A luta pela sobrevivência deflagrou uma nova ideologia para melhorar a raça humana por meio da ciência.
Quando Charles Darwin escreveu sobre a seleção natural e difundiu a ideia de que a sobrevivência dos organismos dependia de sua adaptação no ambiente, importantes pensadores inclinaram-se sobre este conceito e destilaram novas teorias. A luta pela sobrevivência deflagrou uma nova ideologia para melhorar a raça humana por meio da ciência.
Francis J. Galton é o nome associado ao surgimento da genética e da eugenia, que significa “bem nascer”. Teorizando, seria o estudo dos fatores socialmente controláveis que podem elevar ou rebaixar as qualidades raciais das gerações futuras, tanto física quanto mentalmente. Por meio de casamentos e uniões seletivas, Galton acreditava que poderia modificar a natureza das pessoas, separando aqueles que supostamente eram “perfeitos” e preservando assim a qualidade das futuras gerações.
A degeneração biológica passou a ser uma preocupação e a proibição de uniões indesejáveis era algo bastante coercivo. Propostas políticas de higiene ou profilaxia social passaram a surgir em vários países, dentre eles o Brasil. Em 1923, foi fundada a Liga Brasileira de Higiene Mental, pelo psiquiatra Gustavo Riedel, que ganhou sustentação nos pressupostos eugenistas, atingindo, posteriormente, o campo social. A eugenia era vista por Riedel como o “paraíso terrestre”, reafirmando os pressupostos de Renato Kehl, o mentor da eugenia no Brasil.
Fonte: https://goo.gl/qmFsfJ
“A mulher é vigiada não apenas para ter um feto saudável, com saúde perfeita.” – — Breno Rosostolato
O aspecto cultural e social da eugenia é o que chama a atenção, em vários países, inclusive o Brasil. As explicações para as crises econômicas e políticas isentavam as elites e imputavam toda a responsabilidade ao povo. Ou seja, os problemas de uma sociedade eram justificados através de uma constituição étnica e na presença de raças inferiores.
Na Alemanha, a Lei de Nuremberg, alicerçada nos pressupostos eugênicos, proibia o casamento de alemães com judeus, o casamento de pessoas com transtornos mentais, doenças contagiosas ou hereditárias. Propunha-se a esterilização de pessoas com problemas hereditários e que poderiam comprometer a saúde da raça ariana, associado a isso toda a perversidade e crueldade de uma mente doentia de um ditador como Hitler, que desejava conquistar o mundo. O documentário “Homo Sapiens – 1900”, do diretor sueco Peter Cohen, aborda de maneira enfática as práticas eugênicas durante o holocausto. Um verdadeiro genocídio cruel e injustificável.
Esta concepção de eugenia traduz-se, hoje, no biopoder difundido por estudiosos e intelectuais, com o propósito de estudar estratégias de intervenção sobre a vida cotidiana. Entretanto, alguns preconceitos revelam-se como absurdos propagados pelo biopoder, pois se atribuem à marginalização de “raças inferiores” os conflitos sociais, a pobreza, o aumento da violência, as drogas e por aí vai. Questões como o racismo e o sexismo são reveladas. O aconselhamento genético, por esse ponto de vista, é um espaço de poder e controle, ancorado nas concepções dessa nova genética, determinando a subjetividade das pessoas, pois não temos identidade, mas bioidentidades.
Fonte: https://goo.gl/81DHAU
A mulher é vigiada não apenas para ter um feto saudável, com saúde perfeita. O seu corpo sofre muito mais intervenções médicas, comparado ao do homem. A identidade da mulher é influenciada por essas exigências. Na maioria dos casos, o homem permanece numa posição despreocupada. São inúmeros as técnicas e procedimentos resultantes do biopoder como controle populacional e de natalidade, fertilização in vitro, diagnóstico pré-natal e pré-implantação, aborto terapêutico e clonagem reprodutiva.
