Racismo Estrutural no Brasil: (En)Cena entrevista o ativista Mauro Baracho

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O (En)Cena reproduziu a entrevista com o ativista e mestrando em Antropologia pela UFMG, Mauro Baracho, para o curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra, sobre o tema Racismo Estrutural no Brasil, que dentre outros aspectos abordou sobre as consequências do racismo e machismo na sociedade, suicídio entre grupos negros e seus estudos com homens negros.

(En)Cena – Poderia falar sobre a ideia da existência de uma democracia racial no Brasil, da ideia que foi vendida, que foi feita dentro da estrutura estatal a partir de livros didáticos no passado, através de grandes esquemas ideológicos que tentam vender essa imagem  de que as coisas são iguais para todos, de que não há preconceitos, não há racismo, não há discriminação.

Mauro Baracho – Por conta das manifestações nos Estados Unidos, as pessoas se questionam por que os negros brasileiros não se revoltam como os negros americanos. Nessa questão, entra uma série de apagamentos de revoltas negras ao longo da história, mas também entra o processo histórico de pós abolição do Brasil e dos Estados Unidos. E no Brasil, optou-se em maquiar as diferenças sobre ideia de democracia racial.

Vem dessa ideia do exterior que o Brasil é essa mistura de povos, e de fato é, que o Brasil é uma mistura de africanos, de europeus, de indígenas. Mas que na prática, no dia a dia isso não significa muita coisa, porque a discriminação está na aparência, na cor de pele. E ninguém leva isso em conta na hora de contratar na vaga de emprego.

O Brasil optou em criar uma ideia de que é um país mestiço, como de fato era, ela vai ser reforçada principalmente por obras. Para que isso funcione precisa de intelectuais pensando, produzindo obras para criar esse aspecto positivo, principalmente na obra de Gilberto Freire em “Casa-grande e senzala”, que eram muito fortes as ideias do racismo científico onde os mestiços eram considerados como raça degenerada, era a pior raça. Os brancos, os amarelos, os negros e depois os mestiços. Então, essa obra vem para dar um aspecto positivo na identidade mestiça do Brasil. Vem consolidar essa ideia de democracia racial no país, dizer que a escravidão não foi tão cruel, que era branda porque os senhores de engenho e as escravas se relacionam e em que circunstâncias aconteciam essas relações. Na abertura do livro, descreve que nasce uma nova nação, que é a mistura do branco, negro e indígena. Que o racismo não é institucionalizado, no sentido de não ter lei de segregação, mas sabemos que a segregação se deu por costume; nos Estados Unidos se deu por lei e aqui no Brasil se deu por costume. Isso foi um artifício para não se discutir racismo no Brasil, para dizer tem gente misturada, existe branco,  negro e não precisa se falar em racismo.

A ditadura militar perseguiu vários blacks no Rio de Janeiro, por medo do pessoal se inspirar nos movimentos norte americanos, porque não queriam transparecer que existiam diferenças raciais no Brasil. O filme do Simonal mostra isso, quando ele é chamado pelos militares, e interpelam ele por uma letra, afirmando que não existe racismo no Brasil e pregar a ideia de que somos todos uma mistura.

(En)Cena – O antropólogo Munanga, fala em uma das suas obras que o racismo no Brasil, muito mais que qualquer parte no mundo, se dá numa lógica de crime perfeito. Porque dificilmente a gente conhece por vias institucionais, pela grande imprensa, quem são as vítimas, o rosto, a história de fato, e muito menos quem são os algozes. Porque isso cria a falsa sensação de que os crimes de racismo não ocorrem, porque eles também não são noticiados na mesma proporção.

Mauro Baracho – Eles até são noticiados, a gente vê muitos crimes de injúria. Mas é tudo pensado para não punir os agressores, principalmente na separação do que é injúria racial e racismo. Porque racismo é quando ofende um povo, e a injúria é uma questão individual […]. Ao pensarmos como povo, e se uma pessoa me ofende  me faz uma injúria racial, o que impede dela cometer o mesmo crime com outra pessoa negra? Não é comigo, porque eu não tenho uma característica da cor da pele que ela vai fazer isso, ela pode fazer isso com qualquer outra pessoa. É um crime perfeito porque nesse sentido de quem comete, além de sair impune, quem denuncia sai como chato, o extremista. E ao longo da história, percebemos que a galera vai criando mecanismos para abafar essas injúrias raciais. Eu lembro da minha mãe, que é preta, ao chegar e contar para ela sobre episódios de racismo, ela dizer que isso tudo era cisma.

O jornalista Carlos Medeiros fala dessa questão da cisma, que as pessoas falam que racismo é cisma, ele fala que é ‘complexo de cor’ que é a ideia de que os pretos já são cismados, veem racismo em tudo. Então, essa questão de crime perfeito, a pessoa que sofre o racismo é vista como chata, extremista e ‘mimizenta’, e a pessoa branca, como liberdade de expressão, ou são brincadeiras.

(En)Cena – Vejo muito nas universidade um movimento crescente de descolonização das subjetividades, como eles chamam, principalmente os filósofos, sociólogos, e alguns psicólogos  no sentido de fazer com que a gente repense a nossa linguagem. Que a nossa linguagem foi construída também em cima de uma lógica bastante excludente, de uma lógica de separação, de uma dualidade. Um exemplo, a casa onde mora o presidente dos Estados Unidos é a casa branca, nos contos de fadas vemos a Branca de Neve. Então, tudo que está relacionado a brancura, a branquitude coloca-se como aspectos positivos e tudo que está relacionado a negritude, normalmente eram associados a aspectos negativos.

Percebo que muitas pessoas se incomodam quando essas questões são levantadas, e o cuidado que deveríamos ter, eu imagino, é justamente nessa dimensão mais elementar que é na linguagem. Por isso, que talvez as piadas racistas, de fato, elas têm que ser confrontadas, mas tem um grupo crescente  de pessoas que atacam o politicamente correto, elas querem ter o direito de rirem das outras pelas suas particularidades, inclusive são pessoas que consideram que o mundo está mais chato porque elas não conseguem, por exemplo fazer uma piada com um negro, um homossexual, um judeu. Como você vê isso? Pois, o tempo inteiro eu como professor escuto isso, de vez em quando, “eu não posso mais me expressar agora”. É como se a liberdade de pensamento e de fala estivesse acima de qualquer coisa, inclusive da integridade do outro, parece que há uma distorção.

Mauro Baracho – Sim. Tem até um documentário chamado ‘O riso do outro’, que fala exatamente disso. As pessoas falam que não podem se expressar, e quando você aponta algumas piadas racistas, elas se sentem cerceadas, então ela quer ter o direito de ser racista, direito de ser homofóbica, direito de ser machista.

Os Trapalhões, cresci nos anos 90 vendo o Didi fazer piadas racistas com o Mussum, e eu ia para a escola e os meninos reproduziam as piadas em mim e em outros meninos negros, e era brincadeira, era piada. E eu não gostava daquilo, e  duvido que uma pessoa preta vai curtir esse tipo de piada. E se a gente reclamasse, seria o cara excluído, o cara chato; então, isso tem uma questão de socialização.

Quando a gente começa a falar que as coisas não são legais, as piadas racistas, homofóbicas, a galera começa a se sentir ofendida por não poder fazer mais.

Ouvi um comentário que estão acabando com a alegria do brasileiro, aí a gente vê que a alegria do brasileiro é diminuir mesmo, diminuir gente preta, diminuir pessoas gays, mulheres. Porque para eles, o humor é isso, é fazer piada com pessoas que já passam por um processo muito difícil por serem gays, por serem negras, por serem mulheres.

Tiveram pessoas defendendo as manifestações ‘charlotte’s view’ nos Estados Unidos em 2015, que defendia o ato como liberdade de expressão. Eles partem da ideia de que liberdade de expressão é falar o que quiser doa a quem doer, e o humor tem essa ideia deliberal também, que não pode ter tabu ou barreiras. E os meios que defendem isso são sempre os mesmos, Danilo Gentili, essa galera que nunca teve a menor graça mas só chegou onde chegou porque o Brasil é um país muito racista, muito homofóbico, muito machista e sádico. Que sente prazer em ver pessoas como Danilo Gentili, Léo Lins, Sílvio Santos humilhando pessoas. Sílvio Santos levava travestis no seu programa para fazer piadas da cara delas, em pleno domingo a noite no horário nobre. E essas pessoas só são permitidas a espaço na mídia se forem caricaturas, como Vera Verão, o Jorge Lafond. Porém, só era aceitável quando era pra fazer rir. Relação de poder é isso, você se afirma, diminuindo o outro.

(En)Cena – Sobre a questão da apropriação cultural. Acaba surgindo na imprensa alguns grupos que aderem a artigos que são da cultura negra, começam a ser colocados como moda, ou um estilo, tirando inclusive, as características iniciais que tem até uma conotação política … Fazem uma mistura geral para relativizar a ação. Achei interessante o seu post sobre o alisamento de cabelos.

