É comum as pessoas usarem a seguinte frase: “somos todos iguais e todos temos as mesmas oportunidades.” Depende de como e de que lado você está fazendo esta análise. Vamos refletir um pouco mais sobre a questão do negro no mercado de trabalho e academicamente. Essa é uma discussão necessária. Nós, negros, precisamos ter nossa história validada e dita por nós. Esse é o lugar de fala do negro. Em alguns processos seletivos de empresas, há códigos que a empresa cria, por exemplo, um código de inscrição para indicar uma pessoa negra, pois pode ser que o cliente que deseja aquele novo colaborador não queira uma pessoa negra no seu local de trabalho.
Temos também outras descrições, como Cabelo Black ou não liso, nariz largo, lábios mais grossos, tonalidade de pele mais escura. Alguns podem perguntar: “Será que essa pessoa será uma boa recepcionista ou uma boa gerente de contratos para lidar com nossos clientes de outras empresas?”
Incrível essa pergunta e a colocação. Infelizmente, sinto em informar que é o que mais acontece no mercado de trabalho no Brasil. Pessoas são simplesmente julgadas por sua tonalidade de pele, por seu cabelo e seu tipo físico. Neste caso, falo de pessoas negras. Dessa dita “minoria” (em ocupação e mobilidade social), mas que na verdade é a maioria da população brasileira. Vai entender, não é?
Eu faço questão de conversar sobre isso. Critica-se a cota para negros em universidades. Podemos falar do Conceito da Equidade Aristotélica “Implica tratar desigualmente os desiguais para promover a efetiva igualdade” para falarmos de oportunidades. Mas para pensarmos em igualdade, precisamos investir em saúde, educação, saneamento básico e políticas públicas que realmente aconteçam. Isso só irá acontecer realmente se for de interesse da outra parte que é dita “maioria”.
Hoje, há um movimento em que os negros estão realmente utilizando suas vozes para ter espaço de fala e contar a sua história como não foi contata nos livros de história, pois negro era mercadoria, escravo e ainda considerado preguiçoso. Ou seja, não tinha identidade. Quando vemos pessoas negras atingindo um lugar de gerência, diretoria, destaque, dizem que é sorte ou que teve um bom padrinho ou usam isso para afirmar que as oportunidades são iguais para todos.
O pesquisador Milton Santos dizia o seguinte: “Nossos corpos falam”. Nosso corpo está tão ligado a imagem do negro preguiçoso (dito na época da escravidão) que não quer nada com nada. Constroem-se ainda mais estereótipos que os livros de história dizem por aí que a sociedade, como um todo, não coloca o negro em outro local. Apenas como inferior. Isso é algo sério, pois é passado por gerações. Estamos na luta incessante de desconstruir isso. Mas ainda vemos muita resistência, por parte de empresas, pessoas, grupos de classes sociais, escolas, salão de beleza, lojas e muitos outros.
O negro sofre psicologicamente com essas negativas. É um fato que vivemos na sociedade. Se está na hora de mudar? Mais que nunca essa é a hora. Por isso não deixem que a ideia de que o seu corpo fala por você e não o seu conteúdo, seja maior. Por isso, saiba que no caminho de todos nós há pedras, mas no nosso há pregos, cacos de vidros e o racismo. Se podemos? Sim. Por isso, que acredito que “Eu sou, porque nós somos.”
Aproximadamente às 23:40 da noite de um domingo dei entrada na Unidade de Pronto Atendimento – (UPA- SUL), com fortes dores na região abdominal e nos rins. Fiquei esperando a triagem, logo fui chamada. Na sala de triagem haviam dois profissionais, enfermeiro e técnica de enfermagem, os quais rapidamente, após a triagem, me encaminharampara a sala do médico e responderam algumas perguntas que fiz, sempre muito educados. Neste momento pude ver um dos princípios do SUS sendo aplicados a mim com muita responsabilidade e profissionalismo, pois naquele momento tinham outras pessoas na fila para serem atendidas, mas o princípio de equidade foi aplicado e imediatamente foi atendida pelo médico por se tratar de uma necessidade um pouco maior do que das pessoas que estavam ali naquele momento.
