Ao fazer estágio no (En)Cena, tive que escolher um tema dentre 9 conteúdos; preferi a temática “Psicanálise e Política”. Um dos motivos, ao optar por esse tema no estágio, foi porque tive bastante interesse em relação à psicanálise. Assim, conheci o Redemunho. Trata-se de um coletivo suprapartidário, tem como intuito a invenção e promoção de estratégias políticas democráticas, não autoritárias e que consideram como aliados os afetos e os desejos. Muitas vezes, utiliza como ferramenta a psicanálise como forma de compreender a extrema direita e os fenômenos de massa, seu modo discursivo e de exercício de poder.
Durante os dois meses que estou no estágio, tive vários encontros online com o grupo, e compreendi a imensa importância para mim e para minha futura formação profissional. Destaque para as discussões que ocorrem entre os membros do grupo para a construção de caminhos e estratégias com intuito de suportar as consequências dos resultados das últimas eleições em nossa saúde mental, como resistir e atuar politicamente, principalmente neste novo contexto político com características fascistas no Brasil.
Durante o estágio, percebi a grandeza de Paulo Freire para a minha formação acadêmica. Entrei em contato com a literatura desse gigante da educação por meio das obras, dos artigos, dos vídeos referentes a este autor, das discussões que ocorre no grupo. Assim, a literatura de Paulo Freire me ajuda compreender a importância de escuta da fala do outro; compreendê-lo como sujeito de discurso para que eu tenha como objetivo aprender mais sobre o ambiente em que aquele indivíduo está inserido; suas vivências, seus conhecimentos, seus receios, medos, como ouvinte aprendo ter a tolerância, entrar em contato com a diversidade para eu ter uma escuta de qualidade.
Assim, lembrei de algumas falas de Riobaldo, personagem protagonista da obra Grande Sertão Veredas. Ele narra sua vida para um “doutor” (ouvinte), como “Viver é muito perigoso”, “Sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o lugar”, “O sertão está dentro da gente”, “Mestre é aquele que de repente aprende”. Para Riobaldo, dialogar requer, necessariamente, que haja uma escuta. Em que o “Doutor”, ou “Letrado” se coloque numa posição de abertura, de forma horizontal.
Desta forma, compreendo que ao ler os textos ricos de Paulo Freire vou entrar nesse sertão imenso dentro de mim, ao estar inserida em um cenário trágico em que vivo no meu país, pois viver nunca foi tão perigoso… onde entendo que no contexto cotidiano a maldade de certos governantes expõe sentimentos de raiva, impotência e indignação. Assim, infelizmente, no momento o Brasil está convivendo com um governo de extrema direita, uma vez que está bem nítido o descaso com a vida por meio de frases e expressões insensíveis como “Eu não sou coveiro”, “E daí?”; e ao menosprezar temas sérios, como a vacinação, com frases como “Toma vacina vira Jacaré”.
Ao mesmo tempo tenho enfrentado os meus medos, minhas angústias em relação à pandemia que mudou meu contexto de forma mais rápida, assim, comparo-me ao Jagunço Riobaldo. Este necessita enfrentar a brutalidade, os baques, os medos, os desamparos para a travessia do sertão. Dessa forma, eu preciso perpassar pela travessia no estágio do (En)Cena com todos esses enfrentamentos supracitados para seguir o curso da minha vida, sair da minha zona de conforto para questionar a minha existência para uma dimensão política.
Assim como Riobaldo, em suas andanças, em algumas situações caminha solitário e segue ao encontro de descobrir-se para alcançar à completude, à autonomia, sigo meu caminho. Como diz Freire: “A liberdade, que é uma conquista, e não uma doação, exige uma permanente busca. Busca permanente que só existe no ato responsável de quem a faz”. Diante disso, concluo que preciso ir ao encontro da minha autonomia, seja na dimensão psicológica ou política; preciso adentrar no sertão que há dentro de mim.