Mauro Baracho – As pessoas usam isso quando a gente fala de apropriação cultural, primeiro que começam a achar que apropriação cultural é quem pode ou não pode usar turbante, quem pode ou não pude usar tranças. Porém, estamos discutindo processos históricos, de culturas que foram marginalizadas, dita como atrasadas, que tiveram seus processos culturais marginalizados no ocidente e hoje elas são legais desde que sejam em corpos brancos. Quando apareceram três atrizes brancas, Mariana Ximenes, na capa de uma revista usando turbantes. Então quando uma pessoa negra usa um turbante na rua é apedrejada, chamada de macumbeira, mas quando uma pessoa branca usa um turbante é a coisa mais descolada do mundo. As pessoas vem fazer essa falsa simetria de que se for por esse lado, pessoas pretas se apropriam da cultura branca quando alisam o cabelo, já partem para uma premissa totalmente errada, o cabelo é um traço genético.

E a questão das tranças é um elemento cultural no sentido que ela já foi usada para transmitir significados além do tempo, dizem que na época de escravidão as tranças eram usadas para desenhar rotas de fugas, e estamos falando de penteados e não de textura de cabelo. E as pessoas pretas não alisam os cabelos para apropriação da cultura branca, mas para serem aceitas, pois crescem tendo vários padrões de nariz fino, cabelo liso. Ninguém que alisa o cabelo toma o lugar de uma pessoa branca.

(En)Cena – Você que está dentro da universidade, eu percebo que dentro do cientificismo, que é aquela ciência mais dura, dentro daquelas ideias de pessoas que acreditam que a ciência é a única forma de explicar os fenômenos, há uma ciência patriarcal, de origem branca, muito influenciada pela língua inglesa, bastante liberal do ponto de vista econômico. Essa ciência tem uma tendência a se colocar como uma espécie de universalizante, no sentido de desconsiderar os outros saberes. A gente vê isso muito claramente no Brasil quando os saberes populares relacionados a medicina e a linguística, a dinâmica dos cuidados dos povos indígenas e povos negros foram totalmente excluídas dos debates públicos e também não foram considerados como ciência no sentido mais amplo. E isso eu ainda percebo no meio acadêmico, não sei se você também percebe isso no meio acadêmico, uma supervalorização do que seria o científico, mas sem entender de forma mais profunda de onde vem esse científico; se esse científico inclui esses saberes tradicionais ou se ele exclui os saberes tradicionais. Os estudos do francês Edgar Morin, apontam que não é mais possível explicar o ser humano a partir de um pressuposto, de um paradigma, por exemplo, o paradigma científico positivista; ou a gente se abre para outras formas de interpretar esse sujeito e entender esse sujeito ou a gente está fadado ao fracasso.

Mauro Baracho – Se tem uma falsa ideia de que a ciência é neutra, e a academia também não é. Ainda se tem essa resistência, principalmente pessoas pretas e indígenas quererem produzir outras narrativas. Eles gostam de pesquisar o negro, os indígenas, mas quando entra uma pesquisa de branquitude, as pessoas ficam receosas. A minha pesquisa é sobre masculinidade negra, pesquiso o primeiro grupo de masculinidade negra de Belo Horizonte, onde homens pretos se reúnem para discutir masculinidade negra, as questões que atravessam os homens pretos, porque até então a gente só via discussão de meninas pretas. E em Belo horizonte, já deve ter em torno de um ano e meio que eu pesquiso sobre o assunto, e fui muito guiado a pesquisar sobre isso por conta das minhas leituras de autoras negras. Quando eu entrei no mestrado, o grupo estava surgindo com dois homens pretos que foram em um encontro de masculinidade que só tinham homens brancos […]. O interessante foi que depois de um tempo, começaram a levar os pais, os filhos para debaterem.

(En)Cena – Você chama atenção para a construção de quilombos por parte da população negra. Quilombos que podem voltar a replicar estruturas hierárquicas. Do que você estava falando exatamente?

Mauro Baracho – Está na moda falar em construção de espaços, mas não se pode construir um espaço exclusivo para gente preta sem considerar uma série de coisas. Enquanto estiver replicando lá dentro estruturas hierárquicas, no sentido de por ter um título acadêmico, uma visibilidade maior, você tem mais prestígio que outras pessoas pretas. E isso é um cuidado que a gente deve ter nessas estruturas e várias áreas da nossa vida.

A gente tem que considerar uma série de coisas, por exemplo questões de autoestima, saúde mental. Eu criar um quilombo, um grupo de pessoas pretas para reunirem, ou criar uma roda de conversa para reproduzir hierarquias no sentido de que eu posso falar porque tenho um título acadêmico, como se eu tivesse mais prestígio, sem fazer violência psicológica, afinal a maior parte dos suicídios é em população negra.

(En)Cena –  Você falou de uma questão que ocorre no Brasil que é a quantidade de ideação suicida seguida de suicídio da população negra, principalmente os jovens, algumas pesquisas mostram que são de 2 a 3 vezes maior a ocorrência nessa população. Me fez lembrar também de alguns dados que são levantados, de vez em quando, sobre a solidão entre as mulheres negras, principalmente entre as mulheres a partir da meia idade. Esse é um fenômeno que aliado ao próprio fenômeno do racismo estrutural, acaba ceifando vidas, pelo menos do ponto de vista psicológico, afetando muito a saúde mental dessas mulheres. Você conhece algum projeto em Belo Horizonte, ou no Brasil, ou algum autor que trabalha essa questão da solidão entre a população negra em especial as mulheres ou a população em geral?

Mauro Baracho – Sim. Essa questão da solidão é pautada pelas mulheres pretas na década de 80, Laura Moutinho, Sueli Carneiro, Claudete Alves, Ana Cláudia Pacheco; são todas autoras que produziram sobre a solidão da mulher negra. Que não se dá somente na área afetiva ou sexual, a solidão no sentido também mais geral. A medida que tem aquela pirâmide que coloca a mulher preta como a base da pirâmide, e outra, não acredito que em quilombos não se discuta a solidão da mulher preta. De fato, existiu a solidão da população negra no ocidente como eles gostam de colocar, e a solidão da mulher preta implica em todo o estado da pirâmide. E é um assunto que todos nós deveríamos refletir, e não deve ficar só restrito nas meninas pretas debatendo as mulheres pretas. Então, quando eu comecei a falar sobre isso, a galera curtiu porque tinham poucos homens falando sobre isso, tocando nesse assunto. De fato, isso não é um assunto fácil de ser falado, é um constrangimento, isso toca em algumas coisas, vai nas feridas. No livro da Claudete Alves, vai discutir essa questão de os homens negros que ascendem porque casaram com mulheres brancas. Ela quem traz essa implicância com os homens negros. Então, a solidão da mulher negra é um mix de machismo e racismo.

(En)Cena –  Você fez um post que me chamou atenção falando sobre as pessoas que são vítimas de racismo, como elas paralisam diante do racismo. Como isso ocorre? Já que você relatou que já foi vítima de racismo.

Mauro Baracho – Eu fiz aquela reflexão baseada em um livro. A gente estuda o racismo mas não espera por ele. Essa paralisia se dá por conta do encontro que temos entre a ideia de nós mesmos com a percepção das pessoas em relação a nós, você se vê objetificado e isso nos paralisa.

(En)Cena – Qual sua opinião pessoal sobre o futuro do nosso país em relação a um debate como esse, quais são suas perspectivas? Você acha que a gente está trilhando um caminho onde a gente vai amplificar essas vozes, muitas pessoas ficaram decepcionadas com os rumos políticos que tomamos nos últimos quatro ou cinco anos com uma virada para a extrema direita. Onde conquistas sociais que foram alcançadas nos últimos 20 anos foram postas em xeque, foram desafiadas, e a gente vê muitas pessoas desanimadas, são militantes e outros que veem esse cenário todo como um combustível para continuarem mais militantes ainda.

Mauro Baracho – Eu também estou um pouco pessimista, mas também não é algo que me faz desistir. Porque essa ascensão da extrema direita é uma tendência mundial, também não tenho perspectivas boas no Brasil, de que as coisas vão melhorar. Acho que tendem a se manterem. Independente de quem seja, vai continuar difícil. Talvez a gente ache que um governo mais progressista  ajuda para que caminhem melhor. O genocídio da população negra se intensificou nos 13 anos de PT, enquanto não se colocar o debate racial como centro do racismo e da escravidão as coisas vão continuar, não vão mudar muito. Então, para gente vai continuar difícil.

(En)Cena –  Agradecemos por sua participação.

