Práticas ambientais nas Escolas: os desafios em busca da conscientização

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Qual é o papel da escola no contexto das práticas ambientais e como ela pode contribuir para a conscientização ambiental dos alunos?

Por Rosiane Alves (pedagoga) – rosianerosalina03@gmail.com

O uso desmedido e inconsciente dos recursos naturais, bem como a poluição ambiental, vem ocasionando mudanças drásticas no meio ambiente. Sérios problemas podem levar à extinção de todas as espécies, incluindo a espécie humana. A questão é que a conscientização da preservação ambiental tornou-se uma preocupação quando o problema já havia se instalado de maneira expansiva. E para iniciar a conscientização, seria necessário uma reeducação quanto aos valores e hábitos, o que se torna ainda mais desafiador, uma vez que vivemos em uma era consumista, na qual, a cada momento, os objetos se tornam substituíveis, impulsionando o consumismo e a disputa pela igualdade e equiparação na obtenção de bens.

O crescimento das grandes metrópoles, indústrias, o desmatamento ilegal em grandes dimensões, o aumento da atividade agropecuária, e as plantações, todos esses são fatores agravantes e altamente lesivos ao planeta. No entanto, são justamente essas as atividades que vêm gerando riquezas e faturamento para as nações. Isso nos leva a refletir mais uma vez acerca de valores e princípios, pois a cultura humana foi ensinada a disputar, ser melhor que o outro em termos financeiros, e a perceberem que nunca estão satisfeitos, querendo sempre mais, mesmo que isso, inconscientemente, custe a extinção de outras espécies e até mesmo a própria vida.

Para Medina et al. (2011, p.33),

“o que cabe dizer é que o humano não possui, nos  padrões éticos tradicionais, qualquer responsabilidade ética com relação a um ente natural: árvore, alga, pássaro, cervo, mar.”

Nossos valores morais estão diretamente ligados às nossas vivências e aprendizados ao longo da vida. A construção dos nossos princípios se iniciou no nosso lar, e, infelizmente, a Educação Ambiental não era uma pauta nas gerações passadas, nem mesmo nas escolas. Isso se deve à errônea e equivocada percepção de que os recursos naturais são finitos e de que o planeta suportaria tantas agressões.

                                                                                                                                          Fonte: Freepik/fotos

 

Para Santos et al (2022, p.9)

” O grande aumento nos níveis de gases poluentes lançados na atmosfera em grande parte, é devido à produção industrial mundial relacionada aos hábitos de consumo da sociedade humana. O aquecimento global e seus sinais, tais como a redução da água doce, constantes secas e inundações ao redor do mundo tem preocupado os cientistas, surgindo consequências difíceis de serem revertidas se mudanças socioambientais significativas não forem feitas. Não há tempo para irresponsabilidade, é preciso um comprometimento coletivo, população e governo trabalhando juntos na construção de políticas, programas de conscientização e (re)educação ambiental.”

Para minimizar os impactos ambientais, foram criadas políticas públicas, como programas de conscientização para a preservação do planeta. No entanto, essa abordagem surgiu tardiamente na educação. A efetividade da educação ambiental requer que todo o corpo escolar se reeduque em práticas ambientais saudáveis, estudando, vivenciando, aprendendo para, posteriormente, ensinar. Conforme WULF (2021), mais importantes são “as leis não escritas” do comportamento moral que são executadas em contextos e práticas sociais.

A Educação Ambiental surge como uma ferramenta de transformação do paradigma social. No entanto, com ela vêm os desafios, pois, para ser efetiva, é necessário o comprometimento de colocar em prática, não apenas teoricamente. Quando falamos em agir, são necessários recursos e, principalmente, mentes abertas e dispostas a trabalhar para mudar concepções já estabelecidas.

A escola tem o papel de transformar mentes, que, por sua vez, transformam a realidade. Criar projetos que vão além dos muros da escola, impactando a realidade do aluno, do seu lar, bairro e podendo ir muito mais além, é fundamental. Esses projetos têm o potencial de impactar a sociedade em que o aluno está inserido. Além das leis e projetos, a escola tem um papel que exige tanto empenho quanto elevar vozes e ações daqueles que antes eram considerados coadjuvantes. Hoje, os alunos são protagonistas e devem discutir e solucionar problemas do seu próprio meio social.

Não há como mudar o mundo se não houver mudança em si mesmo. Levantar discussões e reflexões sobre a necessidade de mudar o próprio contexto para mudar o do próximo é essencial. Atualmente, vivemos na chamada era digital, uma geração tecnológica, imediatista e altamente consumista. A escola é desafiada a se adequar a essa nova realidade e usar a tecnologia como aliada para engajar jovens e crianças na criação de ideias e projetos para o bem comum. É importante desmistificar a ideia de que só devemos falar em Educação Ambiental em datas comemorativas, como o Dia da Água e o Dia da Árvore, por exemplo.

Observamos que os papéis estão se invertendo, e os filhos têm alertado os pais quanto às mudanças de hábitos, sendo a escola um dos fatores que tem motivado essa transformação. Pequenos hábitos, como fechar a torneira na hora da escovação, fechar o chuveiro na hora de ensaboar, o inofensivo papel de balinha jogado no chão, e atentar às luzes acesas sem necessidade, são pequenas atitudes que podem gerar impactos positivos, minimizando os danos causados e evitando a expansão dos mesmos.

                                                                                                                            Fonte: guiainfantil.com

Quando falamos em pais e filhos, trabalho e conscientização em conjunto, imediatamente nos remete à herança, e quando falamos de herança, não nos referimos somente à financeira, mas sim à herança de valores. Em que estado deixaremos o planeta para as futuras gerações? O que nos leva a refletir sobre respeito e empatia em relação aos que vêm depois de nós. Repensar os hábitos e valores não é apenas por si mesmo, não é só pelo hoje, mas pensando no amanhã. É sobre empatia, é sobre respeitar e amar quem vem depois.

É importante não nos esquecermos dos outros seres que estão deixando de existir pela ação de um ser que se acha supremo e no direito de destruir o lar de todos e de si mesmo, por pensar de maneira egoísta e mesquinha, esquecendo-se de que fazem parte do mesmo ecossistema e que ambos sobrevivem dos mesmos recursos naturais. Se não houver um equilíbrio entre as espécies, todas estarão correndo o risco de serem extintas. A escola também tem esse papel de conscientização quanto à ética, respeito e empatia pelo outro, orientando-os sobre a importância de cada espécie para o equilíbrio do ecossistema.

A Educação Ambiental no Brasil tem raízes históricas, sendo impulsionada por movimentos sociais e ambientalistas a partir da década de 1970. O país viu um marco significativo com a Política Nacional de Meio Ambiente em 1981, que destacou a importância da Educação Ambiental. Em 1992, foi criado o Ministério do Meio Ambiente pelo Governo Federal, e no mesmo ano, o Brasil sediou a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida como a Rio 92. Esse evento foi de grande relevância para as discussões ambientais no Brasil, resultando em documentos importantes, como o Protocolo de Florestas, a Carta da Terra e a Convenção da Diversidade Biológica, entre outros. A Rio 92 abriu caminhos para a criação de leis e documentos voltados para a Educação Ambiental no Brasil.

Em paralelo à Rio 92, o Fórum Global estabeleceu o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis, traçando o marco político para o projeto pedagógico da Educação Ambiental. Segundo Branco et al. (2018), esse tratado está na base da formação da Rede Brasileira de Educação Ambiental, bem como das diversas redes estaduais que formam uma grande articulação de entidades não governamentais, escolas, universidades e pessoas que buscam fortalecer as diferentes ações, atividades, programas e políticas em Educação Ambiental. Em 1996, foi criada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, reforçando esse compromisso e exigindo a inclusão da temática nos currículos escolares.

No entanto, apesar dos avanços normativos, desafios persistem na implementação efetiva, incluindo a capacitação de professores e a integração da Educação Ambiental de maneira transversal nos diversos níveis de ensino. Um dos maiores desafios enfrentados pelos professores em relação à implementação da EA em sala de aula é a necessidade de integração efetiva dos princípios ambientais em diferentes disciplinas, tornando-a assim uma abordagem transversal. Isso demanda não só conhecimento especializado por parte dos educadores, mas também a habilidade de conectar conceitos ambientais como conteúdo curricular, promovendo uma aprendizagem significativa para os alunos. Além disso, a falta de recursos e materiais específicos pode ser uma barreira, exigindo criatividade e adaptação por parte dos professores.