Cheguei ao consultório médico, me queixando de fortes dores tanto na região abdominal quanto nos rins, então, logo passei por uma avaliação médica, e a partir desta avaliação iniciou-se a suspeita de apendicite, e caso fosse confirmada já sairia dali direto para o Hospital Geral de Palmas – HGP. Inicialmente fiquei desesperada, pois se tratava de um procedimento cirúrgico, que por menor que seja, tem sempre um risco.
Fonte: https://goo.gl/Dc8JJ2
O médico continuou a me fazer algumas perguntas, e então chegou a uma segunda suspeita, a de cálculo renal. Ele sempre muito atencioso e continente, vendo meu desespero por sentir tamanha dor e incertezas do que poderia ser, logo receitou alguns medicamentos para dor, o qual tendo sido avisado que sou alérgica a dipirona prontamente trocou o medicamento. Após isso me pediu alguns exames de sangue, que diriam se alguma daquelas suspeitas se confirmava.
Neste momento fui encaminhada a enfermaria feminina e informada que ficaria ali por um período para receber a medicação, ser feita a coleta do sangue para o exame e para ser observada até o resultado do exame ficar pronto. Até este momento todos os profissionais que me assistiram tinham sido educados, atenciosos, éticos e sempre agindo com muito profissionalismo. Pensei então, “tive sorte dessa vez”. Até que a técnica em enfermagem chegou para aplicar a medicação, imediatamente com muita grosseria mandou que eu me sentasse e puxou meu braço, nesse momento perguntei que medicamento era aquele que ela estava aplicando e sua resposta foi a pior que eu poderia escutar: “Não interessa, você não precisa saber, só precisa ficar quieta para eu conseguir pegar sua veia, se não quiser ser furada mais uma vez”.
Ao ouvir aquilo eu só tinha vontade de chorar, pois via ali uma pessoa totalmente inapropriada para exercer aquela função. Ela estava, naquele ato, desrespeitando todos os princípios, códigos e leis que asseguram ao paciente o direito de saber a quais procedimentos está sendo submetido. Ao ouvir aquela resposta me senti tão humilhada, maltratada por alguém que escolheu aquela profissão e agora, talvez por frustração, raiva ou qualquer outra coisa que a profissão tenha lhe causado, me tratava de maneira tão grosseira.
Fonte: https://goo.gl/fnwUxr
Sem responder minha pergunta, ela aplicou o medicamento e saiu. Após algum tempo ela retornou e aplicou mais um medicamento, e novamente eu perguntei o que era aquilo, falei que era alérgica a dipirona e queria saber o que era. Ela me olhou e perguntou se a dor tinha passado, eu ainda com muita dor, respondi que não. Então ela falou: “Agora com esse aqui vai passar, ou passa ou então não tem mais jeito para você aqui”, e mais uma vez saiu sem responder a minha pergunta.
Depois disso, deitei na cama e comecei a chorar, pois os sentimentos de medo, incerteza e indignação me inundaram naquele momento. Vendo aquele choro discreto na última cama do corredor, uma outra técnica se aproximou de maneira educada começou a conversar, perguntou o que eu estava sentindo e por que eu chorava se já tinha sido medicada e o medicamento já devia estar fazendo efeito, ouvindo isso chorei ainda mais pois a dor continuava na mesma intensidade o medicamento não teve efeito. Então respondi que a dor estava na mesma intensidade de quando cheguei, e que a outra mulher tinha falado que se aquele medicamento não parasse a dor nada mais poderia ser feito ali para me ajudar. Ela me ouviu, conversou comigo, esclareceu quais foram os medicamentos que foram aplicados e foi procurar o medico para que reavaliasse se aquele era o melhor medicamento mesmo, já que a dor era incessante.
Em seguida outro médico chegou, me reavaliou e mandou aumentar a dose do medicamento, pois aquele era o mais forte que tinha na unidade e realmente, se aquele meio terapêutico não surtisse efeito eu seria encaminhada ao HGP. Este médico respeitando o princípio de autonomia e justiça, respeitando o princípio do SUS de Integralidade, agindo com ética, educação, atenção e humanidade, me explicou tudo o que estava acontecendo comigo de forma objetiva e com linguagem fácil, me assegurou que em breve a dor iria passar e que logo voltaria com o resultado do exame. Continuei aguardando por um tempo e depois fui informada pela “enfermeira boazinha” que tanto o primeiro quanto o segundo médico que me atendeu tinham ido para o repouso e que em breve outro médico vinha olhar o exame.