Métodos científicos estão a serviço da saúde e da sociedade e possuem como alicerces ideológicos um controle adequado e seguro de doenças, a ponto de antever o surgimento de deficiências ou patologias congênitas, do crescimento descontrolado da população e, por último, o mapeamento do DNA. A genética é a área que se utiliza desses estudos científicos, difunde conceitos, ponderações e determina os aspectos adequados para a existência humana. São métodos eugênicos que estão por trás desses propósitos de prever eventuais problemas.
Porém, a eugenia não cessou. Este movimento social reforça o conceito de etnocentrismo que impera no mundo. Sociedades segregadas por diferenças religiosas são motivos para guerras infinitas e exterminações sumárias. A intolerância sexual, como a misoginia e o antifeminismo, assassina mulheres simplesmente por serem mulheres. A homofobia, lesbofobia e transfobia são intransigentes quanto às identidades sexuais, uma visão rebuscada da heteronormatividade. O racismo é enraizado na sociedade e se manifesta de maneira escancarada, para quem quiser ver. Vivemos um momento social em que essas seleções naturais são praticadas sim, defendidas amplamente por extremistas, fanáticos e radicais. Um sectarismo que não admite a opinião contrária, uma pasteurização social que assola e enfraquece esta infeliz civilização. Civilização?
Compartilhe este conteúdo:
Produtos da Civilização: Um Neonazista Opressor analisado pelo Judeu Oprimido?
Fazendo uso dos conhecimentos possibilitados por Freud, em “O Mal-Estar na Civilização”, como a impossibilidade de se amar incondicionalmente o próximo e a produção de sofrimento causada pelo processo civilizatório para que possamos viver em harmonia, realizei um trabalho cuja proposta foi analisar a dinâmica social colocada sob os dois personagens principais do longa-metragem “Um Skinhead no Divã” e possibilitar um olhar mais critico acerca daquilo que chamamos de “civilização”.
“Um Skinhead no Divã” é uma produção Sueca de 1993, quinto filme da Diretora Suzane Osten, que apresenta dois indivíduos, frutos de uma mesma civilização, porém, antagônicos. De um lado encontramos Soren, um jovem Neonazista, um skinhead; e do outro Jacob, um psiquiatra judeu que se dispõe a ajudar o primeiro com as suas questões, rumo ao melhor entendimento de sua vida psíquica.
Tudo se inicia com o encontro desses dois personagens em um trem, local no qual o psiquiatra vem a cuidar de alguns ferimentos do neonazista e a convida-lo para ir a seu consultório. Esse filme diz muito da sociedade nazista e dos indivíduos os quais ela produziu, sejam os agressores ou os agredidos, trazendo um pouco acerca de um processo de (não) civilização que se fez presente e causou atrito entre dois grandes grupos culturais.
Existe ódio na relação que foi estabelecida, como não o poderia? Um se torna igual a um violento grupo que odeia os supostos diferentes e o outro é o “diferente”. Toda essa trama de ódio pode ser problematizada a partir da Obra de Sigmund Freud, “O Mal-Estar na Civilização”, a qual nos fornece ferramentas para compreender melhor de onde surge tanto ódio e por que ele é descarregado de forma tão hostil e até mesmo elucidar por que o outro, diferente de mim, merece meu ódio e não o meu amor.
Pode-se inferir, segundo Freud, que a civilização tenta frear a grande descarga de ódio direcionada no outro, isso para que seja possível estabelecer alguma ordem entre os humanos, para que seja possível as pessoas se unirem e viverem juntas, dentro de uma organização social estável. Mas esse ódio não desaparece, ele precisa ser direcionado para algo/alguém, a solução é desferir o ódio contra si mesmo, assim nasce a grande instância do Super-eu que vem a lhe vigiar e a lhe causar sensações de culpa, não apenas por infligir regras sociais, mas por meramente pensar em infringi-las.
Soren aparenta se sentir culpado por descarregar tanto ódio no meio externo, no outro, mas acaba por sofrer ao realizar o caminho inverso. O terapeuta vem para ajuda-lo a compreender a organização social a qual ele se insere e a mostrar que ele, e o seu grupo, não são tão diferentes quanto parece.