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Um olhar sobre “Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa
A obra de Paulo Freire, “Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à prática Educativa”, pontua a necessidade da relação Teoria/Prática, uma vez que a teoria pode se tornar somente ideias, sendo necessário garantir a prática, sob a forma de ativismo consciente. Então, a obra assinala que ensinar não é só transmitir conhecimento, mas sim a construção de saberes. Para Paulo Freire, compreende-se que homens e mulheres são seres históricos em processo de mudança. Diante disso, entende-se que ensinar e aprender, são dois verbos que estão interligados; no decorrer da história, os seres humanos aprenderam socialmente e historicamente, logo descobriram que era possível ensinar.
Paulo Freire – Fonte: https://nova-escola-producao.s3.amazonaws.com/D2eaCsMJ5tvhRzRCBMCv2rmRNSutraW4aE32gcqF8PZScppWQbyUBEgvyKeC/paulo-freire.png
Freire argumenta que o educador vivencia de modo autêntico a prática do aprendizado, de tal modo que esse docente insere em um contexto político o conhecimento pedagógico; à medida que mais exercita de forma crítica a capacidade de aprender, mais se aproxima da curiosidade epistemológica. Então, o professor não só faz a transferência de conteúdo, mas sim da leitura verdadeira com intuito de transformar o indivíduo em sujeito, para conhecer o seu contexto e de intervir no mundo.
Assim, a obra Pedagogia da Autonomia pontua por meio da construção da articulação entre conhecimento e ação que é necessário que os educadores respeitem o conhecimento do senso comum do educando. Então, o educador vai ao encontro da construção dos saberes referente às classes populares, como nas práticas comunitárias. Diante desse fato, o educador respeita as vivências dos alunos nos seus contextos para discutirem certas injustiças; o professor dialoga com o aluno em relação à realidade concreta, e interliga saberes curriculares com experiência social.
Compreende-se a importância das experiências cotidianas seja nas ruas, nas praças, nas salas de aula, nos pátios na hora do intervalo, em diversas condutas dos alunos, dos trabalhadores da escola, dos professores para a formação do sujeito sócio-histórico. Entende-se que a prática educativa necessita do reconhecimento dos sentimentos, das emoções, do desejo para a transformação do indivíduo em um ser autônomo.
De acordo com Freire, a curiosidade é uma inquietação discursiva; uma vez que essa conduta potencializa a criatividade para que o sujeito intervenha no mundo de maneira dialógica e dialética. Em outras palavras, o sujeito por meio da reflexão sobre a prática, de modo curioso tem como consequência uma transformação de pensamentos e atitudes e, consequentemente, ele é empoderado.
Freire pontua a importância da luta do professor por seus direitos e dignidade; isso deve ser um momento crucial e não transformar a prática docente em um bico. O comportamento do educador necessita ser dialógica, curiosa, questionadora de modo que tira o indivíduo da situação passiva e coloca em uma posição de agente que indaga, que atua no mundo. A prática da curiosidade, isto é, a instigar o aluno a ser um pesquisador vai em busca da imaginação, das emoções, da intuição, da capacidade de interligar, de fazer analogias.
Diante disso, autoridade e a liberdade se afirmam. Acredita-se que as características principais da autoridade dos docentes democráticos deve mostrar em suas atitudes que tenham liberdade e auto segurança. É a segurança que se expressa na firmeza com que o docente atua, com que respeita a liberdade, com que discute as suas próprias posições que aceita rever-se, é necessário que tenha competência profissional, isso não quer dizer que a prática democrática do professor, seja determinada somente pela sua competência científica.
Paulo Freire explica que a autonomia é originada na responsabilidade de assumir as escolhas. Assim que os indivíduos fazem as suas escolhas, a autonomia vai sendo construída por diversas decisões que vão sendo tomadas. Outro ponto importante nessa obra freiriana, é a importância do Saber Escutar de forma democrática e solidária, conversando com o outro de forma horizontal, o docente que escuta aprende o árduo trabalho de transformar o seu discurso.
Diante disso, a obra pontua a escuta de modo correto, de tal modo que, o sujeito tenha abertura para a fala do próximo sem preconceitos, em relação aos gestos do outro, as diferenças do outro. Isso não quer dizer em se anular em relação à fala do outro. A verdadeira escuta não tira o empoderamento do sujeito em relação a discordar, a se opor, a se posicionar. É o contrário.
