Sex Education e a representatividade LGBTQIAP+ nas salas de aula

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Uma Reflexão Ampliada sobre Inclusão e Respeito nas Escolas a Partir de “Sex Education”.

A obra televisiva “Sex Education” emerge como uma delineadora de narrativas centradas nos protagonistas Otis (Asa Butterfield), Maeve (Emma Mackey), Eric (Ncuti Gatwa) e outros, inseridos na peculiar instituição educacional de Moordale. Sua temática diligentemente aborda questões correlacionadas à educação sexual, estendendo-se à contemplação de tópicos preponderantes, tais como assexualidade, pansexualidade e o movimento Queer.

Nos albores da narrativa, durante as duas primeiras temporadas, o enredo é primariamente centrado na terapia sexual conduzida pela progenitora de Otis, interpretada por Gillian Anderson, bem como na incursão deste como terapeuta sexual na mencionada instituição. O escopo narrativo abrange temáticas relevantes, a saber, impotência, insegurança sexual, gravidez na adolescência e inquirições acerca da sexualidade, propiciando uma contextualização destas vicissitudes às experiências de personagens que enfrentam tais contingências.

A série, de modo invariável, adota abordagens pragmáticas e diretas na exploração de assuntos verídicos, frequentemente relegados à esfera do tabu. Na terceira temporada, destaca-se a introdução de uma personagem não-binária, cujos relacionamentos, de maneira quase didática, elucidam temáticas previamente desconhecidas para os indivíduos cisgêneros. Essa abordagem acessível, marcada por uma didática sutil, contribuiu substancialmente para a notoriedade da série, solidificando seu êxito na plataforma de streaming.

A temática da representatividade LGBTQIAP+ no ambiente escolar emerge como um eixo central e preponderante em “Sex Education”. A série proeminente sublinha que a orientação sexual é intrínseca, desvinculando-se de uma escolha consciente. Propugna-se, portanto, a noção de que existem múltiplos modos de conceber, sentir e vivenciar a sexualidade, todos ancorados na singularidade humana. De acordo com as reflexões de Brasil (2004, p. 29), “embora tenhamos a possibilidade de escolher se vamos demonstrar, ou não, os nossos sentimentos, os psicólogos não consideram que a orientação sexual seja uma opção consciente que possa ser modificada por um ato da vontade”.

A série destaca-se, assim, como uma plataforma de discussão e reflexão, inserindo-se de forma proeminente na arena contemporânea das produções televisivas que buscam abordar, de maneira elucidativa, complexas questões ligadas à sexualidade e identidade de gênero.

Fonte: Pixabay, imagem de pontinsu

 

Quando refletimos sobre a concepção de gênero, uma das primeiras considerações a serem ponderadas, conforme salienta Butler (1990), é que este se configura como uma construção social, erigida a partir do contexto social. À luz de Jesus (2012), o gênero refere-se àquilo que somos, isto é, cada indivíduo é singular, embora compartilhe características comuns. Ao abordarmos as identidades, torna-se evidente que estas nos vinculam a alguns grupos e nos distinguem de outros, originando-se de variáveis como a região de nascimento, a cultura, a classe social, a presença ou ausência de uma filiação religiosa, a idade, as habilidades físicas, entre outras dimensões que marcam a diversidade humana. No escopo desse debate, este guia direciona sua atenção à dimensão do gênero (Jesus, 2012, p. 07).

A manifestação da discriminação sexual, conforme delineado, é uma realidade onipresente em diversos estratos sociais, com destaque para o ambiente escolar. Crianças que desafiam os estereótipos de gênero frequentemente tornam-se alvos de escárnio, perpetuando preconceitos danosos. Profissionais da educação, incluindo docentes, desempenham um papel significativo na potencialização ou combate à homofobia, exercendo influência sobre a incidência de situações discriminatórias.

Conforme a assertiva de Felipe e Bello (2009 p. 147), “é imperativo sublinhar que, desde a infância, muitas crianças expressam uma rejeição profunda a comportamentos que se desviam dos padrões culturalmente estabelecidos em relação à masculinidade”. A instituição escolar, assemelhando-se à sociedade democrática, é instada a envidar esforços para mitigar a intolerância, minimizando os sofrimentos e atenuando os efeitos deletérios. Entretanto, constata-se de modo recorrente que diversas instituições escolares perpetuam preconceitos, incluindo a homofobia, com impactos negativos disseminados entre todos os envolvidos.

A relevância da discussão torna-se ainda mais premente quando se associa a questão de gênero à relação com o corpo. Guacira Lopes Louro (2000) argumenta que o corpo parece ter sido negligenciado no contexto escolar, da mesma forma que o gênero possui pouco espaço para debate nesse ambiente. A matriz curricular muitas vezes não abrange determinadas questões, limitando a discussão ao campo da sexualidade e, ainda assim, frequentemente restrita aos componentes curriculares das ciências ou biológicas.

Em consonância com Junqueira (2009 p. 484), “os processos de internalização da homofobia são fortalecidos, induzindo a vítima a sentir-se culpada, envergonhada e até mesmo merecedora da agressão sofrida, mantendo-a em um estado de reação silenciosa, entregue ao pior desfecho possível”. As violências físicas e simbólicas corroboram para que a vítima colabore na legitimação da agressão, favorecendo o agressor e seus cúmplices, encorajando-os a perpetuar suas ações e coações.

A exposição midiática de incidentes de violência direcionada à comunidade LGBTQIA+ nas instituições educacionais é uma ocorrência não infrequente. Nesse sentido, as instituições de ensino não devem impor padrões sexuais ou de gênero, mas, ao contrário, devem fomentar a liberdade, a pluralidade e a autodescoberta, incitando os discentes a agirem respeitosamente na sociedade.

A escola, enquanto instituição central na construção de gêneros e sexualidades, exerce influência não apenas sobre os conteúdos curriculares, mas também sobre as práticas cotidianas que moldam as relações sociais (Louro, 2008; Junqueira, 2013). Nesse contexto, Louro (2000) sustenta que a escola imprime marcas que transcende as meras informações presentes nos currículos, refletindo-se nas experiências cotidianas compartilhadas com educadores e colegas.

Fonte: Pixabay, imagem de 27707

Ampliando a abordagem sobre a presença das temáticas relacionadas às homossexualidades, bissexualidades e transgeneridades no contexto educacional, Junqueira (2009) ressalta que essas questões permanecem invisíveis no currículo, nos livros didáticos e até mesmo nas discussões sobre direitos humanos nas escolas. Diante dessa constatação, é imperativo que a instituição escolar promova essas discussões e defenda um convívio harmonioso e equitativo entre os indivíduos, estimulando o respeito às diferenças, independentemente de sua natureza, e promovendo a produção do conhecimento e o desenvolvimento da criticidade nos sujeitos que por ela transitam.

As vivências e percepções dos professores LGBTQIA+ em relação aos desdobramentos que envolvem assexualidades no âmbito escolar ratificam a ideia de que o combate à discriminação sexual é uma tarefa contínua que demanda a devida atenção da sociedade. A escola, enquanto uma esfera social com o propósito maior de instigar mudanças na forma de pensar e perceber as diferenças, não deve ser conivente diante de situações de discriminação; ao contrário, precisa abordar o problema e avançar em ações que proporcionem a liberdade de expressão e o autoconhecimento.

Urge a necessidade de reformular as estratégias de acolhimento escolar, tornando o respeito à diversidade uma diretriz fundamental da instituição. Os gestores educacionais precisam assegurar que essa postura seja incorporada de maneira inequívoca no projeto político-pedagógico (PPP) da escola, refletindo a seu comprometimento efetivo com a promoção de um ambiente inclusivo e propício ao desenvolvimento integral de todos os seus membros.

Referências:

  1. BRASIL. Conselho Nacional de Combate à Discriminação. Brasil Sem Homofobia: Programa de combate à violência e à discriminação contra GLTB e promoção da cidadania homossexual (Cartilha). Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
  2. BUTLER, Judith. “Fundamentos contingentes: o feminismo e a questão do pós-modernismo”. Cadernos Pagu, n. 11, p. 11-42, 1998. Tradução de Pedro Maia Soares para versão do artigo “Contingent Foundations: Feminism and the Question of Postmodernism”, no Greater Philadelphia Philosophy Consortium, em setembro de 1990.
  3. FELIPE, Jana. BELLO, Alexandre Toaldo. Construção de Comportamentos Homofóbicos no Cotidiano da Educação Infantil. In: JUNQUEIRA, Rogério Diniz (org.). Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a homofobia nas escolas. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, UNESCO, 2009, p. 141-157.
  4. JESUS, Jaqueline Gomes de. Orientações sobre identidade de gênero: conceitos e termos. EDA/FBN, Brasília, 2012.
  5. JUNQUEIRA, Rogério Diniz. Homofobia nas Escolas: um problema de todos. In: JUNQUEIRA, Rogério Diniz (org.). Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a homofobia nas escolas. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, UNESCO, 2009, p. 13-51.
  6. JUNQUEIRA, Rogério Diniz. Pedagogia do armário: a normatividade em ação. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 7, n. 13, p. 481-498, jul./dez. 2013.
  7. LOURO, Guacira Lopes. Corpo, escola e identidade. Rev. Educação & Realidade, v. 25, n. 2, 2000.
  8. LOURO, Guacira Lopes. Gênero e sexualidade: pedagogias contemporâneas. Pro-Posições, v. 19, n. 2 (56) – maio/ago. 2008.
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Piaget e as contribuições para a Psicologia Escolar

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As teorias de Piaget influenciaram e ainda influenciam na educação infantil, assim como a psicologia escolar.