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Implicações da Covid-19 na população negra brasileira

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O novo coronavírus, denominado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) de SARS-CoV-2, responsável pela doença Covid-19, emergiu e foi identificada em Wuhan, na China, em dezembro de 2019 (LANA et al. 2020). Em 11 de março de 2020, em virtude ao acelerado ritmo de disseminação do vírus, a OMS declarou a pandemia de Covid-19. Conforme dados da Organização Pan-Americana de Saúde (2020), foram ratificados, em nível mundial, 789.197 óbitos até 21 de agosto de 2020, ademais 22.536.278 casos de infecção foram confirmados.

As dores e inquietações provenientes das epidemias, além de serem condições de saúde, também estão associadas a problemas políticos e culturais, pois essas experiências são contextuais e relacionais, visto que o ser humano compreende dimensões biológicas, psicológicas e sociais. Diante disso, à vista dos dados consolidados e expostos pelos veículos de imprensa e informação, constata-se que, conforme Cunha (2020), há populações que se encontram mais sujeitas a contaminação e, consequentemente, a letalidade do vírus. Haja vista que alguns indivíduos configuram maior exposição e, por esse motivo, estão mais suscetíveis a serem atingidos e vitimados em razão de suas circunstâncias sociais, econômicas e de saúde. No cenário brasileiro, a pandemia do novo coronavírus atinge e afeta de modo desigual a população negra, periférica e vulnerável (AMPARO, 2020).

Acontecimentos lastimáveis como esse, além de deixarem rastros de mortes, sofrimento e muita dor, evidenciam um enorme abismo social. A constância da desigualdade presente neste país produz, no imaginário social, uma naturalização da mesma, o que “resulta de um acordo social excludente, que não reconhece a cidadania para todos, onde a cidadania dos incluídos é distinta da dos excluídos e, em decorrência, também são distintos os direitos, as oportunidades e os horizontes.” (HENRIQUES, 2001, p. 1).

Fonte: encurtador.com.br/fESV7

Racismo individual, institucional, estrutural

Silvio de Almeida, grande intelectual jurista, filósofo e professor, evidencia, em seu livro denominado Racismo Estrutural, que o racismo é sempre estrutural. O movimento histórico que aconteceu no século XVI com a ampliação da economia mercantilista junto ao  descobrimento do chamado novo mundo, e logo após o iluminismo que contribuiu de forma significativa e projetou ferramentas que se constituíam dos fatores biológicos, psicológico, econômico e linguístico, para classificar grupos de humanos, serviu basicamente de ponto de partida do que seria o modelo de “homem universal”, baseado no homem europeu.

O positivismo já no século XX, com suas técnicas mensuráveis, foi manejado de tal forma a contribuir com a disseminação do racismo científico. Através das concepções deterministas da época, defendeu-se então a superioridade do homem branco europeu sobre as demais raças, se utilizando de parâmetros da biologia e da física para afirmar que as características físicas, biológicas e ambientais eram capazes de explicitar “as diferenças morais, psicológicas e intelectuais entre as diferentes raças” (ALMEIDA, 2019, p. 25).

Numa perspectiva do racismo individual, o fenômeno é visto como um comportamento patologizado/anormal de um sujeito ou grupo isolado, assim, não havendo uma sociedade ou instituição racista, mas pessoas e grupos racistas. Este horizonte se mostra superficial sobre a análise de que o racismo não nasce e se desenvolve isoladamente, mas é um construto que a todo momento se modifica em prol de uma manutenção do poder de determinados grupos raciais em detrimento de outro, o que não quer dizer que sujeitos que cometem atos discriminatórios não devam ser julgados.

O termo racismo institucional traz em sua concepção que o racismo se reverbera da sociedade para as instituições e das instituições para a sociedade refletindo-se  nas normas, padrões de funcionamento e comportamento, influenciando as nossas decisões, preferências e sentimentos. Portanto, levando em  consideração que são os homens brancos que ocupam esse lugar de poder nas instituições, a manutenção e a formulação desses padrões sociais, são feitos para privilegiar pessoas brancas.

Este processo se configura sistematicamente, numa estrutura que acaba por normalizar o racismo no âmbito de esferas importantes e que norteiam a sociedade como nas áreas política, jurídica, econômica e social, ou seja, ele é estrutural. Portanto, é necessária uma agenda política que de fato trabalhe na desconstrução desse sistema, dessa estrutura que privilegia pessoas brancas em detrimento de pessoas negras.

Fonte: encurtador.com.br/iACIS

Racismo no Brasil

O Brasil, último país das Américas a abolir a escravidão, em 1888, não propiciou de nenhuma maneira aos negros que, supostamente, tinham recebido de volta sua liberdade após receberem as cartas de alforria, políticas que fizessem com que fossem inseridos socialmente e economicamente na sociedade. Além do governo brasileiro não construir estratégias de emancipação econômica para a população negra, promoveu a imigração europeia ao Brasil, com o intuito de embranquecer a população. A esse respeito tem-se que:

A desagregação do regime escravocrata e senhorial se operou, no Brasil, sem que se cercasse a destituição dos antigos agentes de trabalho escravo de assistência e garantias que os protegessem na transição para o sistema de trabalho livre. Os senhores foram eximidos da responsabilidade pela manutenção e segurança dos libertos sem que o estado a igreja ou qualquer instituição assumisse encargos especiais, que tivessem por objetos prepará-los para o novo regime de organização da  vida e do trabalho. O liberto se viu, sumária e abruptamente, em senhor de si mesmo, tornando-se responsável por sua pessoa e por seus dependentes, embora não dispusesse de meios materiais e  morais para realizar essa proeza nos quadros de uma economia competitiva. (FERNANDES, 2008, p. 29).

Petrônio Domingues (2007) diz que ao longo do período republicano o movimento negro, por meio de diversas modalidades de protesto e mobilização, buscou a inclusão social  do negro e a superação do racismo na sociedade brasileira. Seguindo essa mesma ideia Gay e Quintans (s/d) afirmam que durante a redemocratização do Brasil o movimento negro assume “novos contornos, e passa a reivindicar uma série de direitos e políticas públicas capazes de combater o racismo e reduzir as desigualdades” (GAY; QUINTAS, s/d, p. 3). Pode se dizer que estas lutas possibilitaram alguns progressos tais como: acesso à educação, à saúde, participação política, igualdade perante a lei conforme está garantido na Constituição Brasileira de 1988 inspirada na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Contudo, na prática muitos desafios ainda precisam ser superados.

Nesse sentido, para Silva (2013) a educação tem sido um trampolim de ascensão  para que os negros consigam vencer os obstáculos impostos pelos dispositivos de poder e seleção para chegar ao ensino superior, embora ela sozinha não consiga vencer o racismo estrutural. De modo que, mesmo entre os negros com os melhores níveis de escolaridade, os salários são inferiores aos dos brancos. Nesse aspecto a mulher negra é a mais atingida, mesmo aquelas com mais anos de estudo ganham menos que os homens brancos, mulheres brancas e homens negros. Portanto, fica claro que “a desigualdade se mostra articulada não apenas com a categoria raça, mas também com a categoria gênero” (SILVA, 2013, p. 101).

Fonte: encurtador.com.br/hqFY3

Racismo no âmbito do mercado de trabalho

O racismo estrutural, faz parte de todas as esferas da sociedade de modo a impedir intergeracionalmente a ascensão econômica e social do povo negro de forma violenta e voraz. Nesse processo, a mulher negra foi estuprada cotidianamente, obrigada a trabalhar na cozinha da família branca,  enquanto outras trabalhavam nas lavouras, executando o mesmo trabalho dos homens. Angela Davis (2016, p. 17), em seu livro intitulado Mulheres, raça e classe, explicita que as mulheres negras eram vistas apenas como “unidades de trabalho lucrativas, para os proprietários de escravos elas poderiam ser desprovidas de gênero.” Mesmo após a Lei Áurea a situação não mudou muito para a maioria, que continuou a trabalhar como empregada doméstica na casa das famílias aristocratas e burguesas, possibilitando a emancipação da mulher branca que pôde investir no campo intelectual e profissional.

“A história de privação das mulheres negras, se as tornam invisíveis também as desumaniza, daí a naturalização de sua pobreza e exploração, daí também a sua presença majoritária nas funções de pior remuneração”. (SILVA, 2013, p. 102). Exemplo disso é que um dos primeiros casos de coronavírus no país, no estado do Rio de Janeiro no Alto Leblon, um bairro da zona sul, foi o de uma empregada doméstica de 63 anos que trabalhava há dez anos na casa da família da patroa que a contaminou e que acabara de chegar da Itália, país que se mostrou um dos epicentros da doença no início da pandemia. A vítima veio a óbito no dia seguinte ao apresentar os sintomas da Covid-19.

