Beverlei dos Reis Rocha: Nuances entre a escrita e as terapias integrativas

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Beverlei no Lançamento da Antologia Singularidade das Palavras, na Editora Scortecci, dezembro de 2019

Sônia Cecília Rocha – soniacecirocha@gmail.com

O Encena entrevista Beverlei dos Reis Rocha, 73 anos, Analista Administrativo do Conselho Regional de Psicologia de Goiás-CRP-09, há 16 anos, onde exerce a função de Coordenadora Administrativa.

Dentre suas atribuições está a realização de palestras aos discentes de Psicologia, sobre os procedimentos administrativos para início da carreira profissional.

Poetisa com poesias publicadas nas antologias poéticas: Poesia Livre (2019 e 2021), Sarau Brasil (2019, 2020 e 2021) e Poetize (2020, 2021 e 2022), pela Editora Vivara; Singularidade das Palavras (2019), Minuto de Tudo (2020), Esboços da Alma e Palavras do Cotidiano (2021), Scortecci 40 anos e Frações de Tudo (2022), pela Scortecci Editora; Poesia Agora – Primavera, pela Editora Trevo, e Coletânea poética nova poesia, pela Clipe Editora.

Estudiosa, está sempre buscando novos conhecimentos. Possui formação nas terapias Reiki, Floral de Bach, Radiestesia e Tarô.

(En)Cena: Beverlei, nos conte um pouco de sua trajetória, entre o trabalho, as terapias integrativas até o despertar pela escrita.

Sou de uma geração que começou a trabalhar muito jovem. Meu primeiro registro profissional formal se deu aos 14 anos (a famosa Carteira Profissional assinada), e continuo na ativa até o momento, sem previsão de parar.  Depois de tantos anos em intensa movimentação não consigo me ver num ritmo mais calmo.  As terapias integrativas entraram em minha vida a partir de 2014, quando minha filha caçula, já adulta e graduada, foi aprovada em concurso no Rio de Janeiro e o silêncio da casa vazia começou a incomodar. Como tinha várias amigas que sempre me convidavam para os cursos, resolvi experimentar e amei a experiência. Quanto à escrita, sempre fui uma leitora voraz desde a adolescência.  E desde lá, fazia algumas tentativas, porém, sem muito foco.  Quando veio o casamento e os filhos, a atividade foi esquecida. Com o fim do casamento e o voo dos três filhotes em busca de suas próprias jornadas, o desejo da escrita foi se intensificando.  Por incentivo da querida amiga jornalista Maria Cristina Furtado, hoje funcionária da rádio da Universidade Federal de Goiás, iniciei a publicação dos poemas em 2019.

(En)Cena: Qual foi o gatilho para que você entrasse no mundo da poesia, ou seja, qual foi o seu primeiro e decisivo ato literário?

Como disse, o desejo da escrita já existia, mas o gatilho para a concretização foi a necessidade de preencher as horas de silêncio que reinava no intervalo entre o jantar e a hora de dormir, pois nunca apreciei muito a TV e a música aguçava ainda mais a solidão; então, além de ler, comecei a escrever, e me apaixonei por este delicioso exercício. Foi assim como me apaixonar por alguém. Acabei descobrindo em mim e ao meu redor aspectos que me inspiravam, além de me ver vivenciando novas possibilidades. Estar à frente de algo desconhecido, mas ao mesmo tempo tão íntimo para mim, porque não me dar esta oportunidade de viver novas e inteiras paixões?

(En)Cena: Quando começou a escrever tinha algum escritor(a) que te inspirava, ou estes sentimentos narrados em escrita eram só seu eu ou algo implícito se expondo?

Sempre li bastante: romances, poemas e outros estilos. Penso que na experiência da leitura sempre ficamos com algumas notas de determinados autores. No meu caso, me identifico muito com autoras(es) que tocam a alma e os sentidos, sem receio de julgamentos. Impossível enumerar, aqui, todas as autoras e autores que aprecio, no entanto destaco Florbela Espanca, Gilka Machado, Lou Salomé, Clarice Lispector, Ligia Fagundes Teles, Adriana Calcanhoto, Charles Bukowskie, Caio Fernando Abreu, Zack Magiezi.

(En)Cena: Quando você começa a escrever precisa de um clima especial, um ambiente, ou em qualquer lugar ou estado de espírito lhe vem as inspirações?

As ideias podem até vir ao longo do dia, em qualquer lugar, mas só desenvolvo, em casa, à noite, em meu cantinho mais que especial, é neste cantinho que minha mente coloca em prática as ideias que me surgiram ao longo do dia, da semana. Vou juntando fragmentos dos pensamentos que povoam meu imaginário, ou minha realidade vivida.

(En)Cena: Qual o tema que fala mais alto em seus poemas e por quê?

A solidão e a saudade são temas sempre presentes, pois representam a realidade vivida.

Nem sempre é aquela solidão de sentimento de vazio, este sentimento não me pertence, estou sempre cheia de mim, das minhas ideias e sentimentos, é a solidão da saudade de um ente querido que se foi.  Nem tão pouco um sentimento de isolamento, nem de perdas emocionais, é uma aragem que passa e me traz inspirações. Minha solidão é livre, não é imposta e a saudade, áaaa a saudade, ela tanto dói, quanto inspira.

(En)Cena: Quando você está quase adormecendo lhe vem uma ideia, deixa para pensar no dia seguinte ou levanta-se imediatamente para escrever?

Deixo para a noite seguinte. Sou muito dorminhoca e depois de me deitar, não me levanto por nada, mas quando me levanto as ideias estão lá borbulhantes, doidas para sair da mente e ir para o papel.

Fontes de imagens próprias
(En)Cena: Você bebe de outras fontes de escrita que não sejam as suas próprias?

Sim, várias. Sou uma ávida leitora e entre tantos escritores brilhantes tem sempre algum que nos remete temas que gostaríamos de representar. Ouvir a voz dos seus personagens e deixar com que se misturem aos meus, porém com minhas conotações, com a minha maneira de ver e sentir algo ou alguém e que juntos se tornem uma multidão de personas falando por eles e por mim mesma.

(En)Cena: Você acha que Sentimentos negativos são motores bem regulados para a criação de uma obra? Caso seja nos conte como usa-los sem que a obra fique pesada.

Existem autores que possuem obras magistrais inserindo sentimentos como o ódio, a inveja, a cobiça, a avareza, a maldade. Eu, portanto, não os uso com frequência, a bem da verdade quase nunca. Por esta razão não me vejo capacitada para indicar o caminho.

(En)Cena: Quando você lê um romance, vê um filme, tem uma tendência de mudar o final?

Não. Sou profundamente respeitosa com o ato da escrita de alguém. Escrever, embora romantizado, é um ato de sofrimento, pois até chegar ao final desejado, você acorda e adormece vários dias remoendo as ideias. Nunca permiti que meus filhos chegassem em casa com cópias de livros. Pedia até empréstimo bancário para adquirir os originais solicitados pelos professore

Fontes de imagens próprias

(En)Cena: Como é seu processo de escrita, vai amadurecendo a ideias, ou são rompantes de criação?

90% dos textos são frutos de amadurecimento de ideias; os demais, são inspiração única e instantânea. Eu já desisti de buscar uma resposta para minhas inspirações, é algo abstrato, que não se toca, não se define, apenas vem. Às vezes, ouvir alguém declamando uma poesia já é o bastante para fazer com que meu imaginário se encha de inspirações; em outros, basta que eu veja uma flor, um galho seco ou qualquer coisa sem sentido no meio da rua.

(En)Cena: Suas poesias tem sentidos implícitos, se tem são perceptíveis? Seu talento mora nas entrelinhas?

Algumas têm. Acredito que são perceptíveis para um bom observador. Gosto de entrelinhas. Gosto desta brincadeira de construir sentidos, captar os sentimentos que não estão claramente expressos.

