Projeto mostra locais com serviços de saúde mental no Brasil

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Mapa da Saúde Mental reúne serviços de atendimento em várias cidades

A pandemia de covid-19 tem gerado impactos na saúde mental de brasileiros. Um projeto auxilia pessoas que desejam ter atendimento psicológico a encontrar serviços públicos ou de organizações não governamentais.

O Mapa da Saúde Mental disponibiliza em seu site informações sobre iniciativas de atendimento em diversas cidades do país, com explicação sobre o serviço e contatos para acioná-lo.

O site traz projetos relacionados a saúde mental para público em geral, para trabalhadores da saúde e para grupos específicos, como comunidade LGBTTTQI+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis, transgêneros, pessoas queers e intersex), negros, mulheres, idosos, pacientes de determinadas doenças (como câncer) e casais.

No mapa presencial, os serviços e projetos são exibidos de forma geolocalizada, em que o interessado pode colocar seu CEP e visualizar as opções mais próximas do local onde está ou quer buscar ajuda.

Além disso, o site também traz explicações sobre como saber quando buscar ajuda, quais são os direitos das pessoas, como ajudar, como receber ajuda e como identificar se alguém precisa de apoio psicológico.

Segundo a presidente do Instituto Vita Alere, Karen Scavacini, responsável pelo projeto, a iniciativa surgiu da demanda por informações sobre apoio psicológico. “Sentíamos falta de um local onde as pessoas poderiam facilmente encontrar a informação de onde havia ajuda. Pois na maioria das vezes falamos: ‘se não estiver bem, busque ajuda’. Mas como se faz isso, que tipo de ajuda procurar? Reunimos tudo isso no mapa”, diz.

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O que poderia ser, mas não foi

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Essa é a história que por mim será contada: A história de uma menina na estrada.

Era uma vez, uma menina linda que vivia com seus país e dois irmãos. Até que um dia veio o bicho papão da traição e destruiu uma relação de quinze anos de uma linda família.

A filha mais velha começou a usar drogas e logo engravidou. O bebê morreu e ela, bem… Ela enlouqueceu. Entrou em uma depressão profunda que durou seis meses.

Quando ela melhorou, brigou com Deus e entrou para o mundo do crime, dando desgosto para seus irmãos e sua mãe. Ela foi morar na rua e lá, comeu o pão que o diabo amassou. Fugiu para o estado do Maranhão, mas acabou aqui em Palmas/TO, onde se envolveu no mundo do crack, perdendo pouco de respeito e dignidade que ainda lhe restavam.

       Prostituição,

                  Cárcere privado,

                                          Internação,

                                                           Roubo,

                                                                    Descaso,

                                                                                    Rejeição,

                                                                                                Crimes,

                                                                                                         Morar na rua

                                                                                                                             Desprezo e

                                                                                                                                               Discriminação.

Ela chegou a passar um tempo na fazenda da esperança, onde teve uma bebezinha linda com grandes olhos azuis que, no início, ela rejeitou.

Durante um ano e meio, ela permaneceu limpa, até conhecer uma pessoa, foi quando mergulhou mais uma vez no sub mundo das drogas.

Esse homem lindo, pelo qual ela se apaixonou… Rodrigo (nome Fictício)… Eles se uniram na drogadição e, após mais um ano inteiro nessa vida, eles resolveram que deveriam se recuperar.

Procuraram ajuda e se internaram. Ela se converteu, se tornou uma mulher direita e dedicada às suas filhas, e ao seu noivo. Depois de um tempo limpa, ela foi fui abandonada pelo homem que ainda amava muito.

Ela ficou sem chão, e voltou para o lugar de onde seu grande amor havia lhe tirado, recaiu. Logo vieram as consequências. Ela perdeu sua filha de três anos. Seu pai entregou a criança para uma amiga da família… E ela? Ela ficou só.

Drogada, na prostituição, ela passou pela fase mais difícil de sua vida. Nunca havia consumido tanta droga.

Sem dormir e sem comer, ela emagreceu 15 quilos. Seu pulmão doía, ela tossia muito. Ela então resolveu pedir ajuda e lutar mais uma vez pela sua vida, pelas suas filhas, e pela sua família. Foi assim que ela chegou ao CAPS AD.

Vida nova!

Nota: O texto faz parte de uma oficina literária realizada no CAPS AD de Palmas/TO, onde os usuários do serviço são convidados a contar estórias – reais ou imaginárias – do seu cotidiano.

