Os tipos de apego e as relações na vida adulta

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Este artigo propõe uma releitura dos estilos de alguns conceitos da Teoria do Apego e modelos de funcionamento internos, à luz da concepção de Bowlby e autores contemporâneos. Discute-se o quanto os tipos de apego influenciam nas relações de vida do indivíduo adulto.

Para Bowlby (1988-1989) a teoria do apego desenvolveu-se com variações pela teoria das relações objetais. Seu ponto de partida foi a observação de comportamentos.

 

John Bowlby – Fonte: https://www.thescienceofpsychotherapy.com/wp-content/uploads/2020/01/John-Bowlby.jpg

 

O sistema de apego é o sistema comportamental que regula o comportamento de aproximação e contato, tendo como função original a proteção contra predadores. Quando há sinal de desconforto e quebra de equilíbrio no ambiente o bebê sente-se ameaçado, como fome, frio, calor, barulho alto, ruídos graves, ativando assim o sistema de apego. A aproximação da figura de apego, geralmente a mãe, ou outro cuidador central, sendo ativado a regulação fisiológica da criança, sendo assim a natureza selecionou não apenas a amamentação, mas o olhar, o toque, receber limites, o cuidado com a exploração em lugares de perigo, como fontes fundamentais de apego e desenvolvimento saudável. (MENDES, MAIA, 2019).

Entende-se que muitas das escolhas nos relacionamentos sofrem interferências da dinâmica esquemática de cada pessoa envolvida, tanto que a base da Terapia de Esquema parte de que seu tratamento se dá nas relações paciente-terapeuta como potencial reparador. Acredita-se fortemente que as relações são cruciais tanto na origem dos esquemas como na manutenção destes (YOUNG, 2008).

 

Fonte: https://www.vittude.com/blog/wp-content/uploads/teoria_do_Apego-1200×798.jpg

 

O conceito de modelos internos de funcionamento (MIFs) é considerado o componente central de toda teoria de apego e Ainswort (1985) descreveu três estilos de apego básicos na infância: seguro, inseguro resistente (também chamado de ansioso-ambivalente) e inseguro evitativo (ou apenas evitativo) (Bowlby, 1984). Main e Solom (1986) propuseram uma quarta categoria, hoje amplamente aceita para descrever o comportamento de crianças que não se enquadram nas categorias anteriores chamado por eles de estilo de apego desorganizado. A tabela a seguir nos mostra a relação do tipo de apego e comportamento observados em bebês, para entendermos a influência de cada tipo com os comportamentos nas relações pela vida. 

Tabela 1. Estilos de apego na Infância

Estilo de Apego Descrição do Comportamento
Apego seguro Bebes bastante ativos que utilizam a figura de apego como base segura para explorar o ambiente. Interagem mais com a figura de apego do que com estranhos. Protestam ativamente a separação e buscam contato prontamente quando a figura de apego retorna ao ambiente, sendo logo regulados afetivamente em sua presença.
Apego inseguro ou evitativo Não usam a figura de apego como base segura, como se não dessem importância a ela, em uma espécie de autossuficiência. Demonstram pouca ativação emocional ao serem deixadas sozinhas e também não recorrem à mãe quando esta retorna ao estar ausente do ambiente, não parecendo ter preferência por esta. Podem interagir mais com um estranho do que com a figura de apego. 
Apego inseguro resistente Exploram pouco o ambiente, com bastante temor a pessoas estranhas. A maior parte dos bebês protestam bastante a mãe de ausenta. Quando a mãe retorna reagem com birra, raiva, choro. A figura de apego tem dificuldades para regular emocionalmente a criança, como se esta apresentasse uma necessidade infinita de contato.

Fonte: Ainsworth (1985), Bowlby (1984ª), Main e Soloman (1986)

Uma vez estabelecidos os apegos, os Modos internos de funcionamento filtram a realidade de acordo com as expectativas preexistentes. Betherton e Munholland (2016) descrevem que os componentes afetivos, cognitivos e comportamentais dos Modos de Funcionamento Internos.

Para Young os tipos de apego desenvolvimento na infância nos permitem perceber como o adulto tende a agir em suas relações afetivas com pares, podendo ser pares amorosos, amizades, sociedades, etc. Na figura 1 observa-se o Tipo de Apego e como tende a ser a relação do adulto.

