Desafios contemporâneos na esfera do trabalho

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Tal relato teve como base o evento Psicologia em Debate, realizado no dia 03/05/2017, por dois acadêmicos do curso de Psicologia do Centro Universitário Luterano de Palmas e trouxe como tema o livro “A CORROSÃO DO CARÁTER – consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo”, de autoria de Richard Sennet. No decorrer do debate vários temas foram abordados, tais como: Caráter X Rotina X Natureza Flexível, Trabalhador Disciplinado e Trabalhador Flexível, Rotina, Flexibilidade no Trabalho, a Ética do Trabalho e Natureza Flexível.

Os acadêmicos discorreram cada tópico com bastante afinco, e explanaram as ideias do autor acerca de cada um, que na atualidade é motivo de discussões e cuidado, pois os indivíduos muito tem se “perdido” ou mesmo não se dão conta dos seus atos, diante de rotinas exaustivas. Considerou-se um dos fatores, a natureza flexível, que pode ser descrita como na forma de rigidez, uma rotina exagerada, e os diversos significados dados ao trabalho. Tais atos podem provocar nos indivíduos uma série de patologias na qual nem eles mesmos se dão conta do que as provocaram. Para o autor isso seria a corrosão do caráter, já que nos com o exagero no campo do trabalho nos distanciamos da esfera moral, no qual ele descreve como sendo “(…) o valor ético que atribuímos aos nossos próprios desejos e às nossas relações com os outros.” (SENNET, 199, p.10)

Fonte: http://zip.net/bhtJ3k

 

Dois modelos de trabalhadores são citados pelo mesmo. O trabalhador disciplinado e o trabalhador flexível. Os dois são afetados pelo capitalismo. O primeiro tem uma rotina disciplinada, burocratizado e busca um futuro “equilibrado”, construindo sua própria história. Este perfil tem grandes chances de contrair doenças. O segundo, como o próprio nome já diz, é flexível, não se preocupa em manter relações duradouras, rotinas aceleradas, formas burocráticas e nem se preocupa com futuros distantes. Considera-se que, indivíduos com este perfil, são mais difíceis de adoecer, a menos que, á frente, ela perca por completo a dimensão histórica de sua existência, o que pode resultar numa espécie de vazio existencial.

Na atualidade a rotina é fatigante e, consequentemente, provoca desgaste físico e psicológico. Diante deste quadro o ser humano busca uma “otimização” de tempo, criando novas formas de aproveitamento do mesmo, uma delas descrita pelo autor é a substituição do controle face-a-face pelo eletrônico. Diante desse quadro percebe-se que novas formas são re(inventadas), mas o predomínio continua sendo do capitalismo.

Fonte: http://zip.net/bxtKMy

 

Por fim o autor descreve que na atualidade, diante de tanta tecnologia e flexibilidade, os jovens têm maiores chances no mercado de trabalho, pois são mais “adaptáveis” as diversas formas de trabalho. No entanto, deve-se refletir acerca do verdadeiro valor humano, onde foi citado pelos próprios acadêmicos o exemplo do padeiro, que durante muitos anos se dedicou todos os dias, ele mesmo a preparar a massa para os pães. De repente não existe mais a necessidade dele fazer o trabalho, pois foi substituído por uma máquina de última geração que de agora em diante fará todo seu trabalho.

REFERÊNCIA:

SENNET Richard. A Corrosão do Caráter: consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo. Rio de Janeiro: Record, 1999.

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Efeitos Pessoais Laborais no Novo Capitalismo

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No último dia 3 (três) de maio aconteceu o “Psicologia em debate”, que foi apresentado pelos acadêmicos Erismar Araújo e Fabrício Veríssimo. O tema faz uma crítica às consequências que o capitalismo traz à vida do trabalhador. Os estudantes relataram que no início do trabalho houve um impasse entre os valores pessoais e aquilo que o autor aborda.

