As Veias Abertas da América Latina: uma história de exploração

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“As Veias Abertas da América Latina” (1971) de Eduardo Galeano é uma obra literária e histórica que mergulha nas entranhas da história latino-americana, revelando um panorama de exploração, opressão e resistência ao longo de séculos. Publicado em 1971, o livro se tornou um clássico da literatura política e social, provocando debates e reflexões profundas sobre o destino da América Latina. O título, “As Veias Abertas da América Latina”, evoca uma imagem poderosa da região como uma vítima sangrando, vítima da exploração sistemática e do saqueio de seus recursos naturais e humanos. Galeano utiliza essa metáfora para transmitir sua crítica contundente aos processos coloniais e neocoloniais que moldaram a América Latina desde os primeiros contatos com os conquistadores europeus até o século XX.·.

O livro se inicia com uma frase que retrata o cerne da teoria da dependência. Ela afirma que a maneira como o trabalho é distribuído internacionalmente implica como alguns países se especializaram em prosperar, enquanto outros se especializaram em enfrentar perdas. Ao longo de nossa história, a região que conhecemos como América Latina tem uma tradição de especialização na experiência de perdas destes tempos remotos. Esta breve declaração oferece uma representação densa e altamente elucidativa da dinâmica da dependência, sendo frequentemente citada para descrever o status histórico desta região.

            Antes de tudo, para melhor entendermos a magnitude da obra que hora nos referimos, é necessário conhecer um pouco sobre a história do autor que tanto problematizou a exploração sobre a América Latina. Eduardo Galeano (1940-2015) foi um renomado escritor, jornalista e pensador uruguaio, amplamente reconhecido por sua obra literária e sua perspicaz análise social e política. Ele é mais conhecido por suas obras de não-ficção que exploram a história e a cultura da América Latina, frequentemente abordando temas de injustiça social, desigualdade e exploração. Nascido em Montevidéu, Uruguai, em 1940, Galeano cresceu em uma família de classe média e desde jovem demonstrou interesse pelo jornalismo e pela escrita. Envolveu-se com movimentos políticos progressistas na América Latina e, em 1973, durante o golpe militar no Uruguai, foi preso e posteriormente exilado na Argentina e na Espanha. Seu exílio influenciou sua visão crítica da política e da sociedade. Galeano era conhecido por seu estilo de escrita poético e lírico, que misturava história, mito e análise crítica. Galeano era um defensor dos direitos humanos, da justiça social e da igualdade. Seus escritos frequentemente destacavam as lutas dos oprimidos e marginalizados na América Latina. Eduardo Galeano faleceu em abril de 2015, mas sua voz e suas palavras continuam a ressoar como um lembrete constante das questões sociais e políticas enfrentadas pela América Latina e pelo mundo como um todo.

            Galeano utiliza-se de uma metáfora, comparando a América Latina a uma “vaca leiteira” que tem suas veias abertas para o benefício das potências coloniais europeias. Esta metáfora visualmente impactante dá nome ao livro e estabelece o tom crítico que permeia toda a obra. O autor argumenta que a América Latina tem sido historicamente explorada e espoliada de seus recursos naturais em benefício de nações estrangeiras, resultando em subdesenvolvimento e pobreza persistentes.

Galeano também examina os impactos do capitalismo e da industrialização na região, argumentando que muitas vezes esses processos foram conduzidos de maneira a beneficiar elites locais e estrangeiras, em detrimento das populações mais amplas. Ele aborda temas como a dívida externa, o papel das multinacionais e o papel dos Estados Unidos na América Latina. Um dos aspectos mais marcantes do livro é a paixão e a indignação com que Galeano aborda seu tema. Sua escrita é repleta de imagens vívidas e linguagem poética, o que torna a leitura ao mesmo tempo envolvente e emocional. Ele não apenas apresenta uma análise crítica dos eventos históricos, mas também expressa sua simpatia e solidariedade com os povos latino-americanos que sofreram as consequências desses eventos.

O livro é estruturado em capítulos que abrangem diferentes períodos e temas históricos, permitindo ao autor traçar uma narrativa cronológica das experiências latino-americanas. Galeano aborda as complexidades e nuances da história da região, destacando não apenas a exploração econômica, mas também questões sociais, culturais e políticas que moldaram o destino dos povos latino-americanos. Uma das principais contribuições do livro é sua capacidade de revelar o lado humano da história. Em vez de simplesmente apresentar dados e fatos, Galeano preenche suas páginas com histórias pessoais, anedotas e narrativas individuais que ilustram a impactante realidade da exploração e da resistência na América Latina. Essa abordagem torna a leitura envolvente e emocional, conectando o leitor de maneira profunda com as pessoas comuns que viveram e lutaram nesta região.

 

 

                                                              Fonte: memorial.org.br

Escultura “Mão”, de Oscar Niemeyer, localizada no centro da Praça Cívica do Memorial da América Latina

A estrutura do livro não segue um formato de capítulos tradicionais, mas sim uma narrativa contínua que aborda diversos aspectos da história da região. No entanto, você pode identificar diferentes seções e temas ao longo do livro. Na introdução relata sobre a tese central do livro: a exploração e o saqueio dos recursos da América Latina pelas potências estrangeiras. Também discute sobre a contextualização da situação atual da América Latina no momento da escrita (início do século XX). Em seguida discute sobre a colonização e o saqueio inicial, abordando sobre a exploração dos primeiros contatos com os europeus e descreve sobre as práticas de colonização e exploração de recursos naturais, como metais preciosos e terras. Seguindo, discute sobre o impacto do colonialismo abordando discussão sobre as consequências sociais, econômicas e culturais do domínio colonial, dando ênfase na extração de riquezas em detrimento das populações indígenas e locais.

As lutas pela independência são abordadas através da análise dos movimentos de independência na América Latina e a exploração dos desafios enfrentados pelos líderes independentistas e as lutas contra o domínio estrangeiro. O neocolonialismo e o imperialismo são discutidos pelo exame das relações econômicas desiguais entre a América Latina e as potências estrangeiras, especialmente os Estados Unidos. E discussão sobre a exploração de recursos naturais, como petróleo e minerais. Faz, também, uma análise das ditaduras militares e regimes autoritários na América Latina. A exploração das violações de direitos humanos e a repressão política também estão contidas. Dá destaque para os movimentos de resistência, sindicatos, movimentos sociais e a busca por justiça social. Discute o futuro da América Latina através de considerações sobre as perspectivas e desafios enfrentados pela região no futuro. Concluindo com reflexões sobre a necessidade de mudança e justiça na América Latina.

Ao longo de sua obra, Galeano critica fortemente a influência das potências estrangeiras, principalmente europeias e mais tarde os Estados Unidos, nas políticas e economias latino-americanas. Ele explora como os interesses externos frequentemente sobrepujavam o bem-estar das populações locais, levando a ciclos de exploração, dívida e subdesenvolvimento.