“A Educação Ambiental não deve apenas informar, deve transformar” (FREIRE, Paulo, 1992). Ao promover a compreensão dos impactos das ações humanas na natureza, a Educação Ambiental busca cultivar atitudes sustentáveis e a responsabilidade coletiva pela preservação do planeta. Essa conscientização é fundamental para enfrentar desafios ambientais, como mudanças climáticas e perda da biodiversidade, construindo sociedades mais equilibradas, resilientes e empáticas, preservando hoje para garantir o futuro saudável das gerações do amanhã. Não é apenas sobre um, mas sobre todas as espécies.

REFERÊNCIAS:

BRANCO, Emerson Pereira; ROYER, Márcia Regina; BRANCO, Alessandra Batista de Godoi. A Abordagem da Educação Ambiental nos PCN’S, nas DCNs e na BNCC. Nuances, Estudos sobre a Educação. Presidente Prudente, São Paulo. 2018. p. 185- 203 v.1

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Paz e Terra, São Paulo. 1996.

MEDINA, Patrícia. OLIVEIRA, Gustavo Paschoal Teixeira de Castro. MESQUITA, Marcia. BARROS, Graciela Maria. Princípios vida e responsabilidade: o agir humano na contemporaneidade a partir das ideias de Hans Jonas. Revista ESMAT v. 9, n.12, pp. 51-74. 2017.

WULF, Christoph. Educação como Conhecimento do Ser Humano na Era do Antropoceno: uma perspectiva antropológica. Cortez Editora. São Paulo. 2021

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O BRILHO DA MORTE: uma crítica à dependência de medicamentos

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No dia 03 de novembro de 2021 ocorreu uma palestra virtual na semana do congresso de psicologia do CEULP ULBRA, o CAOS. 

Nesse encontro virtual, com o tema especial O Brilho da Morte, iniciou-se o debate apresentando um documentário sobre o acidente radioativo conhecido como césio 137. 

O nome do documentário é: O brilho da morte. Nesse início é apresentado a fala de várias vítimas acometidas por este crime ambiental, na qual perderam paladar, visão e sensibilidade em várias regiões do corpo.

Depois, a segunda parte do evento foi com a participação de uma convidada especialista em saúde coletiva, em Mato Grosso. Em seguida, explica-se como a atenção psicossocial poderia intervir para evitar uma tragédia maior. 

Fonte: Freepik

A convidada explica os ramos e instituições responsáveis por efetuar as ações da Rede de Atenção Psicossocial, que são as unidades básicas de saúde, os centros de atenção psicossocial, entre outros. 

Em seguida, a convidada relacionou o documentário com os possíveis ramos responsáveis por efetuar estratégias em relação ao RAPS.

Contudo, uma parte na fala na qual é de grande relevância para a atuação do psicólogo nessas redes é o do papel da medicalização e a dependência dele nos usuários destes serviços. Sabe-se que, o uso e ingestão de medicamentos é de extrema importância para os problemas dos usuários, mas se depender só deles, ignorando os aspectos biopsicossociais não surtirá nenhum efeito a longo prazo, apenas a dependência química. 

Fonte: Freepik

O que a convidada trouxe em pauta também foi o serviço dos psicólogos, que muitas vezes funciona como articuladores da rede, e de desenvolvimento de estratégias, do que qualquer outra demanda ou função. Ela sublinhou também a importância de se promover as saúdes públicas através dessas estratégias. Isso está intimamente ligado ao que ela frisou sobre a promoção de saúde, que não é apenas cuidar com o que já foi acometido, mas prevenir e trabalhar estratégias que evitem esse tipo de crime. 

E políticas públicas, assim como promoção da saúde, envolve diretamente a participação da população, assim como a sua escuta sobre as suas necessidades e demandas. Porém, o que se vê no Brasil hoje, é principalmente um cuidado que tem evidências de doença, não prevenção ou criação de qualidade de vida e estratégias de saúde.

Fonte: Freepik
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Live Pré-Caos 2021 aborda Políticas Públicas e Promoção de Saúde Mental

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Com a condução do professor Sonielson de Sousa no dia 21/09/2021 às 19h30, foi apresentado na rede social Instagram o PsicoLive Pré-CAOS 2021, um evento demonstrativo meses antes do acontecimento de evento oficial anual chamado CAOS – Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia – que é articulado pelo CEULP-Ulbra e que o próximo ocorrerá entre os dias 3 e 6 de novembro de 2021.

A live teve como convidado o psicólogo Plácido Medrado, de atuação na psicologia social comunitária. Ele é especialista em docência no ensino superior e atua no Sistema de assistência social pela prefeitura de Porto Nacional – TO, assim engajando o seu conhecimento fazendo a apresentação do pré-CAOS com o título “políticas públicas e promoção de saúde mental”, sendo esta a primeira live de várias prévias até o mês do acontecimento do mesmo.

Fonte: Instagram Psicologia Ceulp

A saúde mental é um aspecto importante dentro da sociedade e de acordo com o psicólogo convidado no entendimento “saúde pública” os dispositivos de apoio na base comunitária como SUS (Sistema Único de Saúde), SUAS (Sistema único de Assistência Social), CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), CREAS (Centro de Referência e Especialização em Assistência Social) e as redes de Educação detém sua forma sistemática para a saúde mental, então é necessário o entendimento do contexto social de cada indivíduo, de sua maneira de vida, o formato cultural e as garantias de direitos básicos que este cidadão precisa.

O psicólogo Plácido faz apontamentos na questão da política pública e usou como exemplo o órgão CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) no que faltam instrumentos básicos, serviços para a definição de recursos humanos, também informou da imensa importância que o profissional de psicologia obtém nesses serviços públicos, em que é obrigatório este profissional de psicologia.

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Maisa Carvalho: Consultório na Rua, Políticas Públicas e Cidadania

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O conceito de cidadania é discutível em relação às pessoas em situação de Rua, pois, ter uma certidão de nascimento é dado como o ponto principal de cidadania. Quem não viu a propaganda que passava na TV “Eu tenho nome e quem não tem? Sem documentos eu não sou Ninguém, eu sou Maria, eu sou João, com certidão de nascimento, sou cidadão”?!. A falta de documentos pode ser um empecilho para o exercício da cidadania, acerca disso os profissionais do Consultório na Rua tem como objetivo a busca por Cidadania daqueles que estão em situação de rua. É importante diferenciar a cidadania do direito à dignidade, onde o MPDF (2018) menciona a Constituição Federal quanto ao dever de promoção do bem-estar de todos sem quaisquer tipos de preconceitos com foco na redução das desigualdades sociais.

Nesta entrevista para o (En)Cena, a Assistente Social Maisa Carvalho nos traz um conteúdo muito enriquecedor acerca do trabalho com as pessoas em situação de rua e a prática das políticas públicas na busca pela cidadania dessas pessoas. Ela é graduada pela Universidade Federal do Tocantins – UFT (2016), especialista em Gestão de Redes de Atenção à Saúde pela Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ (2018), especialista em Saúde Mental pelo Centro Universitário Luterano de Palmas e Fundação Escola de Saúde Pública, através do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Mental – ULBRA/FESP (2020), Responsável Técnica do Programa Piloto de Justiça Terapêutica do Tribunal de Justiça do Tocantins, atualmente atua na equipe de saúde Consultório na Rua e é pesquisadora nas temáticas voltadas para Saúde e Direitos Humanos: saúde mental, população em situação de rua e feminização de substâncias psicoativas.

Fonte: Arquivo Pessoal

(En)Cena: A questão da cidadania em relação aos documentos, quando não há esse documento e às vezes é muito difícil correr atrás e o paciente precisa ser atendido em alguma unidade, é negado? Como funciona?

É atendido sim, até porque não conheço nenhum protocolo ou uma lei que impeça que a pessoa seja atendida na saúde se ela não tiver documento. No entanto, se ela for encaminhada para a atenção especializada, se for cirurgia, um exame específico, acredito que dificulta mais. Isso vai depender de quem atende, do protocolo do local, vai depender de qual que é o procedimento, porque o primeiro passo é ter o cartão do SUS. A pessoa tendo um cartão do SUS, ela vai ser atendida independente de ter documento ou não.