Jean Piaget, um dos mais influentes psicólogos do século XX, desenvolveu uma teoria do desenvolvimento cognitivo que teve um impacto profundo nas áreas de psicologia, educação e pedagogia. Sua abordagem construtivista enfatiza a importância da interação entre o indivíduo e o ambiente no processo de desenvolvimento cognitivo. Conforme afirmado por Piaget (1970), “a inteligência não é o que o homem sabe, mas o que ele faz quando não sabe.”

Jean Piaget, um pioneiro na psicologia do desenvolvimento, iniciou sua carreira como biólogo, e essa formação influenciou profundamente sua abordagem à compreensão do desenvolvimento cognitivo. Sua teoria, que se concentra nas mudanças qualitativas e quantitativas nas estruturas mentais das crianças, teve implicações duradouras para a psicologia escolar e a pedagogia.

A abordagem de Piaget baseia-se na premissa de que o conhecimento é construído ativamente pelos indivíduos em vez de ser transmitido passivamente. Ele identificou quatro estágios de desenvolvimento cognitivo – sensório-motor, pré-operatório, operatório concreto e operatório formal – cada um caracterizado por formas específicas de pensamento e raciocínio. Esses estágios têm implicações profundas para a educação, uma vez que os educadores precisam adaptar suas práticas ao estágio de desenvolvimento cognitivo dos alunos.

                                                                                  Fonte: https://blog.portaleducacao.com.br

Uma das contribuições mais importantes de Piaget para a psicologia escolar e a educação é a mudança no papel do educador. A teoria piagetiana desafiou a visão tradicional do professor como mero transmissor de informações. Em vez disso, o educador se torna um facilitador do processo de construção do conhecimento pelo aluno.

Essa mudança de paradigma encoraja os educadores a criar ambientes de aprendizagem desafiadores que incentivem os alunos a explorar, questionar e construir seu próprio conhecimento. Isso significa que o ensino deve ser adaptado ao nível de desenvolvimento cognitivo dos alunos, garantindo que as atividades sejam apropriadas para o estágio em que se encontram.

Piaget (1970) também destacou a interconexão entre desenvolvimento cognitivo e aprendizagem. Sua teoria enfatiza que o processo de aprendizagem ocorre à medida que os indivíduos se desenvolvem. Isso implica que os educadores devem respeitar o momento em que os alunos estão preparados para absorver um determinado conteúdo.

A equilibração, um conceito central na teoria de Piaget, envolve a busca de equilíbrio entre o conhecimento prévio e a nova informação. Isso ressalta a importância de permitir que os alunos se engajem ativamente no processo de aprendizado, experimentando desequilíbrios e, em seguida, trabalhando para restaurar o equilíbrio por meio da assimilação e acomodação. Os educadores desempenham um papel fundamental nesse processo, fornecendo experiências desafiadoras e apoiando os alunos na resolução de conflitos cognitivos.

Ele revolucionou a maneira de pensar com relação às crianças. Até então, a teoria pedagógica tradicional afirmava que as crianças eram “caixas vazias” esperando que os adultos depositassem conhecimento. Na Teoria de Jean Piaget acredita-se que as crianças passam a construir seu mundo de acordo com o que lhes é oferecido, criando e testando suas teorias. Nesse percurso é possível, então, afirmar que Jean Piaget ofereceu uma teoria interacionista em contraposição à teoria comportamentalista que existia na época (Gomes; Ghedin, 2012).

Piaget (1970) propôs que as crianças são ativas construtoras de conhecimento, e essa noção alterou fundamentalmente a maneira como os educadores abordam o ensino. Conforme observado por Piaget (1970), a aprendizagem constitui um processo dinâmico e participativo, no qual se desenvolvem novos conhecimentos a partir das experiências anteriores. Essa perspectiva desafiou o tradicional modelo de educação centrado no professor, favorecendo uma abordagem centrada no aluno, na qual o educador atua como facilitador do processo de construção do conhecimento pelo aluno.

Além disso, Piaget (2013) ressalta a importância do interesse do aprendiz, que está diretamente ligado ao seu esforço, então facilitando o processo de acomodação e assimilação. Dessa forma, um ponto importante a ser discutido é a didática utilizada em sala de aula, bem como o relacionamento de alunos e professores. Não existem métodos de ensino gerais corretos, como uma receita a ser seguida, mas sim técnicas que se adequam melhor à situação de aprendizagem proposta. Dado que a aprendizagem é um processo individual, o professor deve levar em consideração a formação de cada turma ao escolher os procedimentos metodológicos mais apropriados para os alunos em questão.

De acordo com Lefrançois (2008), a teoria de Piaget teve um impacto significativo no currículo escolar, uma vez que destacou que a aprendizagem vai além da simples transferência de informações de fora para dentro da criança. No entanto, é importante ressaltar que essa também é uma teoria da aprendizagem, uma vez que o processo de aprendizagem só ocorre quando há desenvolvimento.

                                                                                                        Fonte: https://www.todamateria.com.br

No contexto da psicologia escolar, o psicólogo desempenha um papel essencial na promoção das ideias de Piaget. Ele aplica conhecimentos psicológicos na escola, diagnosticando e orientando psicologicamente os alunos. Além disso, promove a integração entre família, comunidade e escola, contribuindo para o desenvolvimento integral dos estudantes.

Os psicólogos escolares desempenham um papel crucial na implementação desses princípios na prática. Conforme a Resolução nº 013/2007, eles aplicam conhecimentos psicológicos na escola, diagnosticam e orientam psicologicamente, promovem a integração entre família, comunidade e escola, e desenvolvem programas visando o desenvolvimento humano e a qualidade de vida. Eles também são responsáveis por validar instrumentos psicológicos e pesquisar a realidade escolar.

No entanto, é fundamental que os psicólogos escolares atuem considerando a dimensão institucional, ultrapassando a queixa individual para compreender o contexto educacional como um todo. O trabalho em parceria com agentes educacionais e a comunidade escolar é essencial para qualificar o processo educacional.

Os psicólogos escolares devem respeitar o sigilo profissional e agir de acordo com o Código de Ética Profissional da Psicologia, garantindo a confidencialidade e a proteção da intimidade dos indivíduos. Além disso, devem evitar a negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, colaborando com outros profissionais quando necessário.

Portanto, as contribuições de Jean Piaget para a psicologia escolar atual e a educação são profundas e duradouras. Sua teoria do desenvolvimento cognitivo redefiniu a relação entre educadores e alunos, promovendo uma abordagem centrada no aluno e encorajando a construção ativa do conhecimento. Os psicólogos escolares desempenham um papel fundamental na aplicação desses princípios na prática, contribuindo para a criação de ambientes de aprendizagem mais eficazes e respeitando o desenvolvimento cognitivo individual de cada aluno.

Essa abordagem não apenas transformou a educação, mas também empoderou os alunos a se tornarem agentes ativos na busca pelo conhecimento. Em vez de serem receptores passivos, as crianças e jovens se tornam construtores ativos de seu próprio entendimento, capacitando-os a enfrentar desafios complexos e a se tornarem cidadãos críticos e engajados na sociedade. Jean Piaget, com sua abordagem revolucionária, deixou um legado duradouro na educação e na psicologia escolar, influenciando positivamente a maneira como ensinamos e aprendemos.

Referências

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução CFP N.º 013. 2007

GOMES, Ruth Cristina Soares GHEDIN, Evandro. Teorias Psicopedagógicos do Ensino Aprendizagem. O desenvolvimento cognitivo na visão de Jean Piaget. Boa Vista: UERR Editora, 2012, p. 215- 232. Disponível em: <http://evandroghedin.com.br/files/Texto_Teorias_Psicopedagogicas_Evandro_Ghedin.pdf> Acessado em 20 de set. de 2023.

LEFRANÇOIS, G. R. Teorias da Aprendizagem. São Paulo: Cengage, 2008.

PIAGET, J. Epistemologia Genética. Tradução de Os Pensadores. Abril Cultural, 1970.

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A Lista do Ódio: o bullying no contexto escolar

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A obra de Jennifer Brown leva o leitor a refletir acerca das consequências do bullying nas escolas de diferentes pontos de vista.

 “A Lista do Ódio” narra a história de Valerie, abordando os eventos que antecedem, ocorrem durante e sucedem a um tiroteio na escola onde cursa o ensino médio. O responsável por esse ato é seu namorado, Nick, cujos alvos são pessoas mencionadas na lista do ódio que Valerie inadvertidamente criou. Inicialmente concebida sem a intenção de prejudicar alguém, a lista toma um rumo inesperado quando Nick decide adotar medidas extremas.