(En)Cena: Tem momentos da mais pura falta de imaginação, o que lhe ocorre quando isto acontece?

Sim. Quando ocorre, simplesmente me dedico à leitura e outras atividades, e fico tranquila.

(En)Cena: Qual a importância que você vê nas poesias no mundo contemporâneo?

Vejo a poesia como uma grande aliada das atividades de resgate da alegria e da autoestima. Às vezes sou convidada para palestras no encontro mensal do Death Café e outras instituições, com grupos de pessoas que estão vivenciando perdas graves, seja de familiares ou do estado de saúde. Quando encerro a apresentação, as pessoas estão alegres, motivadas, desejosas de também expressar seu sentimento e esquecidas dos motivos que as levaram ali.

(En)Cena: Beverlei, em sua opinião o mundo hoje em dia carece de mais cultura,

Porque e qual a função social da literatura?

Sim. Não somente da literatura, mas de todas as expressões da arte e da cultura, já que cada pessoa tem uma preferência artística. Como já disse, a arte nos motiva a vencer as dificuldades e as dores.  Acho que a poesia em especial dá mais riqueza às emoções, aguça nossa sensibilidade nossa percepção, precisamos de poesia para viver, se não á escrita, aquela que mora dentro de nós, sem poesia somos tristes, somos pobres.

(En)Cena: Você pretende algum dia viver só de poesia, ou você crê que as pessoas não dão o devido valor na cultura que elas carregam?

Nunca pensei em viver só da poesia.  Embora tenha havido um despertar para a literatura, principalmente nos últimos três anos, devido à reclusão vivida pela Pandemia, ainda acho o mercado literário pouco valorizado.

(En)Cena: Deixe sua mensagem aos que sonham, mas não realizam.

Recomendo que bebam na fonte de Gonzaguinha: “Viver…e não ter a vergonha de ser feliz…cantar e cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz…”.

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A diversidade e o preconceito linguísticos no Brasil: uma luta da psicologia e do multiculturalismo

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O preconceito linguístico existe no Brasil e persiste ao longo da história desde o período colonial. Os portugueses ignoraram a língua nativa dos moradores que aqui viviam e passaram a ensinar o português. E por não saberem a língua portuguesa, os nativos perdiam os seus direitos garantidos diante da Corte.

Quanta injustiça os índios não viveram? E para sobrevierem, muitos tiveram que aprender o português que aos poucos fez com que muitas línguas indígenas fossem esquecidas, já que não foram documentadas e não mais ensinadas para as gerações futuras.

Na sociedade atual, diariamente somos surpreendidos com notícias de que alguém sofreu algum tipo de preconceito, seja social, sexual, preconceito físico, de gênero, etc., e também preconceito linguístico. Mas, como definir o preconceito linguístico em um país que tem 26 Estados e o Distrito Federal, onde no mesmo Estado ou região, pode haver variação de sotaques e usos de palavras para um determinado objeto?

Primeiramente vamos compreender o significa de lingüística. Segundo o dicionário Houaiss, “linguística é a ciência que estuda a linguagem humana, a estrutura das línguas e sua origem, desenvolvimento e evolução”. Ou seja, cada lugar, cada povo possui a sua própria língua, a sua forma de se comunicar uns com os outros. Além da língua, existe o dialeto, o qual conforme o dicionário citado anteriormente é “qualquer variedade linguística coexistente com outra e que não pode ser considerada outra língua (p.ex.: no dialeto português do Brasil, o dialeto caipira, o nordestino, o gaúcho, etc.)”. Logo, conclui-se que dialeto é uma variedade linguística, termo utilizado para se referir a formas diferentes de utilizar a língua de um mesmo país. Essas variedades linguísticas resultam da variação de uma língua que ocorre devido a vários fatores, como por exemplo, a faixa etária, a escolaridade, a região, o contexto social e cultural.

O PRECONCEITO LINGUÍSTICO

Agora é preciso compreender o termo preconceito. O dicionário de Evanildo Bechara define-o da seguinte forma: “Conceito, sentimento ou atitude discriminatória em relação a pessoas, ideias, etc.”. Assim, o preconceito linguístico se manifesta ante as diferenças que existem na forma diversificada de falar, que “cada indivíduo observa como errado”, considerando apenas como certa a variação de aceitação no que diz respeito à norma culta ou padrão, e diminuindo o valor das demais formas linguísticas, classificando-as como inferiores.

Pode-se dizer que preconceito linguístico é qualquer crença sem fundamento científico acerca das línguas e de seus usuários. Ora, a linguagem, como dito, é um mecanismo de comunicabilidade e deve ser usada por todos, sem discriminação. É um absurdo achar que somente a língua aprendida nas academias, que segue as regras da norma culta, é correta. Se a linguagem é uma forma de expressão do indivíduo, o que importa é que a mensagem emanada pelo emissor chegue até o ouvinte e por esse seja decodificada e compreendida. Se isso aconteceu, está tudo certo.

Outra questão que necessita ser observada é diferenciar a linguagem escrita, que segue regras e padrões de formatação que não podem ser alterados pelo fato da linguagem falada ser diferente. Se uma pessoa falar “nóis vai”, não quer dizer que irá escrever da mesma forma.

O sistema econômico subjugou a língua falada, padronizando o comportamento das pessoas, privilegiando alguns para exercer o poder. Isto é, quem pertence à classe social alta, tem mais acesso à educação, inclusive, alguns estudam em escolas que alfabetizam em duas ou mais línguas, além do português.

Tanto é verdade que, por exemplo, entre grupos de médicos, engenheiros, advogados, psicólogos, entre outras tantas profissões, há termos técnicos que são falados entre aqueles profissionais e que não fazem parte do vocabulário dos falantes daquela língua e nem por isso, estes, por se utilizarem de vocábulos “diferentes” são excluídos ou diminuídos pelos demais, ao contrário, são venerados.

Dessa maneira, estes são tratados de forma diferente daqueles que não têm acesso ao ensino básico de qualidade e não conjugam, por exemplo, os verbos da forma padrão. As salas de aula, quando tem aula e onde tem escola, são improvisadas e não há divisão de turmas, de idade entre os alunos, grau de escolaridade, etc., numa visão totalmente antagônica à anterior. Mesmo nos dias de hoje, podemos encontrar escolas como essas em alguns Estados brasileiros.

Fonte: Chico Bento – Tirinha de Maurício de Sousa. 1998.

Outro aspecto relevante a ser abordado são as diferentes formas de se comunicar entre os brasileiros. O Brasil, pela sua dimensão territorial, abriga povos que apresentam diferentes culturas e formas de se expressarem, a depender da região. E as regiões consideradas mais economicamente desenvolvidas discriminam as menos favorecidas no plano econômico.

Fato é que os meios de comunicação também reforçam essa diferenciação, inferiorizando algumas maneiras de falar. Muitas das vezes, o sotaque nordestino aparece quando é encenado por um trabalhador da limpeza ou que atua como humorista. Não se observa com frequência em posição de destaque e influência em papéis principais nos filmes, novelas ou telejornais nacionais.

De igual forma, há uma discriminação dos mais jovens para com os mais velhos, mesmo em relação à linguagem. Como explica Maria Homem, em seu canal, esse fenômeno consiste no embate estrutural, como sempre, que está implícito na palavra cringe, pois, durante milênios, os anciãos eram os que tinham mais respeito, em razão dos anos vividos, da experiência e com ela a sabedoria. Inverter essa estrutura se traduz na prepotência da modernidade, que não cuida dos mais velhos, ao contrário, maltrata, não abarca esse caldeirão de experiências, desvalidando aquilo que não se faz mais.