Conhecer como foi nosso apego, nosso forma de vincular nos ajuda no caminho de escolha e de empatia, pois produzem dinâmicas de infelicidade e sofrimento emocional diante de muitas relações. Existem padrões de comportamentos, estilos, e respostas de enfrentamento, que são respostas aprendidas emocionalmente nas relações primárias e acontecem de forma automática muitas vezes (SIMONE-DIFRANCESCO, ROEDIGER, STEVENS, 2015; YOUNG et al. 2008).

Para Bradbury e Fincham(1990), os modelos de apego são esquemas cognitivos relativamente duradouros que influenciam e são influenciados pelas interações, os Modos Internos de Funcionamento trazem expectativas de um parceiros com o outro, acionando gatilhos e emoções que precisam ser validadas e entendidas, significadas e algumas ressignificadas, formando assim por ambas as partes uma conexão desses tipos de apego, podendo agregar ou trazer disfuncionalidade nas relações.

A motivação individual da escolha de parceiros ao longo da história, evolução, conceito, conteúdos/elementos, foi mudando, o que se percebe é que o apego ainda é evidenciado e muito nas relações, sejam elas liquidas ou tradicionais românticas. A escolha como liberdade, traz em si uma imensa responsabilidade sobre os aspectos individuais, pode-se entender que a motivação, os desejos sempre existirão, sempre estrão lá, mas a força da escolha pode gerir por muitas questões racionais (PAIM e CARDOSO, org., 2016)

 

Fonte: https://soumamae.com.br/wp-content/uploads/2018/02/mae-abracando-filha.jpg

O ser humano como ser social que é, apresenta, como uma de suas necessidades básicas, unir-se a outro. Segundo Zimerman (1997) todo ser humano é gregário por natureza, existindo em função dos seus relacionamentos. Myers (2014, p.309) cita que somos animais sociais e “precisamos pertencer”, o que seria denominado pelos psicólogos sociais contemporâneos como uma necessidade de pertencimento. Tudo isso decorre da dependência que os seres humanos têm uns dos outros, a qual dura a vida toda, colocando as relações no centro da existência humana.

A partir da concepção de Maturana (1998), o amor é uma das maiores fontes de socialização do ser humano, já que está relacionado às relações de proximidade, cooperação, respeito e colaboração. Ele aponta, ainda, que é o modo de vida hominídeo que tornou possível a linguagem,  o amor foi a emoção central na história evolutiva, que deu origem à espécie.

Embora multifacetado e complexo quanto às suas formas de expressão, o amor foi sumamente importante para o desenvolvimento da espécie humana. Segundo Edgar Morin (1979) muitos fatores que corroboraram para que a espécie Homos alcançasse a condição Sapiens. Dentre eles, indica a verticalização da sua postura, como sendo essencial para a transformação das relações humanas, já que propiciou a copulação frontal, mudança qualitativa extremamente importante para o desenvolvimentismo das espécies, com repercussão na anatomia humana (alterando o corpo para ser mais atrativo e chamar atenção dos pares), além de favorecer a confiança entre os pares (já que a posição possibilitou o contato direto entre partes vulneráveis do corpo). Portanto, as relações amorosas tal como se desenvolviam naquela época, foram importantes nesse processo evolutivo.

 

Fonte: https://psiconlinews.com/wp-content/uploads/2015/09/teoria-do-apego.jpg

 

No início de onde se tem registros, a escolha dos pares na sua maioria, nada tinha de romântico, nem de longe ocorriam por conta de algum sentimento amoroso ou conexão emocional, com raras exceções. Na trajetória de evolução da humanidade a união entre duas pessoas ocorria pelo desejo instintivo, essas uniões se pautavam na sobrevivência e prevalência da espécie. A percepção de que andando em bandos havia mais segurança para a sua proteção e as suas chances de sobrevivência aumentariam (HARARI, 2017). Os psicólogos sociais Roy Baumeister e Mark Leary (1995 apud Myer, 2014, p. 303) ilustram bem o poder dos vínculos tais como citado: “para os nossos antepassados, os vínculos mútuos permitiram a sobrevivência do grupo. Ao caçar ou construir abrigos, 10 mãos eram melhores do que duas”.