O autor também enfatiza o papel das elites locais na perpetuação desses sistemas opressivos, muitas vezes colaborando com interesses estrangeiros em detrimento das massas empobrecidas. Ele destaca a concentração de terras, a exploração de recursos naturais e a marginalização das comunidades indígenas e afro-americanas como elementos centrais dessa dinâmica. Galeano não se contenta em apenas apontar os problemas; ele também se envolve em análises políticas e sociais profundas, questionando as estruturas de poder e propondo alternativas para a América Latina. Ele expressa uma esperança persistente de que a região possa se libertar da opressão e do subdesenvolvimento, embora reconheça os desafios significativos que enfrenta.

O livro descreve a exploração sistemática e a extração de recursos naturais da América Latina por poderes estrangeiros, em especial, países europeus e os Estados Unidos. O autor argumenta que essa exploração econômica teve consequências devastadoras para a região, incluindo a degradação do meio ambiente, a exploração de mão de obra, a criação de desigualdades econômicas e a perpetuação do subdesenvolvimento.

“As Veias Abertas da América Latina” é uma obra que busca despertar a consciência sobre as injustiças históricas enfrentadas pela América Latina, oferecendo uma crítica contundente ao neocolonialismo, ao imperialismo e às desigualdades econômicas. O livro teve um impacto duradouro e continua a ser uma referência importante para aqueles que buscam entender a história e os desafios da América Latina.

            Galeano representava estes princípios de forma pessoal e também cativou aos seus leitores. Ele irradiava entusiasmo, autenticidade e firmeza em suas palavras. Suas declarações inspiravam as pessoas a se unirem na busca de um futuro caracterizado pela solidariedade e equidade, e a melhor maneira de homenagear sua obra é renovar esse compromisso.

Embora bastante aclamado, a obra “As Veias Abertas da América Latina” também foi alvo de críticas. Alguns argumentam que o livro tende a simplificar demais questões complexas e que não apresenta soluções práticas para os problemas que descreve. Além disso, alguns críticos afirmam que o livro necessita de equilíbrio e não leva em consideração as nuances das políticas e eventos históricos.

Apesar das críticas, “As Veias Abertas da América Latina” se propõe justamente a uma obra provocativa que nos desafia a repensar a história e a realidade da América Latina. Galeano fornece uma crítica emotiva da exploração econômica e política que a região sofreu ao longo dos séculos. Embora o livro tenha sido alvo de críticas, sua influência duradoura na discussão sobre a América Latina é inegável, tornando-o uma leitura valiosa para aqueles interessados na história e na política da região.

Referência:

GALEANO, E. As Veias Abertas da América Latina. Tradução de Galeano de Freitas. Paz e Terra. Rio de Janeiro, RJ. 1992.

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Caos 2021 aborda Violência Doméstica e Familiar na COVID-19: Realidade no Município de Palmas

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Para esta edição do CAOS (Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia), baseado no tema “Psicologia e Atuação Psicossocial em Situação de Emergência”, será ofertado o minicurso intitulado como “Isolamento, distanciamento e impactos psicossociais – Violência Doméstica e Familiar na COVID-19: Realidade no Município de Palmas”.

Contextualizado sob os altos índices de violência durante a pandemia da COVID-19 que está em vigência no Brasil desde meados do mês de março de 2020, o minicurso será apresentado pela psicóloga Fernanda Barreira Brito (CRP: 23/970), que atualmente é especialista em Gestão de Saúde Pública, atua como membra atuante da Comissão Especial de Psicologia na Política de Assistência Social, foi eleita em 2021 como vice-presidente do Conselho Regional de Psicologia no Tocantins e é psicóloga do Centro Flor de Lis, onde as mulheres vítimas de violência são acolhidas e recebem orientação jurídica, atendimento psicológico e social.

A convidada abordará como o cenário das violências de gênero do município de Palmas-TO tem se comportado frente à pandemia do COVID-19. Enfatiza-se a importância do tema e o compromisso ético que as profissionais de Psicologia tem com o combate às violências, destaca-se o segundo princípio fundamental do Código de Ética Profissional do Psicólogo “O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Além disso, a psicóloga que ministrará o minicurso irá abordar sobre a prevenção a esse tipo de violência.

O minicurso acontecerá online e remotamente no dia 4 de novembro, a partir das 19h via Google Meet. Ao se inscrever no CAOS 2021, o inscrito poderá participar tanto da programação dos minicursos como dos demais eventos do congresso. Para mais informações acesse o link.

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Combatendo a violência contra a mulher

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Na pandemia, houve o triste aumento de casos de violência contra a mulher. Devemos reforçar que violência é qualquer tipo de agressão, seja ela física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral e deve ser combatida.

Alguns fatores como o aumento do consumo de álcool e drogas, problemas financeiros e com a saúde mental, podem ser gatilhos para revelar indivíduos agressivos ou expor mais o lado violento da pessoa. Temos que levar em consideração que o indivíduo não se tornou violento ou agressor durante a pandemia. A violência é um comportamento aprendido em casa ou na sociedade.

Muitos acreditam que no período pós-pandemia as agressões vão diminuir, caso isso ocorra, a queda não corresponde à realidade. Em lares que ocorrem essas agressões, as relações e os laços familiares já apresentam fragilidades, muitas vezes por conta de históricos de violência verbal e até física.

Fonte: encurtador.com.br/artOR

Para combater é importante dar voz e credibilidade a vítima. Muitas vezes, ela fica desacreditada, pois parte dos agressores são sociáveis, bons amigos e prestativos. Isso faz com que estejam acima de suspeitas, mas em seu lar são opressores, violentos e agressores. Também é importante que vizinhos não se calem ao perceber algo, porque a vítima, em geral, sente vergonha ou medo de buscar ajuda.

Alguns serviços acessíveis são a DEAM (Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher) com atendimento voltado para demanda da violência doméstica, dando o suporte e encaminhando a vítima para a rede de apoio, também às medidas protetivas e aos abrigos sigilosos. Além disso, tem a campanha “sinal vermelho”, que a mulher pode receber auxílio em farmácias imediatamente ao exibir um “X” na mão.

Fonte: encurtador.com.br/gnvI7

No artigo 35 da Lei nº 11.340/06 prevê que a União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite de suas competências, centros de educação e de reabilitação para os agressores; e o artigo 45 estabelece que nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor aos programas de recuperação e reeducação. Para casos urgentes, existem o Disque 180, da Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, e o 190, da Polícia Militar.

Dedico parte do meu tempo divulgando esses serviços em minhas redes sociais, sendo voluntária do Projeto Justiceiras, acolhendo, auxiliando, empoderando e fazendo com que essa vítima perceba que pode estar em situação de violência. Para combater a violência precisamos de uma rede de apoio, com medidas e ações educacionais, sociais e jurídicas. Denuncie qualquer tipo de violência contra a mulher.

