Um relato sobre autoestima e transição capilar: meu caminho até o florescimento

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Honrar a nós mesmas, amar nossos corpos, é uma fase avançada na construção de uma autoestima saudável — Bell Hooks

Fonte: Marina Leonova/Pexels.

Creio que a maioria das pessoas em algum momento de suas vidas são atravessadas por questões relacionadas a sua aparência, provérbios populares do tipo “beleza não se põe a mesa”, parece passar a mensagem de que tal atributo não é tão relevante assim no final das contas, porém ainda vivemos em um mundo que valoriza muito a “beleza”, em filmes, livros e na televisão, as histórias são protagonizadas por pessoas consideradas atraentes pela sociedade, em anúncios, belas pessoas posam para atrair o público para consumir aquele produto, e é aí que minha historia começa, crescendo alimentada pela imagem do que era ser bonita, que atributos eu deveria possuir para alcançar o status de uma pessoa atraente, e ter a autoestima abalado ao perceber que essas pessoas não se pareciam tanto comigo, uma questão em especial sempre me perseguiu, o meu cabelo.

Durante a maior parte da minha vida eu odeio meu cabelo, era o dito “cabelo ruim” e rebelde, que precisava ser domado, então sendo assim, busquei durante muito tempo uma fórmula mágica para consertar o que a natureza tão cruelmente tinha feito comigo, ao me dar uma cabelo que não era liso como os das mocinhas que eu admirava na TV, as belas protagonistas de histórias que eu cresci vendo, e além de todas as questões foram internalizadas, por meio da mídia, durante a infância vivenciei diversos episódios que constantemente me lembrava que meu cabelo não era bonito, que era difícil de lidar, volumoso demais, liso de menos, outras crianças eram cruéis com comentários na escola, os adultos não eram menos maldosos, e no topo da lista dos hates do meu cabelo, tinha eu, até que um belo dia em um salão de beleza realizei meu sonho, alisei o meu terrível cabelo, nesse momento eu tinha a esperança de finalmente me senti bem com meu cabelo, mas não foi exatamente isso que aconteceu, porque agora o meu bem estar, e a minha autoestima estava intrinsecamente ligada na conquista do liso perfeito.   

Fonte: Polina Tankilevitch/Pexels.

Horas no salão, na tentativa de encaixar minha aparência no padrão, por meio de inúmeros procedimentos químicos, a “chapinha” se transformou em uma constante na minha rotina diária, além da incansável busca pelo método mais eficaz de alisamento, com o tempo eu esqueci completamente como era meu cabelo natural, e o meu maior terror era quando ele aparecia durante o crescimento da raiz, o contraste entre o cabelo natural e a parte alisada parecia piorar e aumentar toda a raiva que eu tinha pelo meu cabelo. O peso de tudo isso foi no final das contas, minha autoestima em frangalhos, raramente eu me olhava no espelho e me sentia bonita, minha imagem para mim, por meu tempo só seria boa o suficiente se meus cabelos estivesse completamente lisos, o que demandava esforço e trabalho, que às vezes eram recompensados com dores de cabeça, pescoço, olhos lacrimejando e ardendo, e ainda assim, não era o suficiente.   

Com o passar do tempo houve um processo globalizado de mulheres passando por uma tal de transição capilar, deixando seus cabelos crescerem até se livrar completamente da parte alisada quimicamente, a partir desse movimento, a indústria de cosmético aparentemente entendeu que havia uma enorme demanda e procura por produtos específicos para cuidados com cabelos cacheados e crespos, nas redes sociais em ascensão, várias mulheres compartilhavam sua transição capilar, em relatos que se entrelaçavam em questões comuns às outras mulheres que vivenciaram a mesma história que a minha, uma caminhada que compartilhamos entre nós, percorrendo, principalmente o ponto em que o cabelo cacheado/crespo convergia com a autoestima, e a jornada de se descobrir e se perceber bonita com o cabelo natural. Entre muitas coisas comecei a perceber que talvez eu não odiasse meu cabelo, talvez eu tenha aprendido de forma constante a apreciar apenas um tipo de beleza.