Em depoimento ao site UOL (2020), a cunhada da vítima relatou que “ela era muito trabalhadora. Pegava três conduções para chegar ao trabalho. Para voltar, era a mesma coisa: dois ônibus e um trem. Ela saía de casa no domingo e só voltava na quinta”. Essa é a realidade de trabalho de muitos negros no Brasil, com jornada de trabalho extensa e com baixa remuneração, tendo que enfrentar as dificuldades de mobilidade, já que as cidades são projetadas para separar as classes mais “altas” de classes mais “baixas”. Muitas vezes, por não conseguirem trabalhos formais de carteira assinada, precisam trabalhar na informalidade para tentar garantir o mínimo para o sustento de suas famílias. Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em 2003, 27% das mulheres negras trabalham como empregadas domésticas e apenas 23% possuem carteira assinada, enquanto 12% das mulheres brancas que são empregadas domésticas, 30% tem registro na carteira.

Este dado supramencionado mostra o impacto direto em questões como a aposentadoria, pois para receber o benefício é necessário um tempo de contribuição, sendo no caso das mulheres, 30 anos, e, dos homens, 35 anos, conforme evidencia o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em 2019. Devido ao processo histórico, conforme expõe Goes, Ramos e Ferreira (2020, p. 1), a população negra encontra-se, majoritariamente, presente nos indicadores negativos, tais como “atividade no mercado de trabalho informal, que limita o acesso a direitos básicos como a remuneração pelo salário mínimo e a aposentadoria.” Acresce-se ainda que a pandemia desvela a desigualdade do Brasil e salienta o quão pouco este país avançou na superação do racismo, dado que, como já supracitado, esta configura um dos fatores determinantes para este cenário de altas taxas de mortalidade.

Neste  cenário atual de pandemia pode-se ressaltar também que atender a necessidade de exercer o isolamento social sem que haja comprometimento do trabalho de onde advém a renda, representa um grande desafio, tendo em vista que muitos ocupam cargos informais, ou ofícios considerados essenciais durante a pandemia, que demandam presença física e trabalho manual, e não estão amparados por benefícios ou direitos trabalhistas.

Fonte: encurtador.com.br/iCE56

Impacto do racismo na saúde dos negros

A  saúde, conforme prevê a Constituição Federal de 1988, Art. 196, visa alcançar o bem-estar e a justiça social, além de ser reconhecida como direito de todos e dever do Estado, por intermédio de políticas públicas e econômicas que objetivem reduzir riscos e agravos, bem como acesso universal e igualitário às ações e serviços para prevenção, promoção, proteção e recuperação. Outrossim, a mesma ainda estatui a respeito de direitos sociais fundamentais como trabalho, segurança, lazer, previdência social e proteção à maternidade e à infância.

Nesta perspectiva, averígua-se que as desigualdades de saúde presentes nos países, bem como a maioria das enfermidades, decorrem de questões socioeconômicos, raciais, étnicas e de gênero, assim como circunstâncias de nascimento, moradia, trabalho e renda, isto é, Determinantes Sociais da Saúde (DDS), que, em um contexto racista, restringe o acesso à informações e serviços disponíveis, visto que as condições de vida dos indivíduos estão diretamente relacionadas a sua situação de saúde (BUSS; FILHO, 2017).

À vista disso, faz-se necessário ampliar debates sobre o fato de que o racismo se configura como determinante social da saúde, uma vez que grande parcela da comunidade negra está exposta e vulnerável a conjunturas de padecimento, violência, enfermidades e morte, em bairros excludentes, com maior poluição e sem acesso a serviços fundamentais. (GOES; RAMOS; FERREIRA, 2020).

Institucionalmente, as desigualdades e injustiças sociais estorvam e engendram o acesso a serviços essenciais, bem como a oportunidades, em consequência do racismo estruturado. Desta forma, verifica-se o intenso sofrimento, negligenciado pelo Estado, que negras e negros vivenciam em suas realidades, assim como o padecimento devido aos impactos da pandemia da Covid-19 e seus múltiplos desdobramentos negativos. No começo da pandemia os casos de infectados não eram divulgados por cor. Segundo o site globo.com  (2020) “os boletins só passaram a incluir tais números a partir do dia 11 de abril, quase 1 mês e meio depois da confirmação do primeiro caso de Covid-19, e graças a pressão da coalizão negra por direitos”, dado este que demonstra a tentativa de invisibilização da população negra.

 Neste ínterim, cabe ressaltar que, segundo Santos (2013), às condições insalubres de moradia, a falta ou precariedade na infraestrutura de saneamento básico historicamente negligenciada pelas políticas públicas à população negra submete-a a diversas mazelas socioambientais como: utilizar água não potável, conviver com lixo e esgoto a céu aberto, falta de limpeza urbana, enchentes, desmoronamentos de encostas, estas e outras situações causadoras de diversas doenças. Assim, a discriminação fundamentada em fatores raciais/étnicos, de gênero, socioeconômicos contribui decisivamente para dificultar o acesso dos negros a direitos básicos e os submete a um tratamento desigual geradores de condições de vida degradantes levando-os ao adoecimento físico e mental podendo chegar a comorbidades e mortalidade graves.

Sob essa luz se justifica a afirmação feita por Thiago Amparo no site Folha de São Paulo (2020): “Mede-se racismo por quão descartável é o corpo negro. Se a Covid-19 desnuda as feridas do racismo que estrutura nossa desigualdade, curar esta pandemia pressupõe, antes de tudo, expô-las.” À vista do que foi exposto, conclui-se que condições sociais possuem forte influência no processo saúde-doença e, posto isso, entende-se a necessidade de implementar-se ações que envolvam todos os setores visando a promoção do bem-estar. Destarte, observa-se que a atual esfera exige procedimentos específicos para o combate ao racismo e suas consequências.

Fonte: encurtador.com.br/rACG1

O papel da Psicologia frente ao racismo

A psicologia, enquanto ciência e profissão, tem sua ação fundamentada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, conforme explicita o Código de Ética Profissional de Psicologia. Além disso, é uma ciência aplicada nos processos coletivos e atua na “promoção, prevenção e reabilitação na esfera psíquica do ser humano. Portanto nas esferas social, econômica, política, cultural, biológica” (RIBEIRO, 2017, p.175). Nesse sentido, a psicologia social vislumbra o indivíduo como biopsicossocial, ou seja, considera-o de maneira integral tendo em vista sua história de vida.

O Conselho Federal de psicologia (CFP), lançou referências técnicas em torno da atuação dos psicólogos referentes a questões raciais. Neste documento, entre as várias pautas  abordadas, a discussão sobre a formação do profissional de psicologia é necessária e urgente, visto que a grade curricular tem certa carência sobre racialidade. Assim o texto traz que

A formação da(o) psicóloga(o) é um momento privilegiado para a construção de conhecimento, de saberes e de práticas sobre diversos assuntos vividos no cotidiano dos sujeitos. Portanto, é nesse momento que se faz necessário apresentar aos estudantes temas relevantes, para despertar o interesse na busca do conhecimento e possibilitar o reconhecimento dos aspectos que envolvem as relações raciais e seus efeitos psíquicos presentes no cotidiano em nossa sociedade. (CFP, 2017, p. 105).

Portanto, os profissionais que se encontram no exercício da profissão, bem como os acadêmicos de Psicologia necessitam compreender a amplitude e especificidade de como se processam as relações raciais no contato social “e principalmente que há um sofrimento psíquico peculiar sutil ou explícito presentes no cotidiano das pessoas negras”, conforme apresenta a referência técnica (CFP, 2017, p. 107).

Na atuação deste profissional, é apropriado aplicar em seu cotidiano os princípios fundamentais propostos, visando extinguir quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão dos direitos, visto que é dever deste atuar com responsabilidade social de forma crítica, considerando as diversas realidades.

Dessa forma, o racismo deve ser um tema trabalhado não só pela Psicologia Social, mas também pelas outras abordagens de forma transversal para que as consequências psicossociais do racismo sejam entendidas como um aspecto que compõe a subjetividade dos sujeitos brancos e negros, indo para além de uma conceitualização superficial, reconhecendo, compreendendo, problematizando e combatendo ações racistas e suas diversas consequências, prevenindo e evitando sua eventualidade. Sendo assim, a Psicologia deve unir-se a outros campos do conhecimento, posto que o racismo ataca por múltiplas frentes (ESPINHA, 2017).

 

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Flávio Aparecido de. A psicologia social e o papel do psicólogo na sociedade contemporânea. 2018

ALMEIDA, S. L. de. Racismo estrutural. 1 ed. São Paulo: Polén, 2019.

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MELO, Maria Luisa de. UOL: Primeira vítima do RJ era doméstica e pegou coronavírus da patroa no Leblon, 2020. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2020/03/19/primeira-vitima-do-rj-era-domestica-e-pegou-coronavirus-da-patroa.htm>. Acesso em: 09 de jul. de 2020.

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Eu tenho um sonho…

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…de que meus quatro filhos um dia viverão em uma nação onde não serão julgados pela cor da pele, mas pelo caráter. 