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Participação da Sociedade na Execução Penal

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“Abandone toda esperança aquele que por aqui entrar.”
Inscrição da porta do Inferno por Dante Alighiere em A divina comédia: Inferno

Quero, neste espaço, traçar um relato de minha participação como acadêmico do curso de Psicologia no Seminário “PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE NA EXECUÇÃO PENAL: perspectivas de melhoria do sistema penal tocantinense”, que aconteceu no dia 22 de março de 2014, em Palmas – TO.

Na oportunidade se reuniram membros da Escola Superior da Magistratura Tocantinense (Esmat), representados da Secretaria Estadual de Defesa Social, Promotoria de Justiça, Centro de Direitos Humanos de Palmas, Universidades, Reeducandas do Sistema Prisional de Palmas e Comunidade em geral para debaterem o tema.

Não posso esconder minha euforia em participar de um evento como este. Afinal, não é todo dia que os Magistrados abrem as portas do Tribunal de Justiça para colocar em pauta a participação da sociedade no sistema penal –  pelo menos foi esta a pretensão que eu tive ao ler o nome do evento.

No discurso de abertura, pôde-se ouvir frases como:

“Prender por prender não é a solução.”

                              “Não é por estar preso que o homem perde a sua dignidade.”

E, na minha opinião, a mais realista e coerente com a temática do evento:

“Não há soluções imediatas para se resolver o problema dos presídios no Brasil.”

Os debates se iniciaram com mesa intitulada “A Realidade Carcerária no Estado do Tocantins”, que cumpriu com seu objetivo ao situar os presentes sobre a atual condição do sistema prisional de nosso estado. A mesa trouxe dados precisos quanto a números de reeducandos(as) e locais onde estes cumprem suas penas. Na sequência, floreios aos Secretários Estadual da Defesa Social do Tocantins, Dr. Nilomar dos Santos Farias, que apresentou o projeto para criação de um novo presídio em nosso estado. Tal medida, à primeira vista, parece resolver o problema da superpopulação dos presídios, da falta de unidades específicas para cumprimento de penas semiabertas e da carceragem em delegacias, prática comum no estado.

Em seguida houve a fala de reeducandas da Unidade Carcerária Feminina do Município de Palmas, que foi, sem sombra de dúvidas o ponto alto da noite. Elas sintetizavam a dor das pessoas que mesmo tendo cumprindo suas penas, não escapavam do julgo da sociedade. As falas dessas mulheres aproximaram os convidados de suas realidades, e fez com que eles percebessem como é sofrer pelo resto da vida por um erro cometido no passado.

O debate seguinte frisou a função da pena e da reclusão na Ressocialização dos cidadãos que cometem crimes, mas que diante da realidade carcerária encontrada em nossos presídios, não acontece. Afinal, o sistema presidiários brasileiro não reeduca, apenas pune, em regime de reclusão. Em seguida o evento chega a seu fim com a distribuição gratuita do Manual do Conselho da Comunidade na Execução Penal lançado pela Esmat na ocasião.

Não posso em minha fala desmerecer o evento, estratégia louvável, tanto da Esmat em abrir-se para esse debate com a comunidade, como a das reeducandas que de tão livre consentimento se propuseram a falar abertamente sobre sua realidade a uma sociedade que, direta ou indiretamente, é sua algoz.

Mas não posso deixar de falar do meu descontentamento e das muitas dúvidas que me restaram após o evento. A primeira, claro, diz da minha condição de estudante de psicologia, uma ciência que ainda que próxima, se coloca tão distante do judiciário e do direito. A segunda, é sobre o evento não ter aberto espaço para perguntas e/ou participação efetiva da comunidade por meio de um debate aberto. O que é muito triste. Claro sinal de que, mesmo com essas tentativas – volto a dizer: louváveis – o Judiciário ainda está muito aquém do que se espera no que tange à participação popular.

Fato curioso, era de que uma das falas mais frisadas da noite, cobrava da sociedade sua (co)responsabilidade com a reabilitação das(os) reeducandas(os) do sistema carcerário brasileiro.