Fonte: Ekaterina Bolovtsova/Pexels

Por anos senti a necessidade de modificar a estrutura natural do meu cabelo para me encaixar em um padrão inventado de beleza, acreditando que meu cabelo não era aceitável, muito menos bonito, ao olhar no espelho era incapaz de visualizar beleza em meus cachos, e tinha verdadeiro pavor ao ver minhas raízes se avolumando sobre meus fios alisados, eram horas de intensa arrumação para alinhar todas as mechas e fios, para o perfeito visual liso, em paralelo a isso, havia uma crescente frustração por não ter o que eu desejava tão intensamente, até que em um belo dia eu vi um filme por acaso, a comédia romântica “Felicidade por um fio”, lançado em 2018, nele acompanhamos a jornada de autoconhecimento de uma jovem publicitária, que alisava seus cabelos desde a infância, entendendo as nuances de seu cabelo natural, e vendo a beleza presente naquilo, olhando em direção ao passado, creio que esse foi um dos pontos de partida que plantou uma sementinha na minha cabeça, brotando modificações acerca da ideia que eu tinha sobre a real natureza do meu cabelo. 

Em um dia tão comum como qualquer outro, ao contrário de realinhar as raízes do meu cabelo eu decidi esperar um pouco mais, como quem não quer nada, foi deixando o cabelo natural crescer, e desde então reencontrei um célebre desconhecido, meu cabelo em sua estrutura natural, pois desde muito cedo ele havia sido puxado, esticado, prendido, pois era uma cabelo difícil de lidar, e ainda na minha infância, alisado, então durante a maior parte da minha vida eu não tinha conhecimento real sobre como era aquele cabelo, natural, sem químicas, além das ideias alheias já pré-concebidas sobre ele, então foi durante a transição capilar, a partir desse ponto, que eu finalmente inicie questionamentos e reflexões acerca de certas questões relacionadas ao padrão imposto sobre os cabelos crespos e cacheados, me livrei das minhas próprias idealizações e comecei, ainda que lentamente a apreciar a beleza que havia no meu cabelo natural, a reerguer minha autoestima, e entende que, que aquilo eu acreditei durante a maior parte da minha vida, que preferia e gostava mais do cabelo liso, a realidade que eu vivenciei era outra, eu foi ensinada a achar meu cabelo feio, e isso não era verdade, no final eu apenas nunca tive tempo ou oportunidade de vê-lo florescer e apreciar a beleza que ali sempre residiu. 

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Relato de experiência anônima: ser uma pessoa gorda

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Desde que me lembro por gente, meu peso já era uma preocupação. Sempre era comentado pelas pessoas e coisa do tipo, mas se fosse pra chutar alguma idade [Em que se percebeu como uma pessoa gorda] eu diria que por volta dos 8 anos, que enfim, acredito que a gente vá criando mais consciência das coisas e acredito que por isso eu sempre tive receio de ir a médicos em geral, desde criança. Pelo fato de saber que seria a primeira coisa a ser comentada mesmo que a minha doença não tivesse nada a ver com isso.

Esse receio ainda existe, mesmo que hoje em dia eu já tenha perdido muito peso e não possa ser classificada exatamente como uma pessoa gorda, o meu peso ainda é a maior preocupação que eu lido todos os dias. Isso nunca mudou na minha cabeça, quando eu vou ao médico ainda é comentado sim sobre meu peso, não como algo direto logo de primeira igual era antes, mas sabe um “ah e seria bom perder um pouco de peso também…” dito no final da consulta.

Isso tudo afeta a vida nas relações completamente, sempre afetou qualquer tipo de relação e afeta a minha vida em sociedade em geral. Até hoje eu não consigo me sentir bem em público e quase nunca saio de casa, em dias ruins não tenho nem vontade de sair do quarto. Sinto que eu passei a vida toda me privando e tentando fazer o máximo para as pessoas não verem meu corpo, então se não era algo necessário tipo ir pra escola ou enfim se não fosse alguma obrigação eu preferia não sair de casa. E em relações amorosas, por exemplo, ou relações de se envolver com alguma outra pessoa, aconteceram só duas vezes na minha vida provavelmente pela minha aparência e por eu ter me fechado tanto pra tudo. Mas sempre foi e ainda é difícil eu me enxergar como uma pessoa desejada, uma pessoa que possa ser desejada de qualquer forma. Mesmo estando em um relacionamento a mais dois anos eu ainda tenho problema pra me sentir desejado.