57 anos após proferir essas palavras, o sonho de Martin Luther King parece ficção. O racismo nega um direito básico do ser humano: ser um indivíduo. Pensar, sonhar e opinar por si. Condena uma criança, antes mesmo de nascer, a um destino genético. Põe cor na violência, na inferioridade e na submissão. Rejeita que imbecis e gênios circulam em todas as raças. 

Vou citar um brasileiro pobre, neto de escravos, nascido em 1839. Tinha ambições intelectuais. Se em 2020 pobreza e intelectualidade se misturam como água e azeite, que dirá nos anos 1800. Esse jovem pobre investiu numa riqueza silenciosa. No amor, apaixonou-se por uma portuguesa. A família dela se opôs à união. A mulher ignorou. O apaixonado escreveu: Tu pertences ao pequeno número de mulheres que ainda sabem amar, sentir e pensar. Em 1869, um homem querer se casar com uma mulher que pensa, só podia se chamar Joaquim Maria Machado de Assis. Genial! 

Fonte: encurtador.com.br/jwQ27

Pergunto-me: como Machado enfrentou o racismo na era escravocrata? Como lutou por seus sonhos intelectuais? Como lidou com medo, insegurança, inveja e desprezo? Em minhas divagações, penso que o autoconhecimento fortaleceu seus sonhos. Devia ser um grande conhecedor de si próprio. Investiu no “conheça-te a ti mesmo” e ignorou os preconceitos que cruzaram seu caminho. Autoconhecimento não evita sofrimento, decepção e ilusão. Autoconhecer-se escolta a autoestima e nos encoraja a sermos fiéis aos nossos sonhos, convicções e valores sem sabotar a realidade. Creia em si, mas não duvide sempre dos outros, escreveu Machado.  

O grande escritor não cursou faculdade. Provou que livros nos alçam a patamares inimagináveis. O crítico Harold Bloom escreveu: Machado de Assis, é uma espécie de milagre, mais uma demonstração da autonomia do gênio literário quanto a fatores como tempo e lugar, política e religião. 

Fonte: encurtador.com.br/CEINO

Arrogantes, preconceituosos e escravocratas sempre existirão. A união de individualidades que pensam como Martin Luther King formará uma sociedade em que o real não pode ser sonho. Julgar alguém pela cor já devia ser comportamento “tiranossáurico”.

Para quem defende o racismo, sugiro dar uma passadinha na Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro. Logo na entrada, o monumento a Machado de Assis, um dos fundadores. Ali, olhando do alto, o maior escritor brasileiro, gênio da narrativa, reverenciado e aclamado em vida, deve observar o coletivo racista e lastimar: quanto tempo consumido na perseguição alheia e desperdiçado da própria vida. A juventude é um relâmpago. Intensa e curta. A vida é breve e finita. Doai-a a ti e ao bem. 

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CAOS 2019: Escravidão contemporânea e saúde mental desses trabalhadores é tema de sessão técnica

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Sessão técnica apresentada por advogada mostra a contribuição da Psicodinâmica do Trabalho no combate ao ciclo nocivo da escravidão contemporânea.

No dia 23 de maio, aconteceu na sala 219 do CEULP/ULBRA, a sessão técnica “A saúde emocional dos trabalhadores resgatados em condições análogas à de escravo”, ministrada por Nathalia Canedo, bacharela em Direito e mestranda em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos. A sessão técnica foi mediada pela Profa Me. Thaís Moura Monteiro.

Nathalia começou fazendo uma contextualização sobre a revolução industrial, e como ela influenciou diretamente no processo de escravidão contemporânea, já que o trabalho passou a não ser mais algo braçal e punitivo como na época da colonização com os negros, indígenas e africanos, para ser algo repetitivo e exaustivo.

Foi abordado também a questão das condições totalmente insalubres desses trabalhadores, pois os “patrões” visam a produção e o lucro, ao invés da saúde física e emocional do sujeito. Tal dinâmica se apresenta como fruto da sociedade capitalista que nos cerca desde a época da revolução industrial.

Para encerrar, ela levou o dado alarmante de que o Tocantins é o 6º estado com o maior número de trabalho escravo notificado e que através dessas denúncias mais de 4.000 trabalhadores já foram libertados ou regulamentados. Com isso, mostra-se a importância do trabalho multidisciplinar entre Direito e Psicologia para combater algo tão antigo, mas que acontece de uma outra forma na contemporaneidade.

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Trabalho como ideologia: necessidade, prazer ou escravidão?

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O termo trabalho e sua significação modificou-se ao longo do processo histórico, essa evolução é reflexo de como o sujeito apreende e reproduz as formas de trabalho no seu cotidiano. O texto apresenta uma discussão sobre o impacto desta tarefa na sociedade, e como os processos políticos, ideológicos, religiosos convergem nessa ação evolutiva, e ainda como o indivíduo fomentou a alteração do conteúdo inerente ao labor e como esta ação humana propiciou o desequilíbrio emocional o que possibilitou a busca de autoafirmação, acarretando assim sofrimento ao sujeito.

Fonte: https://curseduca.com/blog/wp-content/uploads/2014/02/profiss%C3%B5es.jpg

Ao colocar o vocábulo trabalho em destaque, Suzana Albornoz (1998) no seu livro “O que é trabalho” salienta que o mesmo cotidianamente pode ser utilizado e compreendido de forma divergente, visto que, este termo possui muitos significados quanto ao seu conteúdo. Em quase todas as línguas oriundas da cultura europeia essa palavra apresenta mais de um conceito ou pode ainda ter duas palavras com a mesma significação, a exemplo observa-se o termo trabalho e labor que na língua portuguesa refere-se a “realizar uma obra que te expresse, que dê reconhecimento social e seja repetitivo, sem liberdade, de resultado consumível e incômodo inevitável” (p. 9).

A expressão trabalho segundo Albornoz (1998) supõe esforçar-se, no entanto, para alguns, esse esforço será exclusivamente físico enquanto para outros será preponderantemente intelectual, mas um necessita do outro para alcançar a realização do produto final. Clot (2007) em sua obra “A função psicológica do trabalho”, evidencia que este é o precursor de vivencias dolorosas ao indivíduo, porém, esta tarefa o aproxima da realidade, portanto, esta ação humana é o cerne da sociedade atual.

Nesse contexto compreende-se que, culturalmente existe uma discrepância desse conceito e conteúdo, visto que, é mutável de acordo com a época histórica e como a sociedade introjeta essa pratica. É através do trabalho que o homem promove as relações com o outro, com o mundo, estabelecendo-se como um ser social, a cristalização e divisão do trabalho surge de forma inerente ao desenvolvimento de socialização, para tanto, o impacto social se manifesta através de como o sujeito se relaciona com o trabalho e do sentido que a pessoa emprega para o mesmo (CANOPF, 2014).

A análise salienta um contexto histórico sobre trabalho, este, surgiu a partir da agricultura como forma de subsistência, o qual era “regido por um sistema de deveres religiosos e familiares” (ALBORNOZ, 1998, p. 16).  Com a ideia de propriedade privada irrompeu o produto excedente gerando a existência de uma classe ociosa, esta reivindicou a posse e iniciou as trocas de produtos, que se tornaram desiguais, pois o sujeito com maior território sobrepujava o excedente do vizinho. A evolução da propriedade e separação do trabalho resultou da prática da guerra, esta que ampliou a força de trabalho ao conquistar novas propriedades e capturar escravos.

Fonte:http://replygif.net/thumbnail/937.gif

Com o desenvolvimento do trabalho artesanal concomitantemente intensifica-se o comércio, propiciando o surgimento da moeda. A evolução do comércio oportunizou o nascimento a burguesia, “uma comunidade de habitantes de cidades que auferia uma renda das atividades comerciais”, estes comerciantes bem-sucedidos começaram a empregar trabalhadores, possibilitando a criação de uma hierarquia econômica. Sobre o advento da Revolução Industrial, a autora aponta que a mesma ocorreu em três estágios de desenvolvimento da tecnologia: Revolução tecnológica do século XVIII (máquina a vapor), Eletricidade no século XIX e a Automação, a partir do século XX com a invenção do computador. Tal progresso cientifico, fruto do trabalho humano que prometia a ociosidade das massas, veio para as minorias, tornando-se paradoxal, pois o avanço da ciência proporcionou melhorias para a Indústria, mas, não garantiu melhorias para o trabalho humano, distanciando-os da sua felicidade.

Guatarri (2001) no livro “As três ecologias” ao conjeturar sobre este paradoxo corrobora com Albornoz (1998), pois salienta que a ciência desenvolveu meios técnicos-científicos capaz de resolver os problemas ecológicos dominantes, com a justificativa de melhoria de vida para a população, no entanto, não é utilizada pelas forças subjetivas de forma funcional, para resolver, por exemplo, a miséria humana, visto que, a ciência está a serviço dos dispositivos de controle social. Tal fato, também é reforçado pela autora quando se refere ao processo de colonização exploratório da América Latina, mesmo após o desenvolvimento industrial, a modernidade acarretou ainda mais injustiça social e a exclusão.

