A transição da modernidade para a pós-modernidade vem sendo uma temática bastante estudada e debatida no âmbito da Sociologia, Filosofia, Psicologia e outras áreas do conhecimento. Esses estudos surgem a partir da perspectiva de compreender o ponto de vista individual e coletivo e as transformações que ocorrem na sociedade.
A pós-modernidade é o nome denominado para o momento histórico que estamos vivendo, tempos de ruptura de fatos socioculturais da modernidade e do surgimento de novos, assim, a modernidade e a pós-modernidade se complementam e se contrapõem. Conforme apresenta Goergen (1997, p.63 apud Gatti, 2005, p. 602), “modernidade e pós-modernidade não se encontram numa relação de superação de uma pela outra, mas numa relação dialética”.
A juventude que passa por esse momento de transição afeta e é afetada por esse novo cenário, cada indivíduo é responsável pelo seu próprio progresso através de maneiras imediatistas. Nesse contexto, surge o “neo-individualismo” pós-moderno, no qual o sujeito vive sem projetos, sem ideais, a não ser cultuar sua autoimagem e buscar satisfação aqui e agora, “admirando-se a si mesmo e amando-se perdido na multidão” (GOMES; CASAGRANDE, 2002, p. 698).
Ainda nesta mesma perspectiva Gomes e Casagrande (2002), apontam que essa transição que os jovens estão passando se dá por circunstâncias pós-modernas de um mundo com pouca segurança psicológica, econômica e intelectual, sendo esse, um dos pontos negativos desta nova era, pois o mundo moderno é um lugar de certeza e ordem.
Estamos em um tempo de desvalorização da cultura, novos valores estão se formando enquanto ocorre a desconstrução de valores construídos até então, e algumas dessas mudanças podem ser consideradas desfavoráveis, como por exemplo, o individualismo. Um indivíduo voltado para si próprio poderá ter problemas pessoais e grupais, considerando que a sociedade é multicultural, que considera valores, história, e além disso, vivemos em constante socialização para manutenção da sobrevivência.
Existe uma preocupação acerca da influência do individualismo que está relacionada a perda de laços sociais que acompanha a desconstrução de formas de relacionamentos e as possibilidades de diálogos fruto da redução das identidades sociais e culturais. Por outro lado, a pós-modernidade limita as chances de reconstrução desses laços que foram afetados no decorrer do tempo.
Conforme Lacaz (2001), essas novas características favorecem o capitalismo, pois os pós-modernistas compactuam com a forma de convívio social e modelo político-econômico, e o capitalismo traz uma ilusão de pluralidade, quando na verdade ele procura padronizar e homogeneizar. Lacaz ainda salienta que é importante estudar e ter conhecimento da realidade para o enfrentamento do capitalismo hodierno.
Outro ponto que se originou através do capitalismo e que perpetua no período pós-moderno é o consumo excessivo. Para Santos (2002), nos tempos atuais está havendo a sedimentação de um sistema econômico que afeta a todos e permeia as relações humanas. Pois, o modo como vem sendo cultivado e estabelecido o consumo acaba criando falsas necessidades que alimentam o desejo do indivíduo alienado na busca pelo objeto do consumo. Dessa maneira, todas as vezes que os desejos alienados de consumo forem satisfeitos, logo serão substituídos por outros em razão da frequência incessante do consumismo.
Pode-se notar que a lógica dessa busca pela felicidade imediata não consiste apenas nas relações de consumo, como também nas relações sociais, onde o outro é influenciado cada vez adquirir o aspecto de um objeto também de consumo. Portanto, percebe-se que a felicidade se encontra num produto de consumo, que rapidamente é substituída por outro.
