Juntos pela conveniência?

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Estima-se que as pessoas buscam a felicidade e fazem escolhas de forma que contribuem para chegar a esse destino. Mas por que um casal que não consegue se dar bem insiste em continuar a relação? É comum que as pessoas próximas parem de perguntar se estão juntos ou separados, porque o vai e vem se torna tão rotineiro que quase ninguém mais leva a sério as dificuldades conjugais que o casal vivencia.

Nesse tipo de configuração de relacionamento algo pode estar faltando como o sentimento do amor, vínculo afetivo ou até mesmo um senso de dignidade. Pode se ter perdido a consciência do relacionamento e o equilíbrio que é necessário para manter ele. Outro ponto que pode também ocorrer é a perda da noção de identidade, pois suas personalidades podem se emaranhar uma com a outra 1.

Por vezes a irracionalidade toma conta do casal, que fica à mercê de suas particularidades ou disfunções. Assim ambos perdem sua conjuntura de indivíduos que têm poder sobre sua própria história, e permanecem em um estado de inconsciência sobre o seu relacionamento. Algumas vezes na relação pode alternar momentos de equilíbrio, no entanto esse período torna-se passageiro e logo volta a configuração de antes 2.

Alguns sujeitos que estão inseridos nesse tipo de relação, às vezes permanecem por considerar que fará bem ao seu parceiro, mesmo que se sinta desprezado por ele. A noção de que o rompimento pode ocasionar um grande sofrimento emocional pode ser uma grande influência no momento de não optar pelo término do relacionamento2.

Ainda assim, alguns especialistas acreditam que o principal motivo para evitar rompimentos é o medo de ficar sozinho. Muitas pessoas relutam em admitir que existem problemas insolúveis, ou preferem ignorar que seu parceiro é a verdadeira fonte de infortúnio. Outra razão pode ser que algumas pessoas pensam que, se terminarem o relacionamento, serão vistas como uns perdedores sociais, por não conseguir manter um relacionamento1.

Fonte: Pixabay

A separação em sua maioria vem seguida de sofrimento psíquico, mesmo que o sentimento do amor tenha acabado e não haja mais motivos para manter o relacionamento. É por isso que muitos casais insistem em tentar manter um relacionamento que acabam ficando juntos (as) porque, emocionalmente, não conseguem ficar sozinhos (as). É necessário o amadurecimento, mas passar por esse processo pode ser doloroso, e necessita de esforço1.

O benefício de manter a relação e que com isso não é necessário aplicar esforço devido ao processo de individualização que pode ser evitado. Renunciar um relacionamento é abrir mão de seus sonhos e planos com a outra pessoa. A viagem do ano que vem, a casa que vão comprar, o negócio que vão abrir depois da aposentadoria. Tudo desmorona quando a união declara seu fim. Para quem está separando, deve cancelar todos os planos para o futuro e recomeçar. Ter filhos é ainda mais difícil. Além de começar uma nova vida sozinho, você também deve conviver com seu ex-parceiro, além disso quando um dos parceiros depende economicamente do outro parceiro, tem se o medo de diminuir o padrão de vida 2.

 Há muitas razões para permanecer em um relacionamento que terminou. No entanto, manter uma união sem sentimentos pode ter consequências negativas, a começar por viver em constante insatisfação. Compartilhar a vida, inclusive renunciar a alguns desejos, só é possível com sentimentos mútuos um para com outro e desejo de permanecer juntos. Viver juntos pode se tornar um sacrifício quando um relacionamento termina. A insatisfação afeta o relacionamento e a vida familiar. Se não for tratada, ambos ficam em sofrimento e afetam aqueles ao seu redor.

Por outro lado, é preciso avaliar se a relação realmente acabou. Se ainda há sentimentos, pode ser viável tentar encontrar uma solução. A distância que os casais constroem pode ser resultado de falta de comunicação, expectativas irreais um do outro e conflitos não resolvidos. Dê atenção especial a essas questões e, em alguns casos, pode ser possível reconstruir o relacionamento. O companheirismo e a amizade podem até sustentar um relacionamento. Mas depende de qual é a expectativa de vida de cada um que está inserido no relacionamento.

No entanto, se todas as tentativas de construir a felicidade e a convivência agradável falharem, talvez o melhor a fazer é enfrentar a mudança, apesar de o fim de um relacionamento ser em sua maioria um momento de sofrimento, posteriormente pode ser o recomeço de muitas de possibilidades, e se colocar como prioridade pode ser essencial.

Referências

JABLONSKI, B. Até que a vida nos separe: a crise do casamento contemporâneo. Rio de Janeiro: Agir, 1991.

KASLOW, F.; SCHWARTZ, L. As dinâmicas do divórcio: uma perspectiva do ciclo vital. Campinas: Editora Psy, 1995.

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Hometown Cha-Cha-Cha: sobre trauma, simplicidade, cura e rede de apoio

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Série sul-coreana retrata de uma forma calorosa o recomeçar, as formas das quais uma pessoa lida com seus traumas, e a criação de novos laços.

Você está destinada a encontrar situações inesperadas na sua vida. Mesmo que você use um guarda chuva, você vai acabar encharcada. Só coloque suas mãos pra cima e dê boas vindas à chuva (Hong Du Sik)

Fonte: encurtador.com.br/myA09

Esse texto contém spoilers sobre a série e o final de alguns personagens, então tenha cuidado ao ler caso não goste de spoilers e essa série esteja na sua lista de para assistir.