Ora, não é diferente com a linguagem. Os mais jovens desvalidam os mais antigos, a partir de gírias como “broto, pão, avião” que se referiam a alguém bonito e que representam uma determinada geração. Aqueles que reproduzem esses vocábulos são alvo de tratamento pejorativo, jocoso, demonstram estar fora de época, ultrapassados, cringe, como alguém que traz vergonha, e, portanto, algo que deve ser marginalizado, discriminado, numa verdadeira expressão do preconceito linguístico.

A prática desse tipo de preconceito é constatada em todos os lugares e ambientes. Como bem nos assegura Mariane (2008), o ato de julgar antecipadamente consiste na discriminação existente entre pessoas falantes do mesmo idioma que elegem esse outro idioma como oficial e exclui outras variações existentes.

Assim, o preconceito linguístico existe, inclusive, dentro das escolas. O bullying tem levado adolescentes à depressão, à ansiedade e até ao suicídio. Já que o ensino tradicional determinou quem fala certo ou errado, crianças, adolescentes e jovens, que mudam de uma região do Brasil para outra, podem ser alvo de piadas em sala de aula.

Fonte: Imagem por pikisuperstar no Freepik

É oportuno lembrar que existem dois tipos de gramáticas para os linguistas: a normativa e a descritiva. A primeira é a “base da maioria dos livros didáticos e gramáticas pedagógicas, em que se caracteriza um conjunto de regras. Considerada como o conjunto sistemático da norma, ou seja, para o falar bem e escrever. Essa concepção parte do princípio de que todos que falam, sabem de fato, falar. Essa fala segue regras que são consideradas legítimas do ponto de vista do uso e da comunicação entre os diversos tipos de falantes/usuários”. Já a descritiva “tem a preocupação de analisar, descrever e explicar a construção dos enunciados, que são utilizados de fatos pelos falantes”.

Dessa forma, os professores precisam ensinar a variação da língua de forma realista (gramática descritiva) e não utópica (gramática normativa), a fim de minimizar os impactos, fazendo com que o aluno reconheça a importância da própria história, sem perder a essência e ser inserido no novo ambiente, de forma que os demais o recebam com respeito.

Essa atitude está em conformidade com o que prega o Multiculturalismo, que defende a luta pelos direitos civis dos grupos dominados, excluídos.

É oportuno frisar que, diante desse contexto, o preconceito devia ser considerado um problema de saúde pública. O site Veja Saúde publicou uma pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (USFC), que “concluiu que vítimas de discriminação têm um risco quatro vezes maior de desenvolver depressão ou ansiedade e ainda estão propensas a agravos como hipertensão”. “A experiência crônica de intolerância estimula a liberação de hormônios relacionados ao estresse, como o cortisol”, explica o epidemiologista João Luiz Dornelles Bastos, um dos autores do trabalho”.

Desse modo, nota-se que não somente a pessoa que está sendo discriminada, mas, também quem está discriminando pode sofrer problemas psicológicos, como afirma na matéria: a “pessoa prestes a agir de maneira hostil se submete a um estresse interno”, explica Ricardo Monezi, psicobiólogo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Outro fator importante que precisa ser observado é a questão da rejeição e as consequências, pois pode levar o indivíduo que está sendo hostilizado à baixa estima, agressão, solidão e inseguranças, que causam medos de enfrentar os desafios de uma vaga de emprego, por exemplo. É aqui que a Psicologia entra em campo, no cuidado da saúde mental desses indivíduos que sofrem com preconceitos, inclusive o linguístico, já que as consequências são tão devastadoras quanto qualquer outro tipo de discriminação.

CONCLUSÃO

A classificação de certo ou errado para os usos da língua portuguesa não deveria existir, já que há a adaptação do contexto coloquial. A pessoa utiliza determinada maneira para falar, levando em consideração o ambiente familiar, a renda, região que mora, formando a sua própria identidade.

A diversidade na forma de falar torna o Brasil com múltiplas características, já que cada região tem um sotaque, seu vocabulário próprio, sua forma de se expressar, a exemplo das diversas línguas indígenas que carregam em si uma história.

O ser humano pertence a um determinado grupo e isso o torna autêntico, donde se conclui que a “língua” não poderia ser considerada como um problema, ao contrário, a “diversidade linguística, neste caso, está relacionada com a existência e a convivência de línguas diferentes. O conceito defende o respeito por todas as línguas e promove a preservação daquelas que se encontram em vias de extinção por falta de falantes”.

Portanto, a diversidade linguística se refere às múltiplas identidades de cada um e como tais merecem respeito e não preconceito.

REFERÊNCIAS

Pequeno Dicionário Houaiss da língua portuguesa/Instituto Antônio Houaissde Lexicografia, [organizador]; [diretores Antônio Houaiss, Mauro de Sales Villar, Francisco Manoel de Mello Franco]. – 1. Ed. – São Paulo: Moderna, 2015

BECHARA, Evanildo, Minidicionário da língua portuguesa Evanildo Bechara/ Evanildo Bechara. – Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2009, página 718.

HOMEM, Maria. O que é cringe? Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=Hjh6p5Ip6Bg. Acessado em 24/11/21.

SANTOS, Patrícia da Cruz Ferreira dos [1], ANDRADE, Marta Mires Da Cruz de [2], ALMEIDA, Daiane Vithoft de [3], Preconceito linguístico: Intolerância que retrai, língua que marginaliza.Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 08, Vol. 15, pp. 12-33. Agosto de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/lingua-que-marginaliza, DOI:10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/lingua-que-marginaliza. Acesso em 17/11/21.

MATTA, Sozâgela Schemim da. Português, linguagem e interação. Curitiba: Bolsa Nacional do Livro Ltda, 2009.

BERGAMO, Karolina. A intolerância de hoje pode ser a doença de amanhã — inclusive entre quem pratica a discriminação. Publicado em 28 jun 2016. Disponível em https://saude.abril.com.br/mente-saudavel/preconceito-faz-mal-a-saude/amp/. Acesso em 24/11/21.

[1] Pequeno Dicionário Houaiss da língua portuguesa/Instituto Antônio Houaissde Lexicografia, [organizador]; [diretores Antônio Houaiss, Mauro de Sales Villar, Francisco Manoel de Mello Franco]. – 1. Ed. – São Paulo: Moderna, 2015, p. 593.

[2] Idem. p. 334.

[3] BECHARA, Evanildo, Minidicionário da língua portuguesa Evanildo Bechara/ Evanildo Bechara. – Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2009, página 718.

[4] HOMEM, Maria. O que é cringe? Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=Hjh6p5Ip6Bg. Acessado em 24/11/21.

[5] SANTOS, Patrícia da Cruz Ferreira dos [1], ANDRADE, Marta Mires Da Cruz de [2], ALMEIDA, Daiane Vithoft de [3], Preconceito linguístico: Intolerância que retrai, língua que marginaliza.Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 08, Vol. 15, pp. 12-33. Agosto de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/lingua-que-marginaliza, DOI:10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/lingua-que-marginaliza. Acesso em 17/11/21.

[6] MATTA, Sozâgela Schemim da. Português, linguagem e interação. Curitiba: Bolsa Nacional do Livro Ltda, 2009, p. 136.

[7] Idem

[8] BERGAMO, Karolina. A intolerância de hoje pode ser a doença de amanhã — inclusive entre quem pratica a discriminação. Publicado em 28 jun 2016. Disponível em https://saude.abril.com.br/mente-saudavel/preconceito-faz-mal-a-saude/amp/. Acesso em 24/11/21.

[9] Idem

[10] Conceito da diversidade lingüística. Publicado em 2011/atualizado em 2019. Disponível em https://conceito.de/diversidade-linguistica. Acesso em 24/11/21.

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Pulmão de aço: superação e vontade de viver

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Vivendo em uma cama de hospital e com a necessidade de juntar suas memórias, Eliana começou a escrever e a fazer anotações em um diário através da boca.