Nick Levil, o namorado de Valerie Leftman, disparou contra vários colegas na cantina de sua escola. Valerie, ao tentar detê-lo, foi atingida, mas acabou salvando a vida de uma colega que a maltratava. No entanto, ela é responsabilizada pela tragédia devido a uma lista que ajudou a criar, contendo os nomes dos estudantes que praticavam bullying contra eles, a lista que Nick usou para escolher seus alvos. Agora, se recuperando do ferimento e do trauma, Val enfrenta a dura realidade de retornar à escola para concluir o Ensino Médio.

Assombrada pela memória de seu ex-namorado, enfrentando problemas familiares, conflitos com ex-amigos e a garota que salvou, Val precisa confrontar seus fantasmas e encontrar seu papel nesta história em que todos são, ao mesmo tempo, responsáveis e vítimas.

Em “A Lista do Ódio,” a narrativa oscila entre passado e presente. No passado, somos transportados para o relacionamento intenso entre a protagonista, Valerie, e seu então namorado, Nick. A conexão entre eles era profunda, marcada por um estilo de vida alternativo e pelo constante bullying que enfrentavam. Para Nick, esse tormento era agravado pelos abusos que sofria em casa.

No presente, Valerie está sozinha, confrontando a dor da perda. Nick, após abrir fogo na cafeteria da escola, tirou a própria vida. Seus alvos eram aqueles responsáveis pelo bullying, cujos nomes estavam meticulosamente registrados na Lista do Ódio, um caderno mantido em segredo por ele e Valerie. Para Valerie, a lista serviu como uma válvula de escape, enquanto para Nick, tornou-se uma fonte de motivação para vingança. Mesmo tendo evitado que o massacre fosse ainda mais grave, o retorno à escola após a recuperação de Valerie está longe de ser simples. A narrativa segue Valerie enquanto ela relembra o passado, buscando compreender onde falhou ao não perceber os planos de Nick. Ao mesmo tempo, enfrenta o presente, lidando com olhares carregados de ressentimento e acusações veladas dirigidas a ela.

A jornada de Val ao longo da trama é marcada por sua luta para se reintegrar ao mundo. A culpa a consome, e a vergonha a faz hesitar em retornar à escola. As lembranças do tiroteio a assombram, dificultando até mesmo a abertura para uma improvável amizade com Jessica, a garota que ela salvou ao interpor-se entre Nick e ela, uma das que mais a atormentavam.

Com o tempo, Valerie percebe que o massacre no Colégio Garvin deixou marcas profundas não apenas nela, mas também nos demais alunos, incluindo Jessica. Enquanto se recupera, Val enfrenta a necessidade de se redescobrir e se adaptar a uma nova realidade, na qual seus planos foram alterados. Nessa jornada, encontra apoio fundamental no terapeuta, o Dr. Hieler, que se revela um personagem secundário exemplar.

Os flashes do presente revelam seu reencontro com as vítimas sobreviventes, amigos, pessoas mencionadas na lista que conseguiram sobreviver, professores e adultos responsáveis que parecem tão perdidos quanto ela, incapazes de lidar com a situação. Além disso, exploram a dinâmica de sua relação com os pais e o irmão.

Nesse contexto, a terapia se revela essencial na trama, proporcionando a Val um caminho para superar seus traumas. Em contraste com obras que muitas vezes falham em indicar um caminho de superação, “A Lista do Ódio” se destaca ao abordar de maneira eficaz o processo de recuperação de sua protagonista.

                                                                                                                                                 Fonte: Pixabay

Entre as diversas formas de violência que ocorrem entre colegas escolares, o bullying destaca-se como a mais prevalente, sendo observado em grande parte das escolas, independentemente de serem públicas ou privadas, e em diferentes níveis de ensino (Malta et al., 2014). O bullying é um fenômeno intrincado, multidimensional e relacional entre pares, sendo caracterizado por comportamentos violentos, repetitivos e intencionais, que ocorrem ao longo do tempo em relações marcadas pelo desequilíbrio de poder e por diversas formas de manifestação (Olweus, 2013).

Fante (2005, 2008) apresentou que o conceito de bullying engloba um fenômeno caracterizado por ações agressivas e gratuitas direcionadas a uma mesma vítima, ocorrendo de forma contínua ao longo de um período prolongado e é marcado por um desequilíbrio de poder. Essa forma de agressão se distingue de outras, uma vez que é repetitiva, deliberada e intencional, não se referindo a divergências de pontos de vista ou ideias contrárias que possam provocar desentendimentos e brigas.

A gravidade dos atos de incivilidade, intimidações, assédio ou qualquer termo associado ao bullying reside, principalmente, em sua persistência. Tal continuidade provoca nas vítimas sensações de abandono e insegurança, ao passo que proporciona aos agressores a sensação de impunidade e poder, também mencionou Fante (2008a).

Schäfer (2005) abordou que os autores de bullying são indivíduos que realizam agressões contra seus colegas, visando vitimizar aqueles mais vulneráveis e utilizando a agressividade como meio de impor sua liderança em determinado grupo. Tendem a humilhar seus colegas como estratégia para obter valorização social. São frequentemente hábeis em empregar esse poder sobre colegas mais suscetíveis, incapazes de resistir às agressões.

Embora o papel inicial do psicólogo escolar/educacional tenha sido predominantemente clínico, concentrando-se na identificação de alunos com distúrbios de aprendizagem, problemas de conduta e de personalidade, observa-se que, na contemporaneidade, a atuação desse profissional está evoluindo em direção a uma abordagem mais social (Del Prette; Del Prette, 1996).

O exercício da psicologia escolar/educacional requer a habilidade de analisar e compreender as diversas relações presentes na instituição escolar e entre os agentes envolvidos, enquanto identifica as necessidades e oportunidades de aprimoramento dessas relações. Portanto, o profissional de Psicologia se depara com o desafio de direcionar sua atuação para a complexidade dos processos interativos que ocorrem no ambiente escolar (Del Prette; Del Prette, 1996).

Idoeta (2019) ao falar sobre a seleção da escola como palco para a execução de um ataque disse estar vinculado à frustração social do perpetrador, percebendo-o como um ato simbólico no qual a instituição escolar, na realidade, representa a sociedade como um todo. Dessa forma, torna-se imprescindível abordar o tema do bullying como possível agravante social no contexto escolar.

A partir desse entendimento, mostra-se de suma importância estabelecer de maneira nítida qual é o papel dos educadores e da instituição escolar na promoção e prevenção de situações de violência. Segundo Lins (2010), o bullying passou a ser reconhecido como um “problema de saúde pública”, exigindo o reconhecimento e a intervenção de profissionais especializados de áreas específicas. A abordagem eficaz e segura do bullying requer a colaboração conjunta de profissionais da saúde, pais, professores e gestores.

A interação desses agentes é vital para observar o comportamento dos alunos na escola, em casa e nos ambientes sociais de interação, considerando as condições psicopedagógicas, o ambiente físico da escola e as dinâmicas familiares. É fundamental que crianças e adolescentes cultivem relações saudáveis com colegas na escola, uma vez que isso contribui para o desenvolvimento social, previne o estresse psicossocial e fortalece a saúde individual.

Cada indivíduo deve ser motivado a enfrentar desafios, integrar-se em grupos sociais e ser estimulado a comunicar a outros caso experiencie agressões ou testemunhe atos de violência. É crucial que os educadores passem por treinamento para identificar situações de bullying e saibam como lidar com alunos envolvidos nesse processo, fornecendo a devida orientação quando necessário aos profissionais da saúde (Almeida; Silva; Campos, 2019).

Silva (2010) destaca a crucial importância da identificação precoce do bullying por parte de pais e professores, considerando que as crianças frequentemente omitem o sofrimento ou constrangimento vivenciado na escola, seja por receio de represálias ou de vergonha. O bullying é um fenômeno prevalente no contexto escolar, ressaltando a gravidade de uma realidade que causa consideráveis danos aos envolvidos em diversas escolas ao redor do mundo.

Frente aos desafios encontrados no ambiente escolar e na comunidade escolar como um todo, a Psicologia Escolar atua no sentido de mitigar discrepâncias, abordar dificuldades de aprendizagem e buscar estabelecer uma harmonia no ambiente educacional. No que diz respeito às intervenções nos espaços escolares, Marinho-Araújo e Almeida (2005) recomendam a realização de um mapeamento institucional, visando reunir evidências, investigar, analisar, discutir, refletir e colaborar na elaboração do projeto político-pedagógico (PPP) da instituição. A escuta psicológica, sendo a essência da cena no ‘espaço escolar’, é de considerável importância, pois revela as experiências das pessoas envolvidas nesse contexto.

