologia Educacional ou Escolar? Eis a questão. Psicologia Escolar e Educacional, [s.l.], v. 16, n. 1, p.163-173, jun. 2012. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s1413-85572012000100018.
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias: uma introdução ao estudo de psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Referências técnicas para Atuação de Psicólogas(os) na Educação Básica. Brasília: CFP, 2013.
Conselho Federal de Psicologia (1999). A criação da profissão de Psicopedagogia é um equívoco! [Online]. Federal Net – Conselho Federal de Psicologia. <http://psicologia-online.org.br/federalnet.html>.
FACCI, Marilda Gonçalves Dias. A intervenção do psicólogo na formação de professores: contribuições da Psicologia Histórico-Cultural. In: MARINHO-ARAÚJO, Claisy Maria. Psicologia Escolar: novos cenários e contextos de pesquisa, formação e prática. Campinas, SP: Editora Alínea, 2009.
NASCIMENTO, F. D. O papel do psicopedagogo na Instituição Escolar. Psicologado. Disponível em: <psicologado.com/atuacao/psicologia-escolar/o-papel-do-psicopedagogo-na-instituicao-escolar>. Acesso em 09 mar. 2017.
REGINA MALUF, Maria; VILLA VALLE CRUCES, Alacir. Psicologia educacional na contemporaneidade. Bol. – Acad. Paul. Psicol., São Paulo, v. 28, n. 1, p. 87-99, jun. 2008. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415711X2008000100011&lng=pt&nrm=iso>. Acessos 12 mar. 2017.
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