Assim podemos concluir que a infância é um solo fértil para nossos apegos e vínculos se construírem através das figuras de apego e referência, que modelam nosso cognitivo e cadastram emoções em nosso sistema límbico, trazendo esta ponte para as relações ao longo da vida.

REFERÊNCIAS 

BOWLBY, John, APEGO, A natureza do Vínvulo, Martins Fontes, São Martins, volume 1 da trilogia, Apego e Perda.2002

PAIM, K; CARDOSO, B. C. (Org.) Terapia do esquema para casais: base teórica e intervenção. Porto Alegre: Artmed, 2019.

RAMIRES, Vera Regina Rohnel, SCHNEIDER, Michele Scheffel. REVISITANDO ALGUNS CONCEITOS DA TEORIA DO APEGO: COMPORTAMENTO VERSUS REPRESENTAÇÃO. Unisinos, 2010.

ZIMERMAN, D. E. Os quatro vínculos – Amor, Ódio, Conhecimento, Reconhecimento na Psicanálise e em nossas vidas. Porto Alegre: Artmed, 2010.

YOUNG, J. E.; KLOSKO, J. S.; WEISHAAR, M. E. Terapia do Esquema. Trad. COSTA, Roberto C Porto Alegre: Artmed, 2008.

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#CAOS2018: Cibercultura e a teoria do apego é tema do Psicologia em Debate

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O Psicologia em Debate Especial é parte da programação do CAOS. 

A acadêmica do 9° período, do curso de psicologia, Evelly Silva, apresentou nessa noite de terça-feira, 22 de Maio de 2018, o Psicologia em Debate “Angústias contemporâneas em Black Mirror”, com o tema “Volto já: cibercultura e a teoria do apego”. O intuito da estudante foi relacionar a série, em especial, 1° episódio da segunda temporada, com conteúdo ligados a psicologia.

No primeiro momento, a estudante introduz a temática do episódio, que basicamente, envolve um casal de namorados que decidem se mudar para o interior, mas, um dia após a mudança, Ash se envolve em um acidente que acaba sendo fatal. Logo, Martha se ver frente a um processo de luto e acaba entrando em um serviço que ajuda pessoas a passar por esse processo de luto, desta maneira um “Ash” virtual é criado. A ligação que a acadêmica faz com a psicologia envolve a teoria do desenvolvimento infantil e as influencias desse processo em possíveis comportamentos, criada por John Bowlby e Mary Ainsworth.

Evelly Silva falando sobre o episódio Volto Já. Foto: Isaura Rossatto

A segunda perspectiva está relacionada com a cibercultura, basicamente, os relacionamentos estão voltados para a interação virtual, inclinados para o âmbito dos meios de comunicação. Cintando alguns comportamentos que Ash tinha antes de morrer, a acadêmica explicitou o quanto isso se torna algo recorrente na vida dele. O sentimento exposto de maneira perfeita, compartilhando somente aspectos positivos, fez com que ele não tivesse contato com o verdadeiro conteúdo do momento.

A apresentação foi baseada no texto que a acadêmica escreveu para o portal (En)cena, partindo da proposta de relacionar os desafios tecnológicos que a série trás com os mais variados assuntos dentro do campo psicológico e social. O texto pode ser lido na integra no EnCena, link http://encenasaudemental.com/post-destaque/volto-ja-cibercultura-e-a-teoria-do-apego/

Mais informações podem ser obtidas no site do evento: http://ulbra-to.br/caos/edicoes/2018#programacao

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Volto Já: Cibercultura e a Teoria do Apego

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Black Mirror é uma série antológica de ficção científica criada por Charlie Brooker, que explora um futuro próximo onde a natureza humana e a tecnologia de ponta entram em um perigoso conflito (NETFLIX, 2016). A série trata de temas pertinentes à contemporaneidade, a solidão humana e as novas maneiras de estabelecer relações no mundo das mídias sociais, como é o caso do episódio “Be Right Back”, em português “Volto Já”.