 

 

REFERÊNCIAS

  1. ALMEIDA, K. L.; SILVA, A. C.; CAMPOS, J. S. Importância da identificação precoce da ocorrência do bullying: uma revisão de literatura. Rev. Pediatri,v. 9, n. 1, p.8-16, jun./ago. 2019.
  2. DEL  PRETTE,  Z.  A.  P.;  DEL  PRETTE,A. Habilidades  envolvidas  na  atuação  do  Psicólogo Escolar/Educacional.In: WECHSLER, S.  M. (Org.). Psicologia  escolar: pesquisa,  formação  e prática. Campinas, SP: Alínea, 1996, p. 139-156.
  3. FANTE, C. Brincadeiras perversas. Viver Mente e Cérebro, ano XV, 181, 74-79, 2008a.
  4. FANTE, C., PEDRA, J. A. Bullying escolar: perguntas e respostas Porto Alegre: Artmed, 2008.
  5. FANTE, Cleo. Fenômeno Bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para paz. 2.ed. ver. E ampl. Campinas: Versus Editora, 2005.
  6. IDOETA, Paula Adamo. Massacre em escola de Suzano: Padrão de atiradores envolve crise de masculinidade e fetiche por armas, dizem especialistas. BBC News Brasil. São Paulo, 16 de mar. de 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-47573154. Acesso em: 09 de nov. de 2023.
  7. LINS, R. C. B. S. Bullying: Que fenômeno é esse? Revista Pedagógica Inaugural, 2010.
  8. MALTA, D. C. et al. Bullying em escolares brasileiros: análise da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE 2012). Revista Brasileira de Epidemiologia, 17, 92-105, 2014.
  9. MARINHO-ARAUJO, C. M.; ALMEIDA, S. F. C. Psicologia Escolar: construção e consolidação da identidade profissional. Campinas: Alínea, 2005.
  10. OLWEUS, D. School bullying: Development and some important challenges. Annual Review of Clinical Psychology, 9, 751-780, 2013. doi: https://doi.org/10.1146/annurev-clinpsy-050212-185516
  11. SCHÄFER, M. Abaixo os valentões. Viver Mente e Cérebro Ano XIII, 152, 78-83, 2005.
  12. SILVA, A. B. Bullying: mentes perigosas nas escolas. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.
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“Matilda” – as relações no ambiente escolar e o impacto no desempenho das crianças

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O meio educacional pode ter grande influência no desempenho e desenvolvimento da criança nas escolas.

Matilda é um filme de comédia e fantasia baseado no livro homônimo de Roald Dahl. Lançado em 1996 e dirigido por Danny DeVito, o filme conta a história de Matilda Wormwood, uma criança prodigiosa e inteligente, cuja família a trata com negligência e desdém. Enquanto seus pais estão envolvidos em esquemas de golpes, Matilda descobre que possui habilidades telecinéticas, que ela começa a desenvolver e controlar.

Matilda enfrenta dificuldades na escola, onde a diretora tirânica, a Senhorita Trunchbull, faz da vida dos alunos um verdadeiro inferno. Com seu intelecto e poderes especiais, Matilda começa a lutar contra a injustiça na escola, ajudando seus amigos e buscando justiça contra a Senhorita Trunchbull.

Através da amizade com sua professora, a Senhorita Honey, Matilda encontra apoio e compreensão. Juntas, elas buscam enfrentar os desafios e traumas do passado de Matilda e da Senhorita Honey, criando um laço forte entre elas.

O filme aborda temas de empoderamento infantil, família disfuncional, amizade e superação. Com um toque de magia e humor, “Matilda” captura a jornada de uma criança excepcional que usa sua inteligência e habilidades especiais para conquistar seu lugar no mundo e fazer a diferença na vida daqueles ao seu redor.

A relação entre Matilda e a diretora Trunchbull é central para a trama do filme “Matilda”. A Senhorita Trunchbull é retratada como uma figura autoritária, tirânica e cruel na escola em que Matilda estuda. Ela é conhecida por impor regras rigorosas e aplicar punições severas aos alunos, muitas vezes de forma injusta e abusiva.

Matilda, por outro lado, é uma criança extremamente inteligente e sensível, que enfrenta desafios tanto em casa, com pais negligentes e desinteressados, quanto na escola, devido à opressão da Senhorita Trunchbull. A relação entre Matilda e a Senhorita Trunchbull é marcada por conflito, já que Matilda é uma das poucas crianças que ousa desafiar a autoridade e injustiça da diretora.

A habilidade telecinética de Matilda adiciona um elemento único à relação, permitindo que ela enfrente a Senhorita Trunchbull de maneiras criativas e, muitas vezes, humorísticas. Matilda usa suas habilidades para realizar pequenos atos de vingança, como mover objetos ou pregar peças na diretora, o que serve para aliviar a tensão e proporcionar momentos engraçados no filme.

A relação entre Matilda e a Senhorita Trunchbull culmina em um confronto emocionante e climático, onde Matilda usa suas habilidades para expor a verdade sobre os abusos e injustiças cometidos pela diretora. Esse confronto não apenas empodera Matilda, mas também ajuda a libertar a escola da opressão da Senhorita Trunchbull.

No geral, a relação entre Matilda e a diretora Trunchbull representa o conflito entre a inocência e a maldade, a inteligência e a ignorância, e o desejo de justiça contra a opressão. Através desse relacionamento, o filme explora temas de coragem, resistência e o poder de usar habilidades únicas para enfrentar adversidades.

                                                                                                                        Fonte: https://l1nk.dev/Is0uc

Por outro lado, a relação entre Matilda e a professora, a Senhorita Honey, é uma das partes mais tocantes e positivas do filme “Matilda”. A Senhorita Honey é a única figura de autoridade na vida de Matilda que demonstra compreensão, bondade e apoio genuíno. Essa relação desempenha um papel crucial no desenvolvimento emocional e no crescimento de Matilda ao longo da história.

Desde o início, a Senhorita Honey reconhece a inteligência excepcional de Matilda e fica impressionada com suas habilidades. Ela percebe que Matilda está subutilizada na escola e a ajuda a avançar academicamente, fornecendo-lhe livros e desafios mais avançados. Além disso, ela demonstra interesse pelo bem-estar emocional de Matilda, percebendo os desafios que ela enfrenta em casa e na escola.

A relação entre Matilda e a Senhorita Honey se baseia em confiança mútua e respeito. A Senhorita Honey não apenas apoia o crescimento intelectual de Matilda, mas também a encoraja a explorar suas habilidades especiais e a enfrentar a injustiça. Ela serve como um modelo de adulto amoroso e responsável, contrastando com as figuras negligentes e abusivas que cercam Matilda.

Conforme a história avança, Matilda e a Senhorita Honey desenvolvem um vínculo forte e emocional. Matilda é atraída pela gentileza e empatia da Senhorita Honey, enquanto a professora vê em Matilda uma oportunidade de ajudar uma criança talentosa a prosperar.

                                                                                                                   Fonte: https://sk.pinterest.com/

Relações ruins com os educadores e membros da administração escolar podem afetar o desempenho de uma criança na vida escolar de diversas maneiras. De acordo com Baker (2006), a natureza da relação entre professor e aluno é um indicador poderoso da adaptação escolar, especialmente quando se trata de crianças que demonstram problemas comportamentais na sala de aula.

Baker (2006) ressalta adicionalmente que a interação entre professor e aluno é fundamental para estimular o envolvimento das crianças no processo de aprendizagem. Além disso, ela serve como alicerce para a formação de crenças adaptativas em relação a si mesmas e ao mundo social, bem como para a aquisição de habilidades autorreguladoras e socioemocionais, que são elementos cruciais no contexto escolar.

Assim, uma criança que enfrenta falta de apoio, tratamento injusto ou desrespeito por parte dos professores, diretores ou coordenadores, isso pode ter consequências negativas em seu bem-estar emocional e mental. Isso pode levar a baixa autoestima, ansiedade, depressão e falta de motivação para participar ativamente nas atividades escolares.

Birch e Ladd (1997) complementam que crianças que desfrutam de uma relação mais estreita com o professor tendem a enxergar o ambiente escolar como uma fonte de apoio, o que contribui para a formação de atitudes positivas em relação à escola. Essas crianças sentem-se à vontade para compartilhar seus sentimentos e inquietações, permitindo-lhes buscar ajuda e orientação de maneira apropriada enquanto se esforçam para se adaptar ao ambiente escolar.

Dessa forma, relações positivas com os educadores e membros da administração têm um impacto significativo no desempenho escolar de uma criança. O apoio e o incentivo vindos dos professores, diretores e coordenadores podem criar um ambiente onde a criança se sente valorizada e encorajada. Isso pode levar a uma maior autoconfiança, motivação para aprender, participação ativa em sala de aula e busca de oportunidades extracurriculares.

Cultivar um relacionamento positivo com os estudantes pode desempenhar um papel preventivo em relação a questões disciplinares dentro da escola. Além disso, essa dinâmica pode contribuir para reduzir o estresse e a exaustão do professor, enquanto promove o crescimento profissional do educador (Fraser; Walberg, 2005; Wubbels, 2005).

As interações com os educadores e membros da administração também podem influenciar a percepção que a criança tem de si mesma. Relações positivas com esses adultos responsáveis pela educação podem ajudar a desenvolver uma imagem positiva de si mesma e de sua identidade, promovendo um ambiente de respeito mútuo e aceitação.

Em resumo, relações ruins com os educadores e membros da administração podem prejudicar o desenvolvimento acadêmico e emocional de uma criança, enquanto relações positivas têm o potencial de fortalecer sua confiança, motivação e envolvimento na vida escolar.

Um psicólogo pode intervir em situações em que uma criança enfrenta relações negativas com educadores e membros da administração escolar. Eles podem oferecer aconselhamento individual para que a criança expresse seus sentimentos, desenvolver habilidades sociais e emocionais para lidar com desafios.