FICHA TÉCNICA DO FILME:
UM SKINHEAD NO DIVÃ
Diretor: Suzanne Osten
Elenco: Etienne Glaser; Simon Norrthon; Anna-Yrsa Falenius e outros.
País: Suécia
Ano: 1993
Classificação: 16
Compartilhe este conteúdo:
Admirável Mundo Novo: perspectiva da Psicologia Social
A Psicologia Social tem por objetivo estudar os comportamentos no que são influenciados socialmente (LANE, 2006). Dessa forma, a disciplina de Psicologia Social buscou discorrer acerca dessa ciência e de temas que são relevantes para sua compreensão. A partir dos conteúdos discutidos em sala de aula o presente trabalho busca articulá-los com o livro “Admirável Mundo Novo”, tendo que em vista que a obra aponta diversas interferências sociais na forma dos personagens se comportarem, o que possibilita a identificação de diversos fenômenos sociais. O livro “Admirável Mundo Novo” (1932) de Aldous Huxley, apresenta a história de dois mundos, o “Civilizado” e o “Selvagem”.
Fonte: http://migre.me/vEZoD
A narrativa tem início no Centro de Incubação e Condicionamento, que tem como lema do Estado Mundial: Comunidade, Identidade e Estabilidade, é localizado em Londres, no chamado estado da civilização. A história se passa nesses dois cenários, que embora completamente distintos interferem diretamente na construção da identidade de seus habitantes. No entanto, de acordo com suas especificidades produzem diferentes impactos e “jeitos de ser” dos indivíduos.
Diante dessas discrepâncias entre os contextos, surgem também preconceitos com relação ao outro, no qual o diferente é menosprezado e essas vivências também geraram impactos na forma de se comportar dos indivíduos. Assim, o presente trabalho visa realizar articulações entre o livro e os temas Identidade segundo Jacques (1998) e Preconceito de acordo com Myers (2014), a partir de textos que foram discutidos em sala de aula ao longo da disciplina.
.
No Centro de Incubação e Condicionamento, os indivíduos eram condicionados a agirem de maneira estável e social, elementos que constituem suas identidades. Isto, considerando que identidade diz respeito a “um conjunto de representações para responder a pergunta quem és”, Jacques (1998, p.161). Os embriões eram divididos por castas, de forma hierarquizada e suas características biopsicossociais eram definidas a partir disso. Estatura, cor de pele, sensibilidade a determinadas temperaturas e outras especificidades eram estabelecidas previamente de acordo com a casta e suas atribuições.
O sujeito era condicionado a exercer as atividades de seu grupo e não conhecia outras possibilidades, por isso não se importavam com o papel desempenhado ao longo de sua vida. É possível notar que os indivíduos pertencentes a esse estado, o chamado “Civilizado”, tinham seus destinos previamente traçados, bem como suas identidades e características já pré-determinadas, que iam sendo reafirmadas ao longo dos anos, a partir do desempenho de determinadas funções e da ausência de criticidade.
Fonte: http://migre.me/vEZDL
A partir dessa hierarquia, era notório o preconceito existente no trato com as castas tidas como “inferiores”. Referiam-se a eles como negros, horrorosos, pequenos e outros adjetivos que remetiam a desprezo. Preconceito segundo Myers (2014) consiste em um julgamento negativo de um grupo e seus membros, que predispõe contra uma pessoa apenas por ela pertencer a determinado grupo. Isso fica evidente no livro, à medida que um indivíduo era considerado inferior devido fazer parte de um referido grupo. Os Gamas, Deltas e Epsilons foram condicionados a associar massa corporal com superioridade social.
As castas representam a identidade social do indivíduo, que é uma das subdivisões dos sistemas identificatórios e diz respeito a atributos que demarcam a pertença a uma categoria ou grupo (JACQUES, 1998). Dessa forma, a identidade dos indivíduos nesse contexto era totalmente voltada para o aspecto social, uma vez que a maioria não reconhecia suas características pessoais, tendo em vista que isso não era bem visto pelos seus superiores.