O debate teve início com uma breve apresentação da biografia do autor. Richard Sennett é professor de sociologia da Universidade de Nova Iorque, é considerado um dos maiores intelectuais em sociologia urbana na atualidade. Teve influências da filósofa alemã Hannah Arendt e do filósofo francês Michel Foucault. Sua obra mais conhecida é “O declínio do homem público”, na qual aborda a relação entre a vida pública e o culto ao indivíduo e ao individualismo.

Fonte: http://zip.net/bvtKjd

O livro “A Corrosão do Caráter: consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo” é baseado na história de trabalhadores e um dos pontos que o autor aborda é sobre os vínculos duráveis ou não duráveis no ambiente do trabalho e a importância das relações nesse espaço.

Seguindo com o conteúdo explanou-se a respeito de alguns conceitos, como: Corrosão: ato de corroer, destruição. Caráter: formação moral; honestidade: homem de caráter. O autor, também, argumenta que o capitalismo está em um momento caracterizado como natureza flexível em que o trabalhador deve estar sempre pronto para se adaptar às diversas situações impostas pela empresa.

Fonte: http://zip.net/bhtJZ7

Com isso, o autor acredita que o trabalho flexível tem efeito negativo no caráter da pessoa. No trabalho flexível também entra a questão do trabalhador disciplinado que é aquele que busca sempre dar o seu melhor. No entanto, tanto no trabalho disciplinado quanto no flexível, o trabalho ocupa o centro da vida.

A rotina parte da ideia de reestruturação do tempo; criação de formas e de poder; a mudança do ‘controle face-a-face’ pelo controle eletrônico. Ou seja, com as novas tecnologias, há uma nova rotina em que o trabalhador pode organizar seu próprio tempo, tendo seus aspectos positivos e também negativos, pois com isso enfraquece as relações interpessoais. Dessa forma, a ética do trabalho contribui para a degradação humana, pois não há mais experiências compartilhadas.

Fonte: http://zip.net/bbtJLb

Por fim, foi possível compreender, por meio do relato/apresentação, que o autor expõe a problemática do trabalho flexível, quais seus principais impactos para o trabalhador e, consequentemente, à sociedade em geral, pois uma vez que tais consequências atingem o caráter pessoal de um indivíduo impacta, também, toda a população.

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Novas relações de trabalho e corrosão do caráter

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Participar do Psicologia em Debate é sempre um grande aprendizado, já que o evento sempre traz temáticas relevantes para nossa formação acadêmica. Trata-se de uma ação que acontece semanalmente (quartas-feiras) no Ceulp/Ulbra, entretanto, a do dia 03/05/17 teve uma novidade, aconteceu às 08h da manhã, ou seja, uma oportunidade a mais para aqueles que não podem estar presentes no período da tarde.

Cabe ressaltar que o Psicologia em Debate nos permite trocas valiosíssimas, especialmente para os alunos. São apresentados conteúdos que irão agregar a nossa constituição enquanto acadêmicos. Nos mobiliza, e nos faz pensar sobre outra perspectiva. O nosso poder de argumento, de tomada de decisão frente aos acontecimentos é sem dúvida aperfeiçoado, passamos a ter a delicadeza de observar o que nos rodeia com outro olhar. Respectivamente, adquirimos conhecimento, ou seja, é uma viagem por esferas antes desconhecidas.

Fonte: http://zip.net/bktJKG

 

E o simples fato de estarmos no mesmo barco: alunos X alunos, é extremamente enriquecedor. Exemplo disto, os acadêmicos Erismar Araújo e Fabrício Veríssimo ministraram o debate deste dia, com o tema: ‘A CORROSÃO DO CARÁTER – Consequências Pessoais do Trabalho no Novo Capitalismo’. O embasamento teórico foi fundamentado no conceito do Richard Sennett, educador de sociologia da Universidade de Nova York e da London School of Economics, músico e romancista. Tornou-se famoso nos meios acadêmicos brasileiros por seu livro ‘O declínio do homem público’. (SIQUEIRA, 2002). Lembrando que houve participação de alguns professores, com um ambiente repleto de alunos. Ocorreu na sala 203, prédio 2, no CEUPL/ULBRA.