Ademais, os psicólogos escolares desempenham um papel crucial na prevenção e intervenção em questões comportamentais. Eles utilizam abordagens teóricas, como a teoria cognitivo-comportamental, para ajudar os alunos a desenvolver habilidades de autorregulação emocional e social. Como Bandura (1986) destacou, “A autoeficácia é fundamental para a regulação do comportamento. As pessoas que acreditam que podem executar ações específicas tendem a se esforçar mais e a persistir mais diante de desafios”. Os psicólogos escolares trabalham para fortalecer a autoeficácia dos alunos, ajudando-os a lidar com situações de conflito, bullying e outros desafios sociais.

Outra área de atuação importante dos psicólogos escolares é a orientação vocacional. Através de abordagens baseadas na teoria do desenvolvimento de Erikson, eles auxiliam os alunos na exploração de suas identidades vocacionais e no planejamento de suas trajetórias acadêmicas e profissionais. Como Erikson (1959) afirmou, “A identidade profissional é uma parte crucial do desenvolvimento do ego na adolescência”. Os psicólogos escolares orientam os estudantes na tomada de decisões importantes relacionadas à educação e carreira.

Além disso, atuar como mediador na comunicação entre a criança e os educadores, fornecer orientação aos pais para melhor apoiar a criança, defender medidas apropriadas junto à escola em casos mais graves, ensinar estratégias de resiliência para enfrentar desafios, acompanhar o progresso ao longo do tempo e garantir o apoio contínuo da criança. No geral, um psicólogo ajuda a criança a lidar emocionalmente com as relações ruins e a desenvolver as habilidades necessárias para enfrentar positivamente a vida escolar.

 

 

REFERÊNCIAS

  1. Baker, J. A. (2006). Contribuições das relações professor-criança para a adaptação escolar positiva durante o ensino fundamental. Revista de Psicologia Escolar e Educacional, 44, 211-229.
  2. Birch, S. H., & Ladd, G. W. (1997). A relação professor-criança e a adaptação escolar inicial das crianças. Revista de Psicologia Escolar e Educacional, 35 (1), 61-79.
  3. Fraser, B. J., & Walberg, H. J. (2005). Pesquisa sobre relações professor-aluno e ambientes de aprendizagem: contexto, retrospectiva e perspectiva. Revista Internacional de Pesquisa Educacional, 43, 103-109.
  4. Wubbels, T. (2005). Editorial: Percepções dos estudantes sobre as relações professor-aluno na sala de aula. Revista Internacional de Pesquisa Educacional, 43, 1-5.
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Os desafios encontrados pelos atendentes terapêuticos no âmbito escolar

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Entrevista com a Coordenadora Escolar ABA e as dificuldades encontradas por Atendentes Terapêuticos no contexto escolar.

(En)Cena entrevista a pedagoga Janaina Alves de Oliveira. Formada em Licenciatura Plena em Pedagogia na Universidade Estadual de Goiás (UEG), interessou-se por disciplinas como “Educação Especial e Inclusão” e “Psicologia da Educação – Desenvolvimento e Aprendizagem”, que nortearam sua especialização.

É pós-graduada em Neuropsicopedagogia pela Faculdade de Tecnologia e Educação Superior Profissional – FATESP e pós-graduanda em Intervenção ABA para Autismo e Deficiência Intelectual pela CBI of MIAMI.

Faz parte da equipe ABA do Instituto Psiquê – Neurociência e Saúde desde o ano de 2021, tendo iniciado como Assistente Terapêutica Escolar e Clínica, em seguida tornando-se Assistente de Coordenação Técnica e, hoje, atuando como Coordenadora ABA Escolar.

(En)Cena: Os Atendentes Terapêuticos desempenham um papel vital nas escolas, apoiando alunos com necessidades emocionais e comportamentais. Quais são as principais responsabilidades dos Atendentes Terapêuticos escolares?

Janaina: Os Assistentes Terapêuticos estão presentes nas escolas para facilitar a inclusão e desenvolvimentos dos aprendizes, com foco comportamental.  Os atendentes manejam comportamentos de crise, auxiliam na estimulação de habilidades sociais e estão atentos às dificuldades pedagógicas dos aprendizes, assim sinalizando as habilidades que precisam ser trabalhadas com mais ênfase.

(En)Cena: Como coordenadora, qual é o seu papel na capacitação e no apoio contínuo aos Atendentes Terapêuticos em sua equipe?

Janaina: Como coordenadora ABA, sou responsável por supervisionar os atendimentos escolares e por auxiliar os Assistentes Terapêuticos, tirando dúvidas, ajudando a manejar os comportamentos e aplicar programas. Também organizo os planos de ensino, visando os alvos necessários para cada aprendiz.

(En)Cena: Trabalhar em conjunto com professores e outros profissionais da escola é essencial. Como vocês promovem uma colaboração eficaz entre os Atendentes Terapêuticos e a equipe escolar?

Janaina: O objetivo é estarmos alinhados com as escolas para melhorar a qualidade da Intervenção ABA, estimulando, assim, o desenvolvimento dos aprendizes. Reuniões são realizadas com frequência para troca de informações e alinhamento de condutas e objetivos. O ABA está dentro das escolas para somar com o trabalho dos professores e corpo docente, respeitando o espaço dos profissionais e dando autonomia para os professores e oferecendo suporte quando necessário.

(En)Cena: Como vocês promovem a autonomia e a capacitação dos alunos, ajudando-os a desenvolver habilidades emocionais e comportamentais que possam usar independentemente?

Janaina: Cada aprendiz tem o seu plano de ensino individualizado, onde traçamos habilidades que estão em déficit e devem ser estimuladas. Utilizamos um aplicativo onde o assistente alimenta diariamente com informações como: se houve a aplicação do programa de ensino da habilidade em déficit e porcentagem de independência do aprendiz naquela habilidade. Existem níveis de ajudas necessárias para ajudar que o aprendiz adquira a habilidade e a realize de forma independente.

(En)Cena: É provável que os Atendentes Terapêuticos enfrentem desafios diversos ao trabalhar no ambiente escolar. Poderia compartilhar quais são os desafios mais comuns que eles enfrentam e como lidam com essas situações?

Janaina: Pouco se é dito sobre a importante e a função do assistente terapêutico escolar, enfrentamos dificuldades como: falta de espaço para manejo de comportamentos e terceirização do ensino, onde o assistente fica responsável pela vida acadêmica do aprendiz. Ainda há falta dos planos de ensino individualizado elaborados pelas escolas e adaptação curricular.

(En)Cena: Hoje, sabemos que nem todas as crianças conseguem acesso a um acompanhamento escolar quando necessitam. Como isso pode afetar o desenvolvimento do estudante?

Janaina: A falta de profissionais capacitados impacta na evolução do aprendiz, sem o suporte necessário, novas habilidades não serão adquiridas devido à falta de estimulação.

(En)Cena: Como é o preparo da equipe escolar para receber e lidar com crianças neurodivergentes? Quais são as maiores dificuldades relacionadas à docência?

Janaina: As escolas deveriam ter uma equipe especializada com formações continuadas voltadas ao público neurodivergente, porém não é a realidade que encontramos na maioria das escolas. No instituto temos a política de envio de documentações com as atribuições do assistente terapêutico e documentos pessoais. Nossos profissionais realizam formações continuadas, solicitamos reuniões com toda equipe (clínica e escola) para sanar dúvidas e repassar orientações, além de nos disponibilizarmos para ministrar palestras e rodas de conversa.

(En)Cena: De que forma a família pode ajudar no processo de aprendizagem das crianças neurodivergentes?

Janaina: A família é o principal responsável nesse processo, e é quem mais tem a contribuir com o desenvolvimento. Estar alinhado com os métodos e estratégias fazem toda diferença no processo terapêutico. É com a família que o aprendiz passar maior parte do tempo e tem mais oportunidade de generalizar os comportamentos aprendidos em ambiente clínico e escolar.

(En)Cena: Como tem sido sua experiência ao trabalhar com essa profissão tão essencial para o desempenho e crescimento das crianças?

Janaina: É enriquecedor trabalhar na área. Perceber as particularidades de cada aprendiz, contribuir com os ganhos de habilidade e ver os progressos não tem preço. É uma área essencial e de grande contribuição social.

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Relações conturbadas: como ficam os filhos após o divórcio?

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O divórcio é um desafio não apenas para o casal, mas também para os filhos envolvidos no processo, e pode acarretar em uma série de problemas para o convívio familiar.

O divórcio é o processo legal que dissolve o vínculo matrimonial entre duas pessoas. É uma decisão difícil e muitas vezes dolorosa, marcando o fim de um casamento ou união estável. O divórcio pode ser resultado de diversos fatores, como incompatibilidade, problemas de comunicação, infidelidade, abuso, divergências irreconciliáveis ou simplesmente a constatação de que o relacionamento não é mais saudável.

A separação pode ocorrer de maneira amigável, em que ambas as partes mantêm uma relação de amizade e resolvem seus conflitos sem recorrer a meios judiciais. Por outro lado, pode ser um processo mais difícil, caracterizado por intensas brigas, resultando em sentimentos de mágoa, tristeza e rancor. Além disso, é importante destacar que o divórcio afeta não apenas os cônjuges, mas também os filhos, a família e a rede de apoio envolvida. Pode ser um período emocionalmente desafiador, com sentimentos de tristeza, raiva, frustração e confusão.