Justamente por não poder fazer perguntas, voltei para casa com vários questionamentos, no que cerne à criação da nova unidade prisional de Palmas. Num momento em que a sociedade busca formas mais humanizadas de reabilitação destes reeducandos, investir em mais presídios não seria, portanto, um retrocesso? Claro que há ressalvas, até mesmo porque a planta da unidade não foi apresentada à comunidade na ocasião, mas, independente disto, não seria o momento de se pensar em criação de instituições que presem pelas reinserção social destes detentos, muito mais do que pela simples detenção? O que está em jogo aqui, além de outras coisas, é má aplicação de dinheiro público.

A verdade é que, por mais que alguns esforços de personagens específicos tenham sido notadas naquela noite, ainda há muito o que se fazer pela melhoria do nosso sistema prisional, que, acredito eu, precisará de vários anos para que alguma mudança efetiva e humanizada aconteça, no que tange à reformas no sistema prisional brasileiro. Até lá, resta-nos participar de eventos como estes e esperar pela oportunidade de falar de pontos que não foram abordados, para assim, exercermos, enquanto comunidade, nosso papel na reeducação dessas pessoas, que mesmo destituídos de seu direito de ir r vir, são nossos iguais.

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Ato 25, contra a Clínica Santa Isabel: escrevendo a história da Luta Antimanicomial capixaba

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O ato 25, manifestação antimanicomial ocorrido em Cachoeiro de Itapemirim – ES no dia 25 de agosto de 2012, pelo fechamento da Clínica de Repouso Santa Isabel e por criação de mais serviços substitutivos em Saúde Mental, vai ficar pra sempre na história da Luta Antimanicomial capixaba, e falar sobre ele é preciso.

Foto: Henrique Rodrigues Pirovani

A clínica tem algumas quatro décadas de existência e de barbaridades. É uma instituição psiquiátrica do tipo manicômio, hospício, como queiram chamar. Uma masmorra pouco comprometida com a dita saúde mental, e muito com o dinheiro, extraído dos maus tratos com a vida de pessoas. O manicômio é um exemplo de como o ser humano pode ser usado por outros seres humanos como fonte de lucro.

Foto: Henrique Rodrigues Pirovani

O Movimento da Luta Antimanicomial capixaba, assim como vários outros movimentos sociais, sempre denunciou esse estabelecimento. No entanto, nem todas as vozes conseguem reverberar em solos cachoeirenses e capixabas. A censura, o coronelismo e os jogos de poder sempre calaram todas as denúncias, e invisibilizaram as lutas que poderiam atrapalhar o esquema rentável da clínica. Afinal, apesar de ser uma clínica particular, em média noventa porcento de seus leitos são conveniados com o SUS. Os poderes oficiais, executivo, legislativo e judiciário, sempre se fizeram de mortos diante das denúncias, e temos casos de militantes perseguidas judicialmente por bradar indignação contra a clínica. Mas no dia 25 de julho de 2012, o Ministério Público “notificou as Secretarias de Estado de Saúde (SESA), da Justiça (SEJUS) e a Superintendência Regional de Saúde de Cachoeiro de Itapemirim (SRSCI), além da Secretaria Municipal de Saúde (SEMUS) a fim de que tomem providências em relação à regularização da clínica Santa Isabel”, veja mais sobre isso aqui:


http://www.mpes.gov.br/conteudo/CentralApoio/conteudo6.asp?codtexto=4731&tipo=2&cod_centro=6

Foto: Henrique Rodrigues Pirovani

Essa notificação, ação inédita do judiciário contra a Clínica, mobilizou diversos setores da luta antimanicomial capixaba, o que gerou o ato 25. Organizado pela Coordenação Nacional de Estudantes de Psicologia (CONEP), através de estudantes de psicologia da Faculdade São Camilo (Cachoeiro) e da UFES (Vitória), pelo Diretório Central dos Estudantes da UFES, pelo Núcleo Estadual da Luta Antimanicomial, e pelo Conselho Regional de Psicologia 16ª Região, o ato começou em frente à clínica, no bairro Amaral, onde músicas antimanicomiais foram cantadas, cartazes com frases de luta foram colados nos muros do manicômio, e os manifestantes tiveram oportunidade de receber apoio de internas através de algumas janelas gradeadas de uma das alas, e ouvir tristes relatos dos maus tratos sofridos lá dentro. Foi impactante para todas e todos nós, presentes, ver de perto o que muita gente nem acredita quando a gente conta. Não se tratava mais de algo que nos disseram que acontece numa clínica qualquer por aí não, eram as próprias internas que gritavam da janela sobre violências sofridas, para que qualquer transeunte ou morador da Rua Professor Gilceu Machado pudesse ouvir.