Este evento trouxe uma temática muito discutida em sala de aula, principalmente no que diz respeito às patologias ocasionadas pelo trabalho. Esta flexibilidade proposta por esse novo capitalismo traz risco, e com isso insegurança. Para o autor “há uma perda do senso de comunidade e a tentativa de transformar em seu correlato as comunicações eletrônicas, que se caracterizam por sua brevidade, pressa e inconsistência.” (SIQUEIRA, 2002). Concomitantemente, engloba situações diversas, o novo capitalismo chamado de flexível por Sennett, é por sua vez imediatista, os efeitos deste fenômeno mercadológico é desorientador, resultando em malefícios a saúde mental e física do indivíduo. Cobra-se postura, tempo, disciplina, qualidade, perfeição, prazo, enfim, o sujeito que trabalha tem que se reinventar a todo o momento.

Fonte: http://zip.net/bptKps

 

Muitos fatores são comprometidos, perde-se a noção de valores, de tempo e de espaço. E com isso o caráter sofre mutações, ou seja, segundo o autor há uma corrosão. Como decidimos o que tem valor duradouro em nós numa sociedade impaciente, que se concentra no momento imediato? Como se podem buscar metas de longo prazo numa economia dedicada ao curto prazo? Como se podem manter lealdades e compromissos mútuos em instituições que vivem se desfazendo ou sendo continuamente reprojetadas? Estas as questões sobre o caráter impostas pelo novo capitalismo flexível. (SENNETT, 1999, p.11)

A sociedade vivencia o processo acelerado da globalização, e por sua vez traz benefícios, o que cabe nesse discurso é como o sujeito enfrenta esse dinamismo, quais as causas que provocam patologias, e o porquê de tanto desequilíbrio pessoal e profissional. Aproveitando o ensejo, cabe a nós futuros psicólogos adentrar a este universo sem medo, e buscar alternativas que possam colaborar com a promoção da saúde mental desses sujeitos fragilizados e a mercê do sistema capitalista, que por sua vez não perdoa.

REFERÊNCIA:

SENNETT, Richard. O Declínio do Homem Público: as tiranias da intimidade. Tradução: Lygia Araújo Watanabe. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

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Relações de Trabalho no Novo Capitalismo

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No dia 03 de maio de 2017 ocorreu mais um Psicologia em Debate. O encontro foi voltado a questão das consequências que o capitalismo, traz ao indivíduo inserido no contexto do trabalho. O sociólogo e historiador Richard Sennett, autor do livro A corrosão do caráter: consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo, aborda em sua obra o modelo capitalista e a influência que este exerce sobre a vida dos indivíduos.

Na esfera do trabalho, percebe-se que há duas formas de o sujeito se apropriar desse universo. Na primeira ele é visto como um trabalhador disciplinado, onde tem como características uma busca de informações para melhoria no trabalho; este estabelece vínculos duradouros, porém há certa dificuldade para se adequar a mudanças abruptas. No outro caso tem-se o trabalhador flexível, onde este possui uma visão ampla, facilidade para se adequar a novas oportunidades; porém as relações que este estabelece são líquidas.

Fonte: http://zip.net/bqtKGl

Os sujeitos inseridos nas duas dinâmicas de trabalho colocam o trabalho no centro de suas vidas, o que os diferenciam é a forma como o conduzem. Sennett (2009) ressalta que “(…), a flexibilidade dá às pessoas mais liberdade para moldar suas vidas. Na verdade, a nova ordem impõe novos controles, em vez de simplesmente abolir as regras do passado — mas também esses novos controles são difíceis de entender”.

Fonte: http://zip.net/bttKqP

Para se compreender o impacto que o trabalho causa na vida psíquica do sujeito, até que ponto esse ambiente é saudável e a partir de que momento se torna um espaço adoecido para esse ser humano, deve-se analisar o conjunto de fatores relacionados à conduta, valores, prioridades que ele agrega. “O termo caráter concentra-se sobretudo no aspecto alongo prazo de nossa experiência emocional. É expresso pela lealdade e o compromisso mútuo, pela busca de metas a longo prazo, ou pela prática de adiar a satisfação em troca de um fim futuro” (SENNETT, 2009, p. 11).