Eu acredito que sim isso possa mudar, mas às vezes também acho que é ter esperança demais talvez porque muita coisa da sociedade em geral teria que mudar, então não sei o quanto eu acredito que possa acontecer no contexto de todo mundo se aceitar sabe. Porque uma pessoa gorda pode trabalhar muito no próprio psicológico dela e com o tempo ir se aceitando e não sofrendo por algumas coisas, mas o mundo inteiro o tempo todo te lembra de que você é uma pessoa gorda, e não de forma indiferente, mas sim daquele jeito insinuando que tenha que mudar isso. O que faz tudo ser muito difícil, querendo ou não vivemos em sociedade e acredito que seja tudo muito complexo porque envolve realmente muita coisa.

E qual a diferença de antes pra agora, se é que tem uma? Psicologicamente eu não sinto diferença porque enfim a maioria das minhas inseguranças tão fincadas muito fundo em mim eu acho. Mas certamente tem diferença, talvez em como as pessoas me olham já que corpos gordos chamam a atenção de algumas pessoas não muito legais e em me sentir menos chamativa em geral. Mas ainda não mata o desconforto que sinto em público.

E algo que sempre me incomodou em relação a isso tudo que já vivi é aquilo de ser muito fácil pra todo mundo dizer o que é mais socialmente visto como correto, no sentido de que eu sempre estive rodeado de pessoas magras e às vezes tentando conversar sobre as minhas inseguranças com uma pessoa magra, em questões de aparência, sempre vem aquele padrão de resposta e afago “ah que nada você é lindo que isso!!!! se a pessoa não quer você só por você ser gordo ela não vale a pena”.

Mas ao mesmo tempo essas mesmas pessoas nunca se envolveram em momento algum com uma pessoa gorda, então em geral nunca senti que eu era realmente enxergado de uma maneira normal, um homem possível de ser desejado, porque todas as pessoas a minha volta não sentiam desejo em pessoas exatamente iguais a mim ou parecidas.

 

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A Autoestima e seu valor

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O ser humano é muito complexo e para ter uma boa qualidade de vida precisa desenvolver alguns aspectos que favorecem muito as relações consigo mesmo com o outro e com o mundo, a exemplo a autoestima.  Pensando nisso o autor Walter Riso em seu livro “Apaixone-se Por Si Mesmo”, escreve sobre os quatro pilares da autoestima o autoconceito, autoimagem, autorreforço e autoeficácia e com isso procura mostrar o quanto isso é importante e precisa ser cultivado pelas pessoas. Aqui será   tratado apenas a discussão de um desses quatros pilares que é o autoconceito.

Inicialmente o autor coloca que o autoconceito se diz daquilo que a pessoa imagina de si mesmo, o conceito que tem de sua própria pessoa e isso refletirá na forma como trata a si mesmo: o que exige de si e como e o que fala consigo.  A pessoa pode se dar estímulo ou se minar, ou ainda se insultar e não perceber nada de positivo na sua forma de se comportar; bem como pensar em metas que não são alcançáveis, ficando frustrados após isso. Somos resultados das nossas próprias escolhas: cada pessoa decide amar-se ou não, nem todas as vezes temos consciência do dano que estamos nos causando.   Além de ter que sobreviver ao meio e à batalha do dia a dia, também é necessário aprender a sobreviver a si mesmo: aquilo visto como inimigo nem todas as vezes está do lado de fora.

Dando continuidade, o autor ao colocar quanto à autocrítica ruim, diz que a autocrítica se torna conveniente e produtiva no momento em que é realizada com cuidado e com objetivo de aprendizagem e crescimento.  No curto prazo pode ser usada para dar surgimento de novas condutas e correção de erros, no entanto se usada de forma indiscriminada e cruelmente pode ocasionar estresse e afeta de forma negativa o autoconceito. Usada de forma inadequada leva a pessoa a pensar mal de si mesmo, independente do seu comportamento.

Fonte: Freepik

O mau hábito   de sempre fazer análises internas, duras e inflexíveis, dar origem a insatisfação consigo mesmo e ainda sensações de insegurança.  As pessoas não aprendem com estratégias em forma de castigo.   Quando se fala em autopunição a questão está no fato do opressor ser a própria pessoa, esta o carregará nas costas como um infortúnio:  buscar a defesa, será como se estivesse fugindo da própria sombra.  Muitas pessoas possuem um sistema de autoavaliação que as fazem sofrer diuturnamente, em todos os momentos e de forma inexplicável, sentem orgulho do sofrimento que geram a si mesmas.

