Biopoder e Biopolítica: formas de dominação das intensidades humanas

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Fonte: avalen89.wordpress.com

À luz dos textos “A gênese da biopolítica: vida nua e estado de exceção”, “Foucault e as novas figuras da biopolítica: o fascismo contemporâneo” e “A inclusão educacional como estratégia biopolítica”, cujo referencial se encontra abaixo, foi elaborado um ensaio que relaciona os temas, de modo a propiciar uma compreensão da tese central dos autores.

O filósofo francês Michel Foucault foi o criador dos termos de biopoder e biopolítica, que são conceitos que procuram explicar historicamente como funciona a influência a qual a população é submetida por seu soberano (governo). Foucault dá inicio a sua tese explicando como o ser humano desde o seu nascimento tem uma necessidade de proteção por uma forma de autoridade, e essas autoridades eram as detentoras do poder sobre a vida e morte de seus subordinados (PAVIANI, 2014). Deste modo a partir do desenvolvimento da sociedade e das alterações ocorridas nas sociedades surge o biopoder, que ao invés de ter o poder sobre a vida, detém o poder sobre a forma de vida, sobre a qualidade de vida, que também irá de certo modo determinar quem irá morrer, e quem irá viver.

Paviani (2014) trás a visão deste tema em vários contextos, sobretudo sob a forma do fascismo e de sistemas totalitários, e também no sistema educacional.

2Fonte: www.upf.edu

 

Foucault e o Conceito de Biopolitica

Conforme os três textos analisados, compreende-se que a questão da Biopolítica abordada pelo filósofo Foucault vem de uma subjetivação da cultura patriarcal que tem como base um sistema onde os pais, maridos, homens, pessoas que eram figuras de poder dominavam e detinham o poder sobre a vida e morte de seus submissos. Haja vista que conforme Paviani (2014), “a relação entre vida e política constitui o tecido social que sustenta as demais relações humanas com a natureza, a sociedade, a ciência, a tecnologia, o saber e o poder”. Fica claro nessa afirmação que a autoridade ou figura de poder que esteja em vigor em uma comunidade irá determinar o modo com o tecido social e as relações serão estabelecidas.

A vida e morte dos indivíduos na sociedade dependem do soberano e do ordenamento social. Como diz Foucault o soberano pode matar por isso ele exerce seu direito sobre a vida. Esse tipo de poder sobre a vida das pessoas é designado por Foucault e Agamben de biopolítica (PAVIANI, 2014).

Assim a Biopolítica se trata do modo com que as autoridades lidam com a questão da vida e morte dos indivíduos em uma sociedade, sendo estes os responsáveis pela organização social, saúde, educação, infraestrutura, natalidade da população, violência, e questões sociais em geral que afetarão diretamente a comunidade. A partir deste entendimento básico do tema tratado por Foucault, entende-se que as três obras que embasaram este ensaio está relacionado ao tema da biopolítica e suas variantes tratadas pelos autores.

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Fonte: thefunambulist.net

No texto “A gênese da biopolítica: vida nua e estada de exceção”, de Jayme Paviani, fala-se do conceito de biopolítica e de como esse conceito surgiu, quais implicações levaram a este entendimento. Assim o autor em várias de suas obras trata de um estudo histórico da biopolítica em diferentes épocas. “Foucault na obra ‘Em defesa da sociedade’ analisa o poder da soberania e o poder sobre a vida, o homem-corpo e o homem-espécie, a aplicação das normas […]” (PAVIANI, 2014, p. 69). Nesses estudos o autor aborda tanto o século XVII onde o soberano detinha o poder sobre a vida, e já no século XIX o poder é o responsável não pela vida, mas sim pelo deixar morrer (PAVIANI, 2014).

Foucault procura refletir não somente o que é o ser humano, mas sim como a política influencia na subjetivação. Para isso Paviani aborda tanto conceitos de Platão, Aristóteles para refletir sobre os modos de ver o processo de política e vida em sociedade, assim como faz um comparativo entre estes pensamentos e os de Agamben, que faz uso de ideias de Foucault. Sendo que Foucault e Agamben refletem sobre o estado de totalitarismo, nazismo e fascismo.

No segundo texto “Foucault e as novas figuras da biopolítica: o fascismo contemporâneo”, o tema biopolítica ainda é o foco. Foucault notou que nos sistemas totalitários de governo o poder estava não somente na mão de um soberano como era comum até o momento, mas era dividido entre a população de modo que uma maioria da população tinha um poder sobre uma minoria (RAGO; VEIGA, 2009).


