SUS um sistema de princípios e compromisso

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Como usuária do SUS já vivenciei várias situações que marcaram a minha vida, e a mais recente delas ocorreu quando precisei ficar de acompanhante de um primo após um coma alcoólico no mês de agosto deste ano.

Cheguei ao Hospital Regional de Miracema- TO por volta das nove horas da noite de um sábado, com um misto de agonia e tensão, pois ainda não sabia o que tinha acontecido com meu primo Sérgio, apenas tinha recebido um telefonema para que pudesse encontrar a equipe do SAMU no hospital e ficasse como acompanhante. Não sabia como proceder diante daquela situação, a minha ansiedade era tanta, que não sabia quais informações perguntar ou onde esperar.

Sem saber se o pessoal do SAMU já havia chegado, resolvi ficar um pouco lá fora pegando um ar para então entrar na recepção, quando me sentir menos agoniante fui até a moça e perguntei se o paciente por nome de Sergio havia chegado naquela unidade, ela super prestativa e muito educada me respondeu que não, e pediu para aguardar na sala de espera que assim que o SAMU chegasse ela me avisaria, assim fiz, fiquei aguardando do lado de fora do hospital onde me dava uma visibilidade de entrada e saída de todos os veículos.

Por volta de 23 horas da noite avistei o carro do SAMU tão apressado quanto os meus batimentos cardíacos ao avistá-lo. Nesse momento comecei a ter todos os sintomas de ansiedade, pois era uma experiência nunca vivenciada antes, mas agora já era tarde para pensar em desistir. O SAMU adentrou as portas do fundo do hospital, e logo a moça da recepção me chamou, entramos e Sergio já estava sendo colocado em cima da maca do hospital pelo motorista é enfermeira do SAMU. Em seguida foi encaminhado para sala de urgência e emergência onde o médico iniciou os primeiros procedimentos como aferir sua pressão arterial, o nível de glicose e seus batimentos cardíacos, logo depois, foi recomendado um soro na veia para hidratar e acelerar a eliminação do álcool do organismo. Após esses procedimentos Sergio foi encaminhado para a sala de observação onde permaneceu durante dois dias.

Fonte: encurtador.com.br/qrtzP

Já estando na sala de observação, sendo mais ou menos uma da manhã, Sergio acordou muito agitado e gritando muito, rolava de um lado para o outro e eu já não sabia o que fazer, fui até a sala da enfermagem e pedi ajuda, elas de imediato foram lá no leito, conferiram a medicação, ajudaram quando precisei levar ele ao banheiro e me deu algumas dicas do que fazer caso algumas situações hipotéticas ocorressem. Na manhã do dia seguinte, Sergio já estava bem melhor, porém com fortes dores de cabeça, com isso o médico voltou a medicá-lo e o deixou em observação por algumas horas antes de dar alta definitiva.

Sergio já esteve internado no Hospital Geral de Palmas por tentativa de violência autoprovocada, mesmo a família tentando ajudá-lo sempre voltava para a situação precária na qual vivia, e por vezes demonstrava comportamento muito agressivo. A enfermeira ao ter acesso a essas informações chamou Sergio para uma conversa e entendeu que o abuso de substâncias químicas era proveniente de uma atenção e cuidado que ele recebia quando se encontrava em dada situação. A enfermeira apresentou o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) para que ele pudesse receber um atendimento integralizado e especializado, onde passaria por assistente social, psicólogo, psiquiatra e outros atendimentos caso necessário, depois dessas informações os papeis de alta foram assinados e Sergio foi levado para casa de parentes.

As oito horas da manhã do diante seguinte, uma segunda-feira, estávamos nós no CAPS para tentar conseguir um atendimento, fiquei impressionada com o quanto foi rápido para ele ser atendido, visto que anos atrás tive algumas experiências que demonstraram uma falta de efetividade e tato na prestação dos serviços básicos de saúde.

No primeiro atendimento, Sergio passou pela assistente social e a psicóloga, no entanto existia uma resistência muito grande em conversar com essas profissionais. Ele ainda não estava se sentindo seguro para iniciar um diálogo, então foi marcado para o dia seguinte que ele retornasse no mesmo horário para uma nova tentativa. Chegando em casa fui conversar com Sergio e explicar a importância de ele responder as perguntas feitas pela assistente social e psicóloga, e no dia seguinte teve um resultado muito maior a volta ao CAPS, e logo foi encaminhado para uma consulta com o psiquiatra. Após a referida consulta com ele já estava com seus medicamentos em mãos e com um encaminhamento para um neurologista. Ficou marcado um retorno com o psiquiatra com a data de 90 dias após o início dos medicamentos, e sua consulta com o neurologista está marcada para o mês de dezembro de 2019.

Foi uma experiência agregadora, visto que pude constatar na prática como o SUS tem evoluído em todos os aspectos ao longo dos anos e de fato tem cumprido o que propôs a fazer que é oferecer desde o simples atendimento para avaliação da pressão arterial, por meio da Atenção Primária, até o transplante de órgãos, garantindo acesso integral, universal e gratuito para toda a população do país. Não é à toa que é considerado um dos maiores e mais complexos sistemas de saúde pública do mundo.

Fonte: encurtador.com.br/koUV1
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Intervenção com Agentes de Saúde em Palmas

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Através da disciplina Estágio Básico III do curso de Psicologia do CEULP/ULBRA ocorreu uma intervenção com os Agentes Comunitários de Saúde (ACS) de um setor de Palmas-TO. Previamente houve um apanhado teórico em sala de aula com a professora Lauriane dos Santos, com a finalidade de compreender melhor o papel e a importância que desempenham nessa profissão que é a porta de entrada da saúde publica.

Assim, o estágio teve como finalidade desenvolver a postura de pesquisador-participante, usando da ótica da Psicologia Social Comunitária, onde se investigou situações-problema e o impacto que essas tinham no dia a dia do profissional de saúde e, posteriormente, foram propostas intervenções que pudessem vir a ser de ajuda e significado para os mesmos.