Até hoje não tivemos negativa nenhuma, quando tem uma situação assim a gente acompanha, procura explicar “olha é um paciente em situação de rua, ele é acompanhado pelo Consultório na Rua, que é um serviço que atende esse público, que faz parte da Rede, etc.” Porque tem pessoas que não conhecem o serviço e a gente tem que chegar nos lugares explicando o que fazemos, quem somos, para dar mais visibilidade também. O nosso serviço deveria ter literalmente portas abertas em todas as unidades, porque nós somos um ponto da Rede de Atenção Básica, as unidades de saúde elas o nosso apoio. Exemplo, se a gente precisa imprimir documentos, precisa pegar a medicação na farmácia, precisa de atendimento, inclusive de consulta, esse serviço não deveria ser burocratizado, porque a gente faz parte da rede, não somos um outro serviço de fora, mas em algumas unidades ainda não é tão facilitado esse acesso, no entanto isso vem melhorando muito. As unidades que já conhecem, são super abertas, tem atendimento rápido, dão prioridade para os pacientes.

É um serviço de formiguinha que dá essa abertura muito tranquilo, agora quanto a outros serviços realmente não tem acesso. Se você precisa de uma matrícula escolar você precisa de documento, se você precisa fazer um título de eleitor, fazer uma carteira de trabalho, de identidade, se você precisa acessar habitação, você precisa de documento, infelizmente não conseguimos dar prosseguimento sem documentação. E é onde os pacientes ficam de fora se eles não tiverem. Já encaminhei vários ofícios de solicitação de isenção de certidão de nascimento aos cartórios, somando aos enviados e aos documentos que já chegaram, somam-se uns 20 documentos.

O contexto das ruas é de vários tipos de exposição e um deles é a deterioração desses documentos ou até mesmo percas, furtos, eles estão ali alguém vai rouba essa pessoa, leva a carteira, alguma bolsa com dinheiro e leva tudo junto. A certidão de nascimento é um documento que não há necessidade de você andar com ele, você não apresenta em qualquer lugar, você apresenta o RG, que também é fácil para tirar de novo. O que é mais difícil é o registro nascimento, então a gente sugere deixar com uma pessoa confiável, um familiar, um amigo ou uma pessoa próxima, ou então a gente tem também um acordo com o CREAS que é o Centro de Referência Especializado de Assistência Social. Caso a pessoa não tenha ninguém para deixar, nenhum local, deixamos o documento lá até que a pessoa em situação de rua volte para casa, ou se restabeleça, ou caso ela precise, tenta pegar quando é em último caso porque é um documento que você pode não conseguir de novo, para liberar uma vez o cartório libera, mas duas vezes pode ser que não, e aí já foge da nossa governabilidade.

Fonte: encurtador.com.br/nCDHX

(En) Cena: Como funciona a questão do custo desses documentos? O governo arca com isso?

Depois que eu entrei no serviço, construí juntamente com a equipe um fluxo com os cartórios para acessar a segunda via de registro de nascimento, porque para tirar a certidão de nascimento a gente precisa entrar em contato com os cartórios, onde essa pessoa foi registrada e fazer a solicitação. Para que o cartório seja ressarcido desse valor, é necessário que seja encaminhado um ofício e uma declaração de hipossuficiência assinada pelo usuário.Com esse documento, a gente traz todo o histórico da pessoa, que ela mora em situação de rua, quanto tempo, qual é o problema dela, que é acompanhado pelo Consultório na Rua e faço uma breve contextualização do que é esse serviço, trago também algumas partes da lei, onde garante que ela tenha acesso a esse documento, se ela não tiver como pagar, no entanto, ela não consegue chegar lá e simplesmente dizer “então eu preciso da certidão, me ajudem, eu não tenho dinheiro”. Ela não vai conseguir, a gente sabe que não é assim, mas ela tem esse direito. Faço este ofício, o mesmo é enviado para a secretaria de saúde e é assinando é o secretário de saúde, eu faço o documento, ele assina e encaminha para o cartório via Correios juntamente com a declaração. Recebendo, lá eles protocolam e mandam o documento pelo mesmo endereço que a gente encaminha, sendo paga essa ida e a volta do documento. Então, a cidade consegue gratuitamente, não tem nenhum problema, é só mandar um ofício com essa declaração de onde a pessoa declara que não tem condição de pagar que o cartório é ressarcido posteriormente.

Quanto à carteira de identidade que já é um outro processo em outro local que é o Instituto de Identificação aqui em Palmas, as vezes conseguimos, as vezes não, então a gente tenta na conversa “Olha fulano precisa para fazer tal coisa, ele foi contemplado com a unidade habitacional, com algum outro serviço que possa trazer benefício, se não conseguir documento ele não vai conseguir ter acesso a esse benefício.” Tentando sensibilizar quanto a essa necessidade, às vezes liberam, às vezes não. E aí, quando não liberam há uma taxa de 25 reais, mais as fotos que é em torno de 20 reais, vai dar 45 reais no total para ter acesso a identidade. Então, quando eu já peço o documento ou a certidão eu deixo claro “Olha procura se organiza, procura tirar a parte do auxílio que você recebe, para custear a identidade”, porque para poder tirar tem esse custo que é de 25 reais, muitas vezes eles conseguem, porque sabem o preço que é, da certidão, já teve valor próximo de   300 reais, devido ser de outro estado, de longe, que realmente é caro. Então, eu falo “olha, a gente conseguiu um documento de 120,200…e só precisa de 25 para conseguir outro”. É mais na base da conversa, quando a pessoa não tem documento aqui no Estado, e nunca tirou, é de graça, não precisa pagar. Mas, se já tirou a primeira via aqui no Estado, a segunda via precisa pagar. É difícil conseguir de graça, consegue, mas nem sempre, é um trabalho que a gente faz, o “não” a gente já tem, corremos atrás do “sim”, mas é isso, a gente trabalha priorizando o acesso.

(En)Cena: Sendo Palmas a capital, vocês têm acesso a dados do Estado, há uma ligação com os outros municípios no Estado? As políticas públicas que se aplicam aqui em Palmas, se aplicam em Araguaína ou em Gurupi? Como funciona?

O Consultório na Rua só existe em Palmas. Ele não tem em outro lugar (do Tocantins), devido a questão populacional mesmo. Para ter o Consultório na Rua depende do número mínimo de pessoas na cidade, também de investimento da prefeitura. Até onde eu sei só tem em Palmas, quanto aos números de pessoas em situação de rua é impossível saber precisamente, mas em Palmas, passa de 100 pessoas. Não me recordo precisamente. Mas esse número pode ser maior, mas, para ser incluído como um usuário, acompanhado pelo Consultório na Rua, tem que estar cerca de 3 meses em Palmas, é preciso estar acompanhando ele durante 3 meses, porque ele pode estar aqui e ir para outro lugar no mês que vem, ele pode estar em Araguaína, em São Paulo, em outro lugar. Então, não tem como incluir essa pessoa dentro do nosso cadastro de atendimento, por isso não temos um número exato. No entanto, essa pessoa não deixa de ser atendida, ela vai ser atendida normalmente.

Tem a população em situação de rua que é flutuante, ela pode ir para a rua somente quando ela está alcoolizada, somente quando tem uma briga com a família, ela fica 2 ou 3 dias, ela não é uma pessoa considerada moradora de rua, ela tem uma casa, ela tem um vínculo, só que por algum motivo ela está na rua. Já os andarilhos são pessoas que também estão em situação de rua, mas eles estão aqui, daqui a pouco podem não estar mais. Há uma oferta de atendimento também. No entanto, eles não entram no cadastro por isso, porque é um número que vai ficar flutuando muito, muitas vezes estão mesmo de passagem pois estão sempre andando, mas também fazem parte do nosso público.

Quanto ao contato, fazemos também, as vezes os serviços de outros municípios entram em contato pedindo informações de pacientes, há essa troca sim.

Fonte: encurtador.com.br/ajCM2

(En) Cena: Você entrou em 2019 no consultório na rua, sendo que o mesmo foi implementado em Palmas somente em 2016, de forma mais tardia, por assim dizer. Nesse Período, o que você percebeu de mudanças significativas? Houve aspectos positivos e negativos com essas pessoas em situação de rua?