Bernard, um dos personagens, era um Alfa que tinha oito centímetros menos do que o esperado para sua casta, por isso era tido também como “esquisito”, fora do padrão esperado o que o isolava de seus semelhantes. O rapaz se isolava e sentia-se inferior e quando se reportava aos seus “inferiores”, acreditava que eles não lhes respeitavam, por isso era hostil e ríspido para obter atenção. Myers (2014) relata que a frustração pode levar à hostilização, o preconceito pode ajudar a camuflar sentimentos de inferioridade, já que pode proporcionar sensações de superioridade. Isto pode justificar as condutas de Bernard.
Diante dos preconceitos sofridos, Bernard intensificava sentimentos de desprezo a si próprio devido aos seus “defeitos físicos” que o excluíam de sua casta, aumentando sentimentos de exclusão e solidão, apesar da sociedade civilizada não ser programada para vivencia-los. Nesse sentido, a medida que o preconceito “pode defender nossa individualidade contra a ansiedade que vem da insegurança ou do conflito interior” (MYERS, 2014, p. 190), o rapaz pode utilizar desse tipo de atitude para minimizar suas conturbações pessoais.
Fonte: http://migre.me/vF0Gl
Bernard sempre se sentiu como um indivíduo à parte, mas encontrou Helmholtz, que havia percebido seu excesso mental e o que lhe diferenciava de outras pessoas, por isso poderiam compartilhar suas angustias. Bernard relatava ter o desejo de agir mais por si, e não tão parte de outra coisa, de ser apenas uma célula do corpo social. Esses desejos escandalizavam os outros, que diante do condicionamento não cogitavam essas possibilidades e achavam absurdos esses desejos, já que era tão felizes e se sentiam livres.
Aqui fica explicita uma relação de devoção, os indivíduos não tinham conflitos e nem passavam por dificuldades, por isso eram agradecidos ao grupo social que faziam parte, a “civilização”. Essa devoção pode predispor uma pessoa a menosprezar os outros (MYERS, 2014). Os demais recomendavam o consumo de “soma” para que eles não tivessem essas ideias horríveis e se sentissem alegres. Os rapazes tinham suas identidades distintas dos demais e se apropriaram do contexto de forma diferente. No entanto, por causa da necessidade de se sentirem pertencentes precisaram se conformar com as normas do grupo.
Cada grupo vestia uma determinada cor, e até por isso eram alvos de preconceito. Até mesmo os jornais eram destinados a castas. Em Londres tinham três jornais, Londres sendo eles o Rádio Horário, jornal para as castas superiores, A Gazeta dos Gamas, verde-pálido, e, em papel cáqui e exclusivamente em palavras monossilábicas, O Espelho dos Deltas. Tudo isso, atuava reafirmando a identidade social das pessoas que ali habitavam, a medida que tudo era separado para cada grupo, fazendo com que cada vez mais eles se entendessem como Gama, Delta e outros.
Fonte: http://migre.me/vF01V
A segregação favorece o preconceito, bem como a identidade social. Um grupo que usufrui de uma superioridade econômica e social pode justificar essa posição por meio de convicções preconceituosas (MYERS, 2014). Isso fica evidente no livro, pois as castas superiores se utilizavam de argumentos preconceituosos para relatar as diferenças.
Lenina, uma das personagens, era uma típica jovem de casta superior que seguia a risca os regulamentos e tinha atitudes preconceituosas com as outras castas. Isso é potencializado devido a identidade social fortalecida, segundo Myers (2014) é possível que essa identificação leve o indivíduo a detestar grupos diferentes. Além disso, o autor acrescenta que pertencer a um grupo implica também na definição de quem não se é. Por isso, a moça agradecia constantemente por não ser inferior, já que sabia que o grupo ao qual pertencia era de superiores.
Existiam regulamentos para nortear as condutas, por exemplo, as mulheres não deveriam engravidar, mas deveriam relacionar-se sexualmente com quantos homens elas desejassem, por isso, eram sujeitas a anos de hipnopedia intensiva e, dos doze aos dezessete, exercícios malthusianos três vezes por semana, de modo que esses cuidados se tornavam quase automáticos. Tudo isso, reforçava a identidade social e impediam os indivíduos de tomarem consciência de suas singularidades.