Depois decidimos amarrar nossas mãos e seguir marchando até o centro da cidade, panfletando para a população sobre nossas reivindicações e propostas, denunciando o cenário ainda vivido naquela clínica, e convidando as pessoas a lutarem conosco essa luta. Ao final do ato, estendemos na praça da prefeitura da cidade uma grande faixa com algumas de nossas propostas para substituir a Santa Isabel, além de vários cartazes confeccionados para o ato.

Foto: Henrique Rodrigues Pirovani

O Centro Acadêmico Livre de Psicologia (CALPSI-UFES) pretende continuar a luta contra a clínica Santa Isabel, e o próximo passo será a Ouvidoria Antimanicomial. A idéia é de um espaço virtual (blog e e-mail) para recolher denúncias, depoimentos, relatos, etc., acerca da Clínica Santa Isabel, por parte de ex-internos, familiares de internos e ex-internos, vizinhos da clínica, ex-funcionários, etc., e a partir daí montar um dossiê denunciando todas as irregularidades da clínica e da política de saúde mental capixaba.

Abaixo, alguns links sobre o Ato 25, para mais informações:

1) Franco Está Aqui (vídeo em quatro partes, com imagens do ato):
http://www.youtube.com/watch?v=HH8-SVBfgdY
http://www.youtube.com/watch?v=1ljgJNcVH8I
http://www.youtube.com/watch?v=EuilcJhR3tU
http://www.youtube.com/watch?v=LlCYfb4wkIU

2) Fotos do Ato:
http://www.facebook.com/media/set/?set=a.336328769790368.120491.100002397442548&type=1

3) Matéria em vídeo do site G1, exibida na emissora local de televisão filiada da TV Globo em Cacheiro:
http://g1.globo.com/videos/espirito-santo/estv-2edicao/t/edicoes/v/grupo-protesta-por-tratamento-prestado-aos-pacientes-em-cachoeiro-no-es/2107449/

Ministério Público do Estado do Espírito Santo
www.mpes.gov.br

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Saúde: garantia do Estado, dever de todos

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Pretendo nesse espaço partilhar minha experiência no terceiro encontro do Fórum Permanente de Saúde Mental do estado do Tocantins, que se deu no dia 22 de agosto de 2012, na sede do Centro de Atenção Psicossocial em Álcool e Drogas (CAPS AD-III), em Palmas – TO.

Logo de início quero deixar meu contentamento em poder constatar, reunidos, profissionais das mais diversas áreas da saúde (Psiquiatras, Psicólogos, Enfermeiros, Assistentes Sociais, Secretaria Estadual de Saúde, Acadêmicos de Psicologia, Conselho Estadual de Saúde, entre outros) empenhados em levantar, discutir e intervir em questões pertinentes à Saúde Mental em nosso estado.

Como acadêmico do quinto período do curso de psicologia, já havia participado de alguns eventos de temas relacionados à saúde mental, como voluntário do projeto (En)Cena: Saúde Metal em Movimento, já havia entrado em contato com algumas literaturas e debates a respeito do assunto, mas como cidadão, concebendo este como promotor de sua cidadania, foi a primeira vez que me vi realmente implicado no processo.

O tema discutido pelo grupo foi o Matriciamento de Saúde Mental, prática apoiada pelas Secretarias de Saúde, no qual um profissional especializado em Saúde Mental é designado para supervisionar um serviço de saúde de atenção básica que presta assistência ao sofrimento mental. O Matriciamento tem se difundido cada vez mais dentro dos CAPS’s do estado Tocantins, com números relevantes de aprovação pela equipe técnica dos serviços de saúde.

Outra problemática relatada no encontro foi a preocupação da Secretaria Estadual de Saúde com o alto índice de demanda judicial para intervenção familiar em pedidos de internação compulsória.

As políticas de enfrentamento às drogas têm encontrado grandes dificuldades quanto à sua pratica, que é regulamentada pela Lei Nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, pelo Decreto nº 7.179, de 20 de maio de 2010. Tem-se propagado uma intervenção clínica hospitalar em regime fechado, na qual o sujeito é retirado do convívio social. O tratamento é eficaz enquanto o indivíduo está internado, e sob o efeito de medicamentos, mas quando recebe alta, é claro que tudo volta. A comunidade parece negligenciar o que já é sabido por todos: o tratamento de dependentes químicos é moroso, por vezes, pode durar a vida toda. A reinserção social do sujeito, assim como o apoio da família é fundamental nesse processo.