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Koi no Katachi: a voz do silêncio

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“Naquela época, se pudéssemos ter ouvido as vozes um do outro, tudo teria sido muito melhor”. (Shouya Ishida)

O bullying nas escolas é um fenômeno bastante antigo e conhecido; para muitos autores são brincadeiras de mau gosto, num cenário em que os alunos são motivados pelo preconceito, por atenção, e pelo poder sobre o mais fraco. Tudo isso são motivos que os “bullys” utilizam para agredir, intimidar e perseguir de modo repetido seus colegas, também utilizam de agressões verbais, físicas e psicológicas para subjugar as vítimas consideradas por eles “diferentes”.

Para Silva e Borges (2018), o bullying envolve ainda atitudes hostis, intimidadoras sem nenhum motivo aparente, na maioria dos casos em relações de desigualdade entre agressores e vítimas, marcada pelo uso da força física, também na maioria dos casos, em que se estabelece uma relação de poder. No Brasil tem sido estudado a partir de 2005, quando os casos de agressões nas escolas se intensificaram de modo mais aparente. Embora os estudos sobre o bullying escolar no Brasil sejam recentes, o fenômeno é antigo e preocupante, sobretudo em função de seus efeitos nocivos (LOPES, 2005; TREVISOL & DRESCH, 2011). Um exemplo desses efeitos desastrosos do bullying nas escolas foi o atentado de 1999 na escola de Columbine nos Estados Unidos, que ganhou grande repercussão mundial, pois dois jovens abriram fogo contra os colegas de escola. Depois de doze anos foi a vez do Brasil em 2011 presenciar o massacre de Realengo, na Escola Municipal Tasso da Silveira, quando um ex-aluno abriu fogo contra os alunos da escola e matou doze deles. Em 2019 outro grande massacre, agora em Suzano, chocou o Brasil, onde dois jovens mataram cinco estudantes e duas funcionárias da escola. O que todos esses fatos têm em comum? Todos esses jovens sofreram bullying nas escolas e isso pode ter sido um dos maiores fatores que os levaram ao ato, além disso todos se suicidaram em seguida.

Fonte: encurtador.com.br/aipMW

Segundo Oliveira e Antonio (2006), nota-se que o bullying se origina a partir de intimidações discriminatórias e prática frequente de violência no cotidiano escolar, versando sobre exclusão social intimidadora, opressora que machuca sem ter sido declarada de fato.

O bullying causa sérias consequências as vítimas e as famílias, como por exemplo: depressão, baixo autoestima, angústia, isolamento, evasão escolar, autodeflagração, muitas apresentam comportamento agressivo, déficit de concentração, prejuízos no processo socioeducativo e nos casos mais extremos o suicídio (SILVA, BORGES, p. 31, 2018).

Observa-se que a maioria das vítimas de bullying pode ter sentimentos de raiva e vingança, podendo atingir pessoas próximas ou estranhas da mesma forma que foram afetadas. Mas nem todos fazem isso, há pessoas que sofrem sozinhos calados, e suas vozes podem nunca ser ouvidas.

Fonte: encurtador.com.br/glm09

Esse tipo de história é retratado no filme Koe no Katachi, do qual Nishimya Shoto é uma garota com deficiência auditiva. Ela se muda ainda no ensino fundamental para uma escola nova; além dela ter que se adaptar ao novo ambiente seus colegas se deparam com algo diferente, pois Shoto não consegue se comunicar com eles a não ser pela linguagem de sinais. A escola passa então a oferecer a disciplina para que os colegas possam interagir melhor com a nova colega, mas alguns alunos se incomodam com ela e começam a tratá-la mal. Dessa forma, a menina passa a ser alvo de bullying e o principal responsável por isso é o aluno Ishida Shoya, ele é típico aluno que gosta de pregar peças nos colegas, mas com a aluna nova é ainda mais cruel, passa a infernizar a vida da menina jogando seus materiais escolares em uma fonte, coloca frases maldosas no quadro da sala e fala mal dela junto com os amigos. Vendo que suas atitudes não afastam a menina do ambiente escolar, ele passa a jogar fora seus equipamentos auditivos.

Percebendo a dificuldade da filha com a escola, a mãe de Shoto vai ao estabelecimento saber o que está acontecendo; o diretor investiga e descobre que Shoya e seus amigos maltratam Shoto por ela ser diferente deles. O rapaz não aceita ser punido sozinho e acaba delatando seus companheiros, depois disso Shoya passa a receber o mesmo tipo de tratamento dado a Shoto, passando pelas mesmas situações que a colega.

Fonte: encurtador.com.br/eqH08

Anos depois os dois se mudam de escola e passam a viver de modo diferente, mas uma coisa que nunca mudou foi que Shoya passou ser um aluno letárgico, não possuía mais amigos, se culpava pelo o que tinha feito com Shoto e tinha sintomas depressivos que lhe levavam a ideação suicida. Já Shoto não guardava rancor do colega, tudo que queria era ser amiga dele e de alguma forma queria ser ouvida. Eles se passam a ser bons amigos, a aprender juntos as formas de curar as feridas passadas e tornam-se responsáveis pelos sentimentos um do outro.

Mesmo o bullying sendo um fenômeno ruim e perigoso para quem sofre, ele pode ser enfrentado de inúmeras maneiras e uma delas é o combate dele pela escola, pela família e sociedade. Muitas crianças sofrem caladas por medo de serem ainda mais punidas e no caso da personagem do anime por não poder falar tudo o que queria. Não legitimar qualquer tipo de violência contra o ser humano é algo a ser valorizado, mesmo se tratando de “brincadeiras” não deixa de ser algo com finalidade maldosa de atingir a pessoa. Dessa forma, não existe motivos que justifiquem a prática do bullying, pois as pessoas merecem ser tratadas com dignidade e suas vozes não devem estar preenchidas pelo silêncio.

REFERÊNCIAS

LOPES, A. A., NETO. Bullying – comportamento agressivo entre estudantesJornal de Pediatria81(5), 164-172. 2005.

SILVA, L. O.; BORGES, B. S. BULLYING NAS ESCOLAS. Direito & Realidade, v.6, n.5, p.27-40/2018.

OLIVEIRA, A. S.; ANTONIO, P. S. Sentimentos do adolescente relacionados ao fenômeno bullying: possibilidades para a assistência da enfermagem nesse contexto. Revista eletrônica de enfermagem, v.08, n.01, p.30-41. 2006.

TREVISOL, M. T., & DRESCH, D. (2011). Escola e bullying: a compreensão dos educadores. Revista Múltiplas Leituras4(2), 41-55.

