Um convite a conhecer “Um Conto de Natal” de Charles Dickens

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Diz a sabedoria popular que angústia é o sofrimento pelo passado e ansiedade é o sofrimento pelo futuro. O que, de certa forma, é corroborado por Dalgalarrondo (2008): “angústia relaciona-se diretamente à sensação de aperto no peito e na garganta, de compressão e sufocamento. Tem conotação mais corporal e mais relacionada ao passado” e “ansiedade é definida como estado de humor desconfortável, apreensão negativa em relação ao futuro, inquietação interna desagradável. Inclui manifestações somáticas e fisiológicas e também psíquicas”.Em “Um Conto de Natal”, de 1843, parece que Charles Dickens utiliza a ideia de tirar o velho Scrooge da sua zona de conforto provocando-o com uma boa dose de ansiedade e angústia ao presenteá-lo com as visitas dos Espíritos dos Natais passados e dos Natais futuros, além do Espírito do Natal presente.

Ebenezer Scrooge é um velho avarento, egoísta e ranzinza que não vê graça alguma nas celebrações ligadas ao Natal.

Scrooge mostrava-se taciturno, arredio e isolado como uma ostra. Uma frieza interior enregelava-lhe os traços decrépitos, ressumbrava em seu nariz adunco, sulcava-lhe as faces, endurecia-lhe o andar, avermelhava-lhe os olhos, azulava-lhe os lábios finos e fazia sentir-se até mesmo em sua voz estridente. Uma espécie de neblina cobria-lhe a cabeça, os supercílios e o queixo pontiagudo. Esta frieza inóspita Scrooge a levava consigo aonde quer que fosse, de modo que seu escritório continuava gélido durante o mais intenso calor e não melhorava um grau nem mesmo pelo Natal.

Nem mesmo a visita do seu sobrinho para desejar-lhe um Feliz Natal comove-o. Afinal, que motivo há para ele ser feliz?

– Ora! Feliz Natal! Que direito tem você, diga lá, de estar alegre? Que razão tem você de estar alegre, pobre como é?”

Enfim, Scrooge acha tudo uma perda de tempo e, pior, de dinheiro, e por causa disso não alivia nada a vida de Bob Cratchit, seu funcionário, pobre e feliz, que anseia correr pra casa para passar o dia de Natal com sua esposa e seus quatros filhos, um dos quais tem um problema físico nas pernas.

Na véspera de Natal Jacob Marley, ex-sócio de Scrooge e que havia falecido há exatos sete anos, aparece para ele para alertá-lo de que não conseguia descansar em paz devido a sua própria mesquinharia e avareza e que, por causa disso, vinha presenteá-lo com as visitas dos espíritos dos Natais passados, presente e futuros para que ele tivesse a oportunidade de recuperar o tempo perdido e não cometer os mesmos erros. Para ele ainda havia tempo.

Cético quanto a essa aparição Scrooge vai se deitar e logo é surpreendido pela primeira visita, a do Espírito dos Natais Passados.  Assustado com a figura que lhe aparecia à frente Scrooge logo lhe pergunta o que o trazia ali, ao que o espírito responde prontamente: “ – Tua felicidade”.  Em seguida, o fantasma leva-o pela janela para um sem número de experiências que lhe tocam o coração e fazem tremer seus lábios de emoção bem como levam-lhe lágrimas aos olhos. O espírito leva-o a ver-se em felizes momentos de seus Natais passados, quando era uma criança solitária a ler um livro, ou um adolescente muito amado pela irmã, que lhe tratava com tanto amor e que ao morrer deixara um único filho, sim, aquele seu sobrinho que lhe desejara boas festas.