Em muitos casos, como traz Amato (2000), o divórcio representa uma perda tanto para o casal, como para os filhos. A partir disso, acarreta em um desajustamento emocional e provoca sofrimentos para todos os envolvidos da família, principalmente quando o casal possui filhos menores.

Dessa forma, o divórcio se configura como sendo um processo complexo e longo, que traz diversas mudanças aos membros da família. Martins (2010) aborda o assunto ao dizer que mostra-se necessário um período de cerca de quatro anos para que todos os envolvidos consigam realizar os ajustamentos familiares apropriados após a separação.

Quando discutimos o divórcio, é comum que o foco esteja nos cônjuges, porém é essencial direcionar uma atenção especial às crianças e adolescentes, pois eles são mais propensos a desenvolver transtornos de ansiedade, depressão e outros problemas psicológicos. Portanto, torna-se importante discorrer sobre os impactos causados pelo processo nos filhos envolvidos. O divórcio pode ter um resultado significativo, pois envolve uma grande mudança na estrutura familiar e na dinâmica do relacionamento dos pais. No entanto, é importante observar que o impacto varia de criança para criança, dependendo de vários fatores, como idade, personalidade, nível de apoio emocional e como os pais lidam com a situação.

Hetherington (2005) alega que crianças com temperamento mais fácil, responsáveis, inteligentes e socialmente sensíveis possuem mais probabilidade a uma adaptação positiva diante das mudanças no sistema familiar. Kelly e Emery (2003) relatam que fatores como a autoestima, habilidades cognitivas e independência da criança, juntamente com o apoio social, também estão correlacionados de maneira positiva com uma melhor adaptação infantil.

Além do mencionado anteriormente, existem outros fatores que também contribuem para uma adaptação melhor ou pior a essa mudança. Esses fatores incluem a frequência e qualidade do contato com o pai ou mãe não guardião, o ajuste psicológico e habilidades parentais do pai ou mãe guardião, o nível de conflito entre os pais após a separação ou divórcio, o nível de dificuldades socioeconômicas e a quantidade de eventos estressantes adicionais que afetam a vida familiar, como abordado por Souza (2000).

Os sintomas relacionados a essa mudança familiar podem ser observados tanto a curto quanto a longo prazo, abrangendo aspectos cognitivos, emocionais e/ou comportamentais, e podem se manifestar em diversos contextos, como o ambiente escolar e social. Torna-se normal observar que após passarem pelo fenômeno do divórcio, grande parte das crianças ou adolescentes enfrentam desafios emocionais e comportamentais. Esse acontecimento pode incluir sentimentos de tristeza, raiva, ressentimento, demandas excessivas, ansiedade, depressão, agressividade, culpa, baixa autoestima e dificuldades para lidar com a confusão e preocupações resultantes das mudanças nas relações familiares e em sua situação de vida, aborda Berger (2003).

Além disso, outro problema abordado pelos estudiosos é a nova dinâmica financeira do lar. A falta de recursos econômicos pode acarretar diversos problemas para a criança, como menor conforto, qualidade de vida e oportunidades de estudar em boas escolas. Além disso, os momentos de lazer e cultura podem se tornar raros, atividades essenciais para o desenvolvimento social e cognitivo da criança. Os pais também podem enfrentar alterações de humor e estresse devido à impossibilidade de prover os cuidados necessários para a criança.

De acordo com Amato e Keith (1991), é possível observar que, como resultado da separação dos pais, as crianças na fase da infância podem apresentar diversos impactos negativos, tais como baixo rendimento escolar, baixa competência social, redução do nível de autoestima e dificuldades de ajustamento psicológico. Além disso, os adolescentes podem manifestar comportamentos delinquentes, dificuldades de aprendizagem e até problemas de insônia.

Fonte: Imagem stevepb no Pixabay.

Imagem de contrato de casamento sendo cortado

Diante dessa nova dinâmica familiar, a maioria dos pais sente preocupação em relação ao impacto da separação e divórcio em seus filhos. No entanto, é comum que eles também estejam angustiados e perturbados com seus próprios problemas, o que faz com que estejam menos disponíveis e atentos, e, consequentemente, menos capazes de oferecer suporte e auxílio nessa fase. Como resultado, apresentam Almeida e Monteiro (2012), os filhos acabam expostos a diversas perturbações psicológicas, que podem variar em intensidade. É de se esperar, portanto, que essas crianças expressem insatisfação em relação às suas vidas.

Souza (2000) expressa a importância de fornecer informações claras por parte de ambos os pais é fundamental para que as crianças possam compreender e lidar com a separação. A falta de explicações sobre como será a vida dali em diante é um tema que parece causar grande sofrimento infantil. Muitas vezes, para muitas crianças, é muito cedo para compreender o significado prático dessa situação. Além das mudanças na estrutura e funcionamento da família, a criança também precisa lidar com alterações profundas em sua rotina diária, o que, por si só, é extremamente doloroso e difícil, mesmo para um adulto.

Existe, ainda, o divórcio conflituoso, caracterizado por Glasserman (1989), como sendo destrutivo. Segundo a autora, nesse tipo de divórcio, a relação entre os ex-cônjuges é marcada por constantes conflitos, caracterizados por brigas contínuas com o objetivo de preservar a união. Além disso, há dificuldades no cuidado com os filhos, uma necessidade de ganhar e desvalorizar a imagem do outro, bem como a presença de intermediários litigantes, como membros da família extensa, profissionais da saúde, da escola e do sistema judicial, entre outros.

A cartilha do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aborda uma variedade de temas relacionados ao divórcio dos pais, oferecendo contribuições e dicas para a implementação de medidas que minimizem o impacto nos filhos durante e após o divórcio. O CNJ (2015) destaca que após o divórcio, é comum que os pais adotem comportamentos prejudiciais para os filhos. Isso inclui falar mal um do outro na frente das crianças, usar os filhos como mensageiros ou espiões, discutir na presença deles e dificultar o contato com o outro pai/mãe. Essas atitudes causam ansiedade, estresse, tristeza e prejudicam o desenvolvimento emocional dos filhos.

De acordo com o CNJ (2015), é comum que os pais tenham a percepção de que o divórcio é um problema apenas deles e não dos filhos. No entanto, o divórcio afeta também as crianças e os adolescentes, resultando em grandes mudanças, tais como a perda ou redução da disponibilidade de um dos pais, a queda no padrão de vida, alterações na residência, escola, vizinhança e amizades, o novo casamento de um ou ambos os pais, além do processo de adaptação aos novos membros da família.

As consequências dessas mudanças podem perdurar até a vida adulta, e até mesmo resultar em traumas que podem surgir anos depois. Portanto, é crucial lidar com o divórcio na presença dos filhos com cautela e sensibilidade. Os pais devem orientá-los e explicar as mudanças que acontecerão na vida de todos, além de evitar ao máximo discussões na frente das crianças e adolescentes. É fundamental proporcionar um ambiente seguro e acolhedor para ajudá-los a lidar com as transformações decorrentes do divórcio.

No contexto jurídico, é fundamental que os profissionais que lidam com essas famílias priorizem o bem-estar das crianças e adolescentes envolvidos. Nesse sentido, é necessário dar ênfase aos papéis parentais em detrimento dos papéis conjugais, especialmente em casos nos quais o divórcio se apresenta como um fenômeno destrutivo ao sistema e causador de sofrimento aos filhos envolvidos.

O apoio aos filhos de pais separados/divorciados representa um desafio para os profissionais de saúde mental, uma vez que essa área de intervenção tem enfrentado um aumento significativo de demanda devido ao crescimento das taxas de divórcio observadas nos últimos anos. A literatura tem evidenciado a importância e os benefícios do suporte emocional e psicológico oferecido a crianças e adolescentes que enfrentam dificuldades significativas ao lidar com a separação ou o divórcio de seus pais.

A infância é um período único na vida das pessoas, e deve ser vivido de maneira tranquila e feliz. A saúde mental da criança está diretamente relacionada ao bem-estar dos pais e à qualidade do relacionamento entre eles. Se ela crescer em uma família com conflitos conjugais, corre o risco de absorver o sofrimento do casal sem compreender claramente os motivos que levaram a essa situação. Isso pode prejudicar o desenvolvimento social, emocional e mental da criança, causando traumas que podem perdurar até a vida adulta.

Não é o divórcio em si que causa danos aos membros da família. Seria igualmente prejudicial para as crianças se o casal adiasse a separação em prol delas, mas não fosse capaz de manter uma amizade saudável. O divórcio é melhor compreendido pelos filhos quando os pais conseguem conduzi-lo de forma amigável.

É responsabilidade dos pais ou pessoas próximas da família estarem atentos às mudanças de comportamento ou outros problemas que podem ser causados pelo divórcio. Além disso, os pais devem ser capazes de separar as questões matrimoniais da relação entre os genitores e os filhos, evitando envolver as crianças nos desentendimentos do casal separado.

 

Referências:

ALMEIDA, N.; MONTEIRO, S. Os meus Pais já não Vivem Juntos. Intervenção em Grupo com Crianças e Jovens de Pais Divorciados. Comunicação apresentada no 1º Congresso da OPP: Afirmar Psicólogos, Lisboa, 2012.