Por fim, o docente democrático tem competência que testemunha a favor da vida, esperança num mundo melhor, que enfrenta os desafios do cotidiano, seu respeito as diversidades, saber cada vez mais o valor que tem a transformação da realidade, a forma que tem suas vivências no mundo.
REFERÊNCIA: FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessário à prática educativa 25° edição. São Paulo: Editora Paz e Terra (Coleção Leitura) 1996.
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A escuta sensível na interface Psicanálise-Paulo Freire
A Psicanálise faz uso do discurso que coloca o outro da relação na posição de sujeito e o psicanalista consegue recuar da sua posição de saber e poder para escutar o outro na sua verdade. Conteúdo este, que vem de encontro com a pedagogia de Paulo Freire com essa posição discursiva, de escutar o outro em sua verdade e, assim, produzir a aprendizagem e a comunicação política. Entra-se então a importância política da escuta, em tempos de cultura do ódio e do cancelamento.
Paulo Freire usou a escuta como uma grande ferramenta em sua teoria, essa escuta freiriana na prática pode mudar relações. O autor em sua obra Pedagogia da Autonomia (2009), aborda sobre a importância de respeitar o conhecimento que o discente leva para a escola. Isso implica na troca que pode ocorrer entre professor e aluno.
Outro ponto importante a se retirar importância de lidar com o outro, é praticar essa escuta sem objetificação. A escuta política surge como uma arma potente para aqueles que querem utilizá-la. “Tem significação precisamente porque os sujeitos dialógicos não apenas conservam sua identidade, mas a defendem e assim crescem um com o outro” (FREIRE, 2009, p. 118).
Fonte: encurtador.com.br/htFN0
Freud em sua essência traz essa preocupação com a escuta qualificada, abordando sobre o valor dado ao autoconhecimento e consequentemente a liberdade pessoal, a partir essa escuta trabalhada, isto foi considerado como um diferencial entre a psicanálise e as demais abordagens.
A importância dessa escuta para Freud é evidenciada a partir do momento em que você começa a ler os seus textos. Para além, pode observar uma crítica ao analista:
É possível pretender que fórmulas simples permitam compreender o processo analítico? Não, analisar é hipercomplexo: escutar com atenção flutuante, representar, fantasiar, experimentar afetos, identificar-se, recordar, auto-analisar-se, conter, assinalar, interpretar e construir (2003, p. 105).
Fonte: encurtador.com.br/cFJWY
Observa-se a preocupação entre os dois autores em relação a escuta, uma vez que esta prática está interligada a compreensão de realidades concretas, do seu contexto histórico, para além disso, observa a sua inserção no mundo a partir dessa escuta.
A escuta produz a conscientização libertadora e transformadora. Conscientização esta que traz um caminho para reinvenção de novos seres, cada um com a sua subjetividade, buscando a necessidade de coerência para ação e reflexão do ser existencial.
REFERÊNCIA
HORNSTEIN, L. Intersuibjetividad Y clínica. Buenos Aires: Paidós, 2003.
SOUZA, Anna Inês. Paulo Freire: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2001.
FREIRE, Paulo. Pedagogia Autonomia: Saberes Necessários à prática da educativa. Editora Paz Terra, Rio de Janeiro. 2009. Disponível: https://nepegeo.paginas.ufsc.br/files/2018/11/Pedagogia-da-Autonomia-Paulo-Freire.pdf
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A gestão democrática na escola como garantia de preservação subjetiva
A gestão democrática escolar deve ser realizada para que os alunos vistos como agentes sociais sofram mudanças e transformações através de atuações que englobem a comunidade local e também a comunidade escolar, e que tenham o objetivo de construir uma sociedade baseada no respeito e no aperfeiçoamento da qualidade de vida (LÜCK, 2007). Morais e Felgar (2013, p. 10) apontam que: “um dos maiores desafios do gestor é conhecer os valores, as crenças, a cultura que norteiam as ações daqueles que fazem parte da instituição escolar, reconhecendo as medidas necessárias para que estes não se distanciem dos princípios, diretrizes e objetivos da educação”.