Também se viu jovem admirando o enorme coração de seu chefe que, juntamente com sua esposa, oferecia a ele e a outros jovens um alegre baile para comemorar a data. E quase ao fim de sua visita o espírito fez com que recordasse o Natal em que sua noiva libertava-o do seu compromisso, pois há muito já havia percebido que ele a havia substituído em seu coração por um novo ídolo: o dinheiro. Triste e amargurado Scrooge implora que o espírito leve-o de volta, ao que é respondido com uma nova visão: a de uma família feliz, pai e mãe, filhos, comemorando efusivamente a noite de Natal. A mãe, entretanto, era o motivo maior de sua dor neste momento de recordação. Estava ali Isabel, outrora sua noiva, externando com outro a felicidade que poderia ser dele.

“Confesso que me sentiria feliz, se pudesse gozar junto dela do mais pequeno privilégio de uma criança, mas sem deixar de ser um homem, para poder apreciar-lhe o valor”

E assim Scrooge retorna ao seu leito e cai em um sono profundo do qual é rapidamente despertado pela expectativa da chegada do Espírito do Natal Presente. E rapidamente este espírito o levou pelas ruas mais humildes de Londres a mostrar-lhe como as famílias humildes preparavam-se para comemorar aquele Natal. E ao passar por estas famílias o espírito por vezes inundava-los com a luz de seu facho que lhes restaurava o bom humor e a gratidão.

– Será que têm algum sabor particular estas gotículas que caem do vosso facho? – perguntou Scrooge.

– Sim, naturalmente. Têm o sabor do Natal.

– E este sabor pode transmitir-se no dia de hoje a qualquer prato?

– A qualquer prato dado de bom coração, especialmente aos mais pobres.

– Por que aos mais pobres?

– Porque são os que têm mais necessidade deles.

E o espírito leva-o a acompanhar como se dá a comemoração na casa de seu empregado Bob Cratchi, com sua esposa e seus quatro filhos, com especial atenção ao pequeno Tinzinho que mostra-se feliz e animado a despeito de sua doença que o faz necessitar de muletas e que ameaça roubar-lhe a vida.

– Espírito, – falou Scrooge com um interesse que jamais sentira, – dizei-me se Tinzinho viverá muito tempo.

– Vejo uma cadeira vazia neste pobre lar, e umas muletinhas sem dono, conservadas como uma dolorosa lembrança. Se estas sombras não forem modificadas no futuro, esta criança morrerá.

– Não, não, meu bom espírito! – exclamou Scrooge, – dizei-me que o pequeno será poupado.

– Se os destinos permanecerem estáveis nestas imagens, – respondeu o espírito, nenhum membro de minha raça o tornará a encontrar aqui. E por que deplorá-lo? Se é seu destino morrer, que morra já! Isso virá diminuir o excesso de população…

Ouvindo o espírito repetir suas próprias palavras, Scrooge baixou a cabeça, tomado de sentimento e de remorso.

Ainda de cabeça baixa Scrooge espanta-se ao ouvir seu nome. Era Bob que, nos brindes de Natal, e a despeito de tudo que o velho Scrooge lhe faz sofrer em seu dia a dia de labuta, não se esqueceu de seu patrão.

– À saúde do senhor Scrooge! – dizia Bob. À saúde de meu patrão, graças ao qual estamos hoje em festa.

Ao que o espírito segue mostrando comemorações de Natal das mais variadas matizes chegando mesmo a visitar a comemoração na casa de seu sobrinho, comemoração para a qual havia sido convidado e que ele tinha rudemente recusado.

Ao fim da visita Scrooge atreve-se a perguntar o que saia abaixo de suas vestes, pés que mais pareciam com uma garra e que não condiziam com sua imagem. Ao que o espírito responde mostrando o que havia ali.

Das dobras de seu manto, fez sair duas crianças, duas miseráveis criaturas, hediondas, abjetas e repugnantes, que se ajoelharam diante dele e se agarraram ao seu manto.

                                                  …

Eram um menino e uma menina. Pálidos, magros e esfarrapados, tinham uma expressão bravia e odiosa, mas ao mesmo tempo rastejante e humilde. Seus rostos, onde deveria ter desabrochado o frescor da juventude, eram macilentos, encarquilhados, desfeitos, como se a mão do tempo os tivesse tocado. Jamais a criação, em seus insondáveis mistérios, produzira mais feios monstros.