O episódio conta a história de Martha e Ash, um casal de apaixonados que decidem morar juntos numa casa do interior, onde os pais de Ash moraram por muito tempo. Um dia depois da mudança, ao devolver a van usada para transportar os pertences de ambos, Ash se envolve num acidente de carro fatal. No funeral, uma amiga de Martha recomenda um serviço novo que ajuda pessoas em luto a lidar melhor com a situação, criando um Ash “virtual” que se comunica por meio de informações e dados obtidos através de mídias sociais, e-mails de Ash em vida e tudo quanto havia gerado no mundo virtual até então. Ela não aceita bem a indicação da amiga, mas esta acaba por inscrevê-la no serviço – o que Martha só descobre quando recebe um e-mail do “novo” Ash. A partir daí, ela começa a ter vários embates pessoais e morais sobre manter ou não essa relação e a trama se desenvolve justamente nesse cenário de conflitos internos (CARVALHO, 2016).

Fonte: https://goo.gl/WbrrqK

Existem certos aspectos que serão analisados a partir do ponto de vista da cibercultura e da teoria do apego de John Bowlby e Mary Ainsworth, responsáveis por estudos voltados ao desenvolvimento infantil que reverberam em possíveis tendências comportamentais para a vida adulta. Faz-se necessário neste primeiro momento, a elucidação das bases que constituem esta análise em concomitante aplicação aos principais pontos analisados do episódio.

Para Pierre Lévy (2007), o gênero canônico da cibercultura é o mundo virtual, mas vai além, diz respeito a preferência da conexão em detrimento do isolamento, é mais precisamente a universalização da comunicação. São as possibilidades de se relacionar com qualquer pessoa de qualquer parte do mundo por intermédio da internet em ferramentas como celulares e computadores, nos mais diferentes métodos, seja por troca de e-mails ou por interação via redes sociais.

Existem aspectos claramente enfatizados no episódio da série que mostram o quão dependente Ash era da comunicação virtual. Até mesmo em momentos de fragilidade emocional ele se vê na necessidade de compartilhar tudo em suas redes sociais. Um exemplo claro desse fato é quando, ao entrar na casa de seus pais pela primeira vez depois de anos, se depara com uma foto de sua infância, que rapidamente o faz recordar das disfuncionalidades de sua família e de quando seu irmão e pai morreram, a reação de sua mãe foi esconder todas as fotos deles no sótão da casa na esperança de que suas dores fossem também abafadas. Mesmo sendo um fato doloroso, Ash prefere compartilhar a foto, divulgando apenas aspectos positivos, evitando o contato com seus conflitos e também de refletir profundamente sobre seus próprios sentimentos em relação ao que viveu naquele lugar.

Fonte: https://goo.gl/w7B1JU

A teoria do apego de Bowlby e Ainsworth se refere a estudos sobre o desenvolvimento socioemocional durante os primeiros anos de vida e o quão este pode ser influenciado pela maneira como os cuidadores primários tratam as crianças, além dos fatores genéticos, psicológicos e ambientais (DALBEM; DELLAGLIO, 2017).  Para eles, existem quatro tipos de apego que são: o seguro, evitante, ambivalente e o desorganizado. Durante todo o episódio, Ash está sempre mergulhado em seu celular, que de alguma maneira poderia indicar comportamentos ligados ao apego evitante, onde há uma falta de interesse em aprofundar as relações, a intimidade gera desconforto e ele se refugia nas relações virtuais que podem ser em níveis superficiais. Martha por vezes fala da necessidade que sente de haver mais interação entre eles, mas Ash acaba por evitar esses momentos.

Para Bowlby (1989), as experiências precoces com o cuidador primário iniciam o que depois se generalizará nas expectativas sobre si mesmo, os outros e do mundo em geral, com implicações importantes na personalidade e nos modelos internos de funcionamento desse indivíduo, que são caracterizados pela habilidade de constituir representações mentais cada vez mais complexas. Cortina & Marrone (2003) afirmam que a teoria do apego contempla os processos normais de desenvolvimento e a psicopatologia humana, além de abordar os processos de informação para a compreensão dos mecanismos psicológicos utilizados na vivência de um trauma ou uma perda.

Como é o caso de Martha ao ser informada da morte de Ash. Porém, quando sua amiga a incentiva no uso da ferramenta online para “trazer de volta” seu marido, vê-se claramente que o tipo de apego estabelecido por ela com o Ash tanto real como o virtual, que é uma versão “materializada” dele, é o apego ambivalente, visto que de todas as formas ela busca ser aceita e também por maiores níveis de intimidade e receptividade. O que acaba por não encontrar nem naquela versão computadorizada e superficial de Ash ou mesmo no Ash real.