Emoções, laços de maternidade/paternidade e conjugalidade também eram descartados na civilização, uma vez que poderiam gerar instabilidade. Para evitar tais “desconfortos”à sociedade, as pessoas ouviam repetidamente comandos que influenciariam seus comportamentos, eram anos de hipnopedia. Além disso, se por ventura, ocorresse algo desagradável eles utilizavam a “soma” medicamento que lhes permitiam fugir da realidade e suportar as adversidades sem acionar recursos pessoais de enfrentamento.
Ao longo da história, Bernard, decide ir passar suas férias em uma reserva, e leva com ele Lenina. A reserva era conhecida como o estado “Selvagem”, onde se encontram os nãos civilizados, ou chamados índios e mestiços. Lá existiam piolhos, suor, mau cheiro e as pessoas envelheciam. Bem como, casamento e famílias o que para o mundo civilizado era antiquado devido ao condicionamento. Diferente de Londres e a sociedade civilizada de onde vinham.
Fonte: http://migre.me/vF0Tc
Existiam os civilizados e os selvagens e para Myers (2014) as etnias são uma forma de categorizar as pessoas, na qual rotulamos os indivíduos na tentativa de simplificar o mundo.Os chamados civilizados viam os índios como sujos e merecedores de todas “mazelas” do mundo selvagem, ou seja, como tendo características que justificavam essa situação e fortalecem essa diferença de “status” (MYERS, 2014).
Durante a viagem Bernard e Lenina conheceram outra realidade que lhes gerou espanto, desconforto e atitudes preconceituosas. O preconceito pode ser advindo de uma série de convicções negativas, os estereótipos (MYERS, 2014).Para Lenina, as pessoas da reserva eram sujas, imundas, feias, desprovidas de sabedoria, antiquadas, conforme lhe era descrito em Londres.
Conheceram ainda Linda que também trabalhou no Centro de Condicionamento e há alguns anos foi visitar a reserva e se perdeu, estava grávida e lá teve seu bebe. Tendo em vista que e gestação e a relação materna eram inconcebíveis na sociedade civilizada, ela não quis retornar para Londres com seu filho John.
Ao longo do livro são apontadas as dificuldades que Linda teve em se adaptar ao novo contexto e como foi conturbada a relação entre ela e seu papel de mãe. Tendo em vista que sua identidade a resposta para a pergunta quem és era voltada apenas para suas atribuições socais, frente a perda delas Linda não conseguia prosseguir. Isso também se deve ao fato dela ter sido condicionada ao uso de “soma”, um medicamento milagroso que lhe permitia fugir da realidade e evitar solucionar conflitos a partir de seus próprios recursos.
Fonte: http://migre.me/vF1ch
Foi difícil para John se inserir na comunidade local e compreender as regras passadas por Linda. O preconceito era frequente não apenas na sociedade civilizada, mas também no estado selvagem. John era descendente de brancos tinha olhos azuis e pele clara, por isso fora excluído de algumas atividades da comunidade.
Lenina fica espantada com a aparência física de Linda, que devido à idade tinha rugas, dentes manchados e era gorda. Tudo isso, era inadmissível em Londres, pois lá não era permitido que ninguém ficasse assim. Eram utilizadas diversas estratégias para evitar o envelhecimento e esse aspecto “assustador”.
Linda e John retornaram para Londres e são narradas as dificuldades do rapaz para adaptação ao novo ambiente e os novos costumes. Quando Selvagem chegou, todos queriam conhece-lo e por isso tratavam Bernard bem, já que o contato se daria por meio dele. Diante dessa “aceitação” o rapaz mudou seus comportamentos, ficou deslumbrado com a possibilidade de inclusão, tinha quantas mulheres quisesse e sentia necessidade de gabar-se por isso. Aqui, nota-se que a identidade pessoal que está em constante modificação através das novas experiências, começou a se moldar a partir do novo perfil de relações estabelecidas.