Dessa forma, do dia 12/03/2019 a 04/06/2019 houve um acompanhamento da rotina dos ACS, onde foi vivenciado na pratica que eles cumprem um papel que vai além do que o papel da sua profissão exige, eles são “facilitadores do acesso aos serviços de saúde e ouvintes das queixas dos usuários na atenção básica”, e isso os torna imprescindíveis para a atenção primária (SANTOS; VARGAS; REIS, 2014, p. 324).

Neste sentido, os primeiros encontros foram com o caráter de formação de vínculo, pois como Ribeiro (1994) afirma, o psicólogo precisa ter uma sensibilidade e competência nos primeiros momentos, visto que eles são decisivos para a vida do grupo. Assim, além de acompanhamento, os estagiários participaram de reunião e palestra junto com os ACS e puderam vivenciar como funciona a comunicação entre os profissionais de cada área (psicologia, fisioterapia, enfermagem, assistente social) no Centro de Saúde da Comunidade (CSC).

A reunião foi de grande esclarecimento para muitos e a proposta para melhorar a comunicação e o fluxo dos usuários foi de manter uma reunião mensal para levantamento de dúvidas e problemáticas e, dessa forma, não sobrecarregar a equipe. Pode-se perceber o engajamento e a cooperação de todos os presentes, e ate solicitaram a nós estagiários alguma opinião sobre tudo o que foi falado. Após a reunião nos reunimos com a psicóloga do CSC para discutir a primeira intervenção, onde levando em consideração relatos da intervenção passada, onde eles ficaram com uma resistência sobre dinâmicas de grupo e palestra onde apenas eles ouviam.

Fonte: Arquivo pessoal

Primeira intervenção

Para a primeira intervenção, nos juntamos a outro grupo de estagiários de psicologia, e através disso levamos estudos de casos para uma roda de conversa, onde participaram todos os ACS presentes no dia. Assim ocorreu como uma troca de conhecimento, onde eles contribuíram com a experiência profissional e algumas opiniões pessoais. Foram apresentados casos sobre depressão e violência doméstica, que foram assuntos que perpassaram durante as conversas na sala de trabalho onde eles ficam.

Essa primeira intervenção foi coordenada por mim e auxiliada pela estagiária Raab, sendo que o restante ficou como observadores para anotações do debate, dessa forma  caracterizou-se como um grupo operativo que Pichon-Rivière (1988) define ter como objetivo a promoção de um processo de aprendizagem para os sujeitos envolvidos.

 O caso da depressão era sobre um pai de família que perdeu o emprego recentemente e fazia bicos para levar sustento para casa, com o tempo ele foi diminuindo a quantidade de bicos mesmo tendo várias possibilidades, e ficava mais tempo em casa deitado no quarto. Foi passada a palavra aos ACS para começarem, quando muitos se manifestaram falando sobre o pai ter algum problema de verme, sobre a situação do local e como isso poderia impactar na saúde do mesmo. Em determinado momento uma ACS se manifestou e tocou na possibilidade de depressão e disse que teria que ver quanto tempo ele estava assim, se isso vem de antes do emprego ou foi pela questão da perda do emprego, e isso fez com que o restante mudasse um pouco a visão do que estava ocorrendo com o personagem do caso.

A atividade permitiu o compartilhar de vivências pessoais, além da percepção e reflexão de cada um ali presente. Os ACS, à medida que foram comentando sobre o caso, direcionavam algumas dúvidas sobre a visão da psicologia, onde fui pontuando algumas coisas que eles mesmos haviam falado e levando alguns questionamentos a mais como: Quais outros fatores poderiam ser motivadores da aparente depressão, que não estavam na história? Como poderíamos ajudar no primeiro momento essa pessoa? Em seguimento as respostas para tais perguntas foram desenvolvidas por todos os presentes, chegando a respostas e reflexões em que os dois lados puderam contribuir.

O segundo caso foi sobre um pai de família que passava no bar na volta do trabalho, bebia até tarde da noite e quando chegava em casa acordava todo mundo querendo a janta, e nisso a esposa se levantava para esquentar a janta e muita vezes era violentada fisicamente enquanto o filho assistia. Esse caso foi levado apenas com a intenção de que o primeiro poderia ser rápido, mas foi ele o gatilho para muitos conteúdos de fundo profissional e pessoal dos ACS. Logo se iniciou uma discussão entre eles sobre casos que acontecem no território onde fazem cobertura, e como agiram diante deles, sobre risco quando se denuncia casos assim, sendo que atualmente alguns só fazem se a vítima não tiver condições reais de defesa, como crianças e idosos.

No seguimento da intervenção, uma ACS contou dois casos pessoais que ocorram com pessoas bem próximas, e após o relato perguntou o motivo que uma dessas pessoas conseguiu sair e seguir a vida enquanto a outra não. Dessa forma, foi pontuada a questão de rede de apoio que segundo Brito e Koller (1999), são a existência de vínculos que desempenham diferentes papéis permitindo que o indivíduo se desenvolva emocionalmente. Assim a importância desses vínculos quando passamos por dificuldades onde não sabemos como prosseguir, onde no caso apresentado ficou evidente que uma das pessoas teve um apoio durante todo o processo, e a outra apenas no início.

 Então um ACS perguntou “o que prende uma mulher no relacionamento abusivo?”, e após algumas respostas de outros colegas presentes, um dos coordenadores disse que um provável e comum motivo poderia vir da infância, onde os pais batem nos filhos e dizem que o fizeram por amor, então a criança cresce entendendo que apanhar é sinônimo de amor. E após isso houve uma comoção entre todos os ACS apontando um para o outro falando sobre os filhos e como eles tratavam os mesmos em momentos que precisavam corrigir um comportamento errado. A intervenção foi finalizada e deixando no ar essa última questão para fins reflexivos. Os feedbacks quanto à intervenção, e de forma bem positiva parabenizaram os estagiários verbalizando que foi a melhor intervenção onde houve de fato um aprendizado.