Fonte: http://zip.net/brtJJW

Agir de acordo com um modelo implantado por uma instituição, pode por vezes mexer com a estrutura física e psicológica do indivíduo pelo fato de ir de encontro com seus princípios. Sennett (2009) diz que “talvez o aspecto da flexibilidade que mais confusão causa seja seu impacto sobre o caráter pessoal”. Quando o caráter flexível na esfera do trabalho impacta em outras áreas, pode-se acarretar em um adoecimento psíquico.

REFERÊNCIA: 

SENNETT, Richard. A corrosão do caráter: as consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo. Rio de Janeiro, 2009.

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Relações de trabalho e corrosão do caráter em Sennett

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No dia 03/05 foi realizado um debate sobre a concepção de Sennett sobre o caráter e sua relação com o trabalho. O evento foi conduzido por acadêmicos do curso de psicologia. Primeiramente foi apresentado o autor, que é sociólogo, historiador, e possui como obra mais conhecida “O declínio do homem público”. Antes de apresentarem a definição do autor sobre caráter, foram apresentadas definições sob outras óticas, como a geral, em que define como formação moral, honestidade, caracterização do próprio sujeito e da psicologia, para a qual é um conjunto de respostas coerentes que permite situá-lo em determinada categoria.

A definição geral faz parte também do senso comum, pois geralmente relacionamos caráter com honestidade e com o jeito de ser do sujeito, geralmente atribuímos juízo de valor ao caráter e relacionamos com a honestidade. Para Sennett caráter é “o valor ético que atribuímos aos nossos próprios desejos e às nossas relações com os outros, ou se preferirmos […] são os traços pessoais a que damos valor em nós mesmos, e pelos quais buscamos que os outros nos valorizem” (1999, p. 10).

Fonte: http://zip.net/bjtJCS

 

Sennett analisa a corrosão do caráter induzida pela instabilidade profissional sob o capitalismo flexível, a partir de relatos de trabalhadores. Afirma que essa forma de capitalismo flexível que ataca a burocracia, as conseqüências da rotina exacerbada e os sentidos e significados do trabalho e acaba criando uma situação de ansiedade nas pessoas, colocando em xeque o próprio senso de caráter pessoal.  Ele explica que o caráter do sujeito é atingido á medida em que este tipo de capitalismo não oferece uma experiência estável, uma vez que aquele não sabe os riscos que está correndo e a que lugar irá chegar, as relações de trabalho, os laços com os outros não são em longo prazo.

Há uma dinâmica de incertezas e de mudanças constantes de emprego e de moradia que impossibilitam o estabelecimento de laços com vizinhos, fazer amigos e manter laços com a própria família. Ou seja, o capitalismo acarretou uma mudança nas relações de trabalho e interpessoais. Porém essa é uma configuração da sociedade atual, que vê a rotina e o controle como algo ruim e tenta vencê-la através da flexibilização. Sennett acredita que a mudança não acabou com o controle, apenas modificou a forma.

Fonte: http://zip.net/bltJc3

 

Como consequências dessas mudanças e incertezas na vida do sujeito, este pode adoecer, surgirem patologias, ele pode sentir-se desmotivado no trabalho, com sentimento de apatia e isso pode influenciar de maneira negativa em outras áreas de sua vida. Sennett acredita também que houve uma degradação do indivíduo, uma vez que a flexibilização do trabalho requer a flexibilização do caráter do sujeito. A visão de Sennett faz-nos refletir de forma crítica as relações de trabalho da atualidade e como estão entrelaçadas com o modelo de sociedade em que vivemos, além de identificar como os valores modificaram-se ao longo do tempo.