                                                     …

– São filhos do Homem, – disse o espírito, baixando o olhar sobre ele. Estão agarrados a mim para pedir justiça contra seus pais. Este é a Ignorância, e aquela, a Miséria. Toma cuidado contra um e outro, mas especialmente contra a Ignorância; pois vejo escrito em sua fronte a palavra “condenação” e se esta palavra não for apagada, a predição se cumprirá. – Negai-o, todos vós! – clamou o espírito com voz forte, estendendo a mão sobre a cidade. Caluniai aqueles que vos avisam! Tolerai e encorajai um flagelo que serve para os vossos negros desígnios!… Mas temei o fim!

Por fim, visita-o o Espírito dos Natais Futuros, espírito este que nada falava, mas que estava pronto a lhe mostrar os acontecimentos de um Natal que ainda viria a ocorrer. Foi desta forma, acompanhado por uma figura em um traje negro que lhe ocultava o rosto, que Scrooge defrontou-se com sua morte solitária.

E o morto jazia abandonado na enormidade daquela casa vazia, sem um homem, uma mulher ou uma criança que recordasse com mágoa alguma ação generosa sua. A porta miava um gato e debaixo do fogão ouvia-se um rumor de ratos. O que “eles” procuravam naquela casa de morte, Scrooge não ousou pensar.

O que Scrooge testemunhara foi tão grande e tão forte que mudanças operaram-se nele de forma tão intensa que somente lendo o conto e seu epílogo para entendermos e sentirmos o que Charles Dickens nos quis passar ao escrevê-lo. De forma simples e muito bonita Dickens consegue nos levar a sentir, mesmo aqueles que quando adultos tornaram-se céticos e frios, a intensidade de emoções que a data proporciona. E por alguns momentos, ou para sempre, dependendo do impacto das lições apreendidas, podemos, como Scrooge, viver um Conto de Natal.

Como curiosidade, é interessante saber que Walt Disney inspirou-se em Scrooge para criar o nosso conhecido Tio Patinhas, cujo nome, no original em inglês é Uncle Scrooge e que protagonizou com o ratinho Mickey a animação Mickey’s Christmas Carol, baseada no conto. Várias versões do conto podem ser encontradas em quadrinhos, em filmes e animações.

A propósito, a influência de Charles Dickens para a construção do clima de Natal em Londres se deu de tal forma que, conta a lenda, quando soube da morte do autor uma menina que vendia flores em frende de um teatro em Londres falou: “Morreu Dickens? E o Papai Noel, será que morreu também?”

FICHA TÉCNICA DO LIVRO

UM CONTO DE NATAL

Título Original: A Christmas Carol
Autor: Charles Dickens
Ano da primeira publicação: 1843
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Caridade: Amor em sua forma mais nobre

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“Aquele que tem caridade no coração tem sempre
qualquer coisa para dar”

Santo Agostinho

“Caridade faz das mãos prato, do corpo cobertor e
de cada palavra um ato de amor”

Karl Marx

“Virtude sem caridade não passa de nome”.
Isaac Newton

Antes de iniciar uma discussão sobre a caridade, gostaria de trazer um texto com uma história centrada em dois personagens: o ladrão e o bispo.

O ladrão passou dezenove anos em uma prisão. Lá, após inúmeras violências percebeu que se existia um culpado pela sua situação: a sociedade. Ele sabe que é culpado por ter roubado, em seu ensaio mental sobre o crime ele percebe que roubar não é uma situação adequada para sair da situação em que se encontrava – a fome. Eis então que ele se considera culpado do primeiro crime, que lhe deu uma porção menor de sua sentença. Mas dos anos impostos por tentar fugir da prisão, maior parte da pena, a culpa recaia sobre a sociedade.