FICHA TÉCNICA

Título: Koi no Katachi (Original)

Ano produção: 2016

Direção: Naoko Yamada

Gênero: Anime, Drama, Romance

País de Origem: Japão

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O indivíduo oprimido, oprime!

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O desafio é construir um novo indivíduo em uma nova sociedade. ” – Ignácio Martín-Baro

Há anos, pesquisadores de diversas áreas buscam explicações do porquê existirem pessoas ruins. Em meados da década de 70, Philip Zimbardo, professor e psicólogo, realizou o Experimento da Prisão de Stanford, com ele, levantou a ideia de que o papel social determina como o indivíduo irá se comportar. Para isso, um grupo de universitários seriam os guardas, e outro grupo seriam os presos; Zimbardo seria o próprio diretor da prisão.

No decorrer do experimento, os alunos que tinham posição de poder se tornaram autoritários e agressivos com os “presos”, praticando excessos e até se divertindo com a dor alheia. Após apenas seis dias o experimento foi cancelado visto o estado psicológico e físico fragilizado em que se encontravam os participantes. Com isso, Zimbardo declara que forças sociais podem gerar comportamentos ruins, que até pessoas consideradas boas podem se tornar más frente a situações extremas, mesmo que isso signifique ir contra seus valores morais. Temos possibilidades de ser vítima, réu, ou até ambos.

Fonte: encurtador.com.br/afnU9

À vista disso, fica o questionamento: será se há influência de fatores sociais e institucionais que justificam ações/pessoas cruéis? Em paralelo com a situação do Brasil, em 2014 fomos o país sem guerra declarada com mais assassinatos no mundo todo. Tamanha violência deixa de ser sintoma individual e se torna sintoma social, não é mais um caso isolado de roubo na vizinhança, é violência desmedida e por todos os lados, não é só fracasso pessoal, tomou dimensões continentais.

Sob o mesmo ponto de vista, Martim Sampaio, da OAB, relata que “Individualmente, o número de pequenos assaltantes tem aumentado, mas é preciso entender esse fenômeno. Todas as medidas que o governo toma são no sentido de criminalizar o jovem. Se ele quer melhores condições de estudo, o governo chama a polícia e resolve com surra e bomba; se não aceita pagar mais pelo transporte público, não pode protestar que é levado a uma ratoeira e massacrado. Não oferecem alternativa. O que precisamos é de uma política pública inclusiva, de educação e renda. São coisas que falamos há mais de cem anos e não fizemos até hoje.”

Não que o Ser seja passivo ao que acontece a sua volta, não é relegar valores e livre arbítrio, inclusive não é a intenção desse texto reforçar a ideia de que “delinquente é excessivamente vítima da sociedade”. Há uma via de mão dupla: a sociedade constitui o ser e é por ele constituída. Entretanto, estamos sempre, de algum modo, buscando justificativas para culpabilizar um único indivíduo, mas, não é possível ter uma visão holística dele e sua saúde mental sem considerar seu contexto sociocultural.

Fonte: encurtador.com.br/ipwAB

Como relata o psicólogo, filósofo e padre Ignácio Martín-Baro: “Traumas devem ser analisados sob a perspectiva da relação entre indivíduo e sociedade”. De acordo com ele, certos problemas de grupos historicamente oprimidos se expressam de forma compreensível diante de circunstâncias anormais, considerando as idiossincrasias de acordo com o ambiente. Em oposição à psicologia tradicional que tinha seu foco voltado para a abordagem individual e a grupos mais privilegiados economicamente, na metade da década de 1980 surge a Psicologia da Libertação, que enfatiza a alteridade, o conteúdo psicológico sobre influência da sociedade e se compromete em libertar esses grupos menos favorecidos. Essa ideia revolucionou o modo como a psicologia se porta hoje.

Entendendo o que motiva certas pessoas a cometerem atrocidades morais colabora para uma justiça realmente justa. Buscando as raízes do problema e agindo para mudar, o resultado pode demorar, mas as futuras gerações serão gratas. A luta é resgatar a humanidade, mas sem se tornar imparcial. Quem sabe assim o Brasil deixa de ter mais de 70000 homicídios por ano.

 

REFERÊNCIAS

FERNANDES, Nathan. Bandido bom não é bandido morto (2016). Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Revista/noticia/2016/03/bandido-bom-nao-e-bandido-morto.html. Acesso em 17 ago. 2019.

NEVES COSTA, Rita; RODRIGUES, Tiago. Philip Zimbardo: “O heroísmo não existia em nenhum livro de Psicologia” (2018). Disponível em: https://www.jn.pt/nacional/videos/interior/philip-zimbardo-o-heroismo-nao-existia-em-nenhum-livro-de-psicologia-9816275.html. Acesso em 17 ago. 2019.

GISCARDFF. Ignácio Martín-Baro (1942 – 1989) (2014). Disponível em: https://muvucopedia.com/2014/12/23/ignacio-martin-baro-1942-1989/. Acesso em 17 ago. 2019.

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Se a rua Beale falasse: uma ode ao amor e à resistência

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Concorre com 3 indicações ao OSCAR:

Melhor Atriz Coadjuvante (Regina King), Melhor Roteiro Adaptado (Barry Jenins), Melhor Trilha Sonora Original (Nicholas Britell)

Baseado na obra homônima de James Baldwin (1974), com roteiro adaptado por Barry Jenkins (premiado por Moonlight), o filme Se a rua Beale falasse se passa em Harlem, nos anos 70, época de forte opressão étnica por parte da polícia nos Estados Unidos. Entretanto, a sensação que cada cena do filme passa é a de que elas não estão distantes dos dias atuais e não caracterizam a realidade de apenas um lugar no mundo. Assim como o fez em Moonlight, Jenkins trabalha a realidade de forma poética e não apelativa, deixando para o espectador o trabalho de fazer maiores reflexões.

A história é contada por Tish (Kiki Layne), que ao longo do filme vai situando o espectador na jornada vivida por ela e por Fonny (Stephan James), trazendo lembranças da infância e da amizade entre ambos até o momento em que se apaixonam. Os detalhes dessas lembranças ganham um roteiro mais contido, entretanto, nada impede que o público se emocione com o que eles têm a contar. Os closes demorados das câmeras ajudam nisso, enfatizando os olhares e expressões faciais dos personagens.

Fonte: https://bit.ly/2DQKKzg

Há também uma narrativa lenta, com diálogos curtos e calmos, que enaltecem o sentimento puro e inocente vivenciado por Tish e Fonny. Assim, o filme entrega uma história de amor, não daquelas vistas em contos de fadas, mas daquelas que resistem a obstáculos colocados pela sociedade, incrustrados de preconceito e intolerância­. Essa história se passa em um cenário que tem como pano de fundo o preconceito étnico, trazendo à tona a cumplicidade, coragem e força de dois jovens negros que têm um sentimento recíproco entre si.