Pulmão de aço, publicado em 2012 por Eliana Zaqui, configura uma trajetória real de vida no maior hospital do Brasil. O título do livro “Pulmão de Aço” faz menção à máquina em que Eliana foi colocada na madrugada em que chegou ao Hospital das Clínicas de São Paulo, quando tinha apenas 1 ano e 9 meses. O aparelho permite à pessoa respirar depois de ter perdido o controle muscular ou diafragmático através da exceção de pressão negativa sobre o corpo, expandindo a caixa torácica e forçando a entrada de ar. Vítima da poliomielite, também conhecida como paralisia infantil, Eliana não obteve resultado no pulmão de aço, restando a ela ser ligada, através da traqueostomia, a um respirador artificial, aparelho que utiliza até os dias atuais.

Vivendo em uma cama de hospital e com a necessidade de juntar suas memórias, Eliana começou a escrever e a fazer anotações em um diário através da boca. Temos aqui resiliência, conquistas, perdas, momentos de dor, sofrimento, bondade, perseverança, coragem, determinação, fé e tantos sentimentos que permeiam a experiência de quem sobreviveu para contar. O primeiro momento do livro relata a chegada da família de Eliana ao Hospital das Clínicas de São Paulo, os pais assinam os documentos da internação e os médicos percebem a gravidade do caso.

Fonte: https://bit.ly/2RUVK4f

A partir desse momento, somos apresentados a este novo mundo. Nele, Eliana começa a descrever suas vivências. Seus pais se despedem levando a lembrança daquela menininha deitada em uma maca, de vestidinho e sapatos, sem esperança de que a menina que eles conheciam continuasse a existir. Sozinha, Eliana conhece a máquina pulmão de aço, uma criação de Philip Drinker, professor da Harvard University, nos Estados Unidos. É uma máquina que possibilita à pessoa respirar depois de ter perdido o controle muscular ou diafragmático. O paciente é posicionado no aparelho, que é parecido a um forno, ficando somente com a cabeça para fora. O pulmão de aço era considerado muito eficiente por reverter o quadro de insuficiência respiratória em quase 90% dos casos, mas não foi capaz de solucionar o caso de Eliana.

A pólio é uma doença infectocontagiosa aguda, causada por vírus e transmitida por meio do contato direto com secreções. O diagnóstico é feito a partir de um exame de fezes, mas em alguns casos, muitos raros, é necessário fazer outro tipo de exame para detectar. O invasor alcança a corrente sanguínea, podendo chegar até ao cérebro. Esse foi o caso da autora, destruindo os neurônios motores e provocando a paralisia. Com o avanço tecnológico, Paulo consegue vencer o isolamento e faz com que o mundo que ele tanto admirava viesse até ele, entrando em contato, virtualmente, com pessoas, como Ayrton Senna, que ele admirava, e até recebendo visitas.

O segundo momento do livro relata suas amizades e conquistas dentro do hospital e a integração de sete crianças vivenciando as mesmas dificuldades, desconforto, exclusão social e um olhar único entre eles que não se sentiam sozinhos pois tinham uns aos outros. Era a corrente de amor fraterno nascendo da dor. Tânia e Paulo eram os veteranos da UTI. Em meio ao caos explicavam as regras, apresentavam os doentes e funcionários para quem estavam chegando e gritavam por socorro quando algo estava errado com os outros pacientes.

Fonte: https://bit.ly/2Fukkrh

Tânia, era vaidosa e a única que recebia visitas regulares de familiares, mas mesmo com essas visitas ela se sentia excluída. Pedro Donizete, Pedrinho, Luciana e Anderson, unidos e padecendo juntos pelas graves deficiências, vivenciaram e presenciaram juntos diversos sentimentos e comportamentos. Com exceção de Anderson, que tinha o apoio e afeto dos familiares, os outros seis eram carentes de carinho e gostariam de ter uma figura adulta que lutasse em prol deles, e por esse sentimento não se concretizar eles sonhavam em fazer coisas sem depender de ninguém; sentiam vontade de andar, cuidar de si mesmos e não viver no leito do hospital. Na ausência do afeto familiar alguns funcionários foram o consolo no momento do choro, da solidão, da tristeza, sendo que os momentos de solidão e o sentimento de abandono incomodavam mais que a própria doença e seus desdobramentos.

Os moradores temporários recebiam alta, o que aumentava ainda mais o sentimento de angústia e de abandono para os moradores permanentes. Isso se tornava visível e cada separação ajudou os sete amigos a amadurecer rapidamente. A vida imobilizada pode ser difícil mas não impossível, e por trás da aparência frágil Eliana se tornou muito forte por dentro. Ao passar do tempo ela foi deixando de ser aquela menina e tornou- se mulher, com emoções acentuadas, necessidades afetivas etc.

Como todo desenvolvimento, ela começou a sentir necessidade de um feedback aos sentimentos que carregava. Mas, aos poucos foi perdendo as pessoas que amava e a maneira de lidar com as perdas foi aprendendo a escrever e, como ela mesmo diz, a chorar menos, a sentir menos pena de si mesma.

Fonte: https://s03.video.glbimg.com/x720/2028058.jpg

A moradia em um hospital era o seu lar; lá aprendeu e mesmo com o corpo paralisado, sua mente não se acomodou e em uma das suas falas Eliana relata que “se fisicamente não posso andar, em minha mente sou capaz de voar sem limites”. Mesmo com o corpo imóvel, ela desenvolveu habilidades cognitivas, aprendeu inglês, italiano, fez curso de história da arte e virou pintora. Pinta seus quadros com a boca, mostrando força de vontade e a possibilidade de desenvolvimento de repertórios que possibilitaram a felicidade no meio da dor e do sofrimento. Ela tinha tudo para desistir, mas decidiu viver tornando o livro motivacional e inspirador.

Em pulmão de aço, prevalece uma história de superação de vida. Apesar da presença de uma doença que ausentou membros importantes para seu desenvolvimento, Eliana sentiu a necessidade de aprender repertórios para lidar com situações árduas, crendo que na vida, não há limites nem barreiras para ser feliz.

FICHA TÉCNICA

Nome do livro: PULMÃO DE AÇO

Editora: Belaletra Editora

Gênero: Autoajuda

Autor:  Eliana Zagui

Ano de lançamento: 2009

Idioma: Português

Ano: 2012

Páginas: 240

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HACKATHON: “SCRIBO” quer melhorar a vida de jovens estudantes

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O resultado da maratona será divulgado nesta sexta, dia 25/05, durante o encerramento do CAOS e do ENCOINFO, a partir das 19h, no auditório central do Ceulp/Ulbra.

O SCRIBO é uma plataforma que busca o desenvolvimento da elaboração de sentimentos com foco na relação do aluno para com a escola e para si próprio. Pensando no aumento das queixas relacionadas à automutilação, Bullying, depressão e ideação suicida envolvendo adolescentes, que passam grande parte do dia no âmbito escolar, o aplicativo busca fomentar o desenvolvimento do principal mecanismo para distanciar os jovens dessas situações de sofrimento psíquico: a comunicação. Foi desenvolvida por uma equipe composta por acadêmicos de Psicologia e dos cursos da área de Computação, participou do 1º Hackathon Tech for Life, cujo tema é “Tecnologia e Saúde Mental”.

Com a iniciativa da instituição escolar em se cadastrar no site, os alunos podem baixar o aplicativo e fazer login vinculados a sua escola. A partir de então, o usuário pode exercitar livremente suas habilidades de comunicação, enquanto a escola recebe gráficos sobre os sentimentos e relatos pessoais através da conta no site.

Os jovens terão acesso a: Opção de fornecer feedbacks anônimos para a instituição na qual está inserido de maneira irrestrita; Diário de Emoções com calendário emocional, no qual emoções básicas podem ser registradas, gerando gráficos para a instituição escolar, bem como um diário cursivo com opções para fotos; Incentivos para interação com pares; Dicas sobre saúde mental em uma linguagem jovem e simples; Instrumentalização sobre como agir em casos de emergência envolvendo crises.

