“[…] o que eu tenho em mim – meu corpo, meu rosto, minha idade – é suficiente.”
Viola Davis fez história na premiação do Oscar que chegou a sua 89ª edição ocorrida em 2017. É a primeira vez nas premiações do Oscar, que uma mulher negra chega a marca de três indicações. Viola foi premiada com o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante com o filme “Fences”, em português “Um Limite Entre Nós” e soma o Globo de Ouro com o longa, além de levar o Tony Awards em 2001 com King Hedley II e em 2010 com sua atuação na Broadway em “Fences”. Em 2009 foi indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante com o filme “Dúvida”, além da indicação ao Oscar de Melhor Atriz com o filme “Histórias Cruzadas”.
Seu reconhecimento em massa veio em sua atuação como Annalise Keating, uma advogada de renome na série produzida por Shonda Rhimes “How To Get Away With Murder”, em português “Como Defender um Assassino”. Essa personagem lhe rendeu o Emmy de Melhor Atriz em Série de Drama. A primeira mulher negra a receber o prêmio. Ao receber o Emmy, o Tony Awards e o Oscar, Viola entra para a lista de apenas 23 nomes que receberam a Tríplice Coroa de Atuação.
Em um de seus discursos mais famosos na entrega do Emmy em 2015, Viola levantou debate sobre a dificuldade que as mulheres negras enfrentam nos mais diversos campos. Ela afirma que “A única coisa que diferencia as mulheres negras de qualquer outra é a oportunidade. Você não pode ganhar um Emmy por papéis que simplesmente não existem”. Uma problemática que vem tomando os espaços de debate e traz reflexões como a Bei Hooks, importante nome dentro do feminismo negro nos Estados Unidos.
Para nós negras é necessário enfrentar esta questão não apenas porque a dominação patriarcal conforma relações de poder nas esferas pessoal interpessoal e mesmo íntimas, mas também porque o patriarcado repousa em bases ideológicas semelhantes às que permitem a existência do racismo, a crença na dominação construída com base em noções de inferioridade e superioridades. (HOOKS, 1989, p.23).
Sobre os espaços conquistados dentro da Academia, Viola ressalta que existiram mulheres negras que abriram as possibilidades de valorização no campo das artes. Taraji P. Hanson, Kelly Washington, Halle Berry, Nicole Beharie, Meagan Good e Gabrielle Union foram citadas por ela como sendo precursoras na luta em busca da valorização e reconhecimento das mulheres negras no cinema.
Em seus discursos, a atriz reafirma sua gratidão a diretores que quebraram os padrões ao proporem novos espaços de atuação para as mulheres negras, como o exemplo de Shonda Rhimes que descreve Annalise Keating na trama de “How To Get Away With Murder” como sendo uma mulher independente, bem sucedida, que dá aulas de Direito em uma universidade renomada. O filme “Estrelas Além do Tempo” reafirma os novos tempos não apenas no campo cinematográfico, mas que ultrapassa fronteiras e mobiliza ações em todo o mundo.
Angela Davis, filósofa e ativista afro americana, em seu discurso na Marcha das Mulheres (2017) afirma que a marcha “representa a promessa de um feminismo contra o pernicioso poder da violência do Estado. É um feminismo inclusivo e interseccional que convoca todos nós a resistência contra o racismo, a islamofobia, ao anti-semitismo, a misoginia e a exploração capitalista. O pensamento feminista negro, então é um conjunto de experiências e ideias compartilhadas por mulheres afro americanas – mas não somente – que oferecem um ângulo particular de visão de eu, da comunidade e da sociedade. Ele envolve interpretações teóricas da realidade de mulheres negras por aquelas que realmente a vivem (COLLINS, 1989).
Viola Davis está construindo espaços de reconhecimento e empoderamento de mulheres negras e esse novo cenário no campo cinematográfico reverbera em novos modos de ser e agir na sociedade. Ao falar sobre as diferenças entre mulheres brancas e negras e os problemas de classe, Davis amplia as possibilidades de discussão. Em seus discursos o assunto paira e traz à tona, temáticas de domínio do feminismo negro, como o legado de uma história de luta, a natureza interligada de raça gênero e classe, o combate aos estereótipos ou imagens de controle, a atuação como mães professoras e líderes comunitárias e a política sexual. (COLLINS, 1991).
As lutas em busca de equidade entre mulheres brancas e negras não terminam aqui, porém quanto mais houver a abertura de espaços de maior alcance para a discussão e conscientização desses temas, maior será a mobilização social, pois “o que as mulheres compartilham não e a mesma opressão, mas a luta para acabar com o sexismo, ou seja, pelo fim das relações baseadas em diferenças de gênero socialmente construídas.” (HOOKS, 1989).
O combate às desigualdades de direitos entre homens e mulheres no campo profissional, nas relações cotidianas, nos relacionamentos e nas oportunidades deve permanecer, e como Viola Davis defende na entrega do Globo de Ouro 2017 para atriz Meryl Streep, nós viemos para “viver em voz alta” e lutar em prol da diminuição dessas disparidades é fundamental na busca de uma sociedade mais tolerante, igualitária e principalmente, mais sensível ao outro, mais humana.
REFERÊNCIAS:
BORGES, Juliana. O Discurso de Angela Davis na Women’s March. 2017. Disponível em: <https://cronicasnabelavista.wordpress.com/2017/01/22/brevissimas-do-facebook-o-discurso-de-angela-davis-na-womens-march/>. Acesso em: 06 mar. 2017.
COLLINS, Patricia Hill. Black Feminist Thought: Knowledge Consciousness and Polifics of Empowerment. Nova Iorque: Routledge, 1991.
HOOKS, Bei. Talking Back: Thinking Feminist Thinking Black. Boston: South End Press, 1989.