A narrativa de Tish nos apresenta a rotina dela e de Fonny, na qual tem de lidar com julgamentos pela cor da pele. Em um desses julgamentos, Fonny acaba sendo preso por um crime que não cometeu, tendo como base a palavra de um policial – branco – que representa toda a intolerância e racismo agindo como opressão na vida de quem não fez nada mais do que nascer negro.

Fonte: https://bit.ly/2DMhvxQ

Isso tudo parece muito clichê. Porém, clichês existem por uma razão. Essa mesma história pode ser vista em vários outros filmes e, como a arte imita a vida, sabemos que fatos assim são comuns na sociedade, como, por exemplo, um homem negro ser morto pelo segurança de um hipermercado, tendo como aparente justificativa o racismo deste.

Agora, além do sentimento mútuo de amor, o casal vivencia também a dor da prisão injusta. Ao descobrirem que Tish está grávida, passa a existir uma ambivalência de sentimentos: a alegria pela nova vida e a angústia por tentarem tirar Fonny da prisão antes do nascimento dessa nova vida.

Jenkins opta por focar as atenções nas repercussões que a acusação e prisão de Fonny tem em Tish e familiares, não perdendo tempo com as questões jurídicas. O drama pessoal e a injustiça social se apresentam como efeitos colaterais traumáticos, levando Tish e seus familiares a formarem um sistema coeso em função da gravidez e da tentativa de tirar Fonny da prisão.

Fonte: https://bit.ly/2BFJi2C

Um ponto interessante é que o filme não aborda o racismo de forma escancarada e utilizando-se de apelo. Não há a necessidade de brigas e violência, apenas cenas cotidianas, corriqueiras e fatuais que são complementadas pela narração de Tish e dos diálogos envolventes.

Focar a atenção no drama pessoal e injustiça social, tal como trazer isso de forma natural, foram escolhas acertadas de Jenkins. Não é pertinente, nesse contexto, entender a atuação jurídica na história. O principal objetivo do filme é mostrar o quão arcaica a sociedade de modo geral está, onde ainda é necessário haver conscientização sobre questões que nem deveriam precisar disso, nesse caso, questões étnicas.

Fonte: https://bit.ly/2BDRzUU

A poesia desse romance acompanhada por sua crítica social leva o espectador a se envolver com os personagens e a refletir sobre questões pertinentes nos dias atuais. Se a rua Beale falasse, com certeza estaria pedindo clemência e, principalmente, evolução nos modos de conviver em sociedade e das pessoas enxergarem o mundo e a si mesmas.

FICHA TÉCNICA:


SE A RUA BEALE FALASSE

Título original: If Beale Street Could Talk
Direção: Barry Jenkins
Elenco: Kiki Layne, Stephan James, Regina King;
Ano: 2018
País: EUA
Gênero: Drama

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Psicologia Social: conceitos, história e atualidade

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Conceito de Psicologia Social

A Psicologia Social pode ser entendida como o estudo das relações humanas a partir de um viés individual até uma perspectiva mais ampla, ou social, sendo que este ramo enfoca mais o indivíduo. Como escreve Sousa (2011), trata-se de uma ponte entre a Psicologia e a Sociologia, agregando valores dessas duas áreas científicas. Assim sendo, este ramo considera o indivíduo como influenciado pelo meio que o forma e também o sujeito como elemento que altera o ambiente em que vive.

A necessidade da atuação desse ramo está no fato de que as relações sociais influenciam a conduta e os estados mentais dos indivíduos. Por outro lado, a consciência coletiva de uma sociedade é um campo fértil para estudos, como assinala Regader (2015). Portanto, Cherry (2016) ressalta que a Psicologia Social não observa apenas as influências do meio, mas também estuda as percepções desse meio, tratando-o como uma entidade, visando compreender o comportamento social; e analisa as interações que compreendem a sociedade.

Cherry (2016) escreve que é comum o fato de que a Psicologia Social seja confundida com a sabedoria popular, Psicologia da personalidade e a Sociologia, e expõe as diferenças entre elas. Enquanto a sabedoria popular, que também pode ser chamada de senso comum, é baseada em observações anedóticas e interpretações subjetivas, a Psicologia Social emprega métodos científicos e estudos empíricos sobre os fenômenos sociais. Os pesquisadores não apenas fazem suposições sobre como as pessoas se comportam, eles planejam e fazem experimentos que permitem destacar a relação entre diferentes variáveis.

Ao contrário da Psicologia da personalidade, que estuda os traços individuais, características e pensamentos, a Psicologia Social estuda situações cotidianas, estando interessada sobre o impacto dos ambientes sociais e interações sobre atitudes e comportamentos.

Fonte: encurtador.com.br/cDVW0

Em relação à Sociologia, que se interessa pelo impacto de instituições e cultura sobre o comportamento dos indivíduos, a Psicologia Social considera variáveis situacionais que afetam o comportamento social. Portanto, percebe-se que estas duas áreas têm tópicos similares, mas analisam essas questões a partir de perspectivas diferentes.

Há quem veja psicologia social em todos as áreas dos estudos do comportamento humano. Sobre isso, a psicóloga Lauriane dos Santos ressalta: “é possível dizer que qualquer psicologia que se preocupe com a influência social sobre indivíduos e grupos é também Psicologia Social. Do mesmo modo, perceber que o social, muitas vezes colocado como um conceito quase abstrato, é constituído por pessoas que podem modificá-lo a partir dos seus interesses”.

Lane (1984, p. 19) apud Jacques et al (2013, p. 16) escreve:

Toda a psicologia é social. Esta afirmação não significa reduzir as áreas específicas da Psicologia à Psicologia Social, mas sim cada uma assumir dentro de sua especificidade a natureza histórico-social do ser humano. Desde o desenvolvimento infantil até as patologias e as técnicas de intervenção, características do psicólogo, devem ser analisadas criticamente à luz dessa concepção do ser humano – é a clareza de que não se pode conhecer qualquer comportamento humano, isolando-o ou fragmentando-o, como existisse em si e por si. Também com essa afirmativa não negamos a especificidade da Psicologia Social – ela continua tendo por objetivo conhecer o indivíduo no conjunto de suas relações sociais, tanto naquilo que lhe é específico como naquilo em que ele é manifestação grupal e social. Porém, agora a Psicologia Social poderá responder à questão de como o homem é sujeito da história e transformador de sua própria vida e da sua sociedade, assim como qualquer outra área da Psicologia.