Fonte: Arquivo pessoal

Segunda intervenção

Neste encontro a estagiária Raab ficou como coordenadora principal e eu a auxiliei, contamos também com a presença da psicóloga Ângela, que nos auxiliou nessa segunda intervenção. Assim mantivemos o mesmo formato de estudo de caso, em que foi levado o tema Relações Interpessoais, pois achamos pertinente devido à reação de todos com o final do caso de violência doméstica. O caso constituía em uma família com uma filha de cinco anos que passava o dia na creche e a noite não recebia atenção dos pais que estavam cansados, ocupados e pela insistência da menina acabam batendo nela. O debate sobre o caso andou em paralelo com questões da vida real, e assim houve diversos momentos catárticos nos quais muitos colocaram para fora frustrações e medos sobre suas relações parentais.

Através das vivências levadas para a intervenção, pude notar demandas vindas de casa e de experiências passadas com a família antecessora, e dessa forma conduzimos a intervenção, levando uma reflexão crítica sobre como os ACS poderiam contribuir para tornar melhorar o relacionamento familiar. Nesse momento uma ACS verbalizou sobre a dificuldade em demonstrar carinho e afeto com os filhos e que uma filha mais velha estava praticando o mesmo comportamento com o namorado. Ela comentou que a filha mais nova vinha pedir abraço e que ela não sabia como reagir e dizia apenas para ela que depois fazia isso.

Sendo assim, Silva (2002) afirma que “o trabalho em grupo favorece a troca de experiências, a reflexão e a discussão dos temas, aumentando as possibilidades de que novas atitudes e práticas sejam adotas e modeladas por seus membros”, e acredita-se que através dos feedbacks constantes dos agentes isso foi proporcionado a todos.

O acompanhamento do dia a dia e a participação de reuniões com a equipe NASF me proporcionaram uma visão e conhecimento ampliado de como é a prática e como isso se faz fundamental para a formação do psicólogo. Dessa forma, ser o elo entre o CSC e a comunidade e ser parte indispensável no SUS não é uma simples tarefa. Ela exige doação, exige força física e, principalmente, psicológica.

Em suma, a partir do contato com a atenção primária, do conhecimento adquirido sobre a lógica da territorialização e da clínica ampliada através do contato com o trabalho dos ACS, me fez valorizar, mais que antes, essa profissão, onde fui presenteado com inúmeras lições sobre gratidão e superação.

Referencias

BRITO, R. C.; KOLLER, S. H. Desenvolvimento humano e redes de apoio social e afetivo. In: CARVALHO, Alysson Massote (org.). O mundo social da criança: natureza e cultura em ação. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999.

PICHON-RIVIÈRE, E. Teoria do vínculo. São Paulo: Martins Fontes, 1988.

SANTOS, I.E.R.; VARGAS, M.M.; REIS, F.P. Estressores laborais em agentes comunitários de saúde. Revista Psicologia Organizações e Trabalho, v. 14, n. 3, p. 324-335, 2014.
SILVA, R. C. Metodologias participativas para trabalhos de promoção de saúde e cidadania. São Paulo: Vetor, 2002.

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Um dia de vivência na Aldeia Salto – Xerente

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No sábado, 11 de maio de 2019, a Equipe (En)cena acompanhou a Turma de Estágio Básico I em uma visita a aldeia Salto do povo Xerente, localizada em Tocantínia-TO. A visita foi conduzida pelas professoras Muriel e Ana Letícia e pelo professor Rogério Marquezan (UFT). A visita teve como objetivo: oportunizar os acadêmicos a entrar em contato com a dimensão social do curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra.  A Equipe (En)cena foi convidada a fazer a cobertura do evento, e desde então já fiquei bastante animada.

O que vem à sua cabeça quando você escuta as palavras “índio” e “aldeia”? Na minha sempre vinha o que eu vi representado na literatura e alguns filmes. Ou seja, já imaginava vários índios nus, todos bem pintados, uma aldeia cheia de ocas, um rio enorme como fonte de alimento, peixe assado, muitas penas, flechas, um cacique bem idoso e nada de tecnologia. E foi com este pensamento que fui a aldeia indígena Salto, do povo Xerente, e quando cheguei lá, foi um momento de reflexão e desconstrução.

Ao chegar na aldeia já dei de cara com várias crianças e adultos vestindo roupas comuns, um galpão enorme para realizar reuniões e festas, várias casas de tijolos, um enorme campo de futebol, banheiro, energia e água encanada. Fiquei por um tempo tentando avistar o cacique, e logo descubro que o cacique estava do meu lado. Nunca imaginei, pois o homem que estava ao meu lado era jovem. Me perguntei: mas caciques não são caciques justamente por que têm mais experiência? Então por que não um idoso? Diante disto tudo fiquei um pouco confusa, confesso.

Ao visitarmos a casa da Dona Maria Madalena, índia, historiadora, professora e autora de alguns livros indígenas meu coração saltitava de alegria. Ela cantou uma música indígena linda para nossa chegada e disse com alegria o quanto estava feliz com nossa presença. A historiadora contou que na cultura Xerente tudo tem dono, um espírito, desde a água até a folha da árvore. Ou seja, é costumeiro pedir permissão para fazer uso de qualquer coisa. Caso o espírito não permita o uso, as consequências podem ser doenças físicas ou psicológicas. E a cura ou o tratamento é feita pelo pajé, que é considerado o médico dos médicos.

Dona Maria nos contou também que o respeito às diferentes famílias é muito importante. Em momento de reunião política, cada família tem seu momento de fala sem interrupções. Os mais velhos são ouvidos atentamente, e isto é ensinado desde a infância. Assim como a língua indígena Macro Jê, é ensinada as crianças até os 5 anos, e só depois disso que elas aprendem o português.

No fim do passeio fomos conhecer o rio. Descemos uma ladeira cheia de obstáculos em meio a natureza, com vários indiozinhos nos guiando. Ao chegar no local, que maravilha, uma água maravilhosa, com uma brisa sem explicação. Eu só queria mergulhar. Eu e alguns colegas entramos com a roupa que estávamos no corpo. Que sensação incrível, que prazer entrar e me banhar na mesma água que este povo forte e guerreiro também faz o mesmo. Me senti tão viva e aproveitei cada momento.