REFERÊNCIA: 

SENNETT, Richard. O Declínio do Homem Público: as tiranias da intimidade. Tradução: Lygia Araújo Watanabe. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

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Sobre a memória na escrita ou sobre a escrita da memória

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Escrever é tornar registrada uma ideia. Somente uma ideia cultivada em seu próprio ciclo de vida IMPULSO-SIGNIFICAÇÃO-MEMÓRIA-PENSAMENTO pode, no transcorrer da tinta, do impulso eletrônico ou do lance sináptico, tornar-se escrita.

A arte de memória é como uma escrita interna…os locais são como tábuas de cera ou papirus, as imagens como letras, o arranjo e a disposição de imagens, como o script, e a fala, a recitação, como a leitura… Os lugares permanecem na memória e podem ser usados novamente, muitas vezes (…) (Smolka, 171).

Com isso, é clara a ideia de que a escrita ocorre independente do registro externo, o do papel ou do computador, pois se dá no próprio pensamento. As ideias são escritos que foram mais apropriados, mais memorizados, mais editados pelo pensamento, não necessariamente mais velhos. Quando se passa a escrita para o papel, apenas se repete o que se escreveu no pensamento. Ao mesmo tempo, esse passar (refazer um registro) cria uma reação espelhar do/no próprio pensamento que se projeta no infinito microcosmo do registro, tanto o neuronal quanto os de “fora”, das tintas, do carvão, dos sistemas eletrônicos, do vinil, dos cristais e etc. Em suma, escrever é apenas um momento de um pensar que não cessa até a sua morte. Portanto, a escrita é também um exercício da memória, mesmo antes da existência dos papéis, de papiro, de cânhamo, não importa. Seligmann-Silva (2006) faz um estudo histórico acerca de como o conceito de memória modifica-se ao longo do tempo. Esse autor afirma que

Na Antigüidade não só não existia a impressão de livros, como tampouco havia papel tal como nós o conhecemos hoje; daí a importância da memória para o orador. Também em Cícero é patente o valor atribuído à visão dentro da técnica de memorização. O princípio central da mnemotécnica antiga consiste na memorização dos fatos através da sua redução a certas imagens que deveriam permitir a posterior tradução em palavras: a realidade (res) e o discurso final (verba) deveriam ser mediatizado pelas imagens (os imagines agentes). Essas imagens por sua vez, deveriam ser estocadas na memória em certos locais (loci) imaginários ou inspirados em arquiteturas de prédios reais. O importante era que o retor tivesse domínio sobre esses espaços da memória que deveriam ser percorridos no ato de sua fala, quando cada imagem seria retraduzida em uma palavra ou em uma idéia. (Seligmann-Silva, 2006, p.35)

O que é a memória? Qual é sua unidade de medida? O vinil, o cristal e o carvão não armazenam nada além de deformações microscópicas em sua estrutura concreta. É na interação com outros instrumentos que eles se mostram em imagens e em sons dos aparelhos. Talvez a memória seja assim também. Seligmann-Silva (2006) escreve que

Em Aristóteles, portanto, encontramos tanto uma concepção da memória como escritura na nossa placa mnemônica das impressões do mundo, como também uma forte concepção de reminiscência ou recordação, como um procedimento de leitura — e, como é evidente, a comparação com as letras do alfabeto não é de modo algum casual aqui. O elemento ativo da memória é comparado ao modo de ação de um pesquisador ou viajante que busca a inscrição mnemônica pelos labirintos de nossa memória-arquivo. A noção de associação também é essencial no nosso contexto: a estruturação da recordação – e portanto do discurso de um modo geral, que sempre está recuperando informações arquivadas – funciona a partir de um princípio de leitura de semelhanças que não deixa de lembrar a definição aristotélica, da sua Poética, do homem como um “ser mimético” (Seligmann-Silva, 2006, s/p).