Bernard vivenciou sentimentos de exclusão durante todo o tempo devido a suas características físicas desproporcionais a sua casta, por isso não tinha uma identidade pessoal positiva. Myers (2014) relata que nesses casos é comum que as pessoas busquem auto-estima por meio da identificação com grupo e do estabelecimentos de laços. Essa explosão de experiências positivas e de inserção na comunidade, caracterizavam uma grande oportunidade para se firmar com indivíduo.
Fonte: http://migre.me/vF1la
Quando John foi pra civilização ele era uma pessoa distintiva, pois era diferente do grupo dos civilizados, o que fez com que ele se tornasse uma atração. Além disso, as pessoas o tomavam como modelo dos demais Selvagens, o que fazia com que os estereótipos se intensificassem (MYERS, 2014).
Inconformados com a civilização acrítica, Bernard, Helmholtz e Selvagem buscam falar com o diretor, a fim de questionar as motivações para as regras impostas. São informados que isso é para a felicidade de todos, pois as pessoas precisam de estabilidade e para isso precisam viver em hierarquia e sem muitos questionamentos. Aqui nota-se a mudança na identidade deles, que até então não tinha tido coragem de desafiar as regras, mas como o “eu” está em constante transformação passaram a questionar a sociedade na qual estavam inseridos.
Diante dessa petulância, Bernard e Helmholtz foram levados para ilhas longe dali, na qual vão todos que adquiriram demasiada consciência de sua individualidade, que não se satisfizeram na ortodoxia da comunidade ou os quem tem ideias próprias ou independentes. Essa conduta era baseada na tentativa de evitar que outros fossem “contaminados” com essa consciência de si. Selvagem permaneceria na civilização para ser estudado, porém ele resolveu ir também, pois não desejava modificar-se a agir conforme a comunidade civilizada. A mídia local ia a ilha para filmá-lo e observar o seu modo de viver.
Fonte: http://migre.me/vF1Cf
A partir da história contada no livro “Admirável Mundo Novo” e dos conteúdos discutidos por meio da Psicologia Social é possível ressaltar o quanto de social tem em cada indivíduo. O contexto em que cada um está inserido influencia diretamente na sua forma de ser, mesmo que o indivíduo não perceba essas interferências e considere-se livre.
Durante a narrativa os habitantes do estado civilizado foram condicionados a terem uma falsa impressão de liberdade e autonomia, e qualquer um que chegasse a ter consciência dessa ausência de individualidade era tirado da sociedade afim de não contaminar os demais. Diante dessa identidade previamente moldada e da força desse papel social, os preconceitos aumentavam, tendo em vista que o diferente era visto como inferior. Todavia, os preconceitos, rótulos e discriminações estavam presentes nos dois mundos, ainda que por vezes se mostrasse da maneira mais sútil possível.
FICHA TÉCNICA DO LIVRO
ADMIRÁVEL MUNDO NOVO
Editora: Globo Assunto:Ficção científica e distópica Idioma: Português Ano: 1979 Páginas: 178 Ano de lançamento: 1932
REFERÊNCIAS:
HUXLEY, A. Admirável Mundo Novo. Porto Alegre: Editora Globo, 1979.
JACQUES, M. G. C. Identidade. Em: JACQUES, M. G. C. Psicologia Social Contemporânea. Petrópolis: Vozes, 1998.
LANE, Silvia T. Maurer. O que é psicologia social. São Paulo: Brasiliense, 2006.
MYERS, D. G.Preconceito: o ódio ao próximo. Em: MYERS, D. G. Psicologia Social. Porto Alegre: Artmed, 2014.
Em algum momento, no inicio da constituição da comunidade humana, tivemos que fazer um pacto civilizatório. Como bem disse Freud, tivemos que recalcar nossos impulsos mais primitivos, perversos e egoístas em nome da convivência coletiva. Então, desde o início, mesmo com todos os equívocos que invariavelmente cometemos na nossa frágil condição humana, temos optado pelo amor, pelos laços que nos unem numa coletividade. Apesar de não sabemos até quando, é assim que nossa espécie tem sobrevivido até então.