O gestor deve estar sempre atento e em estado de alerta para que ao mesmo tempo que ele tenha que ser flexível e passivo, ele também seja ativo e técnico, o que exige desse profissional uma enorme capacidade de mediar às questões de uma forma onde as demandas possam ser resolvidas da melhor maneira possível, entretanto para que isso ocorra, o gestor deverá considerar todo o contexto da situação e das pessoas envolvidas, levando em consideração aspectos individuais e subjetivos, porém agrupando as questões levantadas à teoria e às normas que sua profissão exige.
Para que a gestão democrática continue sendo implantada ou seja ainda mais implantada e utilizada, é necessário que o gestor esteja comprometido em construir e implantar esse modelo de gestão, o que exige um grande esforço. E segundo Castiglioni (2007), existem três grandes desafios para a gestão democrática, sendo: a profissionalização e modernização da gestão escolar, o que carrega também outros aspectos como “a formação dos gestores, inovação tecnológica e a cultura do planejamento, monitoramento e a avaliação presentes na gestão da escola“ (CASTIGLIONI, 2007 p. 15 ).
Quando o gestor não está atento ao que está acontecendo, ele pode recair em algo denominado como educação bancária, que corresponde a uma espécie de crítica que Paulo Freire realizou direcionada à burocratização da escola e também da gestão escolar, que conta com a racionalidade sendo feita de forma instrumentalizada, o que automaticamente retira a participação dos atores educativos dentro da tomada de decisões da gestão escolar, que é algo que acaba criando e mantendo um comportamento de alienação e repressão (ALCANTARA et al, 2018).
No que corresponde a gestão da escola, Castiglioni (2007 apud MORAES; FELGAR, 2013):
“a) formação dos gestores – observa-se uma formação inicial precária, onde não se tem um foco na função diretiva; quanto à formação continuada pode ser considerada pouco significativa ora por ser muito teórica ora por ser muito técnica;
b) inovação tecnológica – vai muito além de equipamentos tecnológicos, pois engloba, também, serviços, ideias e formas de realização e manutenção da instituição, como maneira de garantir a qualidade do processo educacional;
c) planejamento, monitoramento e a avaliação – muitas escolas ainda realizam seus planejamentos somente com objetivos de cumprir normas legais; não realizam o acompanhamento dos indicadores e resultados e a avaliação ainda está sendo utilizada como forma de pontuação. (ibidem)” (CASTIGLIONI, 2007 apud MORAES; FELGAR, 2013).
No que corresponde à democratização da escola, a gestão escolar na atualidade enfrenta alguns desafios sobre inclusão e respeito às diversidades (MORAES; FELGAR, 2013). Pois não podemos esquecer que a educação sofreu inúmeras mudanças ao longo da história, assim como a sociedade também, e com a gestão escolar não poderia ser diferente, cada época possui suas demandas especificas e assuntos que devem ser trabalhos.
Sabemos que muitas situações provocam discussões intensas dentro da comunidade escolar e também dentro da sociedade de uma forma geral, pois apesar de que as escolas estão realizando debates e projetos sobre o assunto de inclusão e de diversidade, a forma como essas pessoas são vistas e suas necessidades reais ainda é distante da realidade, o que de alguma maneira atrapalha a democratização da gestão escolar.
No que tange a participação da comunidade, que corresponde a um elemento fundamental da democratização da escola, Castiglioni (2007) denota que essa participação não é integral e/ou completa em todos os segmentos escolares disponibilizados para essa ação. Muitos indivíduos da comunidade alegam que a participação nos Conselhos é desnecessária que tomam tempo ou que, até mesmo querendo participar, a decisão final sempre é do diretor. Apesar de considerarmos as possíveis variáveis envolvidas nesse processo, a adesão da comunidade e dos pais ainda é baixa ou mínima, o que gera impactos diretos na gestão escolar democrática.
Para Castiglioni (2007), no processo de humanização da escola podemos perceber que existe influência das mudanças culturais e morais que a sociedade perpassa ao longo da história, visto que, a escola se tornou um lugar fundamental para discutir e elucidar assuntos que podem contribuir para a resolução dos desafios existentes na escola e na gestão escolar, e um desafio que aparece bastante na fala da comunidade escolar na atualidade é a respeito da indisciplina e sobre violência física e moral que ocorre nas escolas, onde existem casos onde professores , alunos e funcionários da instituição são agredidos e violentados, e também casos onde os próprios alunos se agridem entre si.
