A ressignificação dos romances por Jane Austen

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Devo ater-me a meu próprio estilo e seguir meu próprio caminho.
E apesar de eu poder nunca mais ter sucesso deste modo,
estou convencida de que falharia totalmente de qualquer outro.”

Jane Austen considerava que as pessoas que não gostam de um bom romance só podem ser intoleravelmente estúpidas, por perder justamente o encanto dos romances, totalmente conectados a vida real, incluindo as imperfeições. Quem se interessa pelo mundo dos livros certamente já ouviu falar dela, a escritora Inglesa que conseguiu deixar seu legado na literatura mundial em apenas 41 anos de vida. Seus escritos vão além das clássicas histórias de amor onde os personagens principais se amam e algum elemento externo o impedem de ficar juntos, através de seus romances ela critica a sociedade e costumes vigentes do século XVlll, mas, ainda assim, causando borboletas no estômago em seus leitores ao falar de amor.

Talvez sua escrita tenha sido como uma válvula de escape, onde a pressão era tão alta e causada por meras convenções sociais que determinavam o que a mulher devia fazer, falar, e até com quem se relacionar, que suas palavras jorravam como a nascente de uma cachoeira, sutil e bela, mas forte o bastante para ocupar seu lugar no mundo de forma irremediável.

Fonte: https://bit.ly/2zVmUjY

Jane Austen apesar de ter oportunidades, de ser o tema mais recorrente em seus livros e dos finais de conto de fadas, ela nunca se casou, preferiu escrever romances a viver eles, já que o casamento por amor não era valorizado, ela preferiu ficar solteira a casar por interesse ou pressão. Viveu com os pais e com mais seis irmãos, só um deles sendo mulher, chamada Cassandra que se tornou sua confidente e companhia durante toda a vida, já que também não se casou. Ao contrário do que era esperado de uma mulher, Jane se dedicou aos estudos e as palavras, mesmo sendo muito nova já tinha consciência dos papéis de gênero que permeavam todas as relações. Em orgulho e preconceito, livro publicado em 1813, ela quebra estereótipos femininos sobre estar sempre em busca de um marido, especialmente se for rico.

Definitivamente, Jane Austen era uma mulher à frente do seu tempo, pois mesmo tendo pouco contato social com pessoas fora da família, conseguiu escrever universos únicos com diálogos complexos e instigantes, comentários sutis, mas carregados de críticas ácidas.

Fonte: https://bit.ly/2Flcd0g

Trecho do livro Orgulho e Preconceito:

Lizzie: “Eu me pergunto quem descobriu o poder da poesia para espantar o amor.”
Darcy: “Achei que fosse o alimento do amor”
Lizzie: “Do amor belo e vigoroso. Mas se é apenas uma vaga inclinação, um pobre soneto o liquidará.”
Darcy: “Então o que recomenda para despertar a afeição?”
Lizzie: “Dançar. Mesmo que o par seja apenas tolerável.”

Muito fiel a quem ela era, não se deixava influenciar por opiniões ou pelo que esperavam dela, sua identidade está em cada livro. Diferente dos romances escritos até então, Jane apresenta críticas sociais, conflitos entre as classes, minúcias da personalidade de seus personagens em todos os cenários e exterioriza certo caráter moral em seus escritos, expressando as falhas humanas como uma luta pela reforma da humanidade.

Seu conceito de amor, ao contrário do pensamento da grande maioria, não é gostar de alguém por quem essa pessoa é em sua totalidade, mas diz que a pessoa certa, com seu amor saudável deve ajudar a outra a superar suas falhas, e estar disposta a ser ajudada, assim, crescendo juntos em maturidade, sabedoria e gentileza, como um incentivo a reconhecer e lutar contra a ganância, o orgulho e o preconceito que é intrínseco a nossa existência.

Fonte: https://bit.ly/2zPvhh8

“…não tenho medo de mostrar meus sentimentos e de fazer coisas imprudentes, pois acredito que o que não se mostra, não se sente. Coisa que talvez surpreenda muito a você, pois os seus sentimentos são tão guardados que parecem não existir realmente.”

A principal impressão ao ler seus livros é sensação de viver aquelas palavras, porque apesar de não termos nascido no século XVlll, as descrições de cenários, costumes, conversas nos faz sentir uma realidade que não é nossa, situações que nem as pessoas de sua própria época falavam, agora lemos, entendemos e ouso dizer, que vivemos juntos com os personagens, graças a sua forma atualizada e real de se expressar.

Assim como seus personagens femininos, Jane Austen quis falar e ser ouvida, apesar de não ter sido reconhecida mundialmente enquanto viva, é uma verdade básica que sua voz continuará ecoando e inspirando leitores e escritores durante muitos anos.

Seus olhos erravam por aqui, por lá, por toda a parte, maravilhados.
Ela viera para ser feliz, e já se sentia feliz.”