O autor discorre ainda que outra variação da autocrítica prejudicial é a autorrotulação negativa.  Usar em si rótulos que não falam bem de si ou deixar que a demais pessoas o façam buscando com isso encaixar em alguma categoria que gera prejuízo para si.  As classificações sociais (estereótipos) procuram a se referir aos outros   de forma global e não nas suas especificidades, não considerando assim as exceções ou os atenuantes.  O mesmo ocorre quando a pessoa se rotula de forma negativa: mistura a parte com o todo.  Em vez de pronunciar “Eu me comportei como um imbecil” dirá: “Sou um imbecil”.  Esse ataque ao próprio eu e ao que a pessoa é, dar origem a desajustes e alterações de várias formas.  Por outro lado, a autocrítica construtiva   é vista como pontual e nunca alcança o fundo do ser como totalidade.

Outro ponto citado pelo autor é quanto a autoexigência sem piedade.  As pessoas tendem a usar padrões internos na sua autoavaliação que são inalcançáveis. Ou seja, usam de metas e critérios desproporcionais sobre para onde deve conduzir o seu comportamento.  Quanto a autoexigência é feita com racionalidade e bem estruturada, contribui com a progressão psicológica, no entanto quando não se encontra bem calculada, pode interferir seriamente na saúde mental. Os dois extremos são nocivos.  Não devemos negar que momentaneamente necessitamos de uma autoexigência de forma moderada ou em maior nível para sermos competentes como profissionais, a exemplo um cirurgião, no entanto a disfunção acontece quando esses níveis de exigência se tornam inalcançáveis.

Fonte: Freepik

As ideias que devo ser destaque em todas as minhas tarefas e ser melhor a todo custo e que não devo errar são imperativos considerados verdadeiros martírios.  Se a pessoa achar que a felicidade ou a autorrealização estão de forma exclusiva na obtenção de resultados, não demorará muito a perceber o paradoxo em que para se “sentir bem” precisa se “sentir mal”.  O seu bem-estar ocorrer partir de tantas coisas que não diz respeito a sua pessoa que se tornará impossível cuidar das suas próprias conquistas. “A felicidade não é uma estação aonde chegamos, e sim uma maneira de viajar”. Isso se constitui a saúde mental; viajar bem. As pessoas que se tornam obcecadas pelo sucesso, tendo o como valor e ainda o executam com esquemas rígidos, fazem uma viagem mal, mesmo que pretendem mostrar o contrário.  Possivelmente ser feliz não consista em ser melhor em algo, mas simplesmente procurar fazer isso de forma honesta com tranquilidade, com prazer no sucesso.

Quanto ao fator tudo ou nada, o autor coloca que as pessoas muito exigentes consigo mesmas usam de uma forma dicotômica no processo da informação.  Segundo elas a vida é em preta e branco, sem considerar as outras nuances: “tenho sucesso ou sou fracassado”. Essa forma de pensar não está correta, porque não há nada absoluto ou extremo de forma rigorosa. Quando se utiliza essa forma binária para a vida, o vocabulário da pessoa se torna reduzido a nunca, sempre, tudo e nada.  Assim ela se depara com uma realidade bastante diferente da que imagina.  A impossibilidade de considerar trajetos intermediários e o medo de perder ou não alcançar os objetivos fará a pessoa não considerar as aproximações das metas pessoais. As pessoas movidas pelo “tudo ou nada”, não veem as aproximações e nem as sentem, ou simplesmente passam sem percebê-las.   Dirão “estou ou não estou na meta”. Avistarão a árvore, mas não o bosque.

Quanto a mudança não é uma atividade fácil, não somente porque resulta em esforço pessoal, mas pelos valores sociais.  Quando uma pessoa de forma corajosa tem a iniciativa de fazer algo, saindo daquilo que é estabelecido como padrão, surgem as pressões principalmente quando isso não coincide com os valores do grupo de referência.  Quando trocamos o caminho convencional por um mais audacioso e tentamos novos rumos, as pessoas rígidas e afeiçoadas as normas dizem que somos imaturos ou “instáveis”, como se não mudar de direção fosse sinônimo de ser inteligente. Assim não hesite em revê, trocar ou modificar seus objetivos caso forem geradores de sofrimento.  De que outra forma você poderia estar próximo da felicidade?