A indisciplina tem sido um assunto bastante levantado na escola pelos professores, alunos, funcionários e pelas famílias e pela sociedade, pois é frequente que alguém esteja sofrendo algum tipo de violência ou esteja imerso num conflito devido à falta de disciplina em alguma questão. E existem muitos casos onde os pais transferem para a escola a obrigação moral e cívica de introduzir e implantar valores nos filhos, o que causa consequentemente bastante atrito entre os educadores e os pais, pois a escola não deve substituir o papel da família nem deve ensinar o que não faz parte dela.
Muitas vezes nos deparamos com professores e gestores despreparados para lidar com as situações que ocorrem, o que gera um enorme prejuízo no sistema, o que gera grande desconforto em todos.
A verdade é que os passos dados na direção da construção da gestão compartilhada ainda são lentos e inexperientes. Como disse Paulo Freire “A superação da inexperiência democrática por uma nova experiência: a da participação, está à espera” (…). (FREIRE, 2007, p. 91). Ainda há muito caminho a percorrer, tendo em vista a recente democratização do país, e por este motivo ainda existem muitos entraves no que diz respeito a gestão democrática, seja ela escolar ou não.
O Brasil, ainda espera para poder gozar livremente dos benefícios de ser uma organização democrática, onde sejam promovidos a participação, a reflexão e o estabelecimento do diálogo com os atores educativos. Somente assim é que se poderão impulsionar os caminhos para a gestão democrática, até o momento em que os atores envolvidos no sistema educacional possam refletir sobre sua existência (ALCÂNTARA; BORGES; FILIPAK, 2018).
Para Freire (2007), o ideal de uma “educação como prática da liberdade”, será o momento em que a gestão ou a escola sejam capazes de proporcionar “uma organização educativa e pedagógica democrática, autodeterminante e autônoma” (ALCANTARA; BORGES; FILIPAK, 2018, p. 7). Outro ponto que não pode ser esquecido é o fato de que a democratização da escola engloba muito mais do que a gestão de direção da escola, pois, segundo Freire (2003), a democratização da escola implica na hermenêutica do ato de ensinar:
“[…] avançamos pouco em matéria de democratização de nossa educação. Democratização a que nos entregamos inteiros. Na divisão de Educação, a da escola, a das diferentes relações que nelas se estabelecem -educadores, educandos, pais, mães, zeladores, educadores, escola, comunidade. Democratização da escola quanto à sua maneira de compreender o ato de ensinar.” (FREIRE, 2003, p. 125).
Portanto, se tomarmos como meta a gestão democrática postulada por Paulo Freire, pode-se dizer que já caminhamos um pouco, demos alguns passos em sua direção, mas ainda estamos distantes do ideal por ele almejado.
ALCÂNTARA, Luiz Alberto de; BORGES, Valdir; FILIPAK, Sirley Terezinha. Fundamentos da gestão escolar democrática em Paulo Freire. Revista Espacios, Curitiba, v. 39, n. 43, p.1-9, jan. 2018. Disponível em: <http://www.revistaespacios.com/a18v39n43/18394320.html>. Acesso em: 27 de novembro de 2020.
ARRETCHE, M. Federalismo e políticas sociais no Brasil: problemas de coordenação e autonomia. São Paulo Perspectiva, São Paulo, v. 18, n. 2, p. 17-26, abr./jun. 2004. http:// dx.doi.org/10.1590/S0102-88392004000200003.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Termo de Referência nº 03/2014. PROJETO CNE/UNESCO – 914BRZ1144.3. Documento técnico contendo estudo analítico sobre o panorama nacional de efetivação da gestão democrática na Educação Básica no Brasil. Brasília: 2014.
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Brasília, 1988.