As famílias querem resultados imediatos, e recorrem ao poder judiciário para conseguir a internação compulsória, um método que não tem resultados satisfatórios em um curto espaço de tempo. É preciso lembrar que no tratamento de dependentes, cada paciente exige um cuidado subjetivo e singular. Isso sem mencionar que quando falamos em saúde mental esse quadro de dependência, quase sempre, apresenta-se em comorbidade com outro transtorno. A luta de um dependente químico pode perdurar ao longo de toda a sua vida, por se tratar de um mal crônico.

Quando digo de um “mal” crônico, pretendo aludir os malefícios que as substâncias químicas podem causar ao organismo e à saúde do indivíduo, concebendo saúde como: um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças, assim como é definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Torna-se cada vez mais complicado falar de drogas, assim como falar de políticas de enfrentamento às drogas, e/ou de redução de danos. O assunto é cada vez mais polêmico, envolvendo sociedade, mídias, ciências, empresas, estado, igrejas, etc. Dizer de substâncias alucinógenas, assim como seus benefícios e malefícios, tornou-se uma questão subjetiva, e cada um tem o seu olhar, e assim, seu próprio ponto de vista. Afinal o homem é livre para decidir se quer ou não fazer o consumo de substâncias ilícitas. É nesse olhar que nasce a política de redução de danos. O serviço de saúde fica bem no meio de tudo isso, atravessado entre usuário, estado e família.

A questão levantada pelo fórum, é que, do modo que está sendo feito, estamos voltando para o regime asilar, não com o louco, mas com o dependente químico. A sociedade mais uma vez quer se isentar do problema e, erroneamente, busca no internamento uma solução. Parece irônico, mas a história se repete. Já que não se pode curar, tirar o problema do meio social e lançá-lo em um asilo parece ser o melhor a ser feito.

Vivemos no século XXI, o tratamento medicamentoso do que diz respeito à dependência química já melhorou e muito, mas sabe-se que o internamento não resolve problema algum, na verdade, a reclusão tente a ser muito mais prejudicial que benéfica.

Claro que não podemos negligenciar o sofrimento das famílias que, nestas situações, estão muito fragilizadas, e encontram na internação a única solução para lidar com o conflito. O poder judiciário, por sua vez, ao acatar a solicitação da família, só quer atender as reivindicações desta. Contudo, nesse ritmo o regresso ao modelo asilar é iminente. É preciso salientar que a internação compulsória fere o direito de liberdade do sujeito, que pode escolher se quer ou não fazer uso de substâncias ilícitas, afinal o Brasil é um país livre. O que falta é um consenso, uma conversa esclarecendo pontos entre sociedade, família, saúde, educação e justiça.

O fórum lamenta não ter nenhum representante do âmbito jurídico participando das reuniões, já que em questões como essa, sensibilizar a justiça parece ser um dos passos para se chegar à solução. Particularmente, fiquei tocado com o encontro e com o empenho de todos em discutir a saúde mental, o movimento é antes de tudo um manifesto ao direito à vida, a saúde de qualidade e à cidadania.

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O “Circuito” fora da instituição total

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Fazer de experiências profissionais um roteiro é tarefa difícil. Difícil, pois a prática profissional do psicólogo se dá em momentos nos quais tendemos a limitar o espontâneo das relações humanas, pois comedidos, devidamente, pelos conceitos e técnicas de nossa formação. A exposição é maior ainda quando resolvemos falar de experiências infelizes, ditas erradas, por se empregar uma técnica de forma falha ou até mesmo de agir de forma antiética, não abominável, mas tendo em vista a contradição que pode haver entre a ética da técnica e a ética pessoal (importante ressaltar que, na determinação antiética, aqui não se está julgando intencionalidades). Poderíamos perguntar: por que falar de experiências ruins, desastrosas ou simplesmente não exitosas? Afinal, de dramas já bastam os diversos cotidianos que encontramos como profissionais e em nossas vidas pessoais. Mas poderíamos perguntar também: e por que não falar? Afinal, problematizarmos nossas experiências enriquece práticas e conceitos. Todavia, pretendo aqui, antes de contar o causo, defender que, falar ou não de tais experiências, não se trata de uma questão de escolha, mas, antes, de necessidade.