Hometown Cha-Cha-Cha é uma série sul-coreana que foi lançada em Agosto de 2021, exibida no canal coreano TVN e distribuída internacionalmente pela Netflix. Com uma história contada de forma sensível, acolhedora e divertida, o k-drama foca na adaptação de uma dentista de Seul que se muda para o interior, para abrir uma clínica e um faz-tudo (literalmente) que viveu a sua vida inteira nesse vilarejo.

Yoon Hye Jin (Shin Min-a) é uma mulher adulta, dentista que perdeu a sua mãe quando era jovem. Ela atende em uma clínica popular de Seul, porém ao entrar em conflito com a sua chefe antiética (que fazia procedimentos nos pacientes sem necessidade, e cobrava a mais pelos procedimentos), ela pede demissão e vai parar em Gongjin, um vilarejo à beira do mar. O vilarejo é de certa forma significativo para Hye Jin, já que ela costumava ir lá com os seus pais antes de sua mãe morrer. Ela decide abrir uma clínica lá, como uma forma de ganhar dinheiro e ter independência empregatícia.

Já em Gongjin, Hong Du Sik (Kim Seon-Ho) é literalmente um faz-tudo no vilarejo, e possui licença para praticar quase todas as funções possíveis (desde barista à engenheiro). Extremamente atencioso, principalmente com os idosos, Du Sik trabalha ajudando todos do vilarejo, e tira folga um dia por semana. Du Sik foi abandonado pelos seus pais e criado por seus avós, mas um dia durante a sua infância o avô dele acaba falecendo e Du Sik se culpa pelo resto da vida por ter perdido.

Na análise do comportamento, nossos comportamentos são ditados por regras, contingências e consequências. De acordo com De-Farias (2010) e Skinner (1969/1984), regras são estímulos discriminativos verbais que descrevem ou especificam uma contingência. Contingências são relações do tipo “se… então…”.

Hong Du Sik, ao perder seu avô e ser abandonado pelos seus pais, desenvolve um repertório de contingências que representa um padrão de fuga de emoções e de se ter uma real proximidade com alguém através de qualquer tipo de amor. Se ele amar alguém, então essa pessoa definitivamente irá morrer ou irá abandoná-lo. Essa contingência se intensifica quando, ao já estar emocionalmente envolvido com Hye Jin, sua avó Kim Gam Ri morre dormindo. Du Sik é mais uma vez atingido pelo luto e suas contingências de abandono se intensificam.

Como telespectadores, é claro para nós que estamos de fora o quão distorcida a realidade é através das autorregras e contingências de Du Sik.

Um dos pontos mais calorosos sobre a série se trata dos moradores do vilarejo. Um trio de senhoras idosas (em que uma delas inclui sua avó) que ao mesmo tempo que demonstram sua idade e conhecimento, são como três melhores amigas adolescentes. Um cantor que só fez sucesso com uma música, e sua filha fã de um grupo de k-pop (grupo do qual mais tarde vai gravar um programa de TV no vilarejo). Uma mãe divorciada do seu marido que é prefeito do vilarejo, no qual ambos possuem uma amiga que na verdade é apaixonada pela mãe divorciada, quebrando assim estereótipos de heterossexualidade e nos apresentando de uma forma quase dolorosa a realidade de muitas mulheres lésbicas maduras. O melhor amigo de Du Sik e sua esposa que está grávida do segundo filho, da qual se sente negligenciada pelo marido por estar grávida e não ser tão bonita como antes.

Fonte: encurtador.com.br/bdmvB

A série é a demonstração mais clara de quão importante é uma rede de apoio. Cada personagem apresentado, mesmo que seja apenas por alguns minutos de cada episódio, serve como apoio para o outro ao praticar cuidados e atenciosamente ajudar uns aos outros a superar seus traumas e dificuldades. Du Sik, sendo o ponto em comum em todos eles ou não, tem dificuldade em aceitar apoio da sua rede quando está em sofrimento, mas aos poucos compreende que sozinho não consegue lidar com tudo, da mesma forma que as pessoas que ele ajuda.

“Você pode chorar se quiser. Deve ter sido tão difícil pra você. Você deve ter escondido a dor tão profundamente. Você carregou um fardo tão pesado. Você pode se sentir triste quando estiver comigo. Você pode me mostrar a sua dor. Você pode chorar.” (Yoon Hye Jin)

O drama nos faz refletir nos traumas e nos efeitos deles no presente, da mesma forma em que nos trás o calor ao ver o funcionamento de uma rede de apoio funcional, além de relacionamentos familiares funcionais e disfuncionais que refletem a realidade em uma abordagem não punitiva e não agressiva.

REFERÊNCIAS

Análise comportamental clínica: aspectos teóricos e estudos de caso. Ana Karina C. R. de-Farias & colaboradores. Porto Alegre : Artmed, 2010.

Hometown Cha-Cha-Cha: Série sul-coreana de drama aposta na simplicidade e serendipidade. Disponível em: <http://www.benoliveira.com/2022/01/hometown-cha-cha-cha-serie-coreana-drama-simplicidade-serendipidade.html>. Acesso em 26 de Fev. de 2022.

HOMETOWN CHA-CHA-CHA | ANÁLISE PSICOLÓGICA – YouTube. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=X7Y5M-gwcEc>. Acesso em 26 de Fev. de 2022.

The Best Quotes From The Korean Drama, ‘Hometown Cha-Cha-Cha’. Disponível em: <https://www.cosmo.ph/entertainment/hometown-cha-cha-cha-best-quotes-a4575-20211024>. Acesso em 26 de Fev. de 2022.

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