Fonte: https://goo.gl/4BsDHu

Para Barcelos (1993) ancorar-se no passado é a pedra angular de toda dependência afetiva. Martha não consegue se desvencilhar de todas as possibilidades de vida que teria ao lado de Ash e ao descobrir que está grávida dias após sua morte, se apega à esperança de que esse Ash “virtual” preencha todo seu vazio e dê sentido à sua vida, porém todas as suas esperanças são frustradas.

No fim, a dependência emocional está tão fortemente estabelecida, que ela não consegue de modo efetivo se desprender da esperança de um dia poder ter o verdadeiro Ash de volta. O que se nota em Martha é um apagamento do “eu”. Para fugir de suas próprias dores e sentimentos, ela faz como a mãe de Ash, resolve guardar a versão “materializada”, computadorizada dele no sótão da casa, como último recurso para entorpecer seus próprios temores.

REFERÊNCIAS:

BARCELOS, Carlos. Criando sua liberdade: Amor sem dependência. São Paulo: Editora Gente, 1993.

CARVALHO, Claudio. PlotSummary – Black Mirror: Be Right Back. 2016. Disponível em: <http://www.imdb.com/title/tt2290780/plotsummary?ref_=tt_ov_pl>. Acesso em: 02 set. 2017.

CORTINA, M. & MARRONE, M. (2003) Attachment theory and the psychoanalytic process. London: WhurrPublishers.

DALBEM, Juliana Xavier; DELL’AGLIO, Débora Dalbosco. Teoria do apego: Bases conceituais e desenvolvimento dos modelos internos de funcionamento. Arquivos Brasileiros de Psicologia,Rio Grande do Sul, v. 57, n. 1, p.01-13, 02 ago. 2017.

BOWLBY, J. Uma base segura: Aplicações clínicas da teoria do apego. 1 ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.

LÉVY, Pierre. Cibercultura. 2. ed. São Paulo: Editora 34, 2007. 264 p. Tradução de Carlos Irineu da Costa.

NETFLIX (Brasil) (Emp.). Black Mirror. 2017. Disponível em: <https://www.netflix.com/title/70264888>. Acessoem: 31 ago. 2017.

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Família Sistêmica: visão de diversos autores

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Vários autores desenvolveram teorias para compreender o contexto do sistema familiar, entre eles, vale ressaltar a terapia familiar boweniana. Bower desenvolveu a teoria a partir dos princípios e práticas psicanalíticas. Essa teoria compreende o comportamento humano de forma mais ampla, estendendo o enfoque além de outras abordagens de forma mais aprofundada. E assim moldou e continua a moldar o contexto familiar (NICHOLS; SCHWARTZ, 1998).

Nichols e Schwartz (1998) apontam que Bower foi o terapeuta familiar que mais esteve comprometido não apenas como método, mas procurando focar mais na teoria do que na técnica. Nesse sentido, Bower elaborou alguns conceitos que compõem sua teoria: diferenciação do self, triângulos, processos emocionais da família nuclear, processo de projeção familiar, processo de transmissão multidirecional e posição dos irmãos, rompimento emocional e processo emocional societário (NICHOLS; SCHWARTZ, 1998). O objetivo da teoria de Bower é: “reduzir a ansiedade e aumentar a diferenciação do self – nada mais persistente” (NICHOLS; SCHWARTZ, 1998, p. 323).

Fonte: http://zip.net/bqtLsR

Outro fator enfatizado, na teoria Sistêmica, pelas autoras Strey e Azambuja (2004), é que toda família tem suas histórias e segredos que se repetem de geração em geração. Histórias de amor, de dor, de conflito. E muitas vezes essas histórias devem ser preservadas apenas para os membros já outras podem serem expostas para a sociedade. No entanto, é importante que as situações negativas possam ser expostas, não para dar continuidade, mas para que sejam de uma vez por todas rompidas. É o caso das violências na família.