Distinguem-se, portanto, duas maneiras mnemônicas: uma que imprime micromarcações sinápticas e outra que é posta em movimento quando as buscamos em nossos “arquivos”. A primeira parece que comunica algo quando na presença de estímulos parecidos com os que estiveram no momento de sua impressão, como faz o vinil. A segunda comunica algo que intentamos comunicar. A ordem da intencionalidade é assunto para outro artigo, mas, para quem tem interesse, ver o artigo chamado “A Importância da Act-Psychology de Franz Brentano”, de Saturnino Pesquero Ramón (Ramón, 2006), professor da Universidade Católica de Goiás.

Autores como Seligmann(2006), Smolka (2000) e Myrian Sepúlveda dos Santos (1989) escrevem sobre o caráter individual e coletivo da memória. Seu caráter individual abarca a forma como um indivíduo acessa o seu banco de dados ou como ele é de outra maneira acessado; seu caráter coletivo caminha desde a tradição oral da passagem do conhecimento, passando pelas artes em geral, em especial as imagéticas, chegando ao registro eletrônico interativo. Todos eles ressaltam, com ou sem críticas, os trabalhos de Halbwachs, sociólogo francês que desenvolveu o conceito de memória coletiva durante as décadas de 30 do século XX. Por exemplo, Sepúlveda dos Santos afirma que

No primeiro de seus trabalhos sobre memória, Les cadres sociaux de la mémoire, Halbwachs estabeleceu os aspectos principais de sua teoria, reafirmados em trabalhos posteriores, que, a meu ver, consistem, primeiro, da afirmativa de que memórias só podem ser pensadas em termos de “convenções” sociais, chamadas por ele quadros sociais da memória; segundo, de que o passado é reconstruído continuamente; e, terceiro, de que o estudo de quadros sociais ou memórias coletivas pode ser realizado empiricamente e de forma autônoma à intenção dos indivíduos. (Sepúlveda Santos, 1989, p. 149).

O levantamento acima é apenas para mostrar que a memória é mais um amplo tema sobre o qual há tantas divergências quanto convergências. Como a colocamos para rodar? Todas as pessoas talvez saibam a resposta para essa questão, mas não a sabem escrever, nem no pensamento. Parece que a memória se trata de um lugar que está em vários outros lugares, no cérebro, nos músculos, nas células, nos genes. Questiono-me se isso tem alguma coisa a ver com o fato de um dos mais eficazes exercícios psicológicos associados ao desenvolvimento da memória possuir, como comando básico, o uso da imagem de lugares. O exercício é chamado “Palácio da Memória” e tem Matteo Ricci, um italiano fazendo missão jesuítica na China, como reconhecido por ter usado e desenvolvido tal método, no século XVI (Smolka, 2000).

As janelas que definem o Windows são os lugares vistos por dentro, possivelmente uma analogia à ideia de que a indústria cibernética enraíza-se, capilariza-se dentro do pensamento humano. A cibernética lida com o governo dos sistemas físicos automáticos, que podem pensar sem saber que estão pensando. Se sabem ou não, a questão mais contundente na cibernética está no fato de que se trata da área que lida com a disseminação da comunicação de valores sócio-culturais de maneira mais eficaz que conhecemos. Vivemos num mundo que, mesmo que gire em torno do capital fortemente, gira também, de maneira acentuada, em torno da comunicação. A internet pode não ser um sistema de ensino, mas é certamente o que mais educa hoje em muitos centros urbanos. Pelo menos a tendência parece ser essa. Por ela se propagam jeitos de escrever, de falar, de andar, de vestir, de comer, de sentir, de pensar, de viver, da mesma maneira que ocorre no uso dos lugares usados no exercício da memória. Roque Theóphilo (s/d) afirma que

A cibernética nasceu do estudo comparado das máquinas eletrônicas automáticas sobre os processadores do sistema nervoso dos seres vivos e as suas respectivas conexões nervosas. A simulação deste comportamento pelo computador gerou, na prática, o surgimento da cibernética. Com o desenvolvimento da tecnologia o termo estendeu-se às máquinas que efetuam movimentos diferentes segundo alguma condição interna. Com o advento da eletrônica e a sua grande evolução foi possível a utilização das condições elétricas, magnéticas e óticas, bases dos processadores digitais e da cibernética atuais.