História da Psicologia Social

Lane (1981) escreve que o início da Psicologia Social remonta ao século XIX, sendo o filósofo francês Augusto Conte considerado o pai desta ciência. Para Conte, a Psicologia Social seria subproduto da Sociologia e da Moral, sendo encarregada em dizer como o indivíduo poderia ser, ao mesmo tempo, causa e consequência da sociedade. No entanto, só após a Primeira Guerra Mundial, por volta de 1920, é que esse ramo se desenvolveria como estudo científico e sistemático. Num mundo abalado por crises e conflitos, os pesquisadores encontraram um campo a ser amplamente estudado, visando descobrir uma maneira de preservar os valores de liberdade e os direitos humanos numa sociedade tensa e arregimentada.

Os cientistas buscavam entender diversos fenômenos sociais como a liderança, preconceito, propaganda, conflitos de valores e como os indivíduos se comportavam frente a estes. Nos EUA, essas pesquisas tinham o intuito de procurar formas de melhorar a vida do homem no contexto social, utilizando para isso os dados e conceitos de anos de pesquisas na psicologia. A sociedade era o grande objeto de estudo nessa época, suas motivações, atitudes frente á determinadas situações, padrões de comportamento, enfim, tudo que demonstrasse a dicotomia existente entre o ser e a sociedade. Por mais que um não exista sem o outro, são dois fenômenos diferentes.

Houve um clima de otimismo sobre o resultado das pesquisas da Psicologia Social durante algumas décadas, mas frente a resultados de pesquisa contraditórios e à crise mundial, que á cada dia se agravava mais, esta ciência entrou em declínio e passou por um momento chamado de “crise da psicologia social” (LANE, 1981). Esta crise se deu principalmente pela falta de conhecimento prático das pesquisas, muitos resultados que se contradiziam e nenhuma solução concreta para os problemas enfrentados pelos países.

Fonte: encurtador.com.br/byOPS

Críticas foram feitas aos psicólogos norte-americanos devido ao caráter ideológico dos seus trabalhos que eram reproduzidos em países da América Latina sem levar em conta as características próprias desses países. Conhecimentos dos Estados Unidos eram reproduzidos noutros lugares, usavam técnicas e conceitos que não se aplicavam plenamente aos locais em questão. Como escreveu a psicóloga entrevistada neste presente trabalho, a psicologia tradicional era descontextualizada e limitada. Obviamente os resultados seriam duvidosos e inúteis.

Foi então que pesquisadores latinos prepararam um simpósio para trazer as principais dificuldades enfrentadas nas investigações e possíveis soluções para os problemas que caiam sobre eles. Então, cientistas de países como México, Peru e Brasil perceberam pontos similares em suas visões, que apesar de serem semelhantes, tinham a mesma perspectiva devido todos terem as mesmas condições de trabalho. Desde o simpósio entre países latino-americanos, que os participantes decidiram dar um novo rumo para as pesquisas, onde o foco de cada uma seria a necessidade do país onde seria realizada e não mais o indivíduo, ou seja, agora as buscas focariam nas reais necessidades de cada país, independente da dinâmica econômica e geopolítica, sem influência de contextos próprios de outras nacionalidades.

Jacques et al (2013, p. 39) discorre sobre os resultados desta crise:

[…] originam-se múltiplos efeitos, sendo possível detectar, no contexto da psicologia social atual, pluralizações diversas que apontam para um quadro de fragmentação antes do que para a unidade. Novos espaços se constituem pelas conjunções e disjunções realizadas. Implicações antigas são questionadas e descentramentos são propostos. Tornam-se vigorosos os discursos da interdisciplinaridade e das conjunções, bem como o da ecologia social e cognitiva que lhe é consequente, revelando um contexto propício à análise cujos componentes se amalgamam, não se comportando como configurações isoladas. Redes de saberes se propõem a interconexões, possibilitando uma infindável trama de possibilidades de conhecer.


Psicologia Social no Brasil

A Psicologia no Brasil recebeu maior influência dos norte-americanos. Era para centro de estudos na América que nossos cientistas e professores iam para aperfeiçoarem seus conhecimentos, além disso, desses centros vinham professores dos Estados Unidos para lecionarem em nossas universidades. Por exemplo, o professor Otto Klineberg, da Universidade de Columbia, introduziu a Psicologia Social na Universidade de São Paulo na década de 50. Lane (1981, p. 80) acrescenta

E, por sinal, o primeiro livro de Psicologia Social publicado no Brasil foi a tradução da obra de Klineberg, em 1959, contendo tópicos como Cultura e Personalidade, Diferenças Individuais e Grupais, Atitudes e Opiniões, Interação Social e Dinâmica de Grupo, Patologia Social e Política Interna e Internacional.

Em 1980, é fundada a Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO) que visava o intercâmbio entre cientistas de diversas regiões para discorrerem sobre problemas comuns. A fundação da ABRAPSO é importante no processo de consolidação desse campo de estudo no Brasil.

Houveram grandes nomes nacionais que representaram a Psicologia Social, eles influenciaram novas gerações de psicólogos e contribuíram com estudos importantes acerca da sociedade brasileira e dos problemas que esta enfrentava. Podemos citar 3 nomes que influenciaram grandemente esse campo, o percussor Eliezer Schneider, Aroldo Rodrigues e Sílvia Lane. Todos trouxeram contribuições que firmaram a Psicologia Social como uma ciência bem embasada no nosso País.

Eliezer Schneider entra para o ramo da psicologia antes mesmo desta ser reconhecida como profissão, exercendo o cargo “Técnico em assuntos educacionais” como um “psicologista”, termo este que era utilizado para o profissionais desta ciência. Trazendo uma visão crítica à Psicologia Experimental, em seus mais de 100 artigos e um livro, Eliezer afirma que existe uma psicologia cultural e histórica que não destoa das demais e pode ser usada para compreender os fenômenos sociais, este seria a primeira manifestação de estudos relacionados à Psicologia Social.

Fonte: encurtador.com.br/bgBHZ

Crítico também da forma que os estudos eram conduzidos nos EUA, ele traz uma visão que se atenta para a problemática humana, tendo como foco os problemas enfrentados pelos brasileiros e se abrindo para visões de outros cientistas que não tinham como objeto principal o indivíduo, como os Americanos, mas sim as influências socioculturais que todos recebem (LIMA, 2009).

Aroldo Rodrigues foi o maior porta-voz da psicologia social norte americana, além de se tornar mestre em psicologia na universidade do Kansas, trouxe consigo a visão e o método dos cientistas de lá para aplica-las nas universidades brasileiras. Ele também foi professor da PUC no Rio de Janeiro e constantemente criticava os métodos utilizados pelos que se encontravam no movimento da “crise da psicologia social, pois a grande maioria eram críticos ferrenhos das pesquisas e estudos vindos dos Estados Unidos.

Aroldo foi reconhecido por suas contribuições e foi convidado para ser presidente Associação Latino-americana de psicologia social, porém á partir das discordâncias entre os novos métodos, houve um rompimento e Silvia Lane funda a Associação Brasileira de Psicologia que tinha uma visão de embate contra as propostas de Aroldo Rodrigues (LIMA, 2009).