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Fonte: Biopolitics and Biopower: a Music Video (https://www.youtube.com/watch?v=ZdHfMPUxA_s)

Foucault procurou entender esse processo analisando como as formas de poder conseguiram disseminar na população seus ideais e crenças fascistas, stalinista e nazista. Assim ele não analisou profundamente esse processo, seu ideal era somente compreender as formas de poder, de modo que através de suas reflexões dispersas sobre o assunto, tirou como conclusão e conselho que a associação entre fascismo e vida não devia ser seguido, de modo a se evitar uma vida fascista. Segundo a visão deste autor os sistemas totalitários vigentes na época eram manifestações exasperadas de poder, uma doença do poder, que ele dizia que não voltaria a acontecer da mesma forma que já ocorreu porem informa que as formas de totalitarismo do século XX, podem repercutir no século XXI, assim como o século anterior foi influenciado pelo século XIX (RAGO; VEIGA, 2009).

Explica-se como o autor chegou ao conceito de biopolítica e biopoder, através da percepção do poder disciplinador e normatizador, que vinha a administrar a vida e o corpo da população; assim como os dispositivos da sexualidade, todos esses dispositivos procuravam normatizar a conduta da espécie. Conforme Rago e Veiga (2009), “o que se produz por meio da atuação específica do biopoder não é mais apenas o indivíduo dócil e útil, mas é a própria gestão calculada da vida do corpo social”. Sendo assim observa-se uma mudança no lócus do modo de poder após o surgimento do biopoder; onde antes o poder do soberano era o de morte e vida, “[…]agora, era o próprio direito de matar que se encontrava subordinado ao interesse em fazer viver mais e melhor, isso é, em estimular e controlar as condições de vida da população” (RAGO; VEIGA, 2009). Isto fez com que se pudesse impor a violência, a escolha de quem vai viver melhor ou pior.

Foucault descobriu que tal cuidado da vida trouxe consigo a exigência contínua e crescente da morte em massa, visto que é apenas no contraponto da violência depuradora que se podem garantir mais e melhores meios de sobrevivência a uma dada população. Assim, a partir do momento em que a ação do soberano foi a de fazer viver, isso é, a de estimular o crescimento da vida e não apenas a de impor a morte, as guerras se tornaram mais sangrentas e os extermínios se multiplicaram dentro e fora da nação […]. (RAGO; VEIGA, 2009, p.41).

Foucault, a partir de toda essa reflexão sobre os sistemas totalitários, observou que esses sistemas de biopoder se utilizavam do preconceito para exterminar minorias de forma a conscientizar para a sobrevivência de um dado grupo, sendo necessário que certas populações sejam contidas (na formação do que depois viria a ser chamado de “lixo humano”). Ele informa sobre o perigo do fascismo na contemporaneidade, pois ele vem disfarçado entre os sistemas liberais e neoliberais.

A preservação da qualidade de vida de uns está fundada na impossibilidade da vida de outros muitos, de modo que biopolítica e tanto política continuam a remeter-se mutuamente. Eis aí alguns dos vetores de disseminação do novo fascismo, que poderíamos denominar como o fascismo viral, que atua por contaminação endêmica, espalhando-se silenciosamente pelo planeta como enfermidade crônica que precisa ser continuamente combatida (RAGO; VEIGA, 2009, p.50).

Portanto o biopoder continua se aplicando de modo conveniente com o contexto social vigente, não mais de forma clara como foi no século XX, e não mais como no fascismo ou em outro sistema totalitário.

4Fonte: www.politicaltheology.com

O último texto, e não menos importante, também fala do biopoder, e da biopolítica aplicada na educação, onde esta se torna uma ferramenta muito poderosa para o governo, pois conforme Elí e Ramos (2013) “ela subjetiva para regular, vigiar e, na sequência, normalizar”. Ou seja, a escola se tornou um local potencial para a normatização de um sistema biopolítico, potencializando a capacidade das forças de dominação exercer o controle sobre toda a massa.

Dispositivo de segurança que utiliza a sedução como uma estratégia e adquire caráter irreversível na Contemporaneidade. Adianto que esse dispositivo de segurança se torna fundamental para que, posteriormente, possamos perceber a inclusão como uma estratégia biopolítica de fluxo habilidade (T, RAMOS, 2013, p. 30).

A partir dos conceitos aqui abordados, compreende-se que os textos se relacionam quanto ao conceito criado por Foucault, filósofo e psicólogo que se dedicou ao estudo da estrutura do poder, sendo ele um autor que buscava compreender de que modo esses conteúdos de poder eram exercidos, e como era subjetivado na população. Cada autor abordou a ideia de Foucault a partir de diferentes processos, porém usando o mesmo ponto de partida, o biopoder e a biopolítica.

 

Referências 

DUARTE, André. Foucault e as novas figuras da biopolítica: o fascismo contemporâneo. In: VEIGA, Alfredo; RAGO, Margareth. Para uma vida não-fascista. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009. p. 35-50.

PAVIANI, Jayme. A gênese da biopolítica: vida nua e estado de exceção. In: PAVIANI, Jayme. Uma Introdução a Filosofia. Caxias do Sul: Educs, 2014. p. 01-301.

RECH, Tatiana Luiza. A inclusão educacional como estratégia biopolítica. In: T, Eli; RAMOS, Rejane. Inclusão e biopolítica. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2013.