AMATO, P. As consequências do divórcio para adultos e crianças. Journal of Marriage and Family, v. 62, p. 1269-1287, 2000.

BERGER, M. A criança e o sofrimento da separação. 2. ed. Lisboa: Climepsi, 2003.

HETHERINGTON, E. Divórcio e ajustamento de crianças. Pediatrics Review, v. 26, n. 5, p. 163-169, 2005.

KELLY, J.; EMERY, R. Ajustamento das crianças após o divórcio: perspectivas de risco e resiliência. Relações Familiares, v. 52, n. 4, p. 352-362, 2003.

MARTINS, A. Impacto do Divórcio Parental no Comportamento dos Filhos. Factores que contribuem para uma melhor adaptação. Implicações Médico-Legais. Dissertação de Mestrado. Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto, Porto, 2010.

SILVA, L. Boas Práticas dos Programas Psicoeducacionais para Pais Separados/Divorciados. Dissertação de Mestrado (Secção de Psicologia Clínica e da Saúde/ Núcleo de Psicoterapia Cognitiva-Comportamental e Integrativa). Universidade de Lisboa, Lisboa, 2012.

SOUZA,  Rosane  Mantilla.  Depois  que  papai  e  mamãe  se  separaram:  um  relato  dos  filhos. Psicologia: Teoria e Pesquisa. São Paulo, 2000, vol. 16. Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/ptp/v16n3/4807.pdf>. Acesso em: 15 set. 2012.

SOUZA, R. Grupos de Apoio para Filhos de Pais Separados e Divorciados. Iberpsicología: Revista Eletrônica da Federação Espanhola de Associações de Psicologia, v. 10, n. 2, p. 579-599, 2005.

 

 

 

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Desafios e transformações na relação conjugal após a chegada do primeiro filho

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Os desafios emocionais, práticos e de ajuste da dinâmica familiar diante da chegada do primeiro filho.

A dinâmica conjugal é um aspecto fundamental nas relações humanas, e a chegada do primeiro filho é um evento significativo que provoca alterações nessa dinâmica.  Segundo a teoria do ciclo de vida familiar, proposta por Duvall (1977), o nascimento de um filho representa uma transição para o casal, que precisa se adaptar às novas demandas e responsabilidades parentais. Essa transição é marcada por mudanças nas rotinas, na divisão de tarefas, na comunicação e na intimidade entre os parceiros. A chegada do bebê demanda uma reorganização das prioridades, tempo e energia, afetando diretamente a relação conjugal.

Um estudo realizado por Doss e Rhoades (2017) destacou que a chegada do primeiro filho pode levar a um aumento na satisfação conjugal para alguns casais, enquanto para outros, pode trazer um declínio na qualidade do relacionamento. Essa variação se deve a diversos fatores, como a adaptação à nova rotina, a divisão de tarefas e responsabilidades, e a gestão do estresse e das demandas familiares.

Um dos principais desafios enfrentados pelos casais é a redistribuição de tarefas e responsabilidades relacionadas ao cuidado dos filhos. Segundo Cowan e Cowan (2014), essa redistribuição pode gerar conflitos, especialmente se não houver uma comunicação aberta e equitativa entre os parceiros. A divisão desigual do trabalho pode levar a sentimentos de sobrecarga e ressentimento, impactando negativamente a satisfação conjugal.

Além disso, a teoria da interdependência, proposta por Kelley e Thibaut (1978), sugere que a presença de filhos pode aumentar os custos percebidos em um relacionamento. O casal pode enfrentar desafios como falta de sono, aumento das responsabilidades financeiras e diminuição da privacidade. Esses fatores podem gerar estresse adicional, levando a conflitos e desgaste na relação conjugal.

Um dos principais impactos da vinda do primeiro filho é a mudança nas responsabilidades domésticas e no papel de cada membro do casal. De acordo com o modelo de divisão de tarefas proposto por Hochschild (1989), há uma tendência culturalmente construída de que as mulheres assumam a maior parte das responsabilidades relacionadas ao cuidado infantil e às tarefas domésticas. Isso pode gerar conflitos e sobrecarga para a mulher, afetando a satisfação conjugal e aumentando o risco de desequilíbrios de gênero na relação.

A teoria da equidade conjugal, desenvolvida por Adams e Jones (1997), argumenta que a percepção de justiça na distribuição de tarefas é fundamental para a satisfação conjugal. No entanto, muitas vezes, as demandas relacionadas aos cuidados infantis recaem de forma desproporcional sobre um dos parceiros, especialmente a mãe. Isso pode levar a sentimentos de sobrecarga, frustração e ressentimento, afetando negativamente a qualidade do relacionamento.

Além disso, o surgimento do primeiro filho também provoca mudanças na comunicação e na intimidade entre os parceiros. Estudos mostram que, muitas vezes, os casais passam a dedicar menos tempo um ao outro e têm menos espaço para a vida conjugal. A atenção e o cuidado são redirecionados para o bebê, o que pode gerar sentimentos de solidão, negligência e desconexão entre os parceiros.

A teoria do apego, desenvolvida por Bowlby (1969), sugere que a relação do casal pode ser afetada pela forma como cada um deles se relaciona com o bebê. Se ambos os parceiros conseguirem desenvolver um apego seguro com a criança, isso pode fortalecer o vínculo conjugal. No entanto, se surgirem dificuldades no processo de adaptação à paternidade e maternidade, como a presença de sintomas de depressão pós-parto, isso pode impactar negativamente a relação conjugal.

Fonte: Imagem PublicCo no Pixabay.

Imagem de pés de bebê sendo segurados por uma mão.

Além dos aspectos já mencionados, é importante considerar as mudanças emocionais e as expectativas que os pais têm em relação ao filho. A chegada de um filho é um momento de grande significado e transformação, repleto de emoções intensas, tanto positivas quanto negativas. Os pais podem experimentar uma ampla gama de sentimentos, como alegria, amor incondicional, preocupação, medo e ansiedade.

Essas mudanças emocionais podem afetar a dinâmica do relacionamento conjugal. Por exemplo, a sobrecarga emocional pode levar a um aumento do estresse e da sensibilidade, o que pode resultar em conflitos e dificuldades de comunicação. As preocupações e ansiedades relacionadas à parentalidade, como o bem-estar do bebê e a capacidade de serem bons pais, podem ser compartilhadas ou expressas de maneiras diferentes por cada um dos parceiros.

Nesse contexto, a capacidade do casal em lidar com essas emoções e em buscar apoio mútuo é crucial para a adaptação à nova realidade. A comunicação aberta e empática é fundamental para expressar as preocupações, medos e expectativas. O compartilhamento dessas emoções pode fortalecer a conexão emocional entre os parceiros e proporcionar um espaço seguro para o apoio mútuo.

Buscar apoio externo também é importante. Amigos, familiares ou grupos de apoio podem desempenhar um papel significativo, proporcionando um espaço de troca de experiências e de suporte emocional. Além disso, a busca de orientação profissional, como a terapia de casal ou aconselhamento parental, pode ser valiosa para auxiliar os pais a lidarem com as emoções e desafios da parentalidade.

As expectativas em relação ao filho também podem influenciar o relacionamento conjugal. Os pais podem ter ideias preconcebidas sobre como será a vida com o filho, alimentando expectativas de perfeição e felicidade constante. No entanto, a realidade muitas vezes é diferente do que foi imaginado, e isso pode gerar frustrações e desapontamentos.

Nesse sentido, é importante que os pais tenham uma visão realista e flexível da parentalidade. Reconhecer que cada criança é única e que haverá momentos de alegria, mas também de desafios, pode ajudar a reduzir a pressão e o estresse. É essencial cultivar a resiliência e a capacidade de adaptação, reconhecendo que a parentalidade é um processo contínuo de aprendizado e crescimento.

Fonte: Imagem aliceabc0 no Pixabay.

Imagem de pés de casal.

Ademais, ainda há a mudança de prioridades e interesses individuais após o nascimento dos filhos. Os pais podem dedicar a maior parte do seu tempo e energia às necessidades dos filhos, deixando de lado atividades e interesses pessoais e de casal. Essa mudança pode gerar sentimentos de perda de identidade e distanciamento entre os parceiros, afetando a qualidade e a vitalidade do relacionamento.

Outro fator importante a ser considerado é a insegurança que assola o relacionamento diante da situação desconhecida. A pressão social e as expectativas idealizadas sobre a parentalidade podem contribuir para as inseguranças. A sociedade muitas vezes impõe um padrão de perfeição, colocando pressão nos pais para que sejam pais exemplares desde o início. Essa pressão pode levar a um sentimento de inadequação quando surgem dificuldades ou quando as coisas não saem como o esperado.

Também é importante ressaltar o impacto da parentalidade na vida sexual do casal. Pesquisas indicam que a frequência e a qualidade das relações sexuais tendem a diminuir após o nascimento dos filhos, como abordaram Cowan & Cowan (2014). A atenção e o desejo podem estar direcionados principalmente para o cuidado dos filhos, deixando menos espaço para a intimidade e a sexualidade do casal. Essa mudança pode gerar frustração e insatisfação sexual, afetando o vínculo conjugal.