O pão que havia roubado poderia ter sido dado em uma ação caridosa do padeiro, caso ele tivesse pedido, roubar foi errado portanto. Mas a situação de fome, se nos permitimos pensá-la como ela realmente é, um crime, não é um crime pelo qual o ladrão se sentisse culpado, ele percebe então que criminosa é uma sociedade em que se depende da boa vontade do padeiro. Jean amaldiçoa a sociedade, e sai da prisão dedicado a devolver a ela o mal que sofreu.

Vagando pelas ruas como um proscrito, sem emprego por sua condição, sem dinheiro por não ter emprego e sem alimento por não ter dinheiro, o ladrão vê se repetir a condição inicial de sua penitência, a fome. Mas, diferente do passado de 19 anos, ele encontra a mão caridosa de um bispo, que o abriga, dá-lhe comida e permite que durma em uma cama depois de anos de sofrimento.

A noite, o ladrão furta a prataria do bispo e foge, voltando a cometer seu erro inicial, pecando novamente um pecado repetido.

Preso, levado pela polícia à presença do religioso, o ladrão vê na face do bispo não a repulsa, ou ódio, ou qualquer sentimento fácil que dirigimos a quem nos causou mal.

Mas sim a dúvida, que vem seguida da pergunta. “Ó amigo, tudo isso lhe dei, mas esqueceste do melhor.Não deseja levar também os castiçais que havia lhe dado?”. Eis a dádiva da caridade.

O texto acima resume, em uma síntese minha e livre de alguns rigores de reprodução, a parte inicial da trajetória de Jean Valjean, um dos personagens do romance Os Miseráveis do francês Victor Hugo, que, sendo uma das obras mais reproduzidas de toda a história, acabou por gerar adaptações para o teatro e cinema, como o filme Les Miserables (2013). A cena da caridade promovida pelo bispo, Dom Bievenu também. Aqui no Portal (En)Cena, pode-se encontrar na seção Em Cartaz, uma visão geral sobre o filme. Recomendo o filme, não só pela lição de caridade, mas por seu teor altamente humanista.

Deus caritas Est

A perspectiva da caridade como amor, completando a tríade junto a Eros e Agaphe, tem no cristianismo sua máxima “Amar ao próximo como a si mesmo”, esse ensinamento, atribuído a Jesus Cristo, serve para qualificar o ato de caridade como uma atitude antes de tudo, altruísta. O papa Bento XVI, em sua primeira encíclica, texto aberto a toda Igreja Católica pelo mundo, explicou que

O amor — caritas — será sempre necessário, mesmo na sociedade mais justa. Não há qualquer ordenamento estatal justo que possa tornar supérfluo o serviço do amor. Quem quer desfazer-se do amor, prepara-se para se desfazer do homem enquanto homem. Sempre haverá sofrimento que necessita de consolação e ajuda. Haverá sempre solidão. Existirão sempre também situações de necessidade material, para as quais é indispensável uma ajuda na linha de um amor concreto ao próximo. Um Estado, que queira prover a tudo e tudo açambarque, torna-se no fim de contas uma instância burocrática, que não pode assegurar o essencial de que o homem sofredor — todo o homem — tem necessidade: a amorosa dedicação pessoal. Não precisamos de um Estado que regule e domine tudo, mas de um Estado que generosamente reconheça e apoie, segundo o princípio de subsidiariedade, as iniciativas que nascem das diversas forças sociais e conjugam espontaneidade e proximidade aos homens carecidos de ajuda.

Para o papa, a ação da caridade, não é, necessariamente, uma ação de entrega material. É antes disso a demonstração de que o amor entre pares, a irmandade, é uma condição sinequa non para a existência da própria humanidade, essa reconhecida não só como um ajuntamento de seres humanos, mas como a sublimação de nossa condição existencial, a nossa utopia de comunidade.

A elevação disso ao amor de Deus é um exercício de fé. Mas, a despeito da Teologia, a caridade é parte integrante do conjunto de ações humanas e merece ser observada também sob o prisma agnóstico e ateísta. Afinal de contas, não sendo Deus, ainda é possível amar ao próximo?