Nesse ínterim, a violência propriamente dita realizada com meninas, geralmente acontece por parte da figura paterna, seja ela sexual, corporal e/ou psicológica. Outro fator identificado é que a mãe, nessas circunstâncias, geralmente permite tal ação, e investigando mais a fundo, percebe-se que essa mesma violência ocorrera, também, com essa mãe. E essa violência oculta da mãe, só vem à tona, após o acontecimento com a filha. E assim elas não sabem lidar com a situação que se repete. Desse modo entende-se tal ação como a: transmissão transgeracional (STREY; AZAMBUJA, 2004).

Fonte: http://zip.net/bytKXt

A terapia sistêmica se baseia em conceitos normativos da família tradicional. Sendo assim, tal teoria ignora a visão de gênero e reforça o sentido de que o homem é predominante sobre o restante do grupo familiar. A teoria feminista, por sua vez, é uma crítica sobre esse ponto de vista da teoria sistêmica, pois ela defende a ideia oposta de que homens e mulheres devem estar estereotipados em seus papéis de gênero (STREY; AZAMBUJA, 2004).

O feminismo enquanto movimento histórico e político que ressurge nas décadas de 60 e 70, nos Estados Unidos, percebe-se como filosofia que reconhece que homens e mulher tem experiências diferentes. Denuncia, no entanto, que a experiência masculina é privilegiada, enquanto a feminina é muitas vezes negligenciada. O feminismo assinala as desigualdades entre homens e mulheres, escancarando as formas de opressão e os mecanismos de ocultamento das mesmas (STREY; AZAMBUJA, 2004, p. 154).

Fonte: http://zip.net/bdtKZn

Desse modo, concluem-se alguns pontos que desvelam as violências dentro da família. É marcado pelo autoritarismo que leva a compreensão de que o homem tem direitos sobre a mulher, e ela deve se submeter a isso, e mesmo com todas as mudanças da atualidade, ainda, é possível acontecer essa situação nas famílias, principalmente naquelas de baixa renda. E é essa prevalência histórica que faz com que a dominação do homem se sobreponha sobre a passividade da mulher, e a mesma se vê na obrigatoriedade de se submeter ao autoritarismo. E essa atitude histórica, em algumas famílias podem ser passadas de geração em geração, tonando-se um círculo vicioso (STREY; AZAMBUJA, 2004).

Vale destacar que a família é acompanhada de estágios que variam de acordo com a idade cronológica de seus membros. E o estresse familiar tendem a serem maiores nos pontos de transição desses estágios e, geralmente, os sintomas aparecem quando há interrupção no ciclo de vida familiar (CARTER, 1995)

Nesse ínterim, a autora considera o ciclo de vida familiar em relação a três aspectos, tais quais:

(1) os estágios predizíveis de desenvolvimento familiar “normal” na tradicional classe média americana, conforme nos aproximamos no final do século XX, e as típicas disputas clínicas quando as famílias têm problemas para negociar essas transições; (2) os padrões do ciclo de vida familiar que estão se modificando em nossa época e as mudanças naquilo que é considerado “normal”; e (3) uma perspectiva clínica que vê a terapia como ajudando as famílias que descarrilaram no ciclo de vida familiar a voltarem à sua trilha desenvolvimental, e que convida você, terapeuta, a incluir-se, e a seu próprio estágio de ciclo de vida, nesta equação (CARTER, 1995, p. 8).

Fonte: http://zip.net/bhtKDG

Outra importante teoria utilizada, na perspectiva sistêmica, é a teoria do apego, criada por John Bowlby teve início a partir da observação de comportamento, tendo como ponto de partida a teoria das relações objetais. Bowlby (1979/1997, apud RAMIRES; SCHNEIDER, 2010) define o apego como um vínculo em que a pessoa deposita total segurança em uma figura de apego, tendo a mesma como uma base segura.

O autor aponta, ainda, que:

“Como outros sistemas básicos, o de apego é supostamente pertencente a um processo de seleção natural, pois oferece uma vantagem em termos de sobrevivência, pelas chances de proteção obtidas pela proximidade das figuras de apego” (RAMIRES; SCHNEIDER, 2010, p. 26).

Martins-Silva et. al. (2003) afirmam que a teoria “se baseia na proposição de que a evolução da espécie humana equipou o ser humano com vários sistemas de comportamentos que aumentam a possibilidade de sobrevivência e o sucesso reprodutivo” (p. 23). Em consonância a isso, Bowlby (2002 apud MARTINS-SILVA et. al., 2003), revela que o sistema de apego é de extrema importância, pois permite bom desenvolvimento em outras áreas, tendo em vista que o apego promove a ligação do bebê com o cuidador, esse que lhe proporcionará segurança e proteção.