A brasileira Sílvia Lane começou sua vida profissional na docência e, segundo relatos de seus alunos, sempre teve a preocupação de procurar diferentes formas de pensar a psicologia, envolvendo eles em aprendizados que serviriam não só para a vida profissional, mas também para a vida pessoal. Instigava-os, trazendo vários jeitos de pesquisar, investigar e atuar com os conhecimentos teóricos, como a introdução do teatro, música, histórias em quadrinhos e outras expressões artísticas.

Por esses e outros motivos, Silvia Foi tida como uma grande referência entre seus alunos. Lane era marxista e fazia crítica á forma que o sistema socioeconômico capitalista moldava as identidades e como isso contribui para as injustiças tão escancaradas em nossa sociedade. Em “O que é psicologia social”, ela traz algumas dessas críticas, sendo a obra uma referência em vários cursos de psicologia no Brasil (SOUSA, 2009).

Psicologia Social: Importância e atuação no contexto brasileiro atual

Cherry (2016) mostra que uma simples conferida nas notícias jornalísticas diárias é suficiente para termos a dimensão de quão profundos são os impactos dos problemas sociais sobre as pessoas. Portanto, um psicólogo social, a fim de entender tais questões, estuda e procura prevenir, identificar e remediar os problemas que não só atingem um indivíduo como também afetam a saúde da sociedade como um todo.

Assim sendo, de acordo com a psicóloga Lauriane dos Santos, a Psicologia Social atua desde a adaptação social, indo de um modelo supostamente ideal de cidadão, até uma psicologia crítica, em prol dos movimentos sociais e da garantia de direito. As atuações se dão conforme as necessidades de um local e os interesses de psicólogos e instituições.

A entrevistada relata que, no Brasil, a profissão alcança desde a clínica, passando pela área organizacional até chegar aos campos vinculados a políticas públicas. Ela citou como exemplos: Centros de Referência da Assistência Social (CRAS); Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS); organizações não governamentais e movimentos sociais diversos.

No entanto, segundo a psicóloga em questão, há desafios que a profissão precisa vencer. Ela explica dizendo o seguinte

Apesar do entendimento da Psicologia Social crítica ser sabido – teoricamente – por boa parte dos psicólogos, a aplicabilidade desse entendimento nem sempre ocorre, uma vez que perpassa criticar muitas “verdades” instituídas, sendo um “nadar contra a maré”. A constituição de 1988 e as políticas públicas desenvolvidas a partir dela, especialmente o SUS e o SUAS, defendem esse modo crítico de atuar. Mas essa tentativa de crítica esbarra com os valores institucionais tradicionais, que ainda tem forte caráter individualista, biologicista, rotulador e culpabilizante.

Fonte: encurtador.com.br/dhCKN

O salário depende do campo de atuação. Ainda de acordo com a psicóloga entrevistada, em Palmas (TO), os profissionais recém-ingressados via concurso público recebem um salário de 3.500,00 reais para atuar 40 horas semanais, isso em termos de atuação nos CRAS E CREAS.

Tão diretamente ligado aos dilemas de populações carentes, os ambientes nos quais um psicólogo social trabalha pode lhe tornar muito desgastante, o que muitas vezes é usado para embasar concepções preconceituosas sobre a área. Zaith (2012) mostra que a atuação do profissional é negativamente afetada quando não há um eficiente trabalho interdisciplinar e troca de experiências. Além disso, é necessário que o psicólogo social, em sua formação, tenha adquirido os pré-requisitos necessários que o tornem capaz na luta pela melhora de realidades.

É necessário que o psicólogo social consiga romper várias barreiras para atingir seu objetivo de contribuir para uma sociedade melhor no Brasil, pois o meio social se encontra cheio de entraves para que se alcance um serviço público igualitário, integral e universal. Uma dessas dificuldades é a visão superficial e errônea de que nos bairros pobres e favelas existe um ambiente caótico, envolto por drogas e violência. Tal visão deixa muitos profissionais desmotivados para atuarem nesses setores, sendo que essas áreas tem tanta necessidade de pesquisa-ação quanto qualquer outra, independente do nível socioeconômico.

O CRAS, como já exemplificado, é um local de notória atuação dos psicólogos sociais, lá são recebidos casos emergenciais dos mais variados tipos e em sua grande maioria, pessoas com baixa ou nenhuma renda. O objetivo central dos profissionais que atuam nessa área é fortalecer seus usuários como sujeitos de direitos, promovendo terapias grupais, acompanhamento junto ás famílias e auxílio em momentos de dificuldade. Lamentavelmente há inúmeras dificuldades nessa honrada atuação, quase todas vindo do desinteresse e omissão do poder público.

Sobre esta política pública e suas dificuldades, Zaith (2012) escreve:

[…] Criado para aliviar as reflexões da pobreza imediata, […] para proteger seus usuários de maiores riscos relacionados à qualidade de vida, uma vez que já se encontram em situação de vulnerabilidade, passa a ser considerado o espaço o qual torna o trabalho do psicólogo social comunitário acessível ao seu objeto de estudo: a comunidade. Por isso suscita que estudos sejam realizados sobre as práticas envolvidas nessas unidades. O trabalho no CRAS é constituído por serviços burocráticos, visitas domiciliares, atendimentos descontínuos, dificuldade em obter recursos e verbas e intervenções em locais inusitados que convocam os psicólogos para fora do setting tradicional. Dessa forma, o foco se baseia em práticas grupais e a intervenção grupal se torna necessária para o desenvolvimento da consciência, no qual o componente do grupo se descobre no outro.

Portanto, ante os dados supracitados, percebe-se a importância da Psicologia Social não somente como produtora de conhecimentos a respeito dos indivíduos e suas interações, como também atuante determinante na própria sociedade, devendo tratar-se de uma atuação que ajude pessoas e diminua o impacto das desigualdades ou, quem sabe, reduza as próprias desigualdades sociais.

REFERÊNCIAS:

CHERRY, Kendra. Basics of Social Psychology. Verywell. Disponível em: <http://www.verywell.com/>. Acesso em 21 abril 2017.

JACQUES, Maria da Graça Corrêa et al. Psicologia Social Contemporânea: Livro-texto. Edição digital. Petrópolis: Vozes, 2013. 226 p.

LANE, Silvia T. Maurer. O que é Psicologia Social. 1 ed. São Paulo: Brasiliense, 1981,

88 p.

LIMA, Renato Sampaio. História da Psicologia Social no Rio de Janeiro: Dois grandes personagens. Fractal: Revista de Psicologia. Rio de Janeiro, v. 21, n. 2, mai/ago 2009. Disponível em: <http://www.scielo.com.br/>. Acesso em 26 maio 2017.