No trabalho da saúde mental, o Consultório na Rua é um dos pontos da Rede de Atenção Psicossocial, é um trabalho de formiguinha, talvez o que eu falar como evolução, seja visto pelas pessoas como “só isso?” Mas que na realidade podem ser grandes evoluções, para nós e para quem se beneficia dessas mudanças, é um trabalho que não é somente a pessoa parar de usar álcool, ou ela ficar organizada mentalmente, a gente trabalha muito com a redução de danos, existe uma política que rege toda a nossa atuação em cima disso. Então, por exemplo, se a pessoa está em uso durante a vida toda ou passou esse ano todo fazendo uso de álcool e outras drogas sem pausa, ela já está bem emagrecida, a pessoa já tem alguns problemas de saúde em decorrência do uso dessas substâncias, ela já não trabalha mais, ela já não tem vínculo familiar mais, ela está literalmente prejudicada por causa desse uso de substâncias, se a gente consegue com que essa pessoa diminua esse uso já é um avanço muito grande, se a gente consegue que a pessoa, mesmo usando a droga, ela consiga se cuidar, ela consiga por exemplo, buscar uma unidade de saúde, ela consiga se hidratar, se alimentar, ela consiga talvez tomar um banho, já é um avanço muito grande. Agora avanços significativos de mudanças radicais de vida, temos também vários, poderia ter mais?! Poderia! Mas esse contexto de uso de álcool e outras drogas não é bem o contexto do que as pessoas esperam, uma pessoa sair daqui contente da rua, morar numa casa, passar a trabalhar, ter uma vida “bonitinha”, ser uma pessoa aceita. Então assim, esse padrão aí pode ser que não seja alcançado sempre. A gente trabalha com pequenas coisas, com pequenos passos, mas sim nós temos pacientes que moravam de baixo de árvore, por exemplo, que hoje têm acesso a moradia, passaram a ter essa vivência do que é pagar uma água, pagar uma luz, desses compromissos de morar numa casa, e por mais que ela passa a morar numa casa a gente atende até hoje, porque o nosso público não é quem mora em casa, nós trabalhamos com moradores de rua, pessoas em situação de rua, no entanto essa transição é uma fase também de difícil adaptação, e a equipe participa disso.

Tem um casal no qual eles ganharam uma casa, não foi uma conquista de quando eu estava no Consultório na Rua, mas eu já estava como residente, eu pude acompanhar o processo de adaptação e quando eles moravam na rua também eu já era residente. Então eu tive esse acompanhamento, não como profissional da equipe, mas como residente. Eles moravam em uma casa de papelão, quando chovia caia tudo, estavam no relento, e quando eles passaram a ter a casa tiveram dificuldades, por exemplo, de fazer comida, dificuldade de tomar banho, dificuldade de dormir numa cama, porque não é o contexto deles, parece algo tão natural, dormir na cama, usufruir de tudo. Mas a gente as vezes chegava lá eles estavam cozinhando sebo de fazer, por exemplo, porquê era a realidade que eles tinham lá fora, de comer qualquer coisa, de comer qualquer hora, de não ter essa responsabilidade de pagar água, luz, parcela da casa, por que não é 100% dada para as pessoas, ela tem um valor pequeno, geralmente uns 80 reais. Tem os apartamentos que são 100% de graça, mas que para eles não era o ideal, tudo isso foi avaliado em discussões de caso, inclusive com outros serviços, então o melhor seria uma casa, um espaço mais tranquilo e reservado.

 Então eles passaram a ter alguns compromissos e isso foi muito engraçado porque a equipe viabilizou o acesso da casa, entrar com processo para receber Benefício de Prestação Continuada (não recebem ainda), mas tiveram acesso ao auxílio emergencial, e assim que eles receberam o dinheiro ficaram sem saber o que fazer, e aí a gente orientou “olha você precisa pagar esse valor aqui que é da água, você precisa pagar essa energia, você precisa pagar esse valor que é da prestação da casa” e tudo isso para eles era muito estranho, e se a gente não participasse desse processo, correria o risco deles voltarem para a rua novamente, mesmo tendo a casa.

Fonte: encurtador.com.br/fFVW5

O trabalho não é muito fechado, não é somente trabalho in loco, ali com a pessoa na rua. A gente vai além disso. Além desses, tiveram outros casos que foram beneficiados com unidade habitacional com o apoio da equipe, porquê tem que montar todo um dossiê, tem que ter relatório, tem que ter tudo isso. A gente apoia, acompanha os pacientes nesse processo, quando sai por exemplo nome deles na lista eles não tem acesso à internet, telefone, como é que vão saber?! A gente que acompanha também, se sair o nome pra gente ajudar com a documentação e ir atrás.

Temos pacientes que voltaram para casa, às vezes estavam em situação de rua por uma desorganização mental, em surto, e a gente entra em contato, muitas vezes com familiar de outro Estado, caso seja preciso a pessoa ser internada no HGP, também com a gente articulando, é um avanço muito grande, talvez estava na rua somente por um surto psicótico. Às vezes deu uma desorganizada, está sem usar medicação e acabou indo para a rua.

Acesso ao trabalho, com paciente que voltou a ter essa vida ativa no trabalho, às vezes não é um trabalho formal, mas uma venda de picolé, trabalho artesanal, um trabalho de garçom. Infelizmente não são muitas opções ofertadas para essas pessoas. Para as pessoas com formação, já é difícil, imagina quem não tem estudo, informação ou vive nessas condições?  os trabalhos deles são quase sempre subempregos, é uma verdade, trabalhos informais, mas que são trabalhos, que antes as pessoas não tinham, então a gente tem que incentivar isso também. E, tem pessoas que já estão nesse processo do mercado de trabalho, seja autônoma ou seja inserido mesmo com carteira assinada.

A gente tem um paciente que morou muitos anos na rua, que foi acolhido pelo “Palmas que te acolhe” que era um projeto que tinha aqui na cidade, mas que já finalizou, o qual que acolhia a população de rua em um espaço, com dormida, com incentivo a emprego e renda etc. Era uma equipe multidisciplinar que dava esse suporte aos pacientes em situação de rua. Na época, ele foi acolhido por esse serviço e também acompanhado pelo Consultório na Rua. Logo depois, ele foi contratado pela prefeitura, e até hoje ele continua. Ou seja, um paciente que saiu da rua, do consumo abusivo de álcool e mora numa casa, consegue pagar aluguel, se alimentar melhor, ele saiu desse contexto de uso abusivo de álcool, porque a gente sabe que o uso em si as vezes é decorrente de outros problemas.

Por quê que a gente trabalha tentando resolver algumas questões e não em cima do parar de usar drogas, da abstinência? Porque talvez possibilitando o acesso aos direitos sociais básicos, ao reestabelecimento dos laços, ofertando cuidados em saúde em geral, a pessoa pode parar de usar por si só. Não é uma regra, trabalhamos com possibilidades.  Se a gente consegue restaurar o vínculo familiar, se a gente consegue ter acesso a moradia, acesso ao trabalho, já são conquistas que contribuem para a reinserção social. Essa pessoa pode diminuir o uso e o prejuízo sem a gente fazer “nada” especificamente sobre o uso. O mais difícil é essa questão trabalho e renda, porque são casos bem específicos, ainda mais agora que estamos em um contexto de desemprego com níveis talvez nunca antes vistos, tem o contexto de pandemia, contexto social e econômico que o país vive. Para eles não é diferente, para eles é até pior essa questão do acesso ao trabalho, realmente é um desafio que a gente tem muito grande. Mas tem pessoas que estão no mercado de trabalho ou que estão com trabalho autônomo, por isso é importante o acesso a moradia, educação, até mesmo a redução em si do uso de álcool e outras drogas, redução de danos.

REFERÊNCIA

MPDFT – Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Direitos Das Pessoas Em Situação De Rua. Brasília-DF, julho de 2018. 1ª Edição. 2018.

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Saúde mental da população negra e educação infantil: (En)Cena entrevista a psicóloga Talita Lima

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Durante o período de 15 de agosto a 15 de setembro de 2020, o curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra será parte das instituições que prestam apoio à campanha “Saúde Mental da População Negra Importa!”, promovida pela Articulação Nacional de Psicólogas (os) Negras (os) e Pesquisadoras (es) (ANPSINEP). Mobilizado pelas demandas que envolvem a saúde mental e integridade da população negra na educação infantil, o portal (En)Cena entrevista a psicóloga Talita dos Anjos Lima.

Talita é graduada em Psicologia (Ceulp/Ulbra), pós-graduanda em Neuropsicologia, e atua como psicóloga educacional na Secretaria Municipal de Educação em Porto Nacional (TO), Defensora Popular e integrante da Articulação Nacional de Psicólogas (os) Negras (os) e Pesquisadores (ANPSINEP). Confira a entrevista a seguir.

Fonte: encurtador.com.br/lEKZ1

(En)Cena- Você considera que as políticas públicas abordam de maneira satisfatória o racismo no ambiente escolar? Em que perspectivas?