Por fim, o autor dar algumas sugestões para proteger você do  autoconceito da autopunição, da autocrítica e da autoexigência indiscriminada, como:  procure  ser mais  flexível consigo mesmo e com os outros, ou seja, tente  não ser perfeccionista, não rotule a si nem aos outros, concentre nos matizes,  ouça as pessoas que pensam diferente de você;  reveja sua metas e as possiblidades reais de alcançá-las; não perceba em você só o ruim; não pense mal de si mesmo; ame-se durante o maior tempo possível;  aprenda a perder.  Lembre-se você é um mecanismo especial dentro do universo conhecido, não faça mal a si mesma e nem se insulte. Para chegar ao sucesso não é necessário autopunição.

Fonte: Freepik

REFERÊNCIAS

RISO. W. Rumo a um bom autoconceito.  In: RISO. W. Apaixone-se por si mesmo; o valor imprescindível da autoestima. Tradução de Sandra Martha Dolinsky.  São Paulo: Planeta, 2012. p. 14-24.

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A espetacularização e o culto ao corpo na contemporaneidade

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A época em que vivemos caracteriza-se por uma sociedade cujos integrantes, em parte, estão bastante preocupados com seus corpos. Para sentir-se bem, é necessário ter o padrão de beleza considerado bonito e ideal. Os valores que antes eram importantes para a construção da identidade do indivíduo, são agora substituídos por padrões estéticos. Não é preciso mais ter cultura, ideologias, crenças, se você tiver um rosto perfeito, um cabelo bonito e um corpo escultural, é possível observar o deslocamento da moral. Caracterizamos aqui a personalidade somática do nosso tempo.

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O documentário “Tabu: cirurgias Plásticas” apresenta-nos ações praticadas pelos indivíduos na busca desse ideal de beleza. Quando falamos em atingir uma identidade corporal, falamos em “Bioascese”. É grande o número de pessoas que não estão satisfeitas com seus corpos, e que, portanto, estão fazendo tudo para alcançar o “corpo ideal social”, aderindo a cirurgias plásticas, rotinas de academia intensas, dietas rigorosas, produtos de estéticas, enfim, estilos de vida que possam propiciar um padrão aceitável para a sociedade homogeneizada.

Ter uma boa aparência se tornou sinônimo de sucesso social. Aqueles indivíduos que não se enquadram nesse novo e “único” modelo de vida passam a ser e sentirem-se excluídos e inferiorizados pela “massa dominante”. É importante destacar que no decorrer desse processo de adequação social estético, o núcleo da identidade do indivíduo vai sendo atingido e deteriorado cada vez mais. A preocupação em ser aceito é tão grande, que todas as outras faces que poderiam ser desenvolvidas e melhoradas são deixadas de lado, desinvestidas literalmente.

As consequências do ideal de corpo perfeito sobre a autoestima e a autoimagem dos indivíduos

Entende-se por autoestima, a auto-aceitação ou auto-rejeição que o ser tem de sua própria imagem. A autoimagem pode ser descrita como a percepção que o indivíduo tem sobre ele mesmo, e sobre os retornos referentes aos seus sentimentos e ações nas relações interpessoais por ele estabelecidas. (FLORIANI, MARCANTE, BRAGGIO, 2010).

A aparência pessoal está intimamente ligada com a satisfação ou insatisfação da pessoa. Quando existe a satisfação com a aparência, a pessoa se gosta, se aceita, e ela só quer manter a sua auto-estima e auto-imagem, consequentemente a sua qualidade de vida. Quando existe insatisfação, a pessoa busca incansavelmente recursos da estética e nunca está contente com ela mesma, quando deveria tratar o seu interior. Nos dois casos, tanto da satisfação quanto da insatisfação pessoal, a pessoa busca pelos recursos da estética. (FLORIANI, MARCANTE, BRAGGIO, 2010, p.1)

Diante disso, nota-se a importância de se ter uma boa aparência na sociedade atual, já que além de estar interligada à uma boa auto-imagem e consequente auto-estima, também tem sido um dos fatores facilitadores no estabelecimento de novas relações sociais.Buscando então um corpo ideal e uma imagem satisfatória, muitos indivíduos se submetem a procedimentos cirúrgicos estéticos, à utilização de cosméticos e a prática de exercícios pesados em academias (FLORIANI, MARCANTE, BRAGGIO, 2010).