Fonte: https://goo.gl/9kmR79
Às 06:00 horas da manhã esse outro médico apareceu, bem grosseiro começou a gritar o nome das pacientes em voz alta na enfermaria, ao chegar no meu nome fiz um sinal com a mão e ele pediu que me aproximasse dele, então desci da cama tonta pois a pressão estava um pouco baixa e fui, ele olhou o exame e falou que não tinha nada e já podia ir para casa. Eu falei que ador ainda persistia, em menor intensidade mas ainda doía. Sem ao menos ler no prontuário onde estava escrito com destaque que sou alérgica a dipirona, ele me receitou uma dipirona e falou que após isso estava de alta. Novamente tive que falar da alergia e então depois de verbalizar, em tom de ironia, que “esse povo hoje em dia são cheios das alergias” receitou um buscopam simples.
Por volta das 08:00 horas da manhã da segunda-feira retornei para casa, ainda com um pouco de dor e com a pressão baixa e com uma experiência muito mais dolorosa do que deveria. O sentimento era de gratidão para algumas pessoas maravilhosas que realmente desempenaham com muito profissionalismo suas funções. E de indignação por outros que fazem aquilo como se estivessem cumprindo uma pena, tratando tão mal uma pessoa que já se encontra fragilizada tanto fisica como emocionalmente.
Aos 14 anos contraí dengue pela segunda vez. Alguns sintomas ao qual me lembro de ter sentido foram febres, dor de cabeça intensa, moleza e dor no corpo e um extremo cansaço. Tendo se manifestado esses sintomas, meus familiares já suspeitaram que poderia ser o vírus da dengue se instalando em meu organismo e com isso me levaram ao UPA/NORTE. Tendo o diagnóstico comprovado e por perceberem que minhas plaquetas estavam abaixo do padrão de normalidade, fiquei internada por alguns dias no hospital, sendo medicada e com um acompanhamento contínuo.
Foram dias bem exaustivos, pois o ambiente hospitalar não é agradável. Porém, a equipe médica que me assistiu foi bem acolhedora, demonstrando afeto e preocupação. Essa foi uma das experiências em que tive contato com o SUS, na qual foi experenciada de forma positiva, sendo acompanhada por uma equipe médica apta a atender o paciente na situação em que se encontra de forma humanizada.
Confesso que há algum tempo em que apresento dificuldades para comparecer em algum serviço ofertado pelo SUS, seja em Unidades de Pronto Atendimento (UPA), Unidades Básicas de Saúde (UBS), seja para realizar consultas, marcar agendamentos ou mesmo em situações em que meu estado de saúde não está satisfatório, na qual apresento sintomas em meu organismo, porém, vou adiando e evitando o contato com esse ambiente.
Mesmo tendo aversão ao ambiente hospitalar, quando preciso esse sistema está de portas abertas a me atender. Percebo a importância e a contribuição do SUS para com a sociedade. Esse sistema garante que todos possam ter acesso aos serviços de saúde (Universalidade), articulando aspectos curativos e preventivos (Integralidade) e tratando os indivíduos de maneira justa, de acordo com sua necessidade (Equidade).
Sendo assim, esse serviço prestará assistência a todo brasileiro. Como cidadãos temos acesso aos variados níveis de atenção oferecidos pelo SUS, de acordo com cada necessidade. Somos seres únicos, compostos por subjetividades e particularidades, inseridos em contextos diferentes, com hábitos distintos, porém, todos temos um bem precioso em comum: nossa SAÚDE, e dela devemos zelar. Nos tornarmos frágeis a partir do momento em que uma doença nos acomete, por isso precisamos cuidar do nosso corpo.