A internet reconfigura de maneira significativa a forma como escrevemos. E se reconfigura de maneira significativa a forma como escrevemos, alteração de alguma ordem deve trazer também à memória, recurso usado, como já visto, diretamente no exercício da escrita. Benjamin (1994) trata do declínio da tradição oral e da ascensão da novela dos livros como uma das condições pelas quais um povo perde sua memória. A análise de Benjamin nos traz à cena a questão da estratégia comunicacional que liga pessoas por meio de uma determinada troca coletiva na qual partilham de significados, leis, convenções e rituais cuja articulação é chamada “cultura”. Para Roque Theóphilo (s/d)

Assim, a comunicação é regida por um processo de controle, que é a habilidade para fazer que algo se comporte exatamente como se deseja. O homem tem sido considerado pela psicologia, implícita ou explicitamente, um sistema de controle adaptativo pela aprendizagem, explicando-se, pois, como se desenvolve o processo de controle. A teoria do controle tem recebido severas críticas por sua origem mecanicista, não se perdendo de vista que o processo do controle é essencial para a comunicação. A relevância do processo de controle em psicologia é percebida quando a sua ausência se reflete nos processos que são afetados quando surgem erros de comunicação (entropias) que causam sérios transtornos. Evidentemente que o processo de controle, quando efetuado por sistemas eletrônicos sobre o comportamento humano e sobre as demais funções humanas, deve ser regido por severos princípios éticos, porquanto poderiam derivar-se, invasivamente, no condicionamento humano, tão a gosto dos regimes de intolerância para a prática da famigerada lavagem cerebral.

Theóphilo levanta uma questão importante à Psicologia e trabalhada por Benjamin quando trata da narrativa: a constituição de uma sociedade cujos membros, por possuírem pouco uso da memória, encontram-se escravizados. A discussão acerca disso é infindável: abrange desde o condicionamento respondente experimentado por Pavlov ao sistema religioso, científico e capitalista, todos eles aprisionadores.

Contudo, o intuito desse texto não é abarcar conceitualmente a memória, tão pouco o árduo tema do controle e do poder. Esse texto é fruto de um exercício de escrita sem temas. Às vezes escrevo sem ter, primeiramente, um tema. Há, nesse exercício, um sentido diferente no caminho da palavra, do que aquele percorrido por ela em busca de temas, quaisquer. O sentido do fluxo da palavra, na escrita sem tema, é aquele em que elas próprias moldam o pensamento e não ao contrário. Escrever sem temas é deixar ser guiado pelas palavras. E elas foram-me saindo, como se elas próprias fossem a memória em si, fazendo sua função de lembrar e, ao mesmo tempo, de criar o mundo. O sair das palavras me levou ao tema da escrita, da memória, da sociedade, dos sistemas e, de novo, ao da escrita para, por fim, como no início, se não me falha a memória, deixar-me sem tema.

Referências:

BENJAMIN, Walter. O Narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994, p. 197-221.

Ramón, Pesquero Saturnino. A Importância da Act-Psychology de Franz Brentano, in: Psicologia:Reflexão e Crítica, 19 (2), 340-345, 2006.

Roque Theóphilo.  A história da cibernética, s/d. Acessado no sítio:http://www.psicologia.org.br/internacional/ap10.htm, no dia 26 de dezembro de 2012.

Seligmann-Silva, Márcio. A escritura da memória: mostrar palavras e narrar imagens, in: Remate de Males – 26(1) – jan./jun. 2006

Sepúlveda dos Santos, Myrian. O PESADELO DA AMNÉSIA COLETIVA: UM ESTUDO SOBRE OS CONCEITOS DE MEMÓRIA, TRADIÇÃO E TRAÇOS DO PASSADO.  in: CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 19, 1989.

Smolka, Ana Luiza Bustamante. A memória em questão:
uma perspectiva histórico-cultural, In: Educação & Sociedade, ano XXI, nº 71, Julho/00.

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