É válido ressaltar ainda a relação existe entre a auto-estima e autoconfiança, já que quanto maior for a autoestima da pessoa, maior será também a confiança que ela vai ter ao tomar suas próprias decisões. (FLORIANI, MARCANTE, BRAGGIO, 2010).  Depreende-se então que na contemporaneidade, há uma busca por um corpo mais embelezado, decorrente da supervalorização de determinados padrões de beleza, estabelecidos pela própria sociedade. (SAMPAIO, FERREIRA, 2009).

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Fonte: http://migre.me/vpQ6u

O capitulo “O espetáculo do ringue: o esporte e a potencialização de eficientes corporais” do livro Corpos Mutantes, apresenta informações sobre a potencialização e a grande expansão do uso da imagem como fenômeno de conquista de vários objetivos, dentre eles os esportes corporais como o boxe, o MMA e esportes fisiculturistas. É evidente que atletas precisam e utilizam do seu corpo como objeto para conquistas de competições e de campeonato, consequentemente eles utilizam de varias técnicas para o aperfeiçoamento da condição física, estética e funcional do corpo. No texto escrito por Claudio Ricardo e Silvana Vilodre “O espetáculo do ringue: o esporte e a potencialização de eficiente corporais” é retratado um pouco da história, bem como o desenrolar desse processo de potencialização corporal.

Há diferença na potencialização do corpo entre os atletas e pessoas amadoras. Os atletas buscam solidificação e resistência corporal, a fim de ter maior capacidade física, por exemplo, de levantar pesos, correr, saltar, entre outras modalidades, eles buscam apresentar maior condição física para executar os esportes com maior eficiência e qualidade. Já as pessoas amadoras buscam a prática de esporte como a musculação, apenas para um fim estético, raramente com exceções objetivando a saúde e o bem-estar. Portanto o desempenho e os ganhos entre as duas características são diferentes.

Dentro dessas performances afirma-se que “ainda que apanhar, bater e resistir, sejam atitudes vinculadas ao aprendizado pessoal do lutador e ao seu repertorio corporal, a preparação de seu corpo passa, também pela apropriação de conhecimentos tecnológicos e do nível de cientificização do seu treino” (NUNES, GOELLNER, 2007). Há portanto, um aprendizado corporal e significativo para a conduta do atleta, tanto dentro do ringue como fora dele. Esta preparação é capaz de mostrar ao atleta a capacidade de conseguir sofrer lesões; maior capacidade de suportar dores recorrentes de lesões devido ao grande esforço nos treinamentos; capacidade de adquirir maior resistência física, corporal e também psicológica; capacidade lhe dar com a pressão do esporte, do treinador, das dores constantes, do campeonato, do seu adversário.

Na construção muscular é apresentado diversas técnicas de aprimoramento no ganho de força e resistência física, objetivando a construção corporal do atleta lhe dando uma “identidade” como é o atleta dentro do esporte, se é forte o bastante para vencer uma possível lutar, a genialidade de utilização de técnicas, golpes, se seu corpo é tão esteticamente perfeito afim de intimidação, que se certa forma ele consiga “ostentar” com sua capacidade física, motora, técnica e corporal de atleta. Afirmam também que o confronto visual dos atletas antes da luta gera e expressam nos atletas atributos como força, concentração, fibra, coragem e destemor, sentimentos que na realidade eles precisam para conseguir derrotar o oponente e vencer a luta.