Para que haja uma melhor compreensão da reforma psiquiátrica é necessário atentar para dois pontos marcantes nesse processo. Inicialmente a desconstrução da ideia de que o louco é uma ameaça para sociedade e não pode ter convívio com as pessoas consideradas normais, por isso deveria ter um lugar para abarcar o indivíduo no seu decurso de loucura. E posteriormente precisamos compreender o fortalecimento dos serviços substitutivos, ou seja, substituir a lógica manicomial de que existe um lugar específico para esses loucos, o manicômio e somente a psiquiatria poderia tratar esses problemas (MELO, 2012, pág 86)
Melo (2012) cita Amarante (2007) em seu texto, onde ele afirma que a reforma psiquiátrica é um processo amplo que se utilizou de diversas estratégias na remodelação e avanços dos cuidados a saúde mental. Abrangendo 4 dimensões principais: Teórico-conceitual, onde a saúde é entendida como um processo saúde-doença; desinstitucionalização; Técnico assistencial que é a construção de serviços substitutivos ao manicômio CAPS/NAPS, livre de isolamento, repressão e disciplina; Jurídico-política que são as mudanças na legislação, sanitária, civil e penal que vinculavam a loucura com periculosidade, incapacidade social e irresponsabilidade; Sócio-cultural onde há a construção de um novo lugar social para abrigar o sujeito na sua insanidade, trabalhando no imaginário social e o conceito de loucura construído a anos.
A Reforma Psiquiátrica se consolida como marco fundamental da política de assistência à saúde mental oficial com a virada do século, a influência de suas ideias vem-se expandindo no campo social, jurídico, e nos meios universitários que formam os profissionais da saúde. Apesar das dificuldades enfrentada pelo sistema de saúde pública do Brasil, o cenário psiquiátrico vem mudando, os mais de mil Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) espalhados pelo país vem modificando rapidamente a estrutura da assistência à saúde mental.
Fonte: goo.gl/4riQjY
A proposta da criação do CAPS é de substituir o modelo hospitalocêntrico e manicomial, de características opressivas, excludentes e reducionista. Ao invés desse modelo antigo, vem sendo construído com base nos princípios fundamentais do Sistema Único de Saúde (SUS) sendo eles a equidade, universalidade e integralidade, cujo alcance ultrapassa as práticas de saúde e atinge o social e as formas culturalmente validadas de compreensão da loucura.
A proposta da Reforma Psiquiátrica se desdobra em vários planos, situados em diversos campos: Plano Assistencial, pensar em modelos e intervenções, além de inovadores, adequados e mais abrangentes, sem se fixar em apenas um modelo, pois há diversas culturas e contextos compondo a sociedade brasileira; Formação de Recursos Humanos, por se tratar de pessoas jovens a maior parte dos novos profissionais, não foi vivido por eles o processo da luta antimanicomial, de um lado é preciso dar-lhe uma formação teórica e técnica sólida, por outro, é necessário que fomente uma vocação crítica e criativa para atender aos desafios que surge no processo de transformação contínua; nos planos Jurídico e Político, o tema de direitos humanos e defesa da dignidade da pessoa, tem sido acrescido de iniciativas que avançam na discussão dos direitos civis e sociais dos indivíduos portadores de transtornos mentais; no Plano Sociocultural, transformar a loucura e o sofrimento numa questão que ultrapasse discursos técnicos e do saber psiquiátrico, insistindo na dimensão existencial e humana que é facilmente deixada para trás da fala e protocolos médicos-psicológicos.
Após toda uma trajetória de movimentos sendo o resultado de um árduo processo científico-político-social, iniciado na década de 1950 nos países europeus e no final da década de 1970 se enquadrando no contexto brasileiro, deu-se início às mudanças do modelo hegemônico no Brasil, para o modelo de atendimento psiquiátrico comunitário, baseados em serviços de saúde mental descentralizados, multiprofissionais e diversificados que visavam acabar com as condições precárias e trazer a humanização no tratamento existente antigamente em manicômios, os protestos que aconteciam fizeram com que a reforma fosse ganhando consolidação.
Fonte: goo.gl/4n8bXd
A retomada de uma das conquistas mais importantes para a reforma psiquiátrica brasileira foi quando a Lei 10.216 foi posta em vigor, no dia 6 de abril de 2001. Houve início o processo ao qual se tinham uma atenção mais abrangente, incluindo prevenção, promoção, recuperação e ressocialização das pessoas com transtornos psiquiátricos, substituindo os descasos existentes no principio. Com o passar do tempo também foi exigido à existência de equipes multiprofissionais, acomodações adequadas, espaços para recreação e terapias complementares para o tratamento dos pacientes institucionalizados.