O Bom Samaritano

A caridade como elevação da condição humana

Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos.
São dotadas de razão  e consciência e devem agir em relação umas às outras
com espírito de fraternidade.

– Artigo I da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Frequentemente nos esquecemos da brevidade da vida, e de como nossas realizações pessoais são pequenas quando observadas seguindo a escala universal. Individualmente, cada um de nós representa um ser vivo, dentre os bilhões de seres vivos da mesma espécie, contidos no grande grupo de bilhões de bilhões de seres vivos do planeta Terra. Após isso, nos damos conta que nosso planeta é só um de um sistema estelar que se repete ad infinitum pelo cosmo.

Nos constituímos como sociedade, buscando a sobrevivência. Foi assim quando os humanos deixaram as cavernas e passaram a vagar pela Terra em busca de alimento, segurança e meios para perpetuar a espécie. Bem, o grande número populacional mostra que fomos bem sucedidos na tarefa, até demais, de acordo com algumas demonstrações populacionais que apontam para o colapso dos recursos naturais em menos de um século graças ao aumento desenfreado da população.

Mas, diferente de uma espécie puramente replicante, o ser humano buscou realizar seu desejo de expansão escorado por outros objetivos, digamos, mais humanísticos, como a necessidade de pertença local, que gerou as nações e posteriormente os países, e também a aspiração de permanência mesmo a após a morte, dando origem a história. O ser humano quis, portanto, ser, se reconhecer sendo e permanecer sendo.

Na perspectiva humana, de um ponto de vista alheio das muitas religiões, a vida é uma jornada, iniciada no nascimento e findada na morte. O meio do caminho, nossa existência, é o tempo que temos para demonstrar qual nossa missão, qual será nossa pegada e a que devemos nossa vida. A aventura humana é descobrir-se sendo.

Frente a isso, um dos fenômenos mais interessantes, e aí faço um juízo de valor dada à liberdade exclusiva deste texto, é perceber no outro as mesmas vicissitudes e características vividas por nós nessa trajetória. A beleza da vida é perceber que a dor, o amor, o sofrimento, a glória e todos os demais sentimentos abstratos só existem em uma perspectiva divida. Tudo isto é em mim aquilo que eu percebo nos outros.

Lembro me da primeira vez que quis ajudar alguém, entrando agora na seara da caridade, recordo-me que por volta da idade de cinco anos, passava de mãos dadas com minha mãe no regresso à nossa casa, quando um grupo de crianças, do lado de dentro de um muro gradeado, estenderam as mãos e pediram. “Moça, dá uma comida para gente”. Dizendo não ter nada para oferecer, minha mãe apertou um pouco mais minha mão a fim de me fazer desviar o olhar das crianças e seguimos andando.

Mais a frente eu perguntei a ela, porque as crianças não haviam pedido comida para a mãe delas na casa, que ficava no terreno cercado pelo muro gradeado. Minha mãe me disse então que ali existia um orfanato e que, as crianças que pediam comida eram órfãs, não tinham mãe nem pai.

A culpa, sentimento muitas vezes motor da caridade, agora em um julgamento desprovido de mérito, me assolou como uma flecha. Eu tinha uma mãe, eu tinha comida em casa, mas eu não sabia até aquele momento que existiam pessoas sem mãe ou sem comida em casa, eu me percebi humano, ser comunitário e ínfimo pela primeira vez. O tempo, e os mecanismos psíquicos que sejam, fizeram questão de apagar os rostos das crianças famintas de minha mente, mas eu ainda lembro do pedido por comida, e fantasio que depois de minha mãe e eu, alguém, voltando da padaria ofereceu às crianças um pão quente.

A caridade é mais que uma virtude, tal qual a disposição das outras seis nos faz acreditar. É mais do que uma medida da nossa capacidade de dar coisas.

Foto: Sebastião Salgado

É parte da natureza inata do ser humano, é a percepção de que o outro, sofrendo, reproduz a nossa miséria, e nosso ato ajuda a aplacar a nossa finitude.

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