Curiosidades:

O livro Orgulho e Preconceito ficou rapidamente famoso quando publicado, atraindo a atenção de muitas pessoas para seus outros livros. Porém, não era considerado honroso para uma mulher escrever, por isso Jane Austen mantinha sua identidade oculta, assinando anonimamente como The Lady e recebendo apoio dos irmãos para continuar suas obras. Após sua morte, a família revelou que Jane era a autora daquelas obras, recebendo o devido reconhecimento.

Apos 200 anos da morte de Jane Austen, o Banco da Inglaterra estampou sua figura em notas de 10 libras como forma de homenageá-la.

Jane Austen recebe o crédito de ter escrito 40 novas palavras em seus livros.

A casa que Jane Austen passou seus últimos anos de vida, localizada na Vila Chawton, no distrito de Hampshire na Inglaterra, foi transformada em uma casa-museu, onde qualquer pessoa pode visitar o lugar onde Jane viveu e escreveu suas obras.

Fonte: https://glo.bo/2qM2N3K
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laranjas mecânicas

Laranja Mecânica: uma experiência sensorial

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Um filme pra ser mais sentido do que propriamente assistido.

Laranja Mecânica (A Clockwork Orange) é uma adaptação cinematográfica feita por Stanley Kubrick do livro de Anthony Burgess.

Na Inglaterra, em um futuro não determinado, Alex DeLarge vive de forma um tanto caótica. Transgredindo regras e convenções sociais por puro prazer, degustando de ultraviolência a Beethoven e criando neologismos misturando o idioma inglês com o russo.

Alex é o violento líder de uma gangue de delinquentes que matam, roubam, estupram, brigam com outras gangues; verdadeiros agentes do caos. Preso, ele recebe o convite para participar de um programa que pode reduzir o seu tempo de pena. Alex torna-se cobaia de experimento chamado Tratamento Ludovico[1].

A combinação dos nomes do protagonista nos mostra quem realmente é o personagem. Alex, etimologicamente, provém do latim “Lex” que significa lei e o “A” é o prefixo referente a afastamento, negação, privação, a sua principal característica psicológica e/ou comportamental, o desrespeito à ordem e consequentemente a disseminação do caos.

O sobrenome DeLarge não é citado no livro, porém afirma-se que Kubrick fez referência a um momento do livro em que Alex chama a si mesmo de “Alexander, The Large”. A forma que nos é apresentado o personagem e a forma como o acompanhamos no decorrer do filme nos faz sentir ódio, repulsa e, às vezes, até pena. Uma divina interpretação de Malcolm McDowell, o ator que dá vida a Alex, também é um dos grandes fatores que nos levam a esses sentimentos.

A cena inicial é, de todas do filme, para mim a mais importante. Uma cena bastante “Kubrick’ana”, ou seja, cada elemento constituído na moldura/quadro é extremamente calculado para criar uma diegese hiper característica de Kubrick. A cena é criada com uma tela toda vermelha e uma música intensa, mostrando-nos previamente o que será o filme: sangue e uma trilha sonora intensamente sensorial.

Segue, então, um close em Alex com uma expressão de significados sentimentais indecifráveis. A moldura/quadro vai ficando mais ampla com o movimento de recuo da câmera e nos apresentando o mundo do personagem, onde suas roupas brancas têm pequenos adereços bizarros em vermelho (metaforicamente representando a pureza do homem social e a possível violência a ser expressada por seu lado animal), manequins femininos com cabelos e pelos pubianos em destaque são usados como objetos (ou seja, a desvalorização da mulher que em cenas ao decorrer do filme é mostrada com estupros), pessoas catatônicas estão sentadas a observar aquele lugar (nós espectadores, que sabemos que todo aquele caos existe e sabemos onde… porém, apenas assistimos).


Stanley Kubrick (26/07/1928 – 07/03/1999), o diretor, tem como característica principal o perfeccionismo em suas filmagens. Enquadramentos geograficamente estudados para constituir uma significação adequada à narrativa de suas obras. Destaco, como minhas preferidas, as obras: Dr. Fantástico (Dr. Strangelove or: How I learned to stop worrying and love the bomb – 1962);  2001: Uma odisséia no espaço ( 2001: A space odyssey – 1968), Laranja Mecânica (A clockwork Orange – 1971); Barry Lyndon (Barry Lyndon 1975); O Iluminado (The Shining – 1975); e De olhos bem fechados (Eyes wide Shut – 1999).

[1] É uma terapia fictícia. Consiste em expor obrigatoriamente o paciente a assistir imagens violentas por grandes períodos de tempo sob efeito das drogas, o que provoca um efeito de experiência de quase morte. Ao ser obrigado a ver imagens horríveis de estupros, assaltos e outros atos de violência enquanto sofre os efeitos das drogas, o paciente assimilará a sensação e tornar-se-á incapacitado a ou sentir-se-á indisposto se tentar realizar ou simplesmente testemunhar tais atos de violência.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

LARANJA MECÂNICA

Diretor: Stanley Kubrick
Roteiro: Stanley Kubrick
Elenco: Malcolm McDowell, Patrick Magee, Adrienne Corri, Aubrey Morris;
Ano: 1971
País: Inglaterra/ EUA
Gênero: Drama

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