Por fim, o processo de reforma psiquiátrica brasileiro acontece de forma contínua, a desinstitucionalização ocorrida ainda é vista em andamento, gerando questionamentos e enfrentando dificuldades. Todavia, vem constituindo um desenvolvimento muito importante para a garantia dos direitos humanos e a cidadania das pessoas com transtornos mentais, visando sempre o aprimoramento dos serviços de saúde mental.
REFERÊNCIA:
MELO, Anastácia Mariana da Costa. Apontamentos sobre a reforma psiquiátrica no Brasil. Cadernos Brasileiros de Saúde Mental, Santa Catarina,v. 4, n. 9 (2012).
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Você sabe como e porque as desigualdades sociais fazem mal à saúde?
Livro escrito por Rita Barradas Barata, da coleção Temas em Saúde, publicado pela Editora Fiocruz, em 2009 no Rio de Janeiro, “Como e porque as desigualdades fazem mal á saúde” é de leitura interessante e indispensável. Barata traz em seu livro questionamentos sobre a desigualdade, como e porque ela afeta a saúde.
Muitos tentam esvaziar o conteúdo político e as conotações de injustiça social e desrespeito aos direitos humanos expressos nessas desigualdades, reduzindo-os simplesmente a diferenças entre indivíduos ou grupos de indivíduos definidos segundo as características biológicas. (BARATA, 2009, p. 11)
Barata traz em seu discurso a ideia de que a dimensão das desigualdades sociais é maior que só “características biológicas”. Ela marca o início do capitalismo como um ponto em que esse tema foi bastante abordado, onde a sociedade burguesa, que defendia os princípios de igualdade, fraternidade e liberdade, contradizia a realidade da vida da maioria dos indivíduos dos países industrializados.
Mas, quando falamos em desigualdade social geralmente estamos nos referindo a situações que implicam algum grau de injustiça, isto é, diferenças que são injustas porque estão associadas a características sociais que sistematicamente colocam alguns grupos em desvantagem com relação à oportunidade de ser e se manter sadio. (BARATA, 2009, p. 12)
Fonte: goo.gl/oDXayP
A autora defende que os sistemas nacionais de saúde e outras políticas sociais deveriam trabalhar em busca da universalidade, integralidade e equidade. Complementa dizendo que as instituições sociais formais de diferentes setores até levam em sua estrutura, um ideário de estratégias contra as desigualdades, porém, os discursos usados são simplórios, sem levar em consideração os fatores que provocam a desigualdade de fato.
Barata, junto a outros teóricos da medicina social, investiga as variáveis sociais deixando de lado explicações simplificadas e analisando as complexidades dos problemas sociais. Como exemplo dado no livro: Uma gestante, fumante, possivelmente trará malefícios para a criança como; baixo peso, fragilidade corporal, etc., mas, são impactos diferentes se essa gestante é da burguesia, do proletariado ou do sub-proletariado.
Em seu livro, cita as explicações “sócio-históricas” das desigualdades e Barata (2009, p. 23) afirma: “O conceito-chave nessas abordagens é o processo de reprodução social, que, por sua vez, implica a reprodução de diferentes domínios de vida”.
“O sistema de reprodução social dos diferentes grupos inclui os padrões de trabalho e consumo, as atividades práticas da vida cotidiana, as formas organizativas ou de participação social, a política e a cultura.” (BARATA, 2009, p.24).
Ao adotar este tipo de explicação teórica significa romper com a concepção linear de causalidade e abandonar qualquer pretensão de identificar cadeias de causa-efeito entre características ou indicadores sociais e problemas de saúde, bem como entre indicadores de desigualdades sociais. (BARATA, 2009, p. 35)
Fonte: goo.gl/wbrEoZ
A autora segue abordagem na qual defende a não linearidade para eficácia nas resoluções dos problemas sociais. Uma vez que cada indivíduo sofre e reage a uma determinada situação de determinadas formas que são possíveis e que se enquadram na sua classe social.