REGADER, Bertrand. ¿Qué es la Psicología Social? Psicología y Mente. Disponível em: <http://psicologíaymente.net>. Acesso em 21 abril 2017.

SOUSA, Esther Alves de. Silvia Lane: Uma contribuição aos estudos sobre a Psicologia Social no Brasil. Temas em Psicologia. Ribeirão Preto, v. 17, n. 1, 2009. Disponível em: <http://www.pepsic.bvsalud.org/>. Acesso em 26 maio 2017. 

SOUSA, Felipe de. O que é Psicologia Social? Psicologia MSN. Disponível em: <http://www.psicologiamsn.com/>. Acesso em 21 abril 2017.

ZAITH, Michele Cristina. Os Principais Desafios Enfrentados Pelos Psicólogos no CRAS. Disponível em: <http://www.psicologia.pt/>. Acesso em 02 junho 2017.

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CAOS: Tocantins é o 4º estado que mais fiscaliza e bane trabalho escravo

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No dia 21 de agosto de 2017, ocorreu na sala 219 do Ceulp/Ulbra, o mini curso Violência e Sofrimento Psíquico no Trabalho, ministrado pela Psicóloga Profa. Dra. Liliam Deisy Ghizoni, doutora em Psicologia Social do Trabalho e das Organizações na UnB com Estágio Sanduíche na Université Catholique de Louvain la Neuve–Bélgica, professora da Universidade Federal do Tocantins.

Ghizoni enfatizou o trabalho escravo contemporâneo, que ocorre tanto no meio rural quanto no meio urbano. Segundo ela, a escravidão ainda é vista pelo viés histórico pela maioria das pessoas, que imaginam negros em senzalas, acorrentados e chicoteados. Mas a escravidão contemporânea existe, e ocorre onde menos se imagina, quando há excesso de trabalho e condições insalubres para tal, sendo o próprio trabalhador quem se deixa escravizar, principalmente por questões financeiras.

Imagem: Nirsan Grillo em “Escravidão Contemporânea no Brasil”.

Liliam diz que o Tocantins é o 4º estado que mais fiscaliza e bane trabalhos análogos à escravidão. Cita ainda uma pesquisa feita por uma de suas alunas, que entrevistou alguns trabalhadores, dentre eles um bancário, que durante a jornada de trabalho não levantava para ir ao banheiro e nem para beber água, mas quando questionado sobre a sua posição, ele afirma não se ver enquadrado na categoria de trabalho escravo contemporâneo.

Sobre violência no trabalho, a professora diz que é toda ação voluntária de um sujeito ou grupo contra outro sujeito ou grupo que venha a causar danos físicos ou psicológicos, ocorrida no ambiente de trabalho e comenta que a meta é uma violência infligida ao trabalhador, pois é inatingível.

Há duas dimensões básicas da violência, sendo a explícita, que é direta e objetiva e a oculta, que é implícita, indireta e subjetiva. A finalidade da violência é conservar as estruturas de injustiça, de opressão e de privilégios de uma minoria em detrimento das esperanças de vida digna de uma maioria.

Segundo Liliam, “o silenciamento faz com que a violência se reproduza”, diante disto é necessário que o trabalhador conheça seus direitos, reivindicando-os sempre que necessário, pois a violência no trabalho leva ao sofrimento psíquico no trabalho, que por consequência leva aos diversos tipos de adoecimento.

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Servidão Voluntária nas relações de trabalho

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Durante a primeira Semana Acadêmica de Psicologia do Ceulp/Ulbra, no dia 22 de agosto, ocorreu a palestra de abertura do evento com a Dra. Ana Magnólia Mendes, tendo como tema “Discurso e Sujeito na Psicanálise: dimensões éticas e políticas”. A palestrante apresentou o tema de acordo com o contexto atual do trabalho. Ressaltava com veemência o papel dos psicólogos no mercado agressivo de hoje.

 De acordo com Ana Magnólia, o sofrimento humano faz parte da angústia na sociedade. A psicanálise estuda o sujeito de modo distinto da ciência, pois não o reduz ao capitalismo, segundo o qual o indivíduo será ”feliz” se consumir, pois produz o subordinado do desejo. Quanto mais se tem, mais se quer. A qualidade do psicólogo deve ser acima da questão do lucro e do dinheiro. Isso envolve investimento no paciente e tempo. Caso o profissional vise o lucro, a tendência é custar mais barato e menos tempo nas consultas, o que compromete a qualidade da análise clínica.

A oradora apresentou ao público a noção do sujeito da repetição, aquele que repete de modo incessante determinado processo isento de senso crítico. Desse modo, neste discurso ele vai trazer a construção de laços sociais que se estabelecem na perversão, que é a quebra dos seus direitos básicos. Para ser considerado como um, é preciso ser surdo e atender a um comando de uma voz, que apenas a repete e obedece.

A função do psicólogo é resgatar o dependente compulsivo da repetição para o conhecimento. O capitalismo contrapõe o sujeito do saber a um repetitivo e com isso ela retratou suas características. Ele não é reduzível, pois não se submete a processos contínuos; ele é infinito, pois busca o conhecimento. O sujeito repetitivo busca o conhecimento para se resgatar. As pessoas que se automedicam causam aprisionamento do sujeito da compulsão da repetição. Ele é fisgado a partir da produção do outro, no discurso das promessas (paraíso), pois é o lugar da plenitude.

Percebe-se que a palestrante continuamente relaciona seu tema com o capitalismo, pois está intrinsecamente ligado a ele. Esse sistema de mercado contemporâneo destrói a identidade do indivíduo e o submete a desumanização, e dessa maneira causa a indiferença com os demais. Ana Magnolia também expôs o conceito de normopatia, fenômeno no qual acarreta a aniquilação da humanização e laços sociais devido à banalização da violência e da opressão.

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Fonte: http://www.rioeduca.net/blogViews.php?bid=20&id=3124

Outras duas definições diferentes que ela apontou foram sujeito invocante e invocado. No primeiro, refere-se diretamente ao repetitivo, submetido intensamente a demanda do outro e que precisa se descobrir como ser falante e pensante. No segundo, supõe-se uma alteridade, isto é, algo próprio e crítico àquilo que o rodeia. O contraste entre os dois conceitos vigora na globalização, pois a maior parte da população global está como invocada e uma mínima parcela como invocante.

Logo, ocorre a servidão voluntária, onde o submisso é condicionado a aceitar e conviver em situações degradantes para poder manter sua sobrevivência. O psicólogo, nessas condições, deve realizar uma escuta clínica a fim de o sujeito sair da repetição. Além disso, priorizar a ética profissional deve ser o ideal do psicólogo, pois a qualidade do serviço não está ligada na quantidade de pacientes atendidos em um dia. Desse modo, deve analisar os casos e então realizar a demanda necessária separadamente, mesmo que isso custe mais tempo do que o esperado e investimento.

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