Talita Lima – No contexto atual, acredito não ser possível afirmar que temos políticas públicas que abordem de maneira satisfatória o racismo nos ambientes escolares. Tivemos alguns avanços, certamente, como a Lei 10.639/03 que estabelece a obrigatoriedade de se ensinar História e Cultura Afro-Brasileira, além de ter estabelecido o dia 20 de novembro como Dia da Consciência Negra, e que foi, com certeza, um grande marco para a luta antirracista… depois a gente teve a Lei 11.645/08 que alterou a 10.639/03 porque acrescentou também a questão da cultura indígena. Essas legislações instituíram que as culturas indígenas e africanas devem constar no conteúdo programático, especialmente em Educação Artística, Literatura e História.

São avanços significativos, sem dúvida, mas para que eles se efetivem na prática, precisamos ter profissionais que reconheçam a importância e trabalhem isso de forma transversal, não apenas em eventos isolados no dia 20 de novembro, por exemplo. Porque, infelizmente, é isso que acontece, na maioria das vezes a questão é tratada de forma isolada, com ações do tipo: “Vamos agora falar sobre Povos Negros” ou “Vamos fazer um desfile de Beleza Negra no dia 20 de novembro”. E se a gente entende o racismo como estrutural, a gente compreende que ações assim espaçadas e aleatórias, não ser efetivas na luta contra o racismo.

E o racismo na escola se manifesta de forma óbvia, como por exemplo: as pessoas que hoje representam o fenômeno do “fracasso escolar” são os alunos negros. Meninos negros, mais especificamente falando. São eles que tem pior desempenho, são eles que mais abandonam a escola, eles são o estereótipo do “aluno-problema”. E encarar isso de forma individualista é um erro. Esse fenômeno fala de uma estrutura.  Então, a gente tem políticas que se propõem a combater o racismo no conteúdo programático, mas a gente ainda tem muito a fazer, tanto para que elas sejam colocadas em prática de forma legítima, quanto na construção de políticas que combatam o racismo nas relações que se estabelecem dento da escola.

Fonte: encurtador.com.br/afHZ0

(En)Cena – De que maneira você distingue que os psicólogos podem articular serviços e movimentos para promoção da saúde mental da população negra no contexto da educação infantil?

Talita Lima – Parto do pressuposto que psicologia não se faz isolada, então a gente sempre deve trabalhar numa perspectiva de coletividade e em rede. Quando se está trabalhando na educação pública, por exemplo, o contato com a rede de atenção básica à saúde e/ou assistência social é no mínimo obrigatório… essas redes vão ofertar alguns serviços básicos de garantias de direitos para aquela criança que está precisando.

A gente precisa saber quais os serviços ofertados no SUS e no SUAS, precisa saber os caminhos para serviços legais, como a defensoria pública por exemplo. Digo isso porque a criança negra que chega lá na escola e sofre racismo naquele ambiente, pode acreditar que muitas vezes ela vem de uma série de violências sistemáticas, e todas elas implicam diretamente na saúde mental dessas crianças e no aprendizado. É importante saber disso e estar atenta a isso. Essa articulação em rede é essencial. Para além dessa questão de conhecer os serviços de garantias de direitos, acho que a inserção em movimentos sociais não é necessariamente obrigatória, mas fazer parte de algum coletivo pode te ensinar a estar mais engajada na causa, te manter mais ativa, estudando, se inteirando.

Fonte: encurtador.com.br/cnqOX

(En)Cena – Você acredita que a prevenção do racismo no contexto da educação infantil tem ganhado a atenção da psicologia atualmente? Em que aspectos?

Talita Lima – Nós temos cada vez mais publicações, artigos, ações de psicólogos falando sobre racismo na educação, e como combatê-lo dentro da escola, na educação infantil, por exemplo. Ainda temos poucas ações no sentido de prevenção. Mas acredito que a Psicologia, assim como diversas outras áreas do conhecimento têm avançado (ainda que a lentos passos) nesse sentido. O livro “Psicologia Escolar: que fazer é esse?”, do Conselho Federal de Psicologia em 2016 aborda um pouco sobre isso, e também As Referências Técnicas para Atuação de Psicólogas(os) na Educação Básica (2013) falam sobre a necessidade dessa dimensão política da nossa atuação. As Referências do CREPOP não citam diretamente as relações étnico-raciais, mas orientam a observar o contexto sócio-político, e observando o contexto sócio-político é impossível não enxergar o racismo como um dos fatores determinantes do aprendizado ou fracasso escolar.

(En)Cena – Como os psicólogos poderiam atuar frente ao bullying em decorrência do racismo nas escolas?

Talita Lima – Nós temos estudos e pesquisas, como por exemplo, do Anuário Brasileiro de Educação Básica 2019, que mostram que crianças negras tem maior dificuldade tanto no acesso, quanto permanência à escola e na qualidade de aprendizagem, em relação a crianças brancas. Esses resultados são influenciados por vários fatores, desde questões que vem de “fora da escola”, como situação de vulnerabilidade social que os alunos negros por vezes estão mais suscetíveis do que os brancos, até questões dentro da escola como injúria racial praticada por coleguinhas e até professores.

A psicóloga (ou o psicólogo) que trabalha nesta área vai ter que compreender como se dá o racismo a nível estrutural e institucional. Vai precisar propor que o currículo aborde de forma constante as questões raciais; vai precisar apontar o racismo, colocar nome nele, porque às vezes a gente trata apenas como “bullying”, o que dá uma dimensão muito ampla e meio vaga do fenômeno, né? Se uma criança chama a outra de “cabelo de bombril”, por exemplo, não é apenas bullying, é racismo.

As coisas tem o nome que tem, e nomear a situação faz com que ela se torne visível e portanto mais fácil (ou menos difícil) de ser combatida; vai precisar trabalhar em conjunto com a assistência social; vai ter que participar ativamente da construção do Projeto Político-Pedagógico (PPP) da escola para pontuar ali ações de promoção de saúde mental e de combate ao racismo;  vai precisar promover ações de enfrentamento ao racismo dentro da escola a partir de rodas de conversa, levar historinhas (narrativas) que tenham protagonistas negras(os), promover uma reeducação quando uma atitude de racismo acontecer, buscando a princípio um modelo não punitivista, mas para tentar compreender de onde veio aquela atitude (talvez é a reprodução de algo que a criança viu, por exemplo) e indicar novas formas de relacionar-se… Com criança é isso, eu acredito muito que vai pela via do afeto e da educação positiva. A psicóloga pode também montar formações para os professores sobre as questões étnico-raciais. As possibilidades são diversas, não falta campo nem demanda.

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Para Rita Almeida, não é possível separar a Psicologia da dimensão política

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No último dia 20 de abril, às 17h, o prof. do curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra, Sonielson Luciano Sousa, bateu um papo com a psicóloga mineira e doutora em Educação, Rita Almeida, com o tema “Psicologia no Contexto das Políticas Públicas em tempos de Pandemia”. A ação ocorreu dentro do projeto extensionista PsicoLive, na plataforma digital Instagram.

Rita Almeida também é psicanalista e conselheira do CRP-4 MG, e tem uma forte presença nas redes sociais, a partir de produção de textos e comentários sobre os diversos cenários em que a Psicologia dialoga, com especial atenção para a política. A live contou com aproximadamente 100 expectadores. A seguir, confiram a íntegra do bate-papo/entrevista.

(En)Cena: Qual o papel da Psicologia dentro das políticas públicas de saúde coletiva? E especificadamente em relação a pandemia, o que podemos fazer enquanto profissionais?

Rita Almeida: Bom, toda ciência, especialmente as ciências humanas, faz uma escolha política. O que quero dizer com ‘escolha política?’. É no sentido de quem ela vai servir? Quem vai acolher? Que olhar ele vai ter? O fato de ser uma ciência, não escolhe isto de antemão, é definido a partir da diretriz, da qual eu penso nesta ciência. A psicologia nasce com um olhar adaptativo, no sentido que nasce junto com o capitalismo no Brasil, com as indústrias, tendo uma função de selecionar as pessoas para o trabalho, em termo de adaptar o sujeito a uma sociedade capitalista, que é um tipo de vertente política, sendo uma ciência que vai atender um determinado tipo de poder. O que a psicologia faz nesse percurso? Ela vai mudando a sua orientação e escolha política, na perspectiva do conselho, pois existem ciências na psicologia que ainda servem determinado tipo de visão dos “poderosos”.

(En)Cena: Alinhada ao Liberalismo, né?