“O estudo das desigualdades sociais em saúde deveria, idealmente, ter como variável explicativa a classe social construída com base nas relações fundamentais estabelecidas a partir da posição dos indivíduos na estrutura produtiva da sociedade.” (BARATA, 2009, p. 35).
A classe social tem tamanha importância para a saúde, porém
Há vários aspectos a considerar no chamado paradoxo entre riqueza e saúde: a comparação de países, a comparação de regiões de um mesmo país e a comparação entre ricos e pobres […] é importante prestar atenção a dois aspectos relacionados à renda e à riqueza: os valores absolutos e a distribuição ou valores relativos. (BARATA, 2009, p.42).
Barata (2009, p. 56) explica baseado na Teoria Ecossocial, que a discriminação sofrida por certas etnias é um exemplo de imposição do domínio de etnias mais evoluídas economicamente.
Fonte: goo.gl/xZYBJb
Dentro desse entendimento, percebemos claramente, que, o sistema de saúde jamais pode manter o padrão de atendimento com base nas etnias, e sim com base nas necessidades de cada indivíduo.
[…] Além das condições socioeconômicas já assinaladas em relação ao estado de saúde, nas desigualdades no acesso a serviços importa também a configuração da política nacional de saúde, isto é, quais os princípios que a constituem, a forma de organização dos serviços e as formas de relação que se estabelecem entre clientela e profissionais de saúde. (BARATA, 2009, p.63)
Barata (2009, p.63) diz que na saúde, há uma procura de um sistema mais igualitário, regidos pelos princípios de universalidade, integralidade e equidade. Cita como exemplo o SUS (Sistema Único de Saúde).
Barata (2009, p.75) coloca em seu livro um breve discurso sobre a diferença entre sexo e gênero, conclui que sexo possui um perímetro restrito, contendo caráter biológico e gênero possibilita a miscigenação do genótipo com o ambiente, onde, recebe influências sociais.
Fonte: goo.gl/DA8PA9
“[…] as desigualdades em saúde observadas entre homens e mulheres devem ser analisadas a partir dessa dupla determinação: as relações de gênero e as peculiaridades do sexo biológico” (BARATA, 2009, p.75).
“[…] um dos aspectos mais salientes dessas relações é a assimetria do poder que se estabelece entre homens e mulheres na maioria das sociedades […]” (BARATA, 2009, p.75).
Paradoxalmente, as mulheres, em praticamente todas as populações estudadas referem a pior avaliação do próprio estado de saúde e maior frequência de morbidade do que os homens. Algumas explicações para a morbidade mais acentuada nas mulheres baseiam-se nas diferenças hormonais e genéticas entre os sexos, considerando estritamente o ponto de vista biológico. O enfoque nas relações de gênero, entretanto, assinala os diferentes papéis sociais dos homens e das mulheres que acabam por determinar diferentes percepções sobre o processo saúde doença, assim como comportamentos distintos em relação à doença (BARATA, 2009, p.82)
Barata esclarece nesse trecho um a grande diferença entre o ponto de vista biologista e o ponto de vista social. Percebe-se que de fato a influência do ambiente para o indivíduo é de tamanha importância, porém, existe ainda, a influência da classe social, da raça ou etnia, do gênero.
Barata baseia sua obra na não-linearidade, no caso de gestantes que possuem o hábito de fumar, aponta a solução a partir de um controle a essa prática, porém, defende a presença de “[…] políticas compensatórias que possibilitem a melhor alimentação durante a gestação para evitar o baixo peso.” (BARATA,2009, p.96)
Fonte: goo.gl/SPDZwt
“No modelo de determinação social do processo de saúde-doença, as variáveis seriam tratadas através de um modelo hierárquico no qual o principal determinante é a classe social […] A inserção de classe determina igualmente as chances de ocorrência” (BARATA, 2009, p.97).
A autora enfatiza o princípio da equidade para a resolução dos problemas das desigualdades sociais envolvendo etnias ou raças, gênero e a classe social. O texto da autora Rita Barradas Barata apresentou uma visão bastante afrontadora para com o sistema capitalista. Onde o que é implantado pela sociedade nem sempre condiz com a realidade de grande parte da população de um país.