O resultado da maratona será divulgado nesta sexta, dia 25/05, durante o encerramento o encerramento do CAOS e do ENCOINFO, a partir das 19h, no auditório central do Ceulp/Ulbra.

1º Hackathon Tech for Life – Em parceria com os cursos de Sistemas de Informação, Ciência da Computação e Engenharia de Software, o curso de Psicologia participa do 1º Hackathon Tech for Life – que é uma maratona de programação – nos dias 19 e 20 de maio. A temática do 1º Hackathon é “Tecnologia e Saúde Mental” (o tema específico, no entanto, será anunciado na abertura do evento), com o propósito de trabalhar a inovação no desenvolvimento de protótipos, softwares aplicativos, dentre outros projetos de temática tecnológica que possam ser aplicados ou desenvolvidos com este objetivo. A ação é uma prévia do CAOS (Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia) e do ENCOINFO (Congresso de Computação e Tecnologias da Informação).

Integrantes da equipe

Alessandra Soares Araújo, 20 anos, acadêmica de Psicologia do Ceulp, 5° período, Voluntária no Portal (En)Cena.

Antônio Carlos Pereira Mota Milhomens Jr, 22 anos, acadêmico de Ciências da Computação do Ceulp, 8° período, Estagiário no Tribunal de Contas do Tocantins.

Arthur Ribeiro de Araújo Conceição, 20 anos, acadêmico de Sistema de Informação da FACTO, 7° período, Estagiário na CRP Tecnologia.

Isaura de Bortoli Rossatto, 20 anos, acadêmica de Psicologia do Ceulp, 5° período, Estagiária no Portal (En)Cena.

 

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A desconstrução de Jacques Derrida

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Este trabalho tem por objetivo discorrer sobre o pós-estruturalismo de Jacques Derrida, concomitantemente, aspectos relacionados a sua biografia e as influências que ocorreram ao longo de sua trajetória.   Serão elucidados conceitos de estruturalismo, como também as mudanças a este relacionadas. Derrida, em sua carreira, mobilizou a forma de organização da sociedade contemporânea, trazendo o termo “desconstrução”, considerando-o como uma desmontagem de ideias formadas, tidas como verdades absolutas. Foram abordados também críticas do pensamento moderno – logocentrismo e fonocentrismo, vislumbrando todo seu processo, e respectivamente, os princípios destacados, apresentando o conceito de fonemas e as configurações que norteiam as diferenças de escrita.

Para tanto, irá esclarecer o sentido e aplicação; operando a desconstrução, que tem em sua narrativa o conceito de centro, como também a diferença que existe entre différance e desconstrução, de antemão, o mesmo tem foco na escrita e em seu discurso defende a ideia de construir novos significados, possibilitando ver aspectos da verdade sobre um outro olhar. Uma das correntes filosóficas que influenciou o mundo contemporâneo, em meados do século XX, foi o Pós-Estruturalismo (BUENO, 2015). Essa linha de pensamento influenciou desde a arquitetura até a educação, abalando, assim, a forma de organização da sociedade moderna (SANCHEZ, 2012) .  Distingue-se as ideias do pensamento pós-estruturalista como sendo múltiplo e vasto, tendo como característica particular a “desconstrução de ideias e teorias estruturadas” (CORRENTES FILOSÓFICAS, 2011).

Fonte: https://goo.gl/jBvfTC

A corrente que se destaca neste período intitulou-se Desconstrução, ideia de Jacques Derrida, pensador e filósofo francês. Lecionou na França e em grandes universidades estadunidenses, como Yale, Harvard e John Hopkins. Foi muito influenciado pelas ideias de Freud, considerando a teoria do inconsciente como sendo revolucionária para a filosofia moderna (UOL EDUCAÇÃO). Em 1966, ainda desconhecido, Derrida apresenta um ensaio onde criticava e contestava os conceitos do estruturalismo (MENESES, 2013). Mas o que vem a ser a Desconstrução? Derrida aponta que tentar entender a desconstrução como um conceito ou até mesmo um método seria contraditório, já que a corrente surge justamente com o intuitoo de alterar as ideias de conceitos e métodos (VASCONCELOS, 2003). Derrida (apud VASCONCELOS, 2003, p. 74) denomina a Desconstrução como uma estratégia

O que me interessava naquele momento [da escrita de La dissemination, La double séance e La mythologie blanche], o que tento continuar agora sob outras vias, é, a par de uma “economia geral”, uma espécie de estratégia geral da desconstrução. […]. É, pois necessário antecipar um duplo gesto, segundo uma unidade simultaneamente sistemática e como que afastada de si mesma, uma escrita desdobrada, isto é multiplicada por si própria, aquilo a que chamei em “La double séance, uma dupla ciência: por um lado, atravessar uma fase de derrubamento. […] aceitar essa necessidade é reconhecer que, numa oposição filosófica clássica, não tratamos com uma coexistência pacífica de um vis-a-vis, mas com uma hierarquia violenta. Um dos dois termos domina o outro (axiologicamente, logicamente, etc.), ocupa o cimo. Desconstruir a oposição é primeiro, num determinado momento, derrubar a hierarquia.

Assim, a Desconstrução além de uma interpretação, nem mesmo uma operação, mas uma “releitura do mundo”, abrindo uma gama de possibilidades e significâncias e assim não dando espaço a “limitações metodológicas” (MENESES, 2013, p. 183). Em se tratando das críticas do pensamento moderno, tem-se o logocentrismo, caracterizado por “(…)um conjunto de pressuposições em que se assenta a cultura do Ocidente.  Bem de acordo com o percurso da lógica, o logocentrismo marca-se por um grupo    de    conceitos    estabelecidos    em    categorias    opositivas    como    mente/corpo, essência/circunstância, verdade/mentira” (GOULART, 2003, p.12).

Fonte: https://goo.gl/Aab1gu

Atrelado a essas noções que organizam o pensamento humano, que funcionam como elementos centrais, se concebe uma série de conceitos e ideias que dão ao homem uma espécie de realidade como um todo. Derrida utiliza-se muito da antítese no logocentrismo, afirma ainda que essas ideias centrais acabam sendo usadas como objeto de dominação e hierarquização

Nessa atitude, procede-se a uma hierarquização que tem por objetivo afirmar a superioridade de um termo em relação ao outro.  Assim, nenhuma dúvida haveria em se pensar as oposições espírito/matéria ou Deus/diabo como produtoras   de   uma   verdade   que   ilumina   o   primeiro   elemento   da   oposição.   Essa hierarquização também é vista por Derrida como um tipo de relação de poder uma vez que a  predominância  do  elemento  privilegiado  denota    um fundamentalismo  que  se  impõe, autoritariamente,   no   sentido   de   propor-se   como   um   centro   inquestionável,   única possibilidade  de    explicação  da  realidade  e  de  explicitação da  verdade,  em  termos absolutos, Derrida atua para avultar-se  a concepção logocêntrica  afirma o  valor  de  um  centro,  em  prejuízo   de  seu  oposto, e   metafísica  atribui  ao logos a possibilidade de afirmação da verdade e a própria explicação da origem do ser (GOULART, 2003, p.12).

Ao falar de fonocentrismo, Derrida faz uma crítica. Segundo ele, a linguagem na cultura ocidental tem o seu lado negativo, uma vez que ela subtrai as várias formas de linguagem. Critica ainda o fato de que a racionalidade e a razão são completamente ligadas a fala e que esta é um objeto direto de verdades conscientes. Isso é o que difere um indivíduo do outro, visto que a etiologia do fonocentrismo é a fala sobre a escrita, escrita essa que não está sujeita a autoridade de quem a escreve (GOULART, 2003). A esse respeito:

Nas suas investidas contra a metafísica, Derrida dedica um significativo espaço para a crítica ao fonocentrismo, ou seja, para mostrar tudo o que a fala tem de negativo, uma vez que   ela   contribui   para   a   manutenção   das   condições   que   oblitera   a   manifestação multifacetada da linguagem. Por coisas como essas é que disse, acima, que a fala pode ajudar a compreender a presença, na medida em que a fala, por suas propriedades fônicas, atua como se estivesse legitimando a presença do falante, numa dinâmica que é a própria autenticidade, por estar, ali, sem artifícios e sem aparências, atestando uma presença e uma verdade (GOULART, 2003, p.13).