Entre os requisitos básicos para o desenvolvimento do ser humano, a educação ganha destaque. Entretanto (sabemos), ela não é privilégio de todos. A realidade muitas vezes leva muitas pessoas a abandonarem os estudos, principalmente em decorrência da necessidade de trabalhar em tempo integral. Felizmente, desde o início da década de 40, temos no Brasil a EJA (Educação de Jovens e Adultos), que busca reintegrar esses no processo de ensino-aprendizagem, promovendo educação e desenvolvimento para aqueles que assim desejam, considerando a carga que esses indivíduos já trazem consigo.
Já inseridos na EJA, esses jovens e adultos se encontram frente à necessidade de adaptação ao ambiente já conhecido, porém novo e à integração aos colegas e professores de turma. Vargas e Cardoso (2013) apontam para questões importantes acerca do processo de socialização e como esse auxilia na educação de jovens e adultos. Citam Lev Vygotsky e Paulo Freire, em que ambos concordam que o ser humano é social, histórico e ativo na construção do seu próprio ser, tal como de seu conhecimento e aprendizado.
Fonte: https://goo.gl/kMZbNQ
Segundo Vargas e Gomes (2013), essas perspectivas levam a compreender os jovens e adultos analfabetos e/ou não escolarizados como sujeitos históricos, sociais e culturais, dotados de conhecimentos e experiências acumulados ao longo da vida, e que necessitam da intervenção de instituições culturais capazes de desencadear o desenvolvimento de suas potencialidades. São, portanto, não objetos depositários de conhecimentos, mas sujeitos capazes de construir conhecimento e aprendizado.
A instituição que dispõe o ensino a jovens e adultos, como qualquer outra, possui normas e regras que devem ser cumpridas pelos alunos para que estes concluam o aprendizado. No entanto, tais alunos, por serem jovens e/ou adultos, já possuem uma carga de experiências que, certamente, envolve tudo o que é visto em sala de aula. Portanto, estão ali somente para sistematizar o ensino de modo a tornar conhecido os métodos científicos desse.
Fonte: https://goo.gl/CcKq7V
Mais do que promover o ensino pedagógico, a EJA acaba por promover o uso do conhecimento de vida, em que os indivíduos participantes do processo, através do diálogo, compartilham seus próprios conhecimentos uns com os outros e, dessa forma, cada qual vai formulando sua própria conceituação de mundo e do meio em que se está inserido.
Em uma pesquisa realizada em uma sala de aula de alfabetização de EJA, dando ênfase à história de Antônio, um dos estudantes, buscou-se observar como se dá o processo de interação dos alunos e dos professores. A investigação ocorreu em torno da linguagem, verbal e não verbal, e se ela oferece o suporte necessário para o desenvolvimento do conhecimento acadêmico. Os resultados da pesquisa mostram que Antônio reconhecia a necessidade do conhecimento teórico para o desenvolvimento de suas capacidades e até mesmo de sua identidade, aprimorando seu modo de refletir e pensar sobre problemas e buscar solucioná-los.
Fonte: https://goo.gl/RqiDM8
Fazendo um diálogo desta pesquisa com o pensamento do psicólogo Kurt Lewin de que uma teoria só é boa quando se pode colocá-la na prática, percebe-se que a EJA tem dado muito certo, haja visto que o programa iniciou pela necessidade de conciliar a vida acadêmica com o trabalho de jovens e adultos que abandonaram os estudos antes de concluí-los.
Portanto, sendo colocada em prática essa ideia, é fornecida aos alunos a oportunidade de resgatar seus potenciais e desenvolvê-los, levando em conta não apenas o conhecimento teórico, científico e/ou acadêmico adquirido em sala de aula, mas também valorizando o seu histórico de vida e o conhecimento adquirido por suas experiências, através da convivência e interação com outros sujeitos e o mundo a sua volta, dando maior autonomia para os indivíduos envolvidos no processo.
Referência
VARGAS, Patrícia Guimarães; GOMES, Maria de Fátima Cardoso. Aprendizagem e desenvolvimento de jovens e adultos: novas práticas sociais, novos sentidos. Educ. Pesqui. vol.39 no.2 São Paulo April/June 2013 Epub May 10, 2013. Artigo disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151797022013000200011#. Data de acesso: 13/05/16.