Rita Almeida: É alinhada ao liberalismo, a um tipo de autoritarismo. Já o conselho (sistema conselhos em Psicologia) vem direcionando no sentido de atender aquela população que está de certa forma submetida a esse tipo de poder, uma psicologia que tem pretensão transformadora, cujo nosso jargão é: Psicologia e Compromisso Social, compromisso com a sociedade, com a coletividade. A psicologia fez um redirecionamento, que eu considero que seja muito importante, e foi daí que caímos, obviamente, nas políticas públicas — para que se tenha uma noção, o maior empregador de psicólogos são as políticas do SUS e do SUAS — a psicologia está profundamente enlaçada as políticas públicas.

Hoje você não pensa Política de Saúde Mental brasileira sem psicólogos, tendo um papel potente, protagonista na reforma psiquiátrica brasileira, na criação dos CAPS, que são os dispositivos que substituem o modelo manicomial. Não conseguimos pensar as políticas tanto do SUS quanto do SUAS, sem escutar sobre a psicologia, nos tornamos atores muito importantes. E hoje, com essa situação da pandemia, os psicólogos continuam atuando, pois são considerados de prioridade neste momento, pois as questões de saúde mental permanecem, e podem até se agonizar, claro que com mecanismos diferentes, para garantia da questão do cuidado.

(En)Cena: Inclusive esses dias vi uma nota do Conselho Federal de Psicologia, que foi também replicado pelos conselhos regionais, sobre os cuidados que os profissionais deveriam ter com aqueles grupos que são considerados mais vulneráveis, as mulheres, as crianças, os negros, e eu imagino que o sistema conselhos tenha um olhar especial para esses públicos, que historicamente são marginalizados, que em uma situação como essas, a situação se agrava.

Rita Almeida: É. E é exatamente esse olhar, esse viés político que te falei, nosso olhar é para quem? É para a população que naturalmente sofre mais, com as questões da sociedade, por isso tem sua saúde mental mais fragilizada, ou então faremos uma psicologia ao qual as pessoas vão simplesmente se adaptar a um tipo e modo de funcionamento. Então é exatamente esse o cuidado que a psicologia tem que atender, a população mais frágil, tanto nos termos de sofrimento, como você disse: O racismo, o machismo, a homofobia, são questões que adoecem as pessoas, e as questões econômicas de vulnerabilidade… A psicologia entra de modo que não é só cuidar do tratamento, é inclusive, promover uma sociedade que seja menos racista, menos machista, menos homofóbica. Pois se a gente entender que não basta só tratar, mas precisamos cuidar também para que a sociedade seja menos adoecedora; que é o compromisso social que a psicologia tem quando se coloca nessa perspectiva.

(En)Cena: Perfeito. Rita, eu queria que você falasse um pouquinho da perspectiva do Código de Ética do profissional de psicologia. Porque é algo prescrito, não é uma invenção sua, isso é fruto de um amplo processo de debate em rede nacional, ouvindo todos os psicólogos e todas as vertentes.

Rita Almeida: Isso, todo nosso código de ética, normativas, nossas diretrizes são construídas com categorias, temos eventos, atividades políticas, técnicas, estudos, temos o CREPOP, que é o Centro de Pesquisa de Políticas Públicas, por exemplo. Então assim… tudo isso foi uma construção, como você falou, um processo histórico que faz a nossa ciência ter uma diretriz, uma direção, uma forma de olhar para as coisas, tem sua perspectiva ética, e todas elas construídas junto com a categoria.

(En)Cena: Nesse sentido gostaria de reforçar o que você falou, no início. Às vezes eu escuto alunos, colegas que criticam posicionamentos políticos dos psicólogos, como se fosse a visão do “jornalismo imparcial”, como se de fato existisse imparcialidade. Em comunicação, nós estudamos isso: O mito da imparcialidade. É impossível haver uma imparcialidade completa. Eu vejo que de um modo geral a psicologia é baseada no humanismo filosófico, e nos direitos humanos. Ao que parece, é muito claro isso, a psicologia defende os princípios democráticos, para que ela possa inclusive existir enquanto profissão. Sempre que a democracia está em risco, a psicologia é uma dessas profissões que se levantam em defesa da democracia; isso parece que é particularmente importante hoje, já que estamos em um cenário político de extrema direita. Como você avalia atualmente a situação do Brasil?

Rita Almeida: Então, isso que você falou é muito importante, a gente escuta muito sim… as pessoas confundem muito posicionamento político com partido político, e não é isso. Nós temos uma direção que é nosso eixo, nossa coluna vertebral são os direitos humanos, pois se eu não tenho uma perspectiva em que o humano é colocado como agente de direitos, e que essa garantia de direitos é garantia de saúde mental, que psicologia que eu posso fazer? É contraditório! Então assim, é meio óbvio termos que discutir um tipo de coisa dessas. Se eu parto do pressuposto de que eu posso torturar alguém, para que a pessoa seja do jeito que eu gostaria, que psicologia é essa que eu defendo? Não é possível existir uma psicologia sem direitos humanos e democracia, ela não existe! Existem outras coisas, dogmatismo, imposição de crença, lavagem cerebral, tortura, mas isso não é psicologia. Por que a psicologia é fundamental na transformação do manicômio, por exemplo? O que a psicologia tem a oferecer em um lugar que a pessoa está trancada, sendo violada diariamente em seus direitos, tanto de cidadania, e direitos humanos, sofrendo violência, abandono, fome, mortes, que psicologia é essa que permite esse tipo de diretriz? Então isso não é psicologia, é qualquer outra coisa, isso é conivência. Então um psicólogo que está dentro de um serviço institucional, onde ele assiste violação de direitos, paciente passando frio, fome, se ele não atua politicamente nesta perspectiva, que psicologia ele vai fazer? Então qualquer proposta de política que ataque os direitos humanos e a democracia, ela não pode ser sustentada! Independente de qual partido. Nós temos um conflito de perspectiva de extrema direita, economicamente se diz liberal, mas não é bem isso que a gente vê, mas, um governo que declaradamente é contra direitos humanos, isso não é velado, é dito com todas as letras.

(En)Cena: É uma posição institucionalizada?

Rita Almeida: Isso, é falado pelo presidente, ele não finge que fala, ele fala mesmo! Na época da campanha dele, disse que o psicólogo na época dele era um porrete, esse eram os direitos humanos dele, um porrete. Então é uma pessoa que defende a tortura, não só pessoalmente, temos um governo nessa perspectiva. Então a psicologia que pretende ser minimamente responsável por si mesmo, pela sua própria sobrevivência, não pode apoiar esse tipo de pessoa.

Tivemos recentemente a posição do ministro da Saúde, que foi Mandetta, que saiu agora, apesar de compor esse mesmo governo, ele dentro do SUS, tem uma defesa impecável do SUS, ele mesmo não tinha esse histórico, sendo a favor da saúde privada, tendo um histórico que não combina com o SUS, mas que diante da pandemia, e tendo o SUS como seu aliado, ele foi impecável, usando diretrizes da ciência, da OMS, se submeteu as diretrizes, entendeu sua grandeza e defendeu o que deveria, tanto que foi demitido pelo mesmo governo. O conselho, apesar de ser contra a linha do Bolsonaro, foi totalmente favorável as diretrizes do Ministério da Saúde, não por causa do partido, mas que dentro desta perspectiva ele estava tomando uma decisão que condizia. A gente até brincava (risos), não somos nós que estamos concordando com ele, é ele que está concordando conosco. Trazendo uma visão que não era de perspectiva individual. Numa noção exata do que seria a ideia de saúde coletiva, tendo a visão de que não adianta eu estar saudável, se a outra pessoa não está, precisamos cuidar disso coletivamente, cuidando do outro.

Quando eu uso máscara eu não estou protegendo a mim, estou protegendo a outra pessoa, então é um modo de pensar em saúde muito interessante e, muito novo, e que condiz com o que a psicologia sempre disse: O modo como eu falo e lido com o outro interfere na saúde mental dele, então se eu for machista, se eu for racista, se eu sou preconceituosa, rígida com meus princípios eu vou estar ferindo o outro, sendo irresponsável com minha relação, violento. Nós da psicologia já sabíamos como a minha presença, a forma como falo e ajo interferem no outro, e agora o coronavírus vem ensinar isso para todo mundo, a psicologia tem muito a oferecer, a gente sabe que é assim.

(En)Cena: É, isso faz parte do cotidiano profissional de psicologia, não é, Rita? E você falando isso, me lembra muito a Resolução 1/2018 emitida pelo CRP, que preconiza um posicionamento efetivo das psicólogas e psicólogos, sobre uma situação de preconceito, violência, discriminação, ou seja, não basta só concordar com tais princípios. Nós somos convidados a nos colocarmos diante da sociedade defendendo esses princípios, e não permanecendo na minha casa, no meu consultório… tenho de ter uma atitude ativa, no sentido de fazer com que essas informações cheguem ao máximo de pessoas que eu conseguir atingir.