Fonte: https://goo.gl/M4Jokc

Portanto, segundo o autor, o idealismo favoreceu para as práticas escritas e verbais, como as verdades mais próximas do ser. Derrida afirma que o fonocentrismo está ligado inteiramente a Logocentrismo, pois os escritores o desafiam. Essa escrita que é responsável por excluir a polissemia. No entanto

A escrita não tem sentidos unívocos; ela produz sentidos os quais, mais do que múltiplos (polissemia), são sempre relacionais, incertos e não sabidos, diferentes e diferidos. Os conceitos desconstruídos por Derrida são os de significado, verdade, ser, essência. A esses conceitos, ele opõe as noções diferença (“différance”) e rastro (“trace”). A diferença é o próprio movimento do sentido, que só existe numa rede de elementos passados e futuros, numa economia de rastros” (PERRONE-MOISÉS, 1995).

O princípio que norteia o pensamento de Derrida sobre a Desconstrução dos centros é saussuriano, e ele admite na sua obra “Gramatologia”, conforme comenta Leal (LEAL, 2009), onde apresenta o conceito de fonema, segundo o qual o papel do significante apenas se torna perceptível em contraposição a outro significante, como exemplo, Deus é conhecido quando contrastado ao diabo, a partir das diferenças apresentadas atribui-se significados (DERRIDA, 2006, apud LEAL, 2009). Na acepção de Derrida (2006, apud LEAL, 2009), o significante caracteriza-se pela possibilidade de articulação do significado por meio da fala e da escrita e o significado é o conceito posto para a articulação. Derrida acrescenta ainda:

[…] não era um lugar fixo mas uma função, uma espécie de não-lugar no qual se faziam indefinidamente substituições de signos. Foi então o momento em que a linguagem invadiu o campo problemático universal; foi então o momento em que, na ausência de centro ou de origem, tudo se torna discurso – com a condição de nos entendermos sobre essa palavra – isto é, sistema no qual o significado central, originário ou transcendental, nunca está absolutamente presente fora de um sistema de diferenças (DERRIDA, 2002, p.232 apud PEDROSO JÚNIOR, s.d., p. 18).

Como mencionado acima, Derrida destaca as “margens”, a qual chama de “diferenças”, demonstrando a marginalização da literatura por questões geográficas ou opressões ideológicas. Com isso motivou a busca por pesquisas relacionadas à literatura e estudos culturais. A fala e a escrita são produtos das relações, e de acordo com Derrida, a linguagem é uma estrutura orientada. A desconstrução derridariana (DERRIDA, 2006, p. 265 apud LEAL, 2009) sobre o suplemento que é o fato de existir lacunas de ausências que existe na fala e somente a escrita contribui para complementá-la.

Fonte: https://goo.gl/x5Y8Xp

Na desconstrução tem como princípio da diferença, da referência e do contexto, desmembramento do mesmo conceito, em que o termo e seu outro são co-participantes do significado. Derrida coloca que a configuração do significado de bem depende do conceito de mal, cada um é definido a partir de sua diferença com seu outro (LEAL, 2009). Embora fosse herdeiro do estruturalismo, ele problematiza o conceito de centro, ou seja, se existia um centro é porque ainda permanece no estruturalismo e consequentemente é considerada uma verdade metafísica e que como todas as verdades devem ser colocadas em questão.

Interessava-se em discutir e explicar os termos denominados de desconstrução e différance, pois para ele era clara a diferença entre os dois. Cada palavra tinha seus sentidos próprios e o que elas representavam. “Différance é um termo que Derrida cunhou em 1968 à luz de suas pesquisas sobre a Teoria Saussuriana e estruturalista da Linguagem(LECHTE, 2002, p. 125). Derrida dizia que havia uma grande complexidade entre a fala e a escrita, uma vez que os sons das palavras entram pelo córtex auditivo atravessam outras áreas e chegam ao córtex motor primário para o processamento da fala e nesse percurso distorções podem ocorrer, pois segundo Lechte (2002, p.126) “além disso, a afirmação de que a escrita fonética é inteiramente fonética ou de que a fala é inteiramente auditiva torna-se suspeita […]”.

Fonte: https://goo.gl/1US6F1

Em todas as suas obras Derrida teve o foco na escrita, pois inclui elementos pictográficos, ideográficos e fonéticos, sendo assim, ela não é semelhante em si mesma. A escrita é sempre multifacetada e desafia a identidade ou a ideia de originalidade. Derrida frisava quanto à “impureza” da escrita e seus diversos sentidos. No sentido da desconstrução percebe se a queda da linguagem da metafísica, pois através deste houve o rompimento do significado único das palavras e surge uma aplicação com maiores significados entre a palavra proferidas e escritas.

O Pós-Estruturalismo foi considerado uma desconstrução e uma quebra de paradigmas que perdurou por diversos anos. No entanto alguns pensadores como Derrida deram sua grande contribuição com ideias revolucionárias, que mudaram a postura do ocidente no campo da gramatologia e outros conceitos, no qual ele não concordava, pois os mesmos resumiam se a ideia de centro. As proposições de Derrida são consideradas um tanto quanto desafiadoras. Críticos questionam se o próprio filósofo teria incorrido naquilo que contesta, uma vez que seus conceitos também podem ter sido influenciados pelo contexto histórico e cultural, assim como aqueles sobre os quais ele debatia.

Fonte: https://infogr.am/desarrollo-sustentable4

 A ideia de desconstrução supõe questionar aquilo que, predominantemente no mundo ocidental, é considerado como verdade absoluta. O questionamento das tais ocorre principalmente através da linguagem, uma vez que é a forma pela qual elas foram instituídas. Derrida critica as noções dualistas a partir das quais se limita e reduz as características da linguagem, tais quais os termos que, uma vez mencionados, implicam necessariamente em um oposto (Homem/mulher ou verdade/mentira, por exemplo). Para ele, é preciso mais que simplesmente contextualizar as produções e influências que estavam sob elas; indo além, faz-se necessário abrir-se às possibilidades de uma linguagem que é multifacetada.

REFERÊNCIAS:

BUENO, Sinésio Ferraz. Da teoria crítica ao pós-estruturalismo: breves apontamentos para uma possível confrontação entre Adorno e Deleuze. Educar em Revista. ed. Curitiba: UFPR. n. 56, p. 149-161, 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/er/n56/0101-4358-er-56-00149.pdf>. Acesso em: 14 de mar. 2017.

CORRENTES FILOSÓFICAS. Pós-Estruturalismo, 2011. Disponível em: <http://correntesfilosoficas.blogspot.com.br/2011/11/pos-estruturalismo.html>. Acesso em: 14 mar. 2017.

LEAL, Edilene M. Carvalho. Jacques Derrida: pensador da desconstrução pensador da diferença – XV ENCONTRO NACIONAL ABRA11PSO, 2009, Maceio-AL. Anais. Faculdade Integrada Tiradentes-FITs, 2009. Disponível em: <https://goo.gl/RdhJZq>. Acesso em: 01 mar 2017.

LECHTE, John. Cinquenta pensadores contemporâneos essenciais: do estruturalismo à pós-modernidade. 2ª ed. Rio de Janeiro: DIFEL, 2002.