Ao chegar em casa eu refleti bastante. Pensei em toda história do índio no Brasil, da forma que a terra foi tomada de suas mãos. Foram feitos de escravos. E mesmo séculos depois, com toda tecnologia, a aldeia Salto do povo Xerente continua praticando sua cultura, aprenderam a conviver com a cultura do homem branco sem perder a identidade indígena, encontraram equilíbrio nas duas coisas.

Diante de toda experiência vivida, carrego no peito um emaranhado de sentimentos um tanto quanto ambivalente. É um misto de alegria com tristeza, pois a tristeza me invade quando penso no sofrimento que a história do índio no Brasil é contada. Mas meu coração também se enche de alegria ao ver de perto que cada índio daquela aldeia vive a identidade indígena, independente de morar em uma oca ou em uma casa de tijolo.

A visita me fez refletir sobre minha própria história enquanto mulher negra, descendente de escravos. Me fez pensar nos meus antepassados e ao invés de olhar com pena, olhei com admiração. Que povo forte. Que mesmo com o passar do tempo, que jamais percamos nossas raízes. Que o respeito à diferença seja uma lei de todos, pois independentemente da cor, raça, cultura e status, ninguém é melhor do que ninguém. Hoje sigo fortalecida e com o coração cheio de gratidão por quem fui, por quem sou e por quem serei.

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Temáticas da psicologia da educação presentes nas vivências pessoais e profissionais

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Sou Licionina Maria Rodrigues da Silva há dezoito anos a frente da Presidência/direção da Escola Especial Um Passo Diferente – APAE do município de Tocantinópolis, estado do Tocantins. A escola atende a alunos da Educação Especial do Ensino a partir de 2008 tomamos à frente da direção da referida escola na qual se observou vários problemas que se agravavam, sobretudo pelas dificuldades de relação entre Família/Escola, no que se refere à aceitação da deficiência  como também  procura de atendimento de profissionais de saúde que atesta a deficiência por meio de laudo médico e/ou psicológico, ocasionando assim dificuldade de ser assistido de acordo as suas necessidades. Nesta escola percebeu-se que a família se mantinha distante ou mesmo ausente da vida escolar dos filhos, trazendo com isto, uma série de problemas relacionados ao desenvolvimento de habilidades cognitivas e de interação social.

Com base dos dados expostos procurou-se promover na escola, ação para trazer um psicólogo educacional  e demais profissionais da equipe multidisciplinar da saúde, pois muito dos alunos atendidos não apresenta laudo psicológico. Necessitando assim de uma avaliação psicológica, a qual segundo o Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2000) reflete um processo de coleta de informações resultante de um conjunto de procedimentos confiáveis. Tal processo permitiria ao psicólogo avaliar comportamentos, contribuindo para a orientação de ações profissionais de forma segura e pertinente (Paula, Pereira, & Nascimento, 2007).

Para a realização do trabalho, foram convocados pais/ou responsáveis pelas crianças matriculadas na escola de modo que se realizou  quatro grandes reuniões no decorrer de três meses, as quais se obteve uma significativa participação dos mesmos, onde os profissionais da saúde foram disponibilizados pela a secretaria municipal de saúde em forma de parcerias.

Fonte: encurtador.com.br/guvKS

A partir dessas atividades observou-se que houve uma significativa melhora no que se refere à participação dos pais na vida escolar dos filhos e no cotidiano da escola. Diante desta ação ficou constatado que a escola especial atende diferentes tipos de deficiências de acordo laudo de médicos e psicólogos, sendo eles: Autismo, Deficiência Intelectual Severa, Deficiências Múltiplas Deficiência Intelectual Deficiência Visual Deficiência Auditiva e Física.

Como incentivo a esta participação criou-se o momento de encontro semestral para que a psicóloga pudesse acompanha o desempenho dos alunos e avaliá-los. O trabalho da Escola Especial “Um Passo Diferente” – APAE de Tocantinópolis, feito com o compromisso de valorizar as potencialidades e as necessidades individuais dos alunos adotando ações positivas, surge das conquistas que muitas vezes impressiona, mas que viabiliza o desenvolvimento das capacidades da pessoa com deficiência, resgata a auto- estima e melhora a qualidade de vida.

Portanto, é valido considerar que a atuação do Psicólogo no ambiente escolar pode ser compreendida como por um serviço preventivo e terapêutico. Quando se trata de inclusão educacional de pessoas com deficiência, ele tem um papel crucial na preparação dos profissionais envolvidos, apoio familiar e suporte a comunidade discente. Sendo assim, o objetivo do nosso artigo é discutir as contribuições do psicólogo escolar no processo de inclusão educacional de pessoas com deficiências. O psicólogo deve ter um olhar abrangente, ver o aluno com deficiência como um ser biopsicossocial, e não olhando apenas o biológico, mas um ser que apesar das limitações é também dotado de potencialidade. Dessa forma Vianna (2016, p- 54), relata que: A atuação do profissional de psicologia no ambiente escolar, nos dias atuais permanece marcada por dificuldades, em relação ao fazer a prática. Muitos psicólogos ainda sentem certo bloqueio ao sair do modelo tradicional clínico, centrado no psicodiagnóstico.

Fonte: encurtador.com.br/guvKS

REFERENCIAS 

Paula, A. V., Pereira, A. S., & Nascimento, E. Opinião de alunos de Psicologia sobre o ensino em avaliação psicológica. (Psico-USF,2007).

VIANA, M.N. Psicologia escolar: que fazer é esse? In: Conselho Federal de Psicologia- Brasilia – CFP, 2016.

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Impactos políticos e psicológicos do discurso feminista

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Recente palestra apresentada pela egressa do curso de Psicologia Lilian Julian da Silva Guimarães abordou a temática do Movimento Feminista, citando inicialmente as três e importantes Ondas que deram origem e força ao Movimento histórico, na qual cada fase termina sendo marcado por conquistas no âmbito intelectual, político e filosófico que compõem o Movimento, em um panorama de lutas. Assim, entre outros assuntos pertinentes a temática proposta, justifica como chegou a uma escolha pelo tema e ainda a influência da filósofa, escritora, professora e militante feminista brasileira Marcia Tiburi, que norteou seu Trabalho de Conclusão de Curso, além é claro de Beauvoir e Betty Friedan.