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Fonte: http://migre.me/vpPLQ

 O consumismo vem sendo uma marca registrada em todo o mundo, onde para ter o corpo desejado é preciso gastar com academias, suplementos, esteróides anabolizantes, personal trainner entre outros. O capítulo “o espetáculo do ringue: o esporte e a potencialização de eficientes corporais”, tem como ponto de partida a forma como as pessoas se percebem em meio às outras:

A potencialização do corpo está na forma como percebemos nossas eficiências e deficiências mensuradas na contemporaneidade, através de nossa anatomia e contornos corporais. Julgamos a nós mesmos a partir de um referente corporal cuja  expressão primeira aproxima – se da potência, da jovialidade, da produtividade […] que marca os corpos a partir das performances cada vez mais aproximadas, demarcando sua aparição como um espetáculo a atrair e prender sobre si o olhar do outro. (NUNES, GOELLNER, 2007) 

Observa–se atualmente uma grande espetacularização do corpo, em prol da saúde, beleza ou por uma questão social. A mídia é um dos fatores sociais que vem exercendo grande influência na vida das pessoas, propagando um corpo a ser seguido e a ideia de que “somos o que aparentamos ser”.

Nota-se que na atualidade boa parte da juventude e adultos estão preocupados com a aparência física. Muitos passam a aderir a uma vida de alimentação saudável, frequentam academias e alguns usam o discurso que o faz em prol da saúde, mas na verdade seu objetivo real é o espetáculo do seu corpo. Esta espetacularização está presente em várias instâncias da vida das pessoas, como por exemplo nas redes sociais, como uma forma de propagação de seu desempenho.

Pensar, portanto, o esporte e a cultura física como instância sociais a produzir novas eficiências corporais significa analisar o quanto representações idealizadas de saúde, de beleza estética e de performance estão colaborando para designar, na atualidade, os corpos que não se ajustam a essas eficiências construídas por nossas culturas como sendo deficientes e, por consequência, hierarquicamente inferiorizados ante a expressão de tamanha perfectibilidade(NUNES, GOELLNER, 2007)

Diante de uma análise geral sobre o capítulo, sintetiza-se o seguinte: dois corpos que foram bastantes treinados, entram em uma disputa pelo espetáculo, espetáculo esse experimentado em forma de glória, que é proporcionado pela plateia.

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Fonte: http://migre.me/vpPYU

Os sujeitos fora do padrão de beleza dominante, são tachados como “doentes” mesmo que estejam em ótimas condições de saúde, apenas por terem outros tipos de beleza. A partir daí surgem os preconceitos, os desprezos, a falência da empatia, pelo outro que é diferente do resto. Toda essa compulsão por beleza traz sofrimento e frustração a todos nós. É triste perceber que de fato somos por “dentro” invisíveis, sendo o externo o que temos de mais importante e valorizado pelos outros.

REFERÊNCIAS:

Beleza, identidade e mercado. Psicol. rev. (Belo Horizonte) [online]. 2009, vol.15, n.1, pp. 120-140. ISSN 1677-1168. Acesso em: 08 set. 2016.

DANTAS, Jurema Barros. Um ensaio sobre o culto ao corpo na contemporaneidade. 2011. Disponível em: <http://www.revispsi.uerj.br/v11n3/artigos/pdf/v11n3a10.pdf>. Acesso em: 08 set. 2016.

FLORIANI, Flávia Monique; MARCANTE, Márgara Dayana da Silva; BRAGGIO, Laércio Antônio. Auto estima e auto imagem: A relação com a estética. 2010. Disponível em: <http://siaibib01.univali.br/pdf/FlaviaMoniqueFloriani,MárgaraDayanadaSilvaMarcante.pdf>. Acesso em: 08 set. 2016.

NUNES, Cláudia Ricardo Freitas; GOELLNER, Silvana Vilodre. O espetáculo do ringue: O esporte e a potencialização de eficiente corporais. In: SOUZA, Edvaldo. GOELLNER, Silvana Vilodre (Org.). Corpos mutantes: ensaios sobre novas (d)eficiências corporais. Porto Alegre: UFRGS, 2007. p. 55-71.

SANTOS, Verônica Moura; MEZZAROBA, Cristiano. A percepção da imagem corporal: algumas representações de corpo na juventude. 2013. Disponível em: <http://www.efdeportes.com/efd182/a-percepcao-da-imagem-corporal-na-juventude.htm>. Acesso em: 08 set. 2016.

Tabu Brasil: Cirurgias Plásticas. Direção: Eduardo Rajabally. Coordenação de Produção: Luana Binta. National Geographic, 2013. 47’35. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=7N9wVtONEMY>. Acesso em: 24 mar. 2016.

Fontes da imagem: <http://migre.me/vpP8K>, <http://migre.me/vpP9Q>, <http://migre.me/vpPam>.

 

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