Rita Almeida: Fazer política nesse sentido é isso. É você fazer da sua prática uma ação em um determinado sentido, pensando em quem você quer ajudar, para promover a saúde mental

(En)Cena: Um acadêmico, o Bruno, está perguntando “por que o governo é considerado de extrema direita e não apenas de direita”?

Rita Almeida: Bom, vou tentar ser breve. Um governo de direita é um governo mais da perspectiva liberal, entender que o estado teria que ter se reduzido, para que o mercado pudesse se autorregular, que cabe em uma corrente política de direita. Não é bem o caso do Brasil.

(En)Cena: Que comporta diversidade? Um liberalismo puro comporta esse pensamento aberto…

Rita Almeida: Inclusive ele é mais radical ainda, em termos de “liberdades individuais”, entendendo que cada um pode ser o que quiser. Inclusive o liberalismo é extremamente permissivo com a questão das liberdades sexuais, uso de drogas, então assim… são liberais mesmo. O indivíduo é responsável pelas escolhas que quer ter, o estado não se mete nas questões, não se importa com questões de aborto, se quer ser usuário de droga, se quer ter uma orientação sexual, se quer ou não se casar. No liberalismo mesmo, o estado não se mete na vida do indivíduo nem para cuidados das vulnerabilidades. É aí que entra a necessidade do cuidado, as necessidades específicas, especialmente em países onde existe uma injustiça social muito grande, como é o caso do Brasil, então é preciso sim que o estado intervenha para que minimize essa distância entre os mais vulneráveis e os poderosos. E o que a gente vê no governo Bolsonaro não é esse liberalismo, é uma perspectiva de extrema direita, são os chamados governos de orientação fascista.

Falando na minha opinião, que tenho estudado isso, de como seria a perspectiva de um governo fascista, é onde a grande questão de gestão de governo tem a ação de redução do estado, de privatização, sucateamento das políticas públicas, privatizando-as, mas não com a ideia de libertar o sujeito das amarras do estado, mas no sentido de fazer com que a população se vulnerabilize cada vez mais. Ao qual só consegue governar plantando caos o tempo todo, afetando as pessoas emocionalmente, o governo gerencia esses afetos, o poder deles é centrado nos afetos ruins, sendo eles mesmos os maiores produtores.

(En)Cena: Rita, o fascismo nesse sentido é uma política de constante enfrentamento e de constante construção de inimigos, se movendo a partir disso. Ele não quer costurar uma rede consensual, sim?

Rita Almeida: Não, inclusive ao contrário, tentam o tempo todo provocar a divisão. São dois afetos em que precisam estar fomentando constantemente: O medo e o ódio. O tempo todo a sociedade está com medo, ele se oferece como ajuda, como aquele que vai cuidar, mas que na verdade não cuida pois precisa continuar provocando esses afetos ruins, com promessas nunca cumpridas. Se você pensar isso, em uma perspectiva de uma sociedade democrática, que imaginávamos até o momento, com suas instituições funcionando, os três poderes, o Senado, a Câmara dos Deputados, qual seria o papel de um presidente? É fazer uma liderança política. As instituições existem, as leis, a Constituição, já estão em andamento, como falei o SUS, SUAS, assim como todo o sistema judiciário, o que se espera de um presidente? É que minimamente, se não esperamos nada, que não fizesse nada! Que mude nada, deixasse como está, e não piorar. Numa situação dessas se espera que ele transmita uma segurança para a população, para acalmar, mas o que vemos, é o tempo todo ele só se apresenta para divisão, ódio, inimizades, com essa posição paranoica, de que tem alguém o seguindo. Na verdade, ele foi eleito com essa perseguição, aos chamados “comunistas”, que até agora nós não entendemos quem são. É nessa perspectiva que se faz o governo de extrema direita.

(En)Cena: Do ponto de vista global, parece que na Inglaterra há o exemplo de um governo que elege a direita, não a extrema direita, com um sistema público de Saúde que é exaltado pelo próprio primeiro ministro, mas ao mesmo tempo, no campo econômico tem políticas liberais, e também é liberal nos costumes. O que pontua bem a extrema direita brasileira é um excesso de conservadorismo moral.

Rita Almeida: Depois do coronavírus, nenhum governo no mundo sustentou o liberalismo, nenhum… todos eles recuaram, até os Estados Unidos, inventando até uma renda mínima, que é uma proposta, por não terem o que se tem na Inglaterra, na França. Todos os países deram um passo atrás, que nesse momento de vulnerabilidade o estado tem sim que participar da vida pública, pois não há liberdade se não tiver vida.

(En)Cena: É uma falsa dicotomia, preservação da vida, preservação da economia… A acadêmica Monique perguntou aqui: “Na sua opinião, de que modo a psicologia pode se posicionar diante do contexto pandêmico? Nas práxis mesmo”.

Rita Almeida: A gente não pode generalizar, vai depender do que cada serviço vai obedecer ao município em que ele trabalha. Então por exemplo se um psicólogo está no CAPS, que é um serviço para pessoas com transtorno mental grave, nesse contexto de pandemia, no meu município, as atividades ao público geral estão suspensas, então tem atendido de emergência. Nesse contexto o psicólogo, por exemplo, não estará com a agenda aberta, nesse momento o mais importante é evitar a exposição das pessoas, mas pode sim, manter contato com o paciente, usar as ferramentas virtuais, criar formas para que de algum modo esteja olhando, observando este paciente. Que é algo que a gente já fazia, não é algo novo. Um telefone, uma vídeo chamada com o paciente era algo que se usava em determinadas situações. Nós não trabalhamos com a pessoa com coronavírus, a não ser em um contexto hospitalar. Mas o trabalhador da saúde pública no geral não está ligado ao trabalho com a pessoa com o corona, mas pode ter um trabalho preventivo de orientação, de monitoramento com suas famílias.

(En)Cena: Uma atuação que se respalda no apoio… sem estar na linha de frente como o médico, mas que dá suporte. O Beto fez um comentário, disse: “O estado neoliberal é preconceituoso, homofóbico, classicista, misógino”… E o Iuri perguntou: “Qual sua opinião em relação a contribuição que a psicanálise da para a construção de novos arranjos a partir da pandemia?”

Rita Almeida: Eu acho que é uma pergunta que estamos nos fazendo: “que novos laços iremos criar a partir da pandemia? Que novas subjetividades?”. As vezes existe uma visão otimista, de que iremos mudar nossa forma de olhar, e pensar nas questões solidárias, na medida que o coronavírus nos coloca confrontados com a questão da coletividade, ao qual o cuidado de si é o cuidado do outro também. Alguns acreditam que a partir daí as pessoas pensem diferente. E existe outra perspectiva que diz que não, que é nessas situações que o homem mostra o quão ruim é, mostrando que não somos solidários.  Acredito que venha um pouco de casa coisa, que vem da subjetividade de cada um. Acredito que as pessoas que já tinham um olhar, um direcionamento político mais solidário, de entendimento, foram mais ainda em direção a isso, e as pessoas que não tinham isso como perspectiva, que tinha a coisa da competitividade, mergulharam ainda mais nesse mecanismo.

 Em uma situação de ameaça, temos dois mecanismos de defesa: Uma é o medo, a fobia, que a pessoa entra em um padrão excessivo, e uma outra que é a negação, que crê que nada está acontecendo, é uma invenção. Duas posições extremas, sendo que nenhuma é interessante, em uma o sujeito se encontra paralisado, na outra coloca a si e os outros em risco, que é o que está havendo. Algumas pessoas, diante disso, se encontram impossibilitadas de entender que a anterior forma de lidar com o mundo, não funciona com o coronavírus. Não adianta colocar o dinheiro em primeiro lugar.

(En)Cena: Bem Rita, temos outras questões, mas estamos chegando ao final, estamos próximos de uma hora. Vou fazer uma rápida consideração. Antes, gostaria de comentar o que a Elizete, uma estudante da Ulbra que está passando uma temporada na Itália, país que esteve no centro da pandemia… ela falou se existe o psicólogo de urgência do Samu. Se eu não me engano o psicólogo não está inserido no serviço de urgência.

Rita Almeida: Não, pelo menos aqui no Brasil não.