No livro O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir, principal obra que marca a revolucionária caminhada rumo aos libertários direitos femininos, aos quais nós enquanto mulheres somos gratas a essa inquietante filósofa e escritora, as importantes conquistas para o nosso atual protagonismo feminino; ainda que seja necessário muitos avanços. De certa forma, enquanto mulher podemos nos sentir amparadas, e até mesmo reconhecidas em nossas angústias, ao nos deparamos com a célebre frase: “Ninguém nasce mulher, torna-se mulher”. Nesse sentido, a palestra em sua maioria assistida por mulheres conseguiu trazer como pano de fundo o papel da mulher na atualidade e acirrar um debate sobre as disparidades, violência e desigualdades ainda presentes em uma sociedade impregnada pelo machismo.

Fonte: https://goo.gl/PFK2DC

Falou por exemplo que a primeira onda possui como marco a Revolução Francesa e a extensão do direito de voto. Na segunda onda, aparecem nomes importantes como Simone de Beauvoir (1908-1986) e Betty Friedan (1921-2006). Na terceira onda, historicamente reconhecida na década de 1990, marcada por questionamentos dentro do próprio movimento que permitiu uma importante redefinição das falhas dos movimentos anteriores, argumentando as diferenças e as condições étnicas e sociais, com intuito de negociar espaços e direitos de forma detalhada.

Além disso, adentrou assuntos como o protagonismo da mulher negra e lésbica, que não se sentiam contempladas no Movimento Feminista das primeiras fases, ou Ondas. Além disso, outra problemática apontada foi a influência desse movimento na vida do homem, como por exemplo, a perda de identidade e as vantagens desse movimento na vida deles. Importante lembrar que o movimento foi amplamente criticado por representar mulheres brancas e de classe alta, havendo de certa forma uma divisão dentro do próprio Movimento.

Foram ressaltados também aspectos culturais envolvidos nas questões de gênero, como a visão da mulher como o “sexo frágil”, a inversão objetal e as críticas ao feminismo. Ademais foram relatados aspectos que evolvem a mulher, seu corpo, o aborto, o mito da maternidade. Citando ainda Butler sobre as complexas estruturas que normatizam e reproduzem as questões de gênero que escreve em nossos corpos um discurso politico marcadamente violento e excludente de ser mulher.

Fonte: https://goo.gl/HYGKq1

O feminismo é um movimento político que tem buscado desde sempre, direitos iguais entre os gêneros; nesse contexto torna-se necessário trazer a tona um debate essencial para o entendimento de que vivemos numa sociedade patriarcal, ao qual Marcia Tiburi muito bem nos lembra, sobre o machismo presente nas mais simples e cotidianas relações às quais é marcadamente imposto pelas diferenças entre os gêneros, segundo ela, derivadas das crenças e também da cultura que é impregnada na história por um cenário discursivo e simbólico desse patriarcado, um legado que traz como centro o gênero masculino em detrimento do gênero feminino como segundo plano. Nesse ponto, incentivando para que a mulher tenha um lugar politico e de criação, sujeito histórico.

Marcia Tiburi apresenta o Feminismo como revolucionário, e nos alerta que a classe conservadora, os que têm medo da mudança, é essa sim que dizem que o feminismo é ultrapassado. Ela aponta o movimento como uma constante dialética, uma prática que é uma teoria e vice versa, sempre em voga e as pessoas devem se apropriar dele, nos fazendo pensar como uma grande questão que nos move. O feminismo é plural, e segundo ela, são muitos escapes que trazem à tona temas como gênero que hoje em dia de certa forma o sistema ainda esconde para que a mulher não perceba seu verdadeiro papel nesse contexto histórico.

Fonte: https://goo.gl/FpVMD5

O Feminismo é uma pergunta que devemos nos fazer: o porquê de tantos privilégios? E o porquê de manter uma sociedade de privilégios? Assim, Tiburi adentra a filosofia de Marx que aponta, sobre como percebeu as mulheres como sendo os proletários do proletário, observando no cerne da classe operária e proletária, o lugar que a mulher operária ocupava como subalterna, sofrendo mais que o homem operário. Devemos quebrar com essa opressão, e o Movimento é forte por lutar pela quebra do domínio patriarcado, e a lógica do machismo é sempre atacar o feminismo.

Dessa forma, foi um debate rico em questões atuais que envolvem a realidade que as mulheres vivenciam na sociedade. O debate contribuiu de forma significativa para o entendimento das questões de gênero, pois proporcionou um momento de reflexão sobre a temática. O Feminismo é uma ética, e historicamente todos os movimentos sociais estão de certa forma, interligados ao Movimento Feminista e suas reivindicações por direitos iguais entre os gêneros. Quando a mulher se auto-proclama feminista ela está marcando sua causa, seu lugar de criação que marca sua territorialidade, sua liberdade, e principalmente pela luta de tantas mulheres que foram e ainda são mortas todos os dias, nesse sistema institucional patriarcal.

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Vozes para além do previsível: um relato de experiência

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Eu sinceramente me surpreendi de forma positiva com o conjunto da obra do III Fórum Internacional de Novas Abordagens em Saúde Mental, evento que ocorreu neste começo de junho, em parceria com a UFRJ, na capital carioca. Em que pese eventuais problemas, de longe a programação e, sobretudo, o carisma dos conferencistas internacionais – com destaque para o psicólogo norte-americano Oryx Cohen – foram de uma enorme riqueza.

