Qual a verdade passamos através das mídias sociais?
Por Matheus Aquino Alves- mathewsaquino2@gmail.com
Obs: contém spoilers do filme, caso você não o tenha assistido.
Em 2018, foi lançado mundialmente o filme de suspense ‘Buscando…’, que conta a história de uma família formada por David Kim, Pamela Kim e Margot Kim, a filha do casal. Desde a infância de Margot, que a família decide guardar fotos, vídeos e lembranças no computador pessoal da casa. O longa já impressiona desde o seu início, quando nos deparamos com um tela do Windows 2003 e a criação dos perfis de David e Pamela.
Nos minutos seguintes do filme, os anos vão se passando até que Margot se torna uma adolescente e cria seu próprio perfil no computador. A inserção nas redes sociais também é vista, com a ascensão do Facebook. A família é abalada quando Pamela descobre que tem câncer e inicia o tratamento, porém não resiste e falece em 2015, quando Margot tem apenas 13 anos.
O telespectador é surpreendido quando descobre que todo o filme é rodado como se estivéssemos acessando o computador da família Kim. Em 2018, na atual história, Margot tem 16 anos e já cursa faculdade longe de seu pai e eles mantêm contato através do Facetime e pelas mensagens do celular. Além de estudar, Margot faz aulas de piano e tudo parece estar dentro do normal até que um dia David liga para a filha e esta diz que está na casa de uma amiga estudando e sem muitas delongas, se despede do pai e desliga a chamada de vídeo.
Mesmo diante do afeto criado durante a infância, David percebe que sua filha está um pouco distante, mesmo com as chamadas de vídeo e mensagens trocadas, as falas apenas beiram o básico. De acordo com Flanzer (2020), as tecnologias, por mais que facilitem a comunicação de quem está distante, podem ser uma ferramenta potente de exclusão e isolamento do sujeito, com suas relações sociais e sua própria cultura.
No dia seguinte, David decide conversar com Margot e ela não atende suas chamadas e não responde as mensagens dele. Ele se preocupa, mas espera até o final do dia para que ela o responda. Visto que ela não o fez, ele decide ligar para a amiga de Margot e esta diz que ela não dormiu na casa da amiga e foi embora cedo. Só então que David se dá conta de que não conhece a filha e muito menos os amigos dela.
Após 1 dia sem dar notícias, David se desespera e então decide invadir o computador da filha para que ele saiba o seu paradeiro. Ele descobre que Margot possui suas contas do facebook, twitter e instagram privadas, e somente com o Youcast, um aplicativo para lives, que ele sabe como a filha se expressava com os demais.
Ele nota que Margot, havia desistido das aulas de piano, mas estranha o fato, pois todo mês ela continuava a pedir para ele o dinheiro das aulas. Descobre que a filha parecia triste para os demais e expressava através da rede social, mas com o pai, ela mantinha a sua alegria de sempre. Mussio (2017) em sua pesquisa, informou que as relações sociais de adolescentes com amigos virtuais podem se tornar mais próximas e intensas.
Loader (1997) aponta que a onipresença nas redes sociais e tecnologias, transformou o ser humano como dependente do uso, ao passo que ele se sente em fragilidade e dependência quando está desconectado do mundo virtual. Margot falava com muitas pessoas ao mesmo tempo durante as lives e se sentia mais segura para falar de sua vida, já que estas pessoas de fato não tinham presença física no seu dia-a-dia.
Visto que esta falava mais nas lives e visita um lugar de refúgio para se sentir mais relaxada, David decide buscar pelas pessoas que conversavam com ela a fim de descobrir seu paradeiro. Então ele percebe que ela conversava com uma pessoa específica e que falavam sobre seus problemas. A pessoa identificada tinha a foto de perfil de uma mulher e aparentemente precisaria de dinheiro para ajudar sua família. David descobre que Margot passou a enviar o dinheiro das aulas de piano para essa amiga virtual.
Com a ajuda da detetive Vick, é iniciada uma investigação sobre o desaparecimento da filha, até que David decide ir até o local onde ela se refugiava e descobre alguns pertences dela, desesperado, entra em contato com a detetive que envia uma equipe de buscas até o local. No dia seguinte o carro de Margot é encontrado com manchas de sangue e então surge a hipótese de que a menina esteja morta.
Inconformado, ele decide mais uma vez acessar as mensagens da filha e descobre que ela mantinha contato frequente com o irmão dele. As mensagens levam ele a crer que os dois mantinham uma relação amorosa ou de abuso e decide falar com o irmão. Com a ajuda de câmeras, ele pretende arrancar uma confissão do irmão e após uma discussão, o irmão assume que eles se viam sempre, mas que apenas conversavam e eles faziam o uso de maconha juntos.
Flanzer (2020), informa que as mudanças que são impulsionadas através das tecnologias, podem causar impressões rápidas e conclusões acerca da interpretação do que é visto. Neste caso de David, a conclusão que ele chegou sobre as mensagens do irmão e da filha eram fruto do seu construto pessoal e cultural e não era a verdade absoluta. Esta reflexão nos faz pensar que nem tudo o que é compartilhado nas redes é real, sendo que as pessoas utilizam-se dessas ferramentas para demonstrar posturas que não conseguem manter em grupos sociais.