O processo de alienação do trabalho está intrínseco a modernidade, ao processo de produção, Suzana (1998) evidencia que o trabalho é alienado do trabalhador, pois este vende seu tempo e sua capacidade a outro, ou seja, não possui, tão pouco detém os meios de produção, não conhecendo o produto final do seu trabalho, vende-se até mesmo a sua personalidade como sendo sua marca. Além disso, o processo de especialização, não torna o trabalho mais bem elaborado, pelo contrário, fragmenta-o ao ponto de perder a técnica.

Com a contemporaneidade o trabalho e a sua ideologia são instrumentos que estão submissos ao poder político, os meios midiáticos criam o desejo de consumo, o homem é então produto do mercado e os que não acompanham essas mudanças são excluídos. Sawaia (2001) ao falar sobre inclusão perversa, a qual refere-se que o sujeito está incluído no sistema mesmo que desigualmente, salienta sobre a colonização do imaginário, esta que é uma sociedade da imitação, ou seja, a mídia ao criar o desejo de consumo, direciona os que estão à margem a imitar os ricos, mas a ascensão social dos mesmos é bloqueada, estes são “não cidadãos”, uma vez que, são desnecessários ao processo produtivo.

Na sociedade contemporânea o trabalho foi desvinculado do lazer, este é uma compensação de horas extenuantes de trabalho, é um paliativo para que o trabalhador não se queixe e continue a render lucros, remetendo tal prática ao pão e circo utilizado pelos romanos, sendo portando uma forma de alienação dos corpos.

O livro apresenta um paralelo a respeito da visão das religiões sobre o trabalho, a maioria acreditava que o trabalho era uma punição divina, no entanto, após a reforma protestante esse olhar se modifica, o trabalho tem origem na vontade divina. O capitalismo aliena o indivíduo a utilizar a ideologia do protestantismo que o trabalho dignifica o homem, é uma vocação, enquanto opera no jeito de ser e de viver da sociedade, afinal o sujeito trabalha necessariamente para o consumo e não para produzir algo que o dignifique, que o represente, que fomente sua criatividade. Huxley (2014) ressalta que, a forma verdadeiramente de alienação é quando o sujeito ama a “servidão”, aceita o pouco tempo de lazer por horas cada vez mais excessivas de trabalho.

Na atualidade o indivíduo reproduz a lógica vigente sobre trabalho de forma automática, sem refletir tal comportamento, passa a ser um dispositivo de disciplina em prol do capitalismo e o modo de produção, no qual os corpos sociais precisam ser “economicamente úteis e politicamente dóceis” (FOUCAULT, 2004). Assim o trabalho, segundo Marcuse (apud ALBORNOZ, 1986, p. 75) “não seria apenas alienado no mundo de hoje, mas alienante”. A servidão ao trabalho sem sentido serve para castrar os indivíduos como seres políticos e pensantes. A autora finaliza propondo uma reflexão sobre o que aconteceria com o fim do trabalho, se seria possível às sociedades futuras sobreviver sem o mesmo e de forma igualitária, e ainda, se o trabalho poderia ser aliado à felicidade.

Fonte:http://www.upf.br/comarte/wp-content/uploads/2014/05/Imagem_APOIO_02.jpg

Huxley (2014) no seu livro “Admirável mundo novo” retrata uma sociedade utópica que por meio do condicionamento hipnopédico e da “soma” é capaz de criar uma sociedade onde a felicidade é palpável, no entanto, o trabalho se faz presente nesse contexto divido entre as castas, e desde fetos os sujeitos são alienados e dirigidos a desempenhar determinada função, não refletindo sobre o porquê. “O autor concebe o homem como produto do meio, cuja individualidade é manipulada nas relações sociais, notadamente, por intermédio do controle cientifico organizacional” (GRECHI et al, 2012).

A crítica atrelado a reflexão proporciona observar que, trabalho ao longo do tempo distanciou-se da felicidade, sendo hoje uma ferramenta, um meio para se alcançar status social e capital, no entanto, poucos alcançam esse objetivo, gerando uma sociedade cada vez mais dependente do trabalho, ou seja, infeliz. Esse desequilíbrio propiciado por esta prática e busca desenfreada é resultado do capitalismo e do consumismo acrítico, para que se opere uma mudança de cultura é necessário repensar e formular novas ações e conceitos, o sujeito deve resgatar no trabalho o prazer em desempenhar esta função, e mesmo que seja uma necessidade, essa ação humana não deve escraviza-lo, tão pouco gerar sofrimento, mas sim, ser fonte de felicidade. O homem só alcançará esse resultado quando compreender o que lhe impulsiona ao sofrimento, e então conseguir meios de atenuar o controle social que é sobre ele exercido, por meio do contra controle, ou seja, reprimido o falso desejo do “ter” e promovendo o “ser”, esta tarefa reflete em um equilíbrio ideal.

 

REFERÊNCIAS

ALBORNOZ, S. O que é trabalho. 3ª reimpressão, 1998.

CANOPF L. A função psicológica do trabalho. In: II CONGRESSO BRASILEIRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, Uberlândia, 19 a 21 de novembro de 2014. Disponível em: < http://iicbeo.com.br/anais/1123GT1.pdf >. Acesso em: 10 de agosto de 2015.

CLOT, Y. A função psicológica do trabalho. Petrópolis, RJ. Vozes, 2007.

FOUCAULT, M. Vigiar e Punir. Rio de Janeiro, Petrópolis, Vozes, 2004.

GRECHI et al. O admirável mundo novo e a educação; entre ficção e a realidade. In: IX ANPED SUL, 2012. Disponível em: http://www.portalanpedsul.com.br/admin/uploads/2012/Educacao_Comunicacao_e_Tecnologias/Trabalho/06_16_54_1549-7541-1-PB.pdf. Acesso em: 10 de agosto de 2015.

GUATTARI, F. As três ecologias. 12ª Ed. 2001.

Huxley, A. Admirável mundo novo. Editora Azul. 22ª Ed, 2014.

SAWAIA, B. As artimanhas da exclusão. 2ª Ed, 2001.

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Selma: é preciso acreditar, agir e seguir em frente!

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Com duas indicações ao OSCAR:

Melhor Filme, Melhor Canção Original

“O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons”.
Martin Luther King

 

“Selma” (2014), dirigido pela cineasta norte-americana Ava DuVernay, teve a difícil missão de retratar, num curto espaço de tempo, o ápice da vida de um dos mais proeminentes atividades de direitos humanos do século passado, o pastor protestante e Prêmio Nobel da Paz Martin Luther King.

O longa mostra toda a movimentação em torno da marcha que ocorreu entre a cidade de Selma, no Alabama, até a capital do Estado, Montgomery, em março de 1965, como forma de protestar contra o tratamento que os negros recebiam na região. A pequena cidade acabaria por se tornar palco de um desfecho político que mudou os rumos das relações sociais nos Estados Unidos, à época ainda fortemente marcada pela segregação racial, onde os afro-americanos – notadamente nos estados do Sul – não podiam exercer todos os seus direitos, como o de votar, por exemplo.

Para além do mito que se tornou Luther King, DuVernay mostra um homem às voltas com questões triviais relativas ao seu relacionamento conjugal, alguém que, com frequência, recorre à fé para tentar superar obstáculos que, à primeira vista, parecem intransponíveis. Ao mesmo tempo, “Selma” mostra um Martin Luther King gigante quando instado a subir num púlpito ou num palco; retrata um personagem histórico que conseguiu mobilizar boa parte da nação em torno de um objetivo comum, que era a igualdade de direitos entre todos os norte-americanos.

 

 

O filme mostra como os negros conseguiram, com calma e perseverança, assegurar direitos que sempre lhe foram injustamente negados. É necessário apontar que este é um tema ainda em aberto, sobretudo com as recentes tensões entre populações negras e policiais brancos, em várias cidades dos EUA. Certamente, sem aqueles primeiros e importantes passos dos anos 60, a nação mais poderosa do mundo não teria protagonizado, no século atual, a eleição e reeleição do primeiro presidente negro do país.

 

Com diálogos profundos, que evocam a esperança, a política e as incoerências de uma sociedade mergulhada em grande efervescência (Lyndon Johnson acabara de vencer as eleições com amplo apoio popular, mas estava acuado diante da possibilidade de conduzir mudanças radicais na “América profunda”), os atores David Oyelowo (Luther King) e Carmen Ejogo (que interpretou Coretta Scott King, esposa do ativista) fazem toda a diferença. Eles encarnaram como ninguém as expressões de sofrimento, expectativas (frustradas e superadas), medos, sonhos e, sobretudo, muita bravura, num enlace que dificilmente deixará o expectador apático.