Pois bem, minha jornada pelo Fórum começou com o contato com uma nova – e instigante – maneira de intervenção usada com alguma frequência nos Estados Unidos no que concerne ao tratamento/lida com pessoas que ouvem vozes. Normalmente trata-se de pessoas que são diagnosticadas como sendo psicóticas ou, em casos mais extremos, como esquizofrênicas. Para mim foi surpresa conhecer tão de perto grupos que nos Estados Unidos e em alguns países da Europa – como a Holanda, por exemplo – já se utilizam de estruturas de intervenção onde o profissional de saúde deve se despir de tratamentos concebidos a priori e, como foco principal, ater-se á escuta ativa. Aliás, mais do que uma escuta ativa, o profissional de saúde e/ou psicólogo deve compreender que há uma dimensão da existência para além da normalidade ou da patologização. Esta perspectiva favorece a criação de vínculos de confiança entre os coordenadores de grupos – que são conhecidos como Grupos de Ouvidores de Vozes – e os usuários.

Não se trata – pelo que percebi – de uma tentativa de desqualificar os saberes técnico/acadêmicos ou profissionais, mas, antes, de inverter a lógica do processo terapêutico, onde de fato a centralidade se encontra em cada sujeito, e não no conjunto de técnicas interventivas. É algo radical, num primeiro momento, mas que vem demonstrando resultados surpreendentes, de acordo com os dados apresentados por Oryx. Um destes dados se refere a um estudo longitudinal realizado nos EUA onde se observou dois grupos de pessoas reconhecidas como necessitadas de tratamento psiquiátrico. Um dos grupos recebeu a intervenção num hospital psiquiátrico e o segundo grupo, no mesmo período de tempo, foi cuidado por estudantes universitários – ainda sem discursos que presumem um suposto saber – em casas privadas. Ao final da pesquisa, observou-se uma significativa melhora do segundo grupo em relação ao primeiro.

Chamou-me a atenção o fato de Oryx destacar que, com isso, não quer dizer que todo o saber acumulado e a própria medicalização devem ser rechaçados. No entanto, no mínimo é importante repensar as práticas de intervenção que vem sendo executadas nestes últimos 30 anos. Haveria, portanto, uma tendência a despatologizar os fenômenos – no caso em específico, tornar normal o fato de alguém ouvir vozes – e, com isso, adentrar-se ao universo das pessoas. Literalmente, é preciso ouvir mais para só então o profissional de psicologia ter condições de ser eficaz em sua relação com o outro.

Oryx citou as teses de Carl Jung em uma de suas intervenções, notadamente dentro do conceito do arquétipo do ‘curador ferido’. Parte do pressuposto de que, por um lado, o curador é também um igual ao sujeito adoecido, na medida em que todos compartilham um mal-estar existencial comum á espécie; por outro lado, este curador precisa entender os seus próprios processos internos para, então, com menos resistências, colaborar com os outros. Pareceu-me um exemplo clássico de alteridade, algo preconizado insistentemente na Psicologia e que, dada a sua importância, deve ocupar lugar central na prática.

No mais, para além das palestras proferidas por professores e profissionais do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, me chamou a atenção o perfil dos psiquiatras presentes ao evento. Todos foram unanimes em dizer que uma das formas de se estabelecer uma saúde mental pública de qualidade é optando pela não horizontalização dos saberes, evitando assim que o saber médico funcione como gestor, subjugando as demais especialidades.

Juventude e saúde mental

Senti-me extremamente gratificado em ter apresentado um trabalho como parte de meu mestrado interdisciplinar – na UFT – e em consonância com os temas abordados no portal (En)Cena. Com o tema ‘Impacto da Pós-Modernidade na Saúde Mental de Jovens’, pude contribuir com um olhar filosófico, sociológico e psicanalista sobre as eventuais causas de adoecimento dos jovens na atualidade.

Para tanto, me utilizei de autores como Birman, Freire Costa, Bauman, Lipovetsky, Hall, Han, dentre outros tantos. A minha apresentação ocorreu nas dependências do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro e foi acompanhada predominantemente por psicólogos do Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul.

Ao final da apresentação abrimos o espaço para uma rodada de conversa, onde puder perceber o interesse dos profissionais da psicologia em se envolver cada vez mais na interdisciplinaridade, sobretudo no que se refere á ampliação do olhar sobre o fenômeno humano, que comporta uma explicação cada vez mais ampla e desafiadora.

Por fim, gostaria de registrar que esta é a segunda vez que viajo com a equipe do (En)Cena e, como já era de se esperar, tudo ocorreu numa enorme harmonia. O portal conseguiu apresentar de forma significativa os serviços que são produzidos pela comunidade acadêmica do Ceulp/Ulbra, foi alvo de muitos elogios e iniciou futuras parcerias, sobretudo com associações de apoiadores e/ou amigos dos usuários do sistema de saúde mental.

Em súmula, a viagem rendeu um enorme crescimento pessoal e profissional. Além da expectativa de, no futuro, montarmos um grupo de Apoio aos Ouvidores de Vozes em Palmas. Um desafio e tanto, mas a altura de qualquer profissional que queira, ao se espelhar na vida de Jung, ser um curador ferido de almas.

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A compreensão do tempo nas formações identitárias: uma síntese

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Esta síntese procura evidenciar o conteúdo exposto em apresentação do Psicologia em Debate, pelo acadêmico Vitor Alexandre Lopes Lehnen, no dia 19.10.2016 nas dependências do CEULP/ULBRA, com o Tema: O Impacto da Compreensão do Tempo nas Formações Identitárias, conteúdo este extraído de capítulos do livro “O Tempo e o Cão”, de Maria Rita Khel (2009).

A autora Khel (2009) expõe que o tempo é uma construção social, conforme enfatizado pelo acadêmico Vitor no início de sua exposição, sendo uma espécie de ordem social marcada pelo controle do tempo; neste sentido, o sujeito está submetido às leis do “grande outro” (grifo nosso), regras essas que afetam o contexto da vida concreta e subjetiva do sujeito desejante. O acadêmico, inclusive, explicitou muito bem, que a amplitude do termo ‘o grande outro’ na teoria de Lacan, deve ser ilustrado como um lugar simbólico.