Em suma, a chegada do primeiro filho é um momento de transformação para um casal, afetando diversos aspectos da relação conjugal. As mudanças nas responsabilidades domésticas, na comunicação, na intimidade e nas expectativas emocionais exigem dos parceiros uma capacidade de adaptação e de negociação. Compreender essas alterações à luz de teorias e estudos acadêmicos pode auxiliar casais e profissionais da área da saúde a oferecerem suporte adequado e estratégias de intervenção para promover a saúde e o bem-estar do casal e da família como um todo.

 

Referências:

ADAMS, J. M.; JONES, W. H. A conceituação do compromisso conjugal: uma análise integrativa. Journal of Personality and Social Psychology, v. 72, n. 5, p. 1177-1196, 1997. Disponível em: https://doi.org/10.1037/0022-3514.72.5.1177. Acesso em: 10. jun. 2023.

BOWLBY, J. Apego: a natureza do vínculo. São Paulo: Martins Fontes, 1990.

COWAN, C. P.; COWAN, P. A. Quando os parceiros se tornam pais: A grande mudança de vida para os casais. Porto Alegre: Artmed, 2014.

DOSS, B. D.; RHOADES, G. K. A transição para a parentalidade: impacto nos relacionamentos românticos dos casais. Current Opinion in Psychology, v. 13, p. 25–28, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.copsyc.2016.04.003. Acesso em: 09 de jun. 2023.

DUVALL, E. M. Desenvolvimento familiar. São Paulo: Martins Fontes, 1977.

HOCHSCHILD, A. R. O segundo turno: trabalhadores e trabalhadoras em tempo integral e a revolução inacabada em casa. São Paulo: Paz e Terra, 1989.

KELLEY, H. H.; THIBAUT, J. W. Relações interpessoais: Uma teoria da interdependência. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1978.

Por Daniela Iunes Peixoto – danielaiunesp@rede.ulbra.br

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Karina Leiko Mito: Relacionamentos Abusivos

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Desafios e preocupações relacionados a relacionamentos abusivos.

(En)Cena entrevista a Psicóloga Karina Leiko Mito, especialista em psicologia clínica e psicologia do trânsito. Jaiana possui pós-graduação em Terapia Cognitivo-Comportamental, Inteligência Socioemocional, Psicologia Positiva, Formação de Coaching e Psicologia do trânsito. Também possui Master in Business Administration em Desenvolvimento de pessoas.

Karina, em seu perfil nas redes sociais, compartilha conhecimentos, tira dúvidas, promove reflexões e dá dicas para uma melhor qualidade de vida. Adepta aos reels, alcança seus seguidores com uma criação de conteúdo divertida e leve. Um conteúdo muito discutido em suas redes sociais é o de relacionamentos abusivos, respeito e conflitos relacionais. 

Fonte: Foto do feed do Instagram da entrevistada

(En)Cena: O relacionamento abusivo é uma realidade preocupante que afeta muitas pessoas, tanto homens quanto mulheres, em diferentes contextos sociais. Identificar os sinais e padrões desse tipo de relacionamento é fundamental para compreender a dinâmica e buscar uma solução adequada. Quais são esses sinais e padrões comuns de um relacionamento abusivo?

Karina: Existem duas maneiras de identificar esses sinais, a maneira, talvez mais importante, objetiva, tendo como instrumentos as regras legais e forma de lei, e a maneira subjetiva levando em conta os sintomas e queixas do paciente. Subjetivamente esses sinais e padrões podem variar muito de pessoa para pessoa. Enquanto psicólogos é importante a neutralidade para não haver julgamentos nem rotulações estando atento ao relato e sintoma de cada paciente.

(En) Cena: Reconhecer se estamos em um relacionamento abusivo nem sempre é fácil, pois muitas vezes as dinâmicas abusivas podem se desenvolver gradualmente. No entanto, é essencial entender os indicadores comuns desse tipo de relacionamento para tomar medidas necessárias e buscar apoio. Como posso identificar se estou em um relacionamento abusivo?

Karina: O limiar é: Tudo que ultrapassa nossos limites através de força ou poder excessivo, atitudes e ordens verbais que humilham e causam mal pode ser considerado abusivo. A importância de procurar ajuda psicológica é identificar se o que o este abuso que afeta meu bem estar e qualidade de é causado pelo “abusador” ou por uma ferida aberta que existe em mim.

(En)Cena: Um relacionamento abusivo pode ter um impacto significativo na saúde emocional e psicológica das pessoas envolvidas. Compreender as principais consequências emocionais desse tipo de relacionamento é fundamental para iniciar um processo de cura e recuperação. Quais são as principais consequências emocionais de um relacionamento abusivo?

Karina: Sim, isso é sobre as feridas que mencionei na resposta anterior. As consequências podem ser desde a pessoa se fortalecer até se anular e se tornar uma ferida aberta, se afetando e se machucando diante de qualquer situação que seja “desconfortável”.

(En)Cena: Em um relacionamento abusivo, é comum que a vítima se sinta isolada e sem recursos para buscar ajuda. Como é possível construir uma rede de apoio e buscar ajuda durante um relacionamento abusivo?

Karina: Dependendo da condição de cada pessoa, essa rede de apoio pode vir, desde ajuda profissional psicológico até de vizinhos, amigos ou familiares mais próximos.

(En)Cena: Sair de um relacionamento abusivo é um passo corajoso, mas o processo de recuperação pode ser desafiador. Quais são as etapas do processo de recuperação após sair de um relacionamento abusivo?

Vai depender muito de qual tipo de sequela esse relacionamento deixou. É de suma importância o psicólogo estar atento aos sintomas relatados de cada pessoa. Mas os sintomas podem variar desde pânico, ansiedade, transtorno pós traumático… ou seja, as etapas do processo de recuperação variam e não há uma regra de como vão acontecer.

(En)Cena: A autoestima é frequentemente afetada em relacionamentos abusivos, deixando marcas emocionais profundas. Reconstruir a autoestima é um processo importante para recuperar o amor-próprio e a confiança em si mesmo após sair de um relacionamento abusivo. Como posso reconstruir a  autoestima após um relacionamento abusivo?

Karina: Pode se dizer que a pessoa que suporta e se mantém em um relacionamento abusivo é carente e não tem autoestima. E com certeza isso é agravado, pois traz outros prejuízos, como falta de confiança em si, crenças de desamor, desvaler e tantas outras sequelas. Mas recuperar a autoestima e curar-se dos traumas é importante para não se envolver em outro relacionamento por carência. Uma pessoa que está em relacionamento abusivo acredita que merece aquilo, e não sai por carência e medo de não encontrar outra pessoa. A autoestima pode ser construída através de terapia ou esforço de consumir conteúdos sobre o assunto.

(En)Cena: Estabelecer limites saudáveis é essencial para criar relacionamentos saudáveis e evitar situações abusivas no futuro. Quais são as estratégias para estabelecer limites saudáveis em relacionamentos futuros?

Karina: Uma pessoa só consegue estabelecer limites saudáveis se ela estiver saudável. Limites não é qualquer pessoa que consegue impor. Para alguém fragilizado é quase uma missão impossível. As estratégias saudáveis só pode ser criadas a partir da pessoa saber o que é saudável para ela. O que muitas vezes ela nem sabe e suporta tudo por acreditar que a função dela é aquela.

(En)Cena: Sentimentos de culpa e vergonha são comuns após um relacionamento abusivo, mesmo quando a vítima não tem culpa pela situação.  Como lidar com sentimentos de culpa e vergonha após um relacionamento abusivo?

Karina: Geralmente, a vítima de abuso é submetida a manipulações persuasivas, o manipulador faz a vítima se culpar e se envergonhar. Lidar com sentimentos como estes não é tarefa fácil. Em terapia utilizo uma técnica de troca de papéis e dessensibilização desses sentimentos.

(En)Cena: Existem diversos recursos e programas disponíveis para apoiar e ajudar as vítimas de relacionamento abusivo. Conhecer esses recursos e saber onde buscar ajuda é fundamental para iniciar o processo de recuperação. Quais recursos e programas estão disponíveis para ajudar vítimas de relacionamento abusivo?

Karina: Mulheres em relações abusivas podem buscar ajuda na Central de Atendimento a Mulher discando 180, em casos diversos, podem acionar a polícia discando 190.

(En)Cena: Desenvolver habilidades de comunicação saudáveis e assertivas é essencial para estabelecer relacionamentos saudáveis e evitar situações de abuso.  Como posso desenvolver habilidades de comunicação saudáveis e assertivas para evitar relacionamentos abusivos no futuro?

Karina: É importante ressaltar que, infelizmente, não podemos controlar o comportamento do abusador. Independente de qual comunicação usamos o abusador pode cometer abuso. As habilidades emocionais vão apenas nos garantir se afetar menos ou não se afetar pelo abuso, que mesmo assim continuará sendo abuso. Toda forma de controle, humilhação, constrangimento, manipulação, deboche, chantagem ou ameaças, menosprezo, diminuição, mentiras ou enganação, maltrato e agressões, são formas de abuso. Saber conversar pode evitar ou amenizar sim as formas de abuso mas não é garantia de nada. Essas habilidades podem ser desenvolvidas através da terapia e técnicas de inteligência emocional.

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