MENESES, Ramiro Délio Borges de. A desconstrução em Jacques Derrida: O que é e o que não é pela estratégia. Universitas Philosophica, n. 60, p. 177-204, 2013. Disponível em: <http://www.scielo.org.co/pdf/unph/v30n60/v30n60a09.pdf>. Acesso em: 01 mar. 2017.

PEDROSO JÚNIOR, Neurivaldo Campos. Jacques Derrida e a desconstrução: uma introdução. Revista Encontros de Vista. s.d. Disponível em: <https://goo.gl/lB9NyA> Acesso em: 01 mar. 2017.

PERRONE-MOISÉS, Leyla. Pensamento alterou rumos da crítica e da teoria. Outras Margens. Folha de São Paulo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/12/03/mais!/8.html>. Acesso em: 15 de mar. 2017.

SANCHEZ, Renata Latuf de Oliveira. Estruturalismo e Pós-Estruturalismo: diálogos entre Cinema e Arquitetura. Anagrama, v. 6, n. 1, p. 1-14, 2012. Disponível em: <https://goo.gl/JAsTnc>. Acesso em: 14 mar. 2017.

UOL EDUCAÇÃO. Biografias: Jacques Derrida. s/d. Disponível em: <https://educacao.uol.com.br/biografias/jacques-derrida.htm>. Acesso em: 15 mar. 2017.

VASCONCELOS, José Antonio. O que é desconstrução. Revista de Filosofia, v. 15, n. 17, p. 73-78, 2003. Disponível em: <http://www2.pucpr.br/reol/index.php/RF?dd1=117&dd99=pdf>. Acesso em: 14 mar. 2017.

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(En)Cena promove oficina de produção textual para equipe

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Treinamento visa implantação do projeto “Psicorepórter”, que irá envolver acadêmicos de Psicologia no cotidiano do curso
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O (EN)CENA ofereceu à sua equipe, na noite do dia 04/03/2016 (sexta-feira), uma oficina de produção textual, que ocorreu na sala 518 do CEULP/ULBRA. O objetivo é formar redatores e incentivar a escrita. O evento contou com a participação de sete acadêmicos e, em breve, será estendido para outros estudantes interessados em participar da ação.

A oficina é uma iniciativa do curso de Psicologia e foi conduzida a partir de técnicas jornalísticas de elaboração de notícias curtas. A ação está de acordo com as diretivas da coordenação de Psicologia, cujo objetivo é envolver os acadêmicos no cotidiano das diversas disciplinas oferecidas pelo curso. “É uma maneira interessante e participativa no sentido de fazer com que o futuro psicólogo se aproprie das atividades rotineiras do curso. A dinâmica, assim, visa com que todos avancem no processo educativo, de forma contínua e consistente”, assegura a professora Dra. Irenides Teixeira, coordenadora do curso.

O ministrante da oficina e professor Sonielson Sousa acredita “que o projeto é de extrema relevância porque envolve o acadêmico em três aspectos indispensáveis à formação: contato frequente com a escrita, divulgação de sua produção e, por fim, participação direta nas atividades do curso”.

Uma das participantes da oficina, Ismarina Ferreira Fernandes, acadêmica de psicologia, relatou ter gostado muito, pois aprendeu “uma nova forma de expor um assunto”, além de ter ampliado a “aquisição de conhecimento”.

A atividade escrita facilita a organização do pensamento, bem como o desenvolvimento da criatividade. A oficina, assim, reforça as diretivas da coordenação de Psicologia, bem como do próprio CEULP/ULBRA, que é estimular o processo de formação do acadêmico crítico e instigar a curiosidade do mesmo a buscar novos olhares para os fenômenos, a partir da produção de notícias.

A oficina é o primeiro passo para o projeto “Psicorepórter”, que nos próximos dias envolverá uma gama de acadêmicos de Psicologia. Em breve, o (En)Cena publicará mais noticias sobre o tema.

 

+INFORMAÇÕES

(En)cena

Local: CEULP/ULBRA – sala 518

Data da realização: 04/03/2016

Oficina de elaboração de notícias

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Sobre a memória na escrita ou sobre a escrita da memória

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Escrever é tornar registrada uma ideia. Somente uma ideia cultivada em seu próprio ciclo de vida IMPULSO-SIGNIFICAÇÃO-MEMÓRIA-PENSAMENTO pode, no transcorrer da tinta, do impulso eletrônico ou do lance sináptico, tornar-se escrita.

A arte de memória é como uma escrita interna…os locais são como tábuas de cera ou papirus, as imagens como letras, o arranjo e a disposição de imagens, como o script, e a fala, a recitação, como a leitura… Os lugares permanecem na memória e podem ser usados novamente, muitas vezes (…) (Smolka, 171).

Com isso, é clara a ideia de que a escrita ocorre independente do registro externo, o do papel ou do computador, pois se dá no próprio pensamento. As ideias são escritos que foram mais apropriados, mais memorizados, mais editados pelo pensamento, não necessariamente mais velhos. Quando se passa a escrita para o papel, apenas se repete o que se escreveu no pensamento. Ao mesmo tempo, esse passar (refazer um registro) cria uma reação espelhar do/no próprio pensamento que se projeta no infinito microcosmo do registro, tanto o neuronal quanto os de “fora”, das tintas, do carvão, dos sistemas eletrônicos, do vinil, dos cristais e etc. Em suma, escrever é apenas um momento de um pensar que não cessa até a sua morte. Portanto, a escrita é também um exercício da memória, mesmo antes da existência dos papéis, de papiro, de cânhamo, não importa. Seligmann-Silva (2006) faz um estudo histórico acerca de como o conceito de memória modifica-se ao longo do tempo. Esse autor afirma que

Na Antigüidade não só não existia a impressão de livros, como tampouco havia papel tal como nós o conhecemos hoje; daí a importância da memória para o orador. Também em Cícero é patente o valor atribuído à visão dentro da técnica de memorização. O princípio central da mnemotécnica antiga consiste na memorização dos fatos através da sua redução a certas imagens que deveriam permitir a posterior tradução em palavras: a realidade (res) e o discurso final (verba) deveriam ser mediatizado pelas imagens (os imagines agentes). Essas imagens por sua vez, deveriam ser estocadas na memória em certos locais (loci) imaginários ou inspirados em arquiteturas de prédios reais. O importante era que o retor tivesse domínio sobre esses espaços da memória que deveriam ser percorridos no ato de sua fala, quando cada imagem seria retraduzida em uma palavra ou em uma idéia. (Seligmann-Silva, 2006, p.35)

O que é a memória? Qual é sua unidade de medida? O vinil, o cristal e o carvão não armazenam nada além de deformações microscópicas em sua estrutura concreta. É na interação com outros instrumentos que eles se mostram em imagens e em sons dos aparelhos. Talvez a memória seja assim também. Seligmann-Silva (2006) escreve que

Em Aristóteles, portanto, encontramos tanto uma concepção da memória como escritura na nossa placa mnemônica das impressões do mundo, como também uma forte concepção de reminiscência ou recordação, como um procedimento de leitura — e, como é evidente, a comparação com as letras do alfabeto não é de modo algum casual aqui. O elemento ativo da memória é comparado ao modo de ação de um pesquisador ou viajante que busca a inscrição mnemônica pelos labirintos de nossa memória-arquivo. A noção de associação também é essencial no nosso contexto: a estruturação da recordação – e portanto do discurso de um modo geral, que sempre está recuperando informações arquivadas – funciona a partir de um princípio de leitura de semelhanças que não deixa de lembrar a definição aristotélica, da sua Poética, do homem como um “ser mimético” (Seligmann-Silva, 2006, s/p).