A espacialidade não define o psiquismo, mas o tempo sim, daí a dificuldade dos neurocientistas em localizar, no tecido cerebral, o inconsciente freudiano, conforme exposto por Vitor. Complementando, Khel (2009) enfatiza que a origem do sujeito psíquico, entra na condição temporal, pela subjetivação da espera da satisfação deste a tenra infância, conforme a visão psicanalítica. O psiquismo se institui a partir da espera do objeto de satisfação da amamentação, numa tentativa fracassada de eliminar a angústia do tempo vazio do intervalo desse cuidado. Essa representação “adquire, em primeiro lugar, a forma de uma substituição alucinatória do seio que tarda a se apresentar para saciar e tranquilizar o infans”, conforme Khel (2009 p 112).

A autora conclui o raciocínio teórico freudiano dizendo que esse fracasso irredutível da satisfação pulsional, vai transformando o trabalho psíquico, que aos poucos cria uma espécie de transmutação de identidade de percepção à uma identidade mental. No contexto da teoria lacaniana do “O Tempo Lógico”, aqui enunciado pela autora, como “O tempo e o sujeito”, foi relatado o sofisma contido nos Escritos de Lacan, onde esclarece a natureza da relação necessária entre o saber possível do sujeito do inconsciente e a experiência subjetiva do tempo.

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Fonte: http://migre.me/vs1TA

Para tanto, Khel (2009) cita Lacan apresentando um problema lógico, onde em um presídio é apresentado para três prisioneiros, um desafio cuja solução será permitida a liberdade de apenas um deles. Apresenta-se cinco discos, dois pretos e três brancos, cada prisioneiro terá um colocado em suas costas, onde não conseguirá vê-lo – mas os dos outros dois, sim. A liberdade ocorrerá para aquele que em primeiro lugar deduzir, a partir da observação dos outros, a cor de seu próprio disco.

O autor afirma que, salvo no caso em que um dos participantes do jogo enxergasse nas costas de seus companheiros dois discos pretos, é impossível deduzir a resposta correta sem levar em conta, além das cores dos discos que cada um enxerga, as reações e as hesitações dos outros dois. O problema lógico exposto resumidamente neste parágrafo é, portanto, construído em três tempos: o instante de ver, o tempo para compreender e o momento de concluir.

Desses três intervalos, o primeiro e o terceiro ocorrem instantaneamente segundo Lacan; somente o segundo supõe a duração de um tempo de meditação. Essa passagem precede a certeza do sujeito sobre si mesmo, isto é, sobre a cor de seu disco, que ele só pode deduzir ao se relacionar subjetivamente com as reações dos outros e refletir sobre elas. Com uma certeza jamais inteiramente garantida para a liberdade proposta, o tempo de concluir, é uma objetivação rápida que precipita o sujeito em direção à liberdade.

Khel (2009) explicita que não lhe parece de graça o fato de que a liberdade, na historinha de Lacan, seja o prêmio prometido àquele que primeiro conseguir apostar na cor do disco pregado às suas costas. O momento de concluir é o tempo em que o sujeito é convocado, onde tem que se desprender do registro da identificação com seus companheiros de cela para afirmar, por sua conta e risco, quem ele é; sendo que isso não garante ao sujeito nada sobre o dilema de quem ele realmente é.

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Fonte: http://migre.me/vs294

Para Lacan o ser é um efeito simbólico da certeza antecipada do sujeito desejante, sendo assim, a psicanálise lacaniana valoriza o tempo lógico, necessário à historização do sujeito inconsciente, onde a autora diz ser o tempo que faz existir a possibilidade da análise, ou seja, o tempo de compreender é o tempo apoiado em um “saber inconsciente” (grifo nosso). Há de se reconhecer que o acadêmico Vitor expôs, de alguma forma, o impulso ao consumo. A autora elucida a precipitação passagem ao “ato” (grifo nosso), como produtor pela urgência da demanda do outro, ou seja, a relação do sujeito com o objeto causa do desejo, ou de outra forma. O tempo de compreender sem um saber, como segue abaixo:

A temporalidade contemporânea, frequentemente vivida como pura pressa, atropela a duração necessária que caracteriza o momento de compreender, a qual não se define pela marcação abstrata dos relógios. Daí a sustentação periclitante do saber do sujeito, que o predispõe à queda na depressão, seja qual for sua estrutura neurótica. Por sua vez, o momento de concluir implica a conquista, durante o tempo de compreender, de alguma independência em relação ao tempo apressado da demanda do Outro. (KHEL, 2009, p. 117).

Neste sentido, trazendo a luz das relações da pós-modernidade, a temporalidade vivenciada no contexto da pressa, atropela a duração necessária que caracteriza o momento de compreender, a qual, não se define pelo tempo lógico enunciado por Lacan. Daí a sustentação vacilante desse sujeito consumidor, enunciado por Victor, fica comprometida como pré-disposição à depressão, seja qual for sua estrutura neurótica.

REFERÊNCIA:

KEHL, Maria Rita. O tempo e o cão. São Paulo: Boitempo, 2009.

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Avaliação Psicossocial de Vítimas de Violência Sexual: Desafios da Integralidade do Cuidado

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No dia 22 de agosto de 2016, nas dependências do CEULP/ULBRA, ocorreu como parte da programação da 1ª Semana Acadêmica de Psicologia, a oficina: Avaliação Psicossocial de Vítimas de Violência Sexual, promovida pela coordenação do curso. Ministrada pela psicóloga Lívia Tâmara Barbosa, mestre em ciências da saúde, especialista em saúde pública e psicóloga no Serviço Especializado de atendimento à pessoa em situação de violência sexual (SAVIS) do Hospital Dona Regina, a oficina abrangeu os conteúdos de forma dinâmica e crítica, de modo a facilitar a aprendizagem e envolvimento dos acadêmicos que a acompanhavam.

Abordando um tema atual e recorrente na sociedade, que necessita de atenção especial dos profissionais de psicologia, foram expostos, além da violência sexual, os conceitos de outros tipos de violência, como a física, psicológica, financeira e por negligência, observando as características das vítimas de cada uma delas. Explanou-se também sobre a importância dos direitos humanos como contraponto à violência e a importância da integralidade do cuidado como agente facilitador da resiliência nas pessoas que sofreram abuso.