Freud (1930/1974), em sua obra “O mal-estar na civilização” destaca a busca das pessoas pela felicidade, relacionando com o princípio do prazer:
O que chamamos de felicidade no sentido mais restrito provém da satisfação (de preferência, repentina) de necessidades represadas em alto grau, sendo, por sua natureza, possível apenas como uma manifestação episódica. Quando qualquer situação desejada pelo princípio do prazer se prolonga, ela produz tão-somente um sentimento de contentamento muito tênue (FREUD, 1930/1974, p.95).
Nessa passagem, Freud (1930/1974) afirma que a felicidade é de caráter temporário e que esta satisfação se prolonga, sendo mais flexível.
A pós-modernidade não se resume nas subjetividades e nas relações sociais e políticas, mas, em igual medida, interpõe no modo de vida que interfere diretamente nas dinâmicas culturais, criando um problema que aparentemente é de ordem individual que acomete, sobretudo, os jovens contemporâneos. É preciso pensar, pois, nas gerações futuras, amplamente impactadas por um modo de vida que, de acordo com Bauman (2007), Birman (2013) e Freire Costa (2004), afirmou a autoviolência e a vertigem existencial – falta de perspectiva no futuro – como aspectos aceitáveis.
A saúde mental diante a pós-modernidade é afetada diretamente, pois os sujeitos tendem a ser mais individuais, egocêntricos e movidos por relações de poder, que de alguma maneira traga benefícios para si próprio. Por outro lado, o avanço da tecnologia ganha cada vez mais espaço, com isso as pessoas se aproximam sucessivamente desse movimento que a partir disso surgem as reflexões sobre o desenvolvimento do ser humano e os impactos que isso causam no bem-estar dos usuários.
A pós-modernidade está voltada para a tecnologia e para o presenteísmo, as pessoas têm tido uma necessidade de estar bem o tempo todo, produzindo e consumindo, mas a produção da saúde mental não acompanha esse ritmo a qual a sociedade vem se submetendo. A característica da tecnologia em saúde mental é peculiar, pois ao se cuidar do ser humano, não é possível generalizar condutas, mas sim adaptá-las às mais diversas situações, a fim de oferecer cuidado singular (GONÇALVES, 2009, p. 179).
REFERÊNCIAS
BAUMAN, Zygmund. Vida Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007.
BIRMAN, Joel. Novas formas de subjetivações. In: CPFL CULTURA – INVENÇÃO DO CONTEMPORÂNEO. Campinas-SP: CPFL, 2013. Disponível em: Acesso em: 22 mai. 2016.
FREUD.S. O mal-estar na civilização (1930). In:_______. Obras psicológicas completas. Rio de Janeiro: Imago, 1974. v. XXI, p. 37-171. Edição Standard Brasileira.
GATTI, BERNARDETE A. Pesquisa, educação e pós-modernidade: confrontos e dilemas. Cadernos de Pesquisa, [S. l.], v. 35, p. 595 – 608, 1 dez. 2005.
GONÇALES, Cintia Adriana Vieira. Cotidiano de atenção à pessoa com depressão na pós-modernidade: uma cartografia. 2010. Tese de doutorado (Enfermagem) – Aluna, [S. l.], 2009. DOI 10.11606. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7136/tde-11012010-123208/en.php. Acesso em: 25 nov. 2021.
LACAZ, Francisco Antônio de Castro. O sujeito n(d)a saúde coletiva e pós-modernismo. 2001. [S. l.], 2001. DOI https://doi.org/10.1590/S1413-81232001000100019. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/YpbcLDxHVmYxsfXmTLV3YQv/?lang=pt. Acesso em: 25 nov. 2021.
SANTOS, L. A. R. dos. Psicanálise e educação: um olhar sobre a criança-consumidora e a escola nos dias atuais. Pulsional Revista de Psicanálise, v. 15, n. 155, p. 74-76, mar. 2002.
SOUSA, Sonielson. L.; MIRANDA, Cynthia Mara. Pós-modernidade e vertigem existencial entre jovens. Revista Humanidades e Inovação v.5, n. 4 – 2018.