(En)Cena: Mas seria uma boa em alguns contextos, não é Elizete? Enfim, Rita, gostaria de te agradecer imensamente por ter tirado parte do seu tempo. Você já participa do (En)Cena, a revista eletrônica do curso de psicologia, com vários textos seus publicados lá. Gostaria de te agradecer.

Rita Almeida: Eu que agradeço a oportunidade.

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Em encontro de travestis e transexuais, defensora pública fala sobre acesso ao direito e preconceitos

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“Após se perceberem de um gênero diferente que lhes foi atribuído no nascimento, essas pessoas passam a enfrentar uma verdadeira luta para viverem em sua identidade. Além de um risco constante de serem vítimas de violência, não contam com uma legislação que as protejam, são excluídas do mercado de trabalho, têm enorme dificuldade para acessar o serviço de saúde, são hostilizadas, violentadas e sofrem, frequentemente, com a incompreensão e rejeição familiar.” Este foi um dos pontos abordados pela defensora pública Letícia Amorim em palestra no 1° Encontro de Travestis e Transexuais do Tocantins, na última sexta-feira, 7.

Coordenadora do Núcleo Aplicado de Defesa das Minorias e Ações Coletivas (Nuamac) Palmas, Letícia Amorim abordou a dificuldade no acesso ao direito e o preconceito da sociedade aos transexuais e travestis, bem como à toda comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Intersexuais (LGBTI). “Em 2018, comemora-se 40 anos do movimento LGBTI no Brasil, mas o marco não é o suficiente para que as propostas que asseguram direitos a gays, lésbicas, bissexuais e pessoas trans sejam aprovadas no Congresso”, disse a Defensora Pública.

Fonte: encurtador.com.br/GJRU4

Letícia Amorim falou também sobre o atendimento dos Nuamacs, que têm entre suas atribuições fomen­tar as políticas públicas em defesa dos direitos das minorias, como na defesa da população LGBTI, ques­tões de sexualidade e gênero, bem como fomentar políticas públicas de desenvolvimento e defesa dos direitos humanos.

Diversas pautas voltadas para o público LGBTI integram a atuação dos Nuamacs, dentre elas: nome social, plano municipal de direitos humanos, tratamento hormonal, atendimentos individualizados em casos de homofobia e transfobia, adoção e união estável para casais homoafetivos, dentre outros.

Encontro

O 1° Encontro de Travestis e Transexuais do Tocantins foi realizado pela Associação das Transexuais e Travestis do Tocantins (Atrato) nos dias 6 e 7 de dezembro, e contou com apoio da Defensoria Pública do Estado do Tocantins (DPE-TO), entre outros parceiros: Instituto Equidade Tocantins, Secretaria Estadual de Cidadania e Justiça (Gerência de Políticas LGBTI), Secretaria Estadual de Saúde (Gerência de IST/HIC-AIDS/HV), Secretaria Municipal de Saúde, Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Tocantins (OAB-TO), Universidade Federal do Tocantins (curso de Enfermagem), Universidade Luterana do Brasil (curso de Psicologia) e Conselho Regional de Psicologia

A programação foi realizada no auditório da DPE-TO, em Palmas, e contou com palestras e debates sobre temas diversos, em especial os relacionados à saúde.

De acordo com a presidente da Atrato, Byanca Marchyori, o Encontro objetivou promover não só o empoderamento das pessoas trans e travestis, mas, principalmente, o mapeamento da atuação destas classes, o que pode facilitar o estabelecimento de políticas sociais, de segurança, educativas e da saúde para este público.

NUAmac

Desde o ano de 2017, O Nuamac Palmas leva atendimento jurídico ao público LGBTI em razão da Semana da Diversidade Sexual do Tocantins – Parada LGBTI. Dentre as atividades realizadas pelo Nuamac, destaca-se a visita aos pontos de prostituição da Capital a fim de identificar as principais necessidades de atendimentos jurídicos das pessoas atendidas.

Para Letícia Amorim, no mercado de trabalho a sociedade e as políticas públicas ainda estão longe de promover a inclusão à população trans. Segundo a Defensora, a falta de oportunidade no mercado de trabalho deságua em outros graves problemas, tais como o suicídio. “É necessário ampliar o acesso desta população à prevenção, proteção e assistência à saúde, além de ofertar atenção integral às suas necessidades”, disse.

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“Notificação da violência” é pauta do Grupo de Estudos Feministas

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O encontro acontece no dia 13 de novembro às 17h na sala 203 do CEULP

Grupo Acadêmico de Estudos Feministas é um projeto de extensão ligado ao curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra, sob a coordenação da Profa. Me. Cristina D’Ornellas Filipakis e participação de várias acadêmicas do curso. Os encontros ocorrem às segundas-feiras, 17h, na sala 203. O objetivo é discutir e ampliar a discussão sobre feminismo no âmbito acadêmico, tendo em vista que o tema ainda gera muitos mal-entendidos.

O encontro dessa segunda-feira (13) será conduzido pela acadêmica Evelly Silva, com o tema “Violência Contra Mulheres: como notificar?”. O objetivo Do encontro é apresentar a ficha de notificação compulsória do Ministério da Saúde, que coleta dados sobre doenças, agravos e eventos de saúde pública; incluídos no Sistema Nacional de Agravos de Notificação (SINAN) e contribuem para o manejo de políticas públicas. A Ficha de Notificação de Violência Interpessoal e Autoprovocada deve promover novas organizações e estruturas de atendimento que qualifiquem a atenção à mulheres em situação de violência e a seus familiares.

Segundo Evelly Silva, tratar sobre notificações é fundamental pois “é através do uso desses dados que as políticas públicas de promoção, prevenção a saúde e proteção social podem ser planejados e executados. Não se faz política pública efetiva sem dados epidemiológicos que demonstrem a realidade do local em que se vai intervir. Ressalto ainda, a importância da divulgação desse serviço em grupos como este, visto que a informação é essencial e instrumentalizar mulheres acerca dos seus direitos dentro do SUS é promover o empoderamento de um público, muitas vezes negligenciado e oprimido das mais diversas maneiras, inclusive dentro dos serviços de saúde”, aponta.

Mais informações sobre o evento podem ser obtidas através do telefone 3219-8068 com a profa. Me. Cristina Filipakis.

A atividade é gratuita e aberto à comunidade.

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Psicologia Escolar: o desafio da não clínica

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Dados de pesquisa do CREPOP – Centro de Referências Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas, realizada em 2009, trazem que a maior dificuldade alegada pelos psicólogos escolares está em convencer a equipe que seu trabalho não é clínico. No entanto, este é um caminho necessário para se atender a demanda da psicologia escolar, pois cabe ao psicólogo escolar articular os saberes produzidos nos campos da Educação e da Psicologia Escolar.

Fonte: http://zip.net/bmtGTZ

As propostas sugeridas nesse trabalho estão de acordo com as orientações e princípios do Conselho Federal de Psicologia (CFP) sobre a atuação do psicólogo na educação.

Defendemos, a partir desses princípios, uma Psicologia Escolar crítica e contextualizada. Esta é possível de ser desenvolvida também por psicólogas (os) que trabalham em áreas que interagem com a Educação, como por exemplo, as áreas da Saúde e da Assistência Social. Para isso, é importante que também esses profissionais, além das (os) psicólogas (os) escolares/educacionais, tenham conhecimento das políticas públicas nacionais de Educação, da rede de atendimento e que encontrem espaços de interlocução para integrar seus conhecimentos e ações (CFP, 2013, p. 68).

O CFP chama a atenção ainda para outro desafio importante que se refere, no âmbito das políticas públicas, ao retorno da visão medicalizante/patologizante que atribui a deficiências do organismo da criança as causas da não aprendizagem.

Fonte: http://zip.net/bqtHZz

Daí a necessidade de um profissional de psicologia dentro de uma escola ter cuidado com a alta demanda de solicitações de diagnósticos e testes que podem estigmatizar a criança sendo que, muitas vezes, o problema pode estar na escola e não no aluno. Sobre isto o CFP adverte, “é importante chamar a atenção para a gravidade do atual momento histórico, em que ocorre uma maior incidência de avaliações da qualidade da escola pública e privada oferecida às crianças e jovens brasileiros” (CFP, 2013, p.72). Em relação aos alunos considerados problema, é preciso considerar que a vida escolar é apenas um fragmento da vida da criança. Caso contrário corre-se o risco de estigmatizar pessoas.

REFERÊNCIAS:

CFP, Conselho Federal de Psicologia. Referências técnicas para Atuação de Psicólogas(os) na Educação Básica. Conselho Federal de Psicologia, Brasília: 2013.

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