Segundo a psicóloga, deve-se levar em consideração as particularidades de cada grupo, que tem seus conceitos de violência tangidos por características culturais, religiosas, históricas, políticas e sociais. Estamos inseridos em grupos com características próprias, sendo papel do psicólogo identificar quais técnicas  terão maior aproveitamento com cada indivíduo, dinâmica que também se aplica a pessoas em situação de violência sexual.

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Fonte: http://zip.net/bxtKcs

Atentando-se para uma dúvida comum entre as pessoas e até mesmo entre profissionais, foi analisada a definição do que é violência sexual e os limiares entre ela e outros tipos de violência. Qualquer ato sexual, tentativa de obter um ato sexual, comentários ou investidas sexuais indesejados, ou de alguma forma voltados contra a sexualidade de uma pessoa, independentemente da relação com ela ou o ambiente, são considerados violência sexual.

Dessa maneira, as consequências de tal tipo de violência podem não ser somente físicas, uma vez que a força corporal nem sempre é utilizada, podendo causar danos à saúde mental e bem-estar para com a sociedade, como por exemplo, gravidez, complicações ginecológicas e doenças sexualmente transmissíveis.

Entre as características das pessoas que foram abusadas sexualmente foram citadas: culpabilidade em relação ao ocorrido, baixa auto-estima, problemas de crescimento e desenvolvimento físico-emocional nos casos de crianças e adolescentes, vulnerabilidade ao comportamento suicida, transtornos de ansiedade, depressão e outras psicopatologias. Outras características podem se manifestar dependendo da subjetividade de cada indivíduo e caso ele tenha sofrido outros tipos de violência.

Muito frisado durante a oficina, o termo “integralidade do cuidado” foi descrito como uma bandeira de luta, sendo alcançada através do cuidado integral às vítimas, que por sua vez é a conjunção da atenção emergencial, atenção básica e das redes sociais. A resiliência nos casos de violência se refere à capacidade de uma pessoa de construir ou reconstruir uma trajetória de vida saudável, apesar do ocorrido. Para Lívia, a escuta, o apoio e o atendimento às necessidades do indivíduo, a partir do cuidado integral, servem como fator protetor para a Resiliência.

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Fonte: http://zip.net/bntJnz

Segundo a psicóloga, o indivíduo em situação de violência sexual se recuperaria mais rapidamente com um trabalho em rede, inter setorial, com órgãos como o SAVIS e outros centros de assistência, bem como com um vínculo com a comunidade através de esforços comunitários, campanhas de prevenção, ativismo comunitário e programas nas escolas. Sendo seres biopsicossociais, devemos dissociar a ideia de Resiliência como apenas sendo uma capacidade interna, e sim algo que pode ser alcançado através de interação com o meio social.

Na formação do psicólogo é fundamental o estudo sobre temas como o dessa oficina. Os profissionais de psicologia enfrentam desafios diários com casos de violência sexual, sendo responsáveis por atender as necessidades da pessoa que sofreu abuso e por promover as medidas cabíveis a curto e longo prazo para a recuperação do paciente e prevenção a novas ocorrências.

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Mobilidade: Oficina Experiências e Técnicas de Inclusão na Educação

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A primeira Semana Acadêmica de Psicologia do Ceulp/Ulbra foi um sucesso. Com uma programação repleta de palestras, mesas redondas, oficinas, comunicações orais e, é claro que não pode ficar de fora, deliciosos coffee breacks, foi uma experiência enriquecedora, em que se tornou possível maior contato dos acadêmicos com profissionais atuantes em psicologia, tal como bons momentos de partilha entre todos.

No presente, será retratado sobre a oficina 5, ocorrida no dia 22 de agosto de 2016, às 14h00min, na sala 407. Denominada como Experiências e Técnicas de Inclusão na Educação – Mobilidade foi ministrada pelas professoras Maria Dinalva T. Carneiro e Oneide Teixeira Rodrigues.

Maria hoje é portadora de deficiência visual e Oneide é sua vidente. A oficina inicia com Maria contando um pouco sobre sua história, relatando que nem sempre ela foi cega, mas possuía baixa visão. De forma divertida durante toda a oficina, ela conta que prefere cegueira a baixa visão, pois esta última parece carregar mais preconceitos de terceiros, talvez por ser pouco conhecida e por as pessoas pensarem que não é um obstáculo por que ainda enxerga em certa medida.

Também é relatado sobre a forma como se deve fornecer auxílio aos cegos. Primeiro, é explicado sobre os termos guia e vidente. Vidente é aquele que está ao lado do cego, lhe narrando sobre o ambiente e obstáculos, é o seu orientador. Já o guia, diferente do que é pensado normalmente, na verdade é o próprio cego, pois ele tem autonomia para dizer aonde e por onde quer ir. Maria diz que não é feio oferecer ajuda ao cego, mas feio é segurar seu braço e ir o empurrando sem perguntar nada, contando algumas experiências próprias desta situação.

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Fonte: http://fr.wikihow.com/aider-une-personne-aveugle

As narrações/adaptações feitas para cegos devem passar para eles somente o essencial, sem precisar se ater aos mínimos detalhes. Maria enfatiza várias vezes que não se deve fazer comparações entre deficientes e “normais” e entre os próprios deficientes, mas que somente o tratamento (locomoção, inclusão) deve ser igual. Também, não se deve tirar conclusões sobre deficientes a partir de suas deficiências, mas procurar suas qualidades e capacidades.

É realizada uma dinâmica interessante, em que são feitas duplas, sendo um integrante o cego (é colocada uma venda) e o outro o vidente. São colocados alguns obstáculos no chão e a dupla faz um passeio por eles, invertendo os papeis ao final desse passeio. Foi uma oficina incrível, em que vários ensinamentos foram absorvidos, inclusive o de lutar independentemete das dificuldades. Para finalizar, deixo a frase que o pai de Maria lhe disse quando ela queria vir para Palmas sozinha, para estudar e crescer: “Quem tem medo de cair, não cai, mas também não sobe”.

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