Durante este último acontecimento, a detetive Vick entra em contato com David e informa que pegaram o responsável pelo desaparecimento. O homem, em seu depoimento de confissão aparece pedindo perdão por ter violentado e assinado Margot, e após feito isso, comete suicídio. David, porém, não fica muito convencido e decide investigar mais. Ele descobre que um funeral foi organizado sem ao menos ter o corpo de Margot, e que o rosto de uma moça que aparecia agradecendo por contratar os serviços da funerária era a mesma que conversava com Margot e que recebia o dinheiro dela.
David entra em contato com a suposta jovem e ela disse não saber de nada e que ela é uma modelo que trabalha com divulgação de rosto para diversas marcas. As famosas “Deep Fake” são imagens que foram alteradas do original, em que acontece a troca de rosto e corpo, substituindo a original da foto ou vídeo. A tecnologia pode ser tão bem feita, que é quase imperceptível que houve uma troca de imagens. (DE MORAIS, 2020).
É comum que essa tecnologia seja utilizada principalmente para disseminar fakes news a respeito de uma determinada pessoa, e pode ser utilizado para criminosos se passarem por outra pessoa e aplicar golpes. Recentemente casos semelhantes foram abordados na telenovela da Rede Globo ‘Travessia’ (2022) da autora Glória Perez. A protagonista, Brisa, sofre uma perseguição pois seu rosto foi utilizado na foto de uma sequestradora de crianças, e um pedófilo também utilizou desta tecnologia para se passar por uma mulher que seleciona jovens atrizes e as faz despir as roupas na frente da câmera. A telenovela está sendo exibida atualmente na emissora e também está disponível na plataforma Globoplay.
No final do suspense, David liga para a delegacia e descobre que Vick se dispôs a ajudar no caso e não como selecionada para investigar, como ela havia dito. Desconfiado, ele aciona a polícia e eles prendem Vick, que durante o seu depoimento, confessa que esquematizou tudo para acobertar o filho, que durante uma discussão com Margot, na noite do acidente, empurra a jovem de um penhasco e ela cai, deduzindo que esta poderia estar morta, faz com que um criminoso faça a confissão do homicídio para não levantar suspeitas.
Uma equipe de buscas vai até o local da queda, e resgata a jovem que muito debilitada, foi levada ao hospital. Felizmente, tudo correu bem e Margot consegue voltar a sua rotina diária, mantendo o contato com David através de Facetime e mensagens.
Este filme com certeza, nos mostra os benefícios e os malefícios das tecnologias. Apesar da proximidade que ela pode trazer com quem está longe, pode tornar os indivíduos cada vez mais dependentes delas e isolados. A fluidez das relações na web, não deve substituir o contato pessoal com o outro, pois sabemos que o ser humano necessita de socialização. E por fim, nos faz este alerta, será mesmo que conhecemos totalmente uma pessoa somente pelo que é compartilhado na internet?
FICHA TÉCNICA
Título: Buscando… (Searching…)
Ano de lançamento: 2018
País de origem: Estados Unidos.
Direção: Aneesh Chaganty.
Duração: 102 minutos.
Gênero: Mistério/Suspense.
Disponível: Apple TV +.
REFERÊNCIAS
DE MORAES , CRISTIANE PANTOJA. “Deepfake” como ferramenta de manipulação e disseminação de “fakenews” em formato de vídeo nas redes sociais. Biblios: Revista electrónica de bibliotecología, archivología y museología, [S. l.], n. 79, p. 63-72, 29 nov. 2020. Disponível em: file:///C:/Users/Cliente/Downloads/Dialnet-DeepfakeComoFerramentaDeManipulacaoEDisseminacaoDe-8041632.pdf. Acesso em: 14 mar. 2023.
FLANZA, Sandra Niskier. Jovens em tempos digitais. 1 . ed. Rio de Janeiro- RJ: Consultor, 16/09/2020. 148 p. ISBN 978-65-88511-01-5. Disponível em: https://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=&id=G3YSEAAAQBAJ&oi=fnd&pg=PT3&dq=o+perigo+do+uso+de+telas+nos+adolescentes&ots=s5JC4f56Th&sig=56n8VIul3akChgxZnBKAY3iqZdI#v= onepage & q=interpreta%C3%A7%C3% B5es & f=false. Acesso em: 14 mar. 2023.
Mussio, Rogéria Albertinase Pincelli. A geração Z e suas respostas comportamental e emotiva nas redes sociais virtuais / Rogéria Albertinase Pincelli Mussio. – Rio Claro, 2017 204 f. : il., figs., gráfs., forms., tabs., quadros, fots. Disponível em: file:///C:/Users/Cliente/Downloads/mussio rap _ mercla.pdf. Acesso em 15 mar. 2023.