No mais, “Selma” representa um momento de “amadurecimento” da Modernidade, época marcada por totalitarismos, guerras sangrentas e os primeiros genocídios de que se tem notícia na história, com destaque para o ocorrido ao povo armênio na Primeira Guerra (recentemente reconhecido e lembrado pelo Papa Francisco) e o dos judeus na Segunda Guerra (no holocausto patrocinado pelos nazistas). O próprio Martin Luther King, fruto intelectual da abordagem pragmática nascente, se materializa como o auge de um modo de ver a vida em constante oposição ao conservadorismo insistente.

 

 

Influenciado pelo filósofo Willian du Bois e com uma fé inabalável nas Escrituras Sagradas, Luther King aspirava uma vida mais ampla e mais plena para os negros, depois de séculos de servidão e humilhação. Para isso, “era necessário acreditar na possibilidade do progresso” e rechaçar qualquer caminho que optasse pelo viés da violência. A “trincheira” teria que ser apenas através da oratória, do poder de mobilização social e do enfretamento ideológico, numa abordagem de constante diálogo. Como pregava o pragmatismo, se se perdesse essa crença [de que era possível aspirar uma vida melhor], o resultado era “uma espécie de morte, com uma existência sem desenvolvimento”. É neste sentido que Martin Luther King acreditava na vida, por mais que as intempéries se mostrassem invariavelmente mais sufocantes.

“Selma” aproxima os conceitos da pragmática com os da filosofia clássica de Aristóteles e sua abordagem sobre a eudaimonia, para quem “a felicidade é um fim ético”, cuja aspiração surge do âmago do ser humano. Sobre este tema e em referência a Aristóteles, a filósofa Marilena Chauí escreveu

A felicidade é a vida plenamente realizada em sua excelência máxima. Por isso não é alcançável imediata nem definitivamente, mas é um exercício cotidiano que a alma realiza durante toda a vida. A felicidade é, pois, a atualização das potências da alma humana de acordo com sua excelência mais completa, a racionalidade. (CHAUÍ, 2002)

É difícil não associar esta visão com o pragmatismo de Du Bois e a militância de Martin Luther King. Eles denunciaram a estreita ligação entre a criminalidade e a falta de incentivo à educação e à renda, bases para o desenvolvimento intelectual e financeiro. Estes eram bens que, decididamente, os negros americanos não usufruíam naqueles agitados anos 60. Desta forma, o movimento pela igualdade se baseou na premissa de que além de questionar “os nossos pensamentos e crenças, [era necessário alçar] as implicações práticas deles”.

 

 

Por fim, Luther King tinha a real dimensão da força política e histórica de sua luta. Mesmo num clima de insegurança, não se furtou a perseguir o maior de seus sonhos. Acabou por cunhar na própria vida duas das frases que melhor o definem: “Se não puder voar, corra. Se não puder correr, ande. Se não puder andar, rasteje, mas continue em frente de qualquer jeito”, e “O homem que não está disposto a morrer por uma causa não é digno de viver”.

 

 

Ausência de rabino

“Selma” foi bastante elogiado pelo rigor histórico, pela direção e pela atuação do elenco. Mas sofreu críticas por não mostrar um dos principais apoiadores da causa liderada por Luther King, o rabino, teólogo, ativista social e místico Abraham Heschel. E parte da comunidade judaica americana não gostou desta ausência.

De acordo com a jornalista norte-americana Leida Snow, “os judeus se envolveram fortemente no movimento pelos direitos civis. O rabino Heschel, um dos principais líderes religiosos dos EUA no século 20, foi um dos apoiadores de King e caminhou na marcha ao lado dele, a menos de 1m de distância”. A filha de Heschel, Susannah, teria ficado chocada com a ausência da representação de seu pai no filme: “A foto em que ambos marcham juntos correu o mundo. O presidente Obama me disse: ‘Seu pai é um herói, todos conhecem essa foto’ […] A omissão é trágica e injustificável”, disse ela ao site Allgemeiner.

De acordo com Susannah, “a marcha não foi apenas um protesto político, teve também um caráter profundamente religioso, unindo padres, freiras, pastores, rabinos, negros e brancos de todo o país”.

“Selma”, no entanto, destacou apenas um arcebispo da Igreja Ortodoxa, um ministro da Igreja Batista e um ministro do Unitário-Universalismo. A diretora Ava DuVernay escolheu atores com características físicas semelhantes às dos personagens históricos. Não há em “Selma” ninguém remotamente parecido com Heschel. 50 anos depois, o rabino – e os judeus – não foram “convidados” a participar. No entanto, defende a comunidade judaica americana, “o apoio judaico a King foi muito além da presença de Heschel na Marcha no Alabama. Em 1963, Arnie Aronson, fundador da Leadership Conference on Civil Rights, foi o planejador da Marcha sobre Washington, na qual o rabino Uri Miller recitou a oração de abertura e o rabino Joachim Prinz falou, antes do histórico discurso de King, ‘Eu tenho um sonho’”. (Com informações da Conib).

 

RERERÊNCIAS:

CHAUI, M. Introdução à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. Vol. 1. 2 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2002;

COMTE-SPONVILLE, André. Dicionário Filosófico. São Paulo: WMF, 2011;

O Livro da Filosofia(Vários autores) / [tradução Douglas Kim]. – São Paulo: Globo, 2011;

MORA, José Ferrater. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2001;

Filme “Selma” ignora apoio judaico e presença do rabino Heschel. Disponível em <http://www.ogirassol.com.br/viver/filme-selma-ignora-apoio-judaico-e-presenca-do-rabino-heschel-> – Acessado em 11/04/2015.

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FICHA TÉCNICA 

SELMA


Dirigido por Ava DuVernay
Duração: 128 minutos
Classificação:  Não recomendado para menores de 14 anos
Gênero: Drama – História
Países de Origem: Estados Unidos da América, Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte.
Ano produção: 2014

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12 Anos de Escravidão: liberdade ainda que tardia

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Com nove indicações ao Oscar:

Melhor Filme, Diretor (Steve McQueen), Ator (Chiwetel Ejiofor), Ator Coadjuvante (Michael Fassbender), Atriz Coadjuvante (Lupita Nyong’o), Roteiro Adaptado (John Ridley), Figurino, Montagem, Design de Produção.

Amarás o teu próximo como a ti mesmo.
(Mateus 22:39, Bíblia)

“12 anos de escravidão” foi baseado na autobiografia de Solomon Northup (interpretado por Chiwetel Ejiofor), publicada em 1853. Solomon era um cidadão de Nova Iorque que nasceu livre e que vivia em uma situação relativamente confortável com sua família até cair em um embuste em 1841 e ser sequestrado em Washington (capital dos EUA). Depois disso, foi vendido como escravo em Louisiana, local aonde a escravidão ainda era permitida. A história relatada, então, acompanha alguns dos momentos de sua vida nos 12 anos que “sobreviveu” sendo propriedade de fazendeiros no Sul do país.

 

 

Há alguns fatos históricos que são complexos demais para serem assimilados sem um dado contexto, especialmente porque a linha temporal contribui no estabelecimento de uma estranha distância emocional, fazendo com que aquilo que se vivencia no cinema seja esquecido ou atenuado tão logo se saia da sala de projeção, já que parece se tratar de fatos dissociados da nossa época ou da nossa realidade. Assim o que foi visto passa a ter uma conexão fantasiosa, como se fosse mais uma história imaginada por alguém, sem qualquer vínculo com a realidade.

Acredito que o grande mérito desse filme, sob a direção exemplar do inglês Steve McQueen, é nos aproximar dos personagens mostrados na tela e nos fazer pensar sobre as consequências de determinados fatos históricos. Isso porque cada época carrega consigo, cultural e historicamente, uma série de variáveis que afeta de forma profunda sua dinâmica atual, logo refletir sobre isso parece ser extremamente relevante quando tentamos entender a dinâmica de um povo ou de uma comunidade.

 

 

Em imagens que mostram a imensidão do mar em um duro contraste com as amarras que encarceram os homens nos navios, vimos através do olhar de Solomon a diferença perturbadora entre viver como um ser humano e ser tratado como uma coisa. E enquanto alguns dos homens e mulheres que ali estavam nunca tinham sido livres, logo a liberdade era apenas um conceito abstrato e distante, para ele era um absurdo imaginar que seria propriedade de alguém. Ao mesmo tempo em que ele se achava diferente daquelas pessoas por ser livre, sua expressão mostrava um espanto aterrador ao entender que essa pretensa liberdade vivenciada por ele até então era fantasiosa enquanto outros homens permanecessem escravos.

 

 

Em Louisiana, Solomon foi vendido, juntamente com outra escrava, a um fazendeiro local, William Ford (Benedict Cumberbatch).  Ford, no momento da compra, ficou sensibilizado ao separar mãe e filhos, mas ao pensar em sua propriedade e em suas dívidas, mesmo aparentemente compadecido, tomou a decisão mais lógica (para ele): levou Solomon e a jovem mãe (mesmo que esta gritasse em desespero pelos filhos).