Barata traz de forma genial as diferentes reações dos indivíduos de acordo com a classe social. E se já carrega um passado de inferioridade, na sociedade Patriarcal, como as mulheres ou se trazem uma história de escravidão, exemplo: as etnias que já habitavam o Brasil, antes da chegada dos portugueses, tidas como inferiores por não alcançarem o padrão de normalidade dos portugueses.
Além do princípio de “equidade” defendido por BARATA (2009), acredito que possa aumentar impostos pagos pela burguesia e que essa renda arrecadada seja investida em progressos para indivíduos do proletariado e do sub-proletariado.
Fonte: goo.gl/RBtVQK
Essa pode ser uma alternativa, levando-se em consideração que grande parte da população possui baixa renda e apenas uma minoria possui renda alta.
Podemos notar também que BARATA (2009) traz em seu livro a desigualdade entre gênero, raça ou etnia. O contexto social construído com uma história de escravidão que homens, no caso do Brasil, português com a pele branca, que autoconsiderava mais evoluídos, por meio da força, obrigou índios e negros a trabalharem em condições desumanas.
E o passado de uma vivência em uma sociedade Patriarcal trazendo a mulher durante séculos como inferiores aos homens, cultura que permeia os dias de hoje, como exemplo, a Igreja Católica, que não possui mulheres à frente de suas hierarquias.
Acredito que, levando-se em conta todo esse passado, há uma necessidade de uma base educacional engajada para o desenvolvimento crítico do indivíduo, baseada em uma ideologia de igualdade.
Com a passagem dos anos esse ideário pode ser atingido.
FICHA TÉCNICA:
COMO E PORQUE AS DESIGUALDADES SOCIAIS FAZEM MAL A SAUDE
Fonte: goo.gl/Ppm7uQ
Título Original: COMO E PORQUE AS DESIGUALDADES SOCIAIS FAZEM MAL A SAUDE Autor: Rita Barradas Barata Idioma: Português Editora: Fiocruz Páginas: 118 Ano: 2009
REFERÊNCIA:
BARATA, Rita Barradas. Como e Por Que as Desigualdades Sociais Fazem Mal à Saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009.
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Viola Davis: uma nova perspectiva sobre o cinema e a Mulher Negra
“[…] o que eu tenho em mim – meu corpo, meu rosto, minha idade – é suficiente.”
Viola Davis fez história na premiação do Oscar que chegou a sua 89ª edição ocorrida em 2017. É a primeira vez nas premiações do Oscar, que uma mulher negra chega a marca de três indicações. Viola foi premiada com o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante com o filme “Fences”, em português “Um Limite Entre Nós” e soma o Globo de Ouro com o longa, além de levar o Tony Awards em 2001 com King Hedley II e em 2010 com sua atuação na Broadway em “Fences”. Em 2009 foi indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante com o filme “Dúvida”, além da indicação ao Oscar de Melhor Atriz com o filme “Histórias Cruzadas”.
Viola Davis no filme “Um Limite Entre Nós”.
Seu reconhecimento em massa veio em sua atuação como Annalise Keating, uma advogada de renome na série produzida por Shonda Rhimes “How To Get Away With Murder”, em português “Como Defender um Assassino”. Essa personagem lhe rendeu o Emmy de Melhor Atriz em Série de Drama. A primeira mulher negra a receber o prêmio. Ao receber o Emmy, o Tony Awards e o Oscar, Viola entra para a lista de apenas 23 nomes que receberam a Tríplice Coroa de Atuação.
Em um de seus discursos mais famosos na entrega do Emmy em 2015, Viola levantou debate sobre a dificuldade que as mulheres negras enfrentam nos mais diversos campos. Ela afirma que “A única coisa que diferencia as mulheres negras de qualquer outra é a oportunidade. Você não pode ganhar um Emmy por papéis que simplesmente não existem”. Uma problemática que vem tomando os espaços de debate e traz reflexões como a Bei Hooks, importante nome dentro do feminismo negro nos Estados Unidos.