Fonte: http://zip.net/bmtKkD

A função dessa teoria é basicamente a relação de proteção da mãe-bebê, permitindo que a criança explore seu ambiente. E essa busca física procurada na mãe pelo bebê surge a partir do seu primeiro ano de vida permanecendo durante boa parte da infância (BOWLBY, 1969/1990 apud PONTES et. al., 2007).

Bowlby (1969/1990 apud PONTES et. al., 2007) destaca dois modelos de apego: seguro e inseguro. No apego seguro, o autor aponta que, quando ele é desenvolvido, resulta em aspectos de valorização, autoestima e boas expectativas. No apego inseguro possivelmente resultará reações de insegurança e desvalorização, seguidos de alguns comportamentos como raiva e agressão.

Mantelli e Pinheiro (2011) apontam que as relações íntimas são formadas pela proximidade física, formação essa que foi criada anteriormente no apego. Ou seja, dependendo do jeito como foi formado o apego, haverá influencia no relacionamento afetivo.

Apesar da busca de proximidade no adulto ser diferente e mais complexa que na criança, ela é similar e é facilitada pelo contato físico íntimo nos dois momentos do ciclo de vida (SHAVER, et. al., 1988 apud MANTELLI; PINHEIRO 2011).

Nesse sentido, Rodrigues (2009) ressalta que quando a pessoa torna-se adulta transfere esse apego para outra pessoa, seja um amigo ou parceiro afetivo, e nessa pessoa ela encontra seu novo apego. O autor também enfatiza que há evidências de que pessoas que desenvolveram o apego seguro, tem maior facilidade em desenvolver seus talentos e reconhecer suas habilidades, ou seja, as experiências de um apego seguro na infância resultam no apego das relações adultas.

Fonte: http://zip.net/bdtKZm

Percebe-se que há um vasto modo de explicar e compreender o sistema familiar por meio da perspectiva sistêmica, pois a mesma adere a diversas teorias e suas respectivas técnicas tendo como objetivo amenizar as tensões causadas por uma série de conflitos não resolvidos no seio familiar. Tensões essas que são geradoras de patologias e/ou transtornos que impedem o indivíduo de seguir uma vida tranquila e harmoniosa.

Referências:

CARTER, Betty. As mudanças no ciclo de vida familiar: uma estrutura para a terapia 73 familiar. Tradução; Maria Adriana Verissimo Veronese. 2ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 1995.

MARTINS-SILVA, Priscilla de Oliveira; TRINDADE, Zeidi Araújo and SILVA JUNIOR, Annor da. Teorias sobre o amor no campo da Psicologia Social. Psicol. cienc. prof. [online]. 2013, vol.33, n.1, pp.16-31. ISSN 1414-9893.  http://dx.doi.org/10.1590/S1414-98932013000100003. Acesso em: 29 de agosto 2016.

MANTELLI, Fernanda Lima; PINHEIRO, Maria Cristina Souza Mota. Apego nas relações intimas entre adultos: Uma visão Teórica. TCC (Graduação) – Curso de Psicologia, Faculdade Ruy Barbosa. Salvador, 2011.

NICHOLS, Michael P; SCHWARTZ, Richard C. Terapia familiar: Conceitos e Métodos. Porto Alegre: Artmend, 1° Ed. 1998.

PONTES, Fernando Augusto Ramos, et. al. Teoria do apego: elementos para uma concepção sistêmica da vinculação humana. Aletheia, n.26, p.67-79, jul./dez. 2007. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/aletheia/n26/n26a07.pdf. Acesso em: 14 de Setembro, 2016.

RAMIRES, Vera Regina Röhnelt; SCHNEIDER, Michele Scheffel. Revisitando alguns Conceitos da Teoria do Apego: Comportamento versus Representação?. Psicologia: Teoria e Pesquisa. Rio Grande do Sul, Vol. 26 n. 1, pp. 25-33, jan. 2010.

STREY, Marlene Neves; AZAMBUJA, Mariana Porto; JAEGER Fernanda Pires. Violência, gênero e políticas públicas. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.

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