Fico pensando que o advento da Internet, especialmente das redes sociais, tem nos colocado diante de uma nova forma de laço social diferente da que estávamos acostumados e daí, talvez, a sua fragilidade. A mediação tecnológica, já percebemos, dificulta a empatia. A comunicação pela escrita tende a ser mais fria. Ficam imperceptíveis a entonação da voz e a linguagem corporal o que faz com que os mal entendidos próprios da linguagem se fixem ainda mais no território do impossível de suportar o outro na sua diferença. Enquanto que o cara-a-cara e o olho-no-olho ou as nuances da voz favorecem a empatia fazendo do outro um semelhante mesmo quando diz algo que me causa mal estar, a impessoalidade de um post ou um tuíto transforma o outro num estranho insuportável. Ou não é verdade que seja totalmente possível e suportável discutir política, religião e outros assuntos difíceis na mesa do bar, na sala de aula ou na reunião de trabalho e totalmente inviável discuti-los nas redes?
Outra coisa que muita gente ainda não se deu conta, é que publicar alguma coisa nas redes sociais hoje em dia é enviar uma mensagem para o Planeta inteiro ouvir. Mesmo sentadinhos e protegidos atrás de nossas telas de computador e smartfones, o que dizemos na esfera virtual tem mais transparência, rapidez e capacidade de alcance que qualquer outro modo de comunicação que já foi inventado. Uma publicação irrefletida pode nos levar do constrangimento público ao linchamento virtual.
Isso não quer dizer que as redes sociais e a internet sejam o demônio. Não sou partidária dos melancólicos nostálgicos que sempre temem os novos modos de existência. As novas formas de laço inauguradas pelas redes são uma realidade e, possivelmente, vieram para ficar, entretanto, elas estão exigindo de nós um novo pacto civilizatório. E precisamos fazer isso com urgência, sob o risco do esgarçamento do tecido social com a fabricação cada vez maior de guetos: políticos, religiosos, científicos ou ideológicos. Pois, na tentativa de manter um nível suportável de socialização nas redes, nossa saída tem sido o simples descarte do outro.
Enquanto na vida real o exercício de suportar o outro inclui não poder mata-lo, nas redes sociais matar o outro é tarefa simples e limpa, sem qualquer punição. “Unfollow”, “unblock” e “desfazer a amizade” são formas de eliminar o outro da nossa linha do tempo, mecanismos simples e rápidos que temos utilizado para lidar com os diferentes. Diante do impossível de transigir com o outro na sua diferença a saída tem sido apagá-lo simplesmente, nos relacionando apenas com aqueles que pensam como nós. É assim que os guetos das redes vão se constituindo e se fortalecendo, e não havendo discursos contraditórios, suas verdades vão se tornam ainda mais unificadas, fortes e inabaláveis. E ainda, insuflados pelo nosso narcisismo, pelo prazer de encontrarmos pessoas parecidas conosco e que pensam como nós, nos fechamos cada vez mais em nossos grupelhos com suas verdadezinhas inabaláveis.
Como já dizia o poeta: “toda unanimidade é burra”. E eu completo: todo fundamentalismo é perigoso. Nada é mais perigoso do que um grupo de pessoas munidas de verdades compartilhadas e inabaláveis.
Sendo assim, é urgente que façamos um novo pacto civilizatório para as redes. Precisamos resgatar a humanidade, nossa e do outro, por traz de um post. Precisamos cuidar do que postamos para não destruir pessoas, reforçar mentiras ou contribuir para linchamentos. Precisamos entender que um post é apenas um recorte de um sujeito, não diz tudo sobre ele. Precisamos aprender a suportar a diferença, escutar o contraditório, debater sem atacar. Escutar.
A política do amor, aquilo que nos enlaça enquanto espécie humana é o que nos tem sustentado. O amor é um ato político, sem o qual já teríamos sucumbido. O salto evolutivo que precisamos nesses tempos, talvez seja, levar a política do amor também para as redes.