“Obrigada por nos levar além dessa linha.” Fonte: http://zip.net/bqtGS3
Para nós negras é necessário enfrentar esta questão não apenas porque a dominação patriarcal conforma relações de poder nas esferas pessoal interpessoal e mesmo íntimas, mas também porque o patriarcado repousa em bases ideológicas semelhantes às que permitem a existência do racismo, a crença na dominação construída com base em noções de inferioridade e superioridades. (HOOKS, 1989, p.23).
Sobre os espaços conquistados dentro da Academia, Viola ressalta que existiram mulheres negras que abriram as possibilidades de valorização no campo das artes. Taraji P. Hanson, Kelly Washington, Halle Berry, Nicole Beharie, Meagan Good e Gabrielle Union foram citadas por ela como sendo precursoras na luta em busca da valorização e reconhecimento das mulheres negras no cinema.
Em seus discursos, a atriz reafirma sua gratidão a diretores que quebraram os padrões ao proporem novos espaços de atuação para as mulheres negras, como o exemplo de Shonda Rhimes que descreve Annalise Keating na trama de “How To Get Away With Murder” como sendo uma mulher independente, bem sucedida, que dá aulas de Direito em uma universidade renomada. O filme “Estrelas Além do Tempo” reafirma os novos tempos não apenas no campo cinematográfico, mas que ultrapassa fronteiras e mobiliza ações em todo o mundo.
Annalise Keating, de “How To Get Away With Murder”.
Angela Davis, filósofa e ativista afro americana, em seu discurso na Marcha das Mulheres (2017) afirma que a marcha “representa a promessa de um feminismo contra o pernicioso poder da violência do Estado. É um feminismo inclusivo e interseccional que convoca todos nós a resistência contra o racismo, a islamofobia, ao anti-semitismo, a misoginia e a exploração capitalista. O pensamento feminista negro, então é um conjunto de experiências e ideias compartilhadas por mulheres afro americanas – mas não somente – que oferecem um ângulo particular de visão de eu, da comunidade e da sociedade. Ele envolve interpretações teóricas da realidade de mulheres negras por aquelas que realmente a vivem (COLLINS, 1989).
Viola Davis está construindo espaços de reconhecimento e empoderamento de mulheres negras e esse novo cenário no campo cinematográfico reverbera em novos modos de ser e agir na sociedade. Ao falar sobre as diferenças entre mulheres brancas e negras e os problemas de classe, Davis amplia as possibilidades de discussão. Em seus discursos o assunto paira e traz à tona, temáticas de domínio do feminismo negro, como o legado de uma história de luta, a natureza interligada de raça gênero e classe, o combate aos estereótipos ou imagens de controle, a atuação como mães professoras e líderes comunitárias e a política sexual. (COLLINS, 1991).
Viola em seu discurso no Oscar 2017. Fonte: http://zip.net/bqtGS5
As lutas em busca de equidade entre mulheres brancas e negras não terminam aqui, porém quanto mais houver a abertura de espaços de maior alcance para a discussão e conscientização desses temas, maior será a mobilização social, pois “o que as mulheres compartilham não e a mesma opressão, mas a luta para acabar com o sexismo, ou seja, pelo fim das relações baseadas em diferenças de gênero socialmente construídas.” (HOOKS, 1989).
O combate às desigualdades de direitos entre homens e mulheres no campo profissional, nas relações cotidianas, nos relacionamentos e nas oportunidades deve permanecer, e como Viola Davis defende na entrega do Globo de Ouro 2017 para atriz Meryl Streep, nós viemos para “viver em voz alta” e lutar em prol da diminuição dessas disparidades é fundamental na busca de uma sociedade mais tolerante, igualitária e principalmente, mais sensível ao outro, mais humana.
REFERÊNCIAS:
BORGES, Juliana. O Discurso de Angela Davis na Women’s March.2017. Disponível em: <https://cronicasnabelavista.wordpress.com/2017/01/22/brevissimas-do-facebook-o-discurso-de-angela-davis-na-womens-march/>. Acesso em: 06 mar. 2017.
COLLINS, Patricia Hill. Black Feminist Thought: Knowledge Consciousness and Polifics of Empowerment. Nova Iorque: Routledge, 1991.
HOOKS, Bei. Talking Back:Thinking Feminist Thinking Black. Boston: South End Press, 1989.