Distinguem-se, portanto, duas maneiras mnemônicas: uma que imprime micromarcações sinápticas e outra que é posta em movimento quando as buscamos em nossos “arquivos”. A primeira parece que comunica algo quando na presença de estímulos parecidos com os que estiveram no momento de sua impressão, como faz o vinil. A segunda comunica algo que intentamos comunicar. A ordem da intencionalidade é assunto para outro artigo, mas, para quem tem interesse, ver o artigo chamado “A Importância da Act-Psychology de Franz Brentano”, de Saturnino Pesquero Ramón (Ramón, 2006), professor da Universidade Católica de Goiás.

Autores como Seligmann(2006), Smolka (2000) e Myrian Sepúlveda dos Santos (1989) escrevem sobre o caráter individual e coletivo da memória. Seu caráter individual abarca a forma como um indivíduo acessa o seu banco de dados ou como ele é de outra maneira acessado; seu caráter coletivo caminha desde a tradição oral da passagem do conhecimento, passando pelas artes em geral, em especial as imagéticas, chegando ao registro eletrônico interativo. Todos eles ressaltam, com ou sem críticas, os trabalhos de Halbwachs, sociólogo francês que desenvolveu o conceito de memória coletiva durante as décadas de 30 do século XX. Por exemplo, Sepúlveda dos Santos afirma que

No primeiro de seus trabalhos sobre memória, Les cadres sociaux de la mémoire, Halbwachs estabeleceu os aspectos principais de sua teoria, reafirmados em trabalhos posteriores, que, a meu ver, consistem, primeiro, da afirmativa de que memórias só podem ser pensadas em termos de “convenções” sociais, chamadas por ele quadros sociais da memória; segundo, de que o passado é reconstruído continuamente; e, terceiro, de que o estudo de quadros sociais ou memórias coletivas pode ser realizado empiricamente e de forma autônoma à intenção dos indivíduos. (Sepúlveda Santos, 1989, p. 149).

O levantamento acima é apenas para mostrar que a memória é mais um amplo tema sobre o qual há tantas divergências quanto convergências. Como a colocamos para rodar? Todas as pessoas talvez saibam a resposta para essa questão, mas não a sabem escrever, nem no pensamento. Parece que a memória se trata de um lugar que está em vários outros lugares, no cérebro, nos músculos, nas células, nos genes. Questiono-me se isso tem alguma coisa a ver com o fato de um dos mais eficazes exercícios psicológicos associados ao desenvolvimento da memória possuir, como comando básico, o uso da imagem de lugares. O exercício é chamado “Palácio da Memória” e tem Matteo Ricci, um italiano fazendo missão jesuítica na China, como reconhecido por ter usado e desenvolvido tal método, no século XVI (Smolka, 2000).

As janelas que definem o Windows são os lugares vistos por dentro, possivelmente uma analogia à ideia de que a indústria cibernética enraíza-se, capilariza-se dentro do pensamento humano. A cibernética lida com o governo dos sistemas físicos automáticos, que podem pensar sem saber que estão pensando. Se sabem ou não, a questão mais contundente na cibernética está no fato de que se trata da área que lida com a disseminação da comunicação de valores sócio-culturais de maneira mais eficaz que conhecemos. Vivemos num mundo que, mesmo que gire em torno do capital fortemente, gira também, de maneira acentuada, em torno da comunicação. A internet pode não ser um sistema de ensino, mas é certamente o que mais educa hoje em muitos centros urbanos. Pelo menos a tendência parece ser essa. Por ela se propagam jeitos de escrever, de falar, de andar, de vestir, de comer, de sentir, de pensar, de viver, da mesma maneira que ocorre no uso dos lugares usados no exercício da memória. Roque Theóphilo (s/d) afirma que

A cibernética nasceu do estudo comparado das máquinas eletrônicas automáticas sobre os processadores do sistema nervoso dos seres vivos e as suas respectivas conexões nervosas. A simulação deste comportamento pelo computador gerou, na prática, o surgimento da cibernética. Com o desenvolvimento da tecnologia o termo estendeu-se às máquinas que efetuam movimentos diferentes segundo alguma condição interna. Com o advento da eletrônica e a sua grande evolução foi possível a utilização das condições elétricas, magnéticas e óticas, bases dos processadores digitais e da cibernética atuais.

A internet reconfigura de maneira significativa a forma como escrevemos. E se reconfigura de maneira significativa a forma como escrevemos, alteração de alguma ordem deve trazer também à memória, recurso usado, como já visto, diretamente no exercício da escrita. Benjamin (1994) trata do declínio da tradição oral e da ascensão da novela dos livros como uma das condições pelas quais um povo perde sua memória. A análise de Benjamin nos traz à cena a questão da estratégia comunicacional que liga pessoas por meio de uma determinada troca coletiva na qual partilham de significados, leis, convenções e rituais cuja articulação é chamada “cultura”. Para Roque Theóphilo (s/d)

Assim, a comunicação é regida por um processo de controle, que é a habilidade para fazer que algo se comporte exatamente como se deseja. O homem tem sido considerado pela psicologia, implícita ou explicitamente, um sistema de controle adaptativo pela aprendizagem, explicando-se, pois, como se desenvolve o processo de controle. A teoria do controle tem recebido severas críticas por sua origem mecanicista, não se perdendo de vista que o processo do controle é essencial para a comunicação. A relevância do processo de controle em psicologia é percebida quando a sua ausência se reflete nos processos que são afetados quando surgem erros de comunicação (entropias) que causam sérios transtornos. Evidentemente que o processo de controle, quando efetuado por sistemas eletrônicos sobre o comportamento humano e sobre as demais funções humanas, deve ser regido por severos princípios éticos, porquanto poderiam derivar-se, invasivamente, no condicionamento humano, tão a gosto dos regimes de intolerância para a prática da famigerada lavagem cerebral.

Theóphilo levanta uma questão importante à Psicologia e trabalhada por Benjamin quando trata da narrativa: a constituição de uma sociedade cujos membros, por possuírem pouco uso da memória, encontram-se escravizados. A discussão acerca disso é infindável: abrange desde o condicionamento respondente experimentado por Pavlov ao sistema religioso, científico e capitalista, todos eles aprisionadores.

Contudo, o intuito desse texto não é abarcar conceitualmente a memória, tão pouco o árduo tema do controle e do poder. Esse texto é fruto de um exercício de escrita sem temas. Às vezes escrevo sem ter, primeiramente, um tema. Há, nesse exercício, um sentido diferente no caminho da palavra, do que aquele percorrido por ela em busca de temas, quaisquer. O sentido do fluxo da palavra, na escrita sem tema, é aquele em que elas próprias moldam o pensamento e não ao contrário. Escrever sem temas é deixar ser guiado pelas palavras. E elas foram-me saindo, como se elas próprias fossem a memória em si, fazendo sua função de lembrar e, ao mesmo tempo, de criar o mundo. O sair das palavras me levou ao tema da escrita, da memória, da sociedade, dos sistemas e, de novo, ao da escrita para, por fim, como no início, se não me falha a memória, deixar-me sem tema.

Referências:

BENJAMIN, Walter. O Narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994, p. 197-221.

Ramón, Pesquero Saturnino. A Importância da Act-Psychology de Franz Brentano, in: Psicologia:Reflexão e Crítica, 19 (2), 340-345, 2006.

Roque Theóphilo.  A história da cibernética, s/d. Acessado no sítio:http://www.psicologia.org.br/internacional/ap10.htm, no dia 26 de dezembro de 2012.

Seligmann-Silva, Márcio. A escritura da memória: mostrar palavras e narrar imagens, in: Remate de Males – 26(1) – jan./jun. 2006

Sepúlveda dos Santos, Myrian. O PESADELO DA AMNÉSIA COLETIVA: UM ESTUDO SOBRE OS CONCEITOS DE MEMÓRIA, TRADIÇÃO E TRAÇOS DO PASSADO.  in: CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 19, 1989.

Smolka, Ana Luiza Bustamante. A memória em questão:
uma perspectiva histórico-cultural, In: Educação & Sociedade, ano XXI, nº 71, Julho/00.

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