 

 

Lá, em sua fazenda, Ford reunia negros e brancos para que estes o acompanhassem na pregação da palavra de Deus. E enquanto a mãe escrava chorava a falta de seus filhos, a esposa de Ford dizia: “logo ela esquece”, já que memória, dor e sentimentos são prerrogativas dos seres humanos, não de escravos. Ou seja, os escravos podiam sentar-se nos bancos da igreja improvisada aos domingos com seus proprietários para ouvir as palavras da Bíblia, mas não podiam ficar com seus filhos, ou ir e vir de acordo com sua vontade.

É essa falta de complacência na apresentação dos personagens que dá a esse filme um tom mais aprofundado, pois o fazendeiro bonzinho, que presenteia Solomon com um violino, é também um fraco, que desaparece com a mãe chorosa para que sua esposa não entre em depressão (já que o som do choro da “escrava” a perturba), e que no primeiro sinal de problema, vende Solomon ao cruel Edviw Epps (numa espetacular atuação de Michael Fassbender), mesmo conhecendo a natureza sensível do “seu escravo” e o poder de destruição física e psicológica do seu amigo fazendeiro.

 

 

É na fazenda de Edviw Epps que Solomon conhece Patsey (interpretada notavelmente por Lupita Nyong’o), que mesmo nascida escrava evoca um comovente sopro de liberdade. Ela suporta o trabalho pesado no campo de forma altiva, só não consegue escapar do fascínio doentio que exerce sobre Epps e da inveja que provoca em sua esposa.

 

 

E é na fazenda de Epps que vemos como os proprietários de escravos podem ser cruéis, especialmente quando usam a religião como meio de persuasão. Enquanto Epps prega aos seus escravos e enfatiza a leitura de alguns versículos de forma a evidenciar a necessidade de subserviência por parte deles, também vai criando artifícios para corroborar com sua ideia de que é um bom homem, a serviço de Deus, cuidando “daquelas criaturas”.

Além disso, a religião passa a ser um mecanismo para combater as frustrações que ele tem em relação ao seu casamento, ao desejo incontrolável que sente por Patsey e sua própria incerteza perante sua moralidade e suas virtudes como um homem de Deus. Isso porque suas plantações são constantemente devastadas por pragas (o que remete à ira do Deus do Velho Testamento). Claro que ele encontra uma forma de interpretar as pragas dos céus de acordo com sua perspectiva torta, então passa a responsabilizar os escravos pelo castigo divino. E esse comportamento torna-o muito parecido com algumas figuras que temos em nosso meio, que são capazes de fazer as maiores atrocidades em nome de um Deus e de um discurso bíblico forjado segundo seus próprios e escusos critérios.

 

 

Epps torna-se ainda mais alucinado e cruel na medida em que sua obsessão por Patsey aumenta, especialmente porque, mesmo tendo posse de seu corpo, não consegue enxergar nela algum tipo de retorno. Acredito que ele nem consegue entender que tipo de retorno gostaria de ter, e talvez seja essa confusão emocional que o torna ainda mais monstruoso.

A violência física é terrível e existem cenas perturbadoras nesse aspecto, mas acredito que a violência psicológica é ainda pior, a forma como vamos percebendo que aquela vastidão luminosa das fazendas do Sul se torna incompatível com a condição abominável de sobrevida daquelas pessoas.

 

 

Solemon teve que suportar o sofrimento, a humilhação, a dor das pessoas que conviviam com ele e a saudade de uma família que parecia existir só em seus sonhos – sem reagir, sem atacar, porque todas as tentativas que presenciou de rebelião foram contidas e resultaram em mortes. Mas, de todas as vidas sofridas apresentadas nessa história, o que achei mais perturbador e tocante foi perceber que a luz que emanava de Patsey, aquela que no início do filme tinha um espírito livre apesar da escravidão, foi paulatinamente encoberta pela brutalidade avassaladora de ser tão cruelmente invadida. A morte, naquele contexto, parecia não ser apenas uma saída adequada, mas a única possibilidade de descanso.

 

 

Por ser baseado em um livro autobiográfico, sabemos de antemão que Solomon consegue sobreviver àquele inferno. Mas, o seu retorno a liberdade enquanto seus amigos ficaram à mercê da estupidez de um sistema absurdo não pareceu uma vitória. E isso se refletiu na jornada que ele iniciou a partir de então, que foi promover uma campanha pela abolição da escravatura em todo o território americano.

Voltando para nosso contexto, sabemos que, apesar de vivermos em um país com uma miscigenação tão intensa, ainda há no Brasil muito preconceito racial latente e, em muitos casos, evidente. E isso não é refletido somente nos discursos patéticos de alguns humoristas em redes sociais, geralmente apoiados por uma legião de seguidores, mas nos perfis das pessoas que ocupam determinados cargos, nos personagens principais das novelas, na política e, especialmente, em ações triviais do nosso cotidiano. Chegamos a um ponto em que não adianta mais propagarmos apenas a ideia de uma liberdade poética, é preciso mostrar, de fato, que há oportunidade para o exercício dessa liberdade.

 

FICHA TÉCNICA:

12 ANOS DE ESCRAVIDÃO

Direção: Steve McQueen
Roteiro: John Ridley
Elenco Principal: Chiwetel Ejiofor, Lupita Nyong’o, Michael Fassbender, Benedict Cumberbatch
Ano: 2013

Alguns Prêmios:

Golden Globe 2014 (Melhor filme drama)
Screen Actors Guild Awards (Melhor Atriz Coadjuvante: Lupita Nyong’o)
AFI Awards, USA (Melhor Filme)
Austin Film Critics Association (Melhor Ator (Chiwetel Ejiofor), Melhor Atriz Coadjuvante (Lupita Nyong’o), Melhor Roteiro Adaptado (John Ridley))

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Django Livre: escravidão, violência e debate social

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Com cinco indicações ao Oscar:

melhor  filme, ator coadjuvante (Cristoph Waltz), melhor roteiro, fotografia e edição de som.

 

Quentin Tarantino havia em seu último trabalho – Bastardos Inglórios – transformado a história da Segunda Guerra Mundial em uma sangrenta vingança, com direito a um cinema explodindo e levando embora todo o alto comando nazista. O sensacional Christoph Waltz encarnava o Coronel Hans Landa, sádico soldado alemão que alimentava um prazer mórbido ao realizar seu trabalho de caça aos judeus.

Bem, Tarantino trouxe de volta Waltz, que novamente interpreta um alemão em Django Livre – a despeito da nacionalidade austríaca do ator – só que nesse filme, em uma ironia típica do diretor Tarantino, o Dr. King Schultz, papel de Waltz, é o único que parece ter alguma lucidez sobre um tema que manchou a história de todo o continente americano: a escravidão negra.

 

 

Com mais de duas horas e meia de filme, a história conta a trajetória de Django (Jamie Foxx), um escravo liberto por Schultz, um caçador de recompensa. Após realizar trabalhos em parceria com o alemão, Django conta que sua meta é libertar sua amada, Broomhilda (Kerry Washington), também escrava em uma propriedade chamada Candyland.

Comovido pela história do amigo, Schultz decide ajuda-lo, mais curioso que animado, já que a amada de Django, além de ter um nome inspirado em uma lenda germânica, foi criada por uma família alemã.

 

 

Com a plasticidade violenta que Tarantino traz em todos os seus filmes, Django Livre tem ainda uma pitada de debate social. Expondo os perfis sociais encontrados no auge da escravidão nos estados sulistas dos EUA, a película consegue demonstrar, em cenas realmente agoniantes, como era a vida dos homens e mulheres escravizados e torturados por uma minoria branca.

 

 

Destaque para o personagem de Samuel L. Jackson, que interpreta o escravo Stephen. Um velho que cresceu em Candyland e que não só apoia seus escravizadores como faz de tudo para que nenhum negro jamais pense que a situação da escravidão poderá ser revertida. “Meu personagem é um desgraçado de um colaborador”, disse Jackson em uma entrevista.

O filme convida a uma breve reflexão: “Como uma maioria negra, que superava numericamente seus senhores brancos em cada uma das plantations, era mantida quieta sem se revoltar?”

 

 


FICHA TÉCNICA DO FILME

DJANGO LIVRE

Título Original:  Django Unchained
Gênero: Faroeste
Direção: Quentin Tarantino
Elenco: Leonardo DiCaprio (Calvin Candie), Samuel L. Jackson (Stephen), Christoph Waltz (Dr. King Schultz), Jamie Foxx (Django), Kerry Washington (Broomhilda), Walton Goggins (Billy Crash).
Países de Origem: Estados Unidos da América
Classificação: 16 anos
Duração: 165 min

Alguns prêmios:
Golden Globes: Melhor roteiro e Ator Coadjuvante (Christopher Waltz).

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