Refiro-me aqui a experiências que ocorrem, em especial, em serviços de saúde e de saúde mental. A característica inusitada dos dias, do cotidiano de um serviço de saúde e de um serviço de saúde mental nos chama, constantemente, a reinvenções de nossas práticas e de nossos conceitos; a característica interdisciplinar desses espaços nos demanda um movimento constante de assimilação e de acomodação; aliás, estas características não se resumem aos serviços de saúde, mas seguem em nosso cotidiano de vida. Nesse tipo de prática profissional as possibilidades de relacionamento no ato de cuidado são tão amplas, em número e formas, e também imateriais, pois não palpáveis, não consumidas como a um sapato qualquer, que fica difícil falarmos das experiências por meio da categoria “erro”. Mas logicamente que, em nosso calvário reflexivo, encaixamos diversas ações na categoria das “erradas”.

Alguns se culpam e outros não, o que me leva ao principal fator que justifica a necessidade de falarmos de nossas experiências não exitosas, que é: nos culpamos, pois não temos espaços em que falamos e que não somos julgados pela virtualidade chamada “intenção”, seja por nós, seja por outros, com a conseqüência lógica deste julgamento, a reprovação. Volto, portanto, à minha tese da necessidade, completando-a devidamente: necessitamos falar de nossas práticas desastrosas, pois nos enriquecemos, desde que seja num espaço sem o crivo do julgamento das intenções escondidas, remota e profundamente, em nosso ser id-ota. Que o julgamento reflita sobre conseqüências de ações tendo como norte orientador o tipo de sociedade que queremos estimular, que se dá exatamente pelas conseqüências presentes no nosso dia a dia. Agora sim, vamos ao caso.

Em resumo:O CONTEXTO: o cara, cujo braço dava duas das minhas coxas, estava, no linguajar psiquicológico, entrando em crise maníaca do Transtorno Afetivo Bipolar, sem medicação; a mãe do cara extremamente amedrontada pelo que já viveu em outros tempos estava pedindo socorro, diariamente, ao CAPS; o cara começou a ter um quadro de narcolepsia (dormia de repente; muitas vezes em sua cama, com o cigarro na boca; além de um problema clínico importante, havia um risco de se queimar e de queimar seu quarto) e não aceitava qualquer abordagem clínica.ATO 1: um monte de profissionais sem saber o que fazer e com uma batata quente na mão: a guia de internação assinada pela médica do serviço (que no momento não se encontrava) pressionando de um lado (impressionante como somos estranhos; uma folha assinada nos faz repensar toda a necessidade de vida de um sujeito) e com a mãe do cara pressionando do outro lado (ou do mesmo, não sei); mas tinha também uma preocupação geral com isso da crise estourar (o histórico de crises do cara era de violência), da saúde dele piorar e de ele se colocar fogo; ele negava, com frases de sentidos inquestionáveis (como, não quero saber de médico e nem de psicólogo) qualquer abordagem clínica. Conclusão da equipe: convencer o cara de se internar.O ATO 2: O convencimento se deu na base da troca, sugerida pela mãe: ela o convencia a se medicar em troca de um sapato. Assim se fez e ele dormiu. Três horas depois a ambulância chegou; o cara meio tonto percebeu a cena toda, mesmo medicado-dopado percebeu que iria ser internado, sem seu consentimento, aliás, sem saber do fato e agrediu um profissional o que justificou a necessidade da internação, na lógica mais clássica de uma instituição total, processo definido por Goffman de “circuito”.

Na verdade, esta história, este fato é muito mais rico em detalhes, inclusive de tentativas e tentativas, anteriores a estas, de se fazer vínculo com o intuito do cuidado clínico do rapaz. De fato, é mesmo difícil de expormos e discutirmos ações desde o começo mal preparadas, equivocadas até, e não se ver, desde o mesmo começo, que a coisa estava é armada pra dar “errado” mesmo. Mas, como me diz um amigo, é muito fácil falarmos de futebol na segunda-feira. Enfim, o relato poderia se estender em mais atos narrados, mas tal detalhamento não serve para o objetivo dessa reflexão, que é deixar o seguinte questionamento: que mecanismos operam em serviços de saúde mental que, mesmo com pessoas preocupadas e empenhadas num trabalho orientado pela Atenção Psicossocial (essa é uma avaliação pessoal de alguém que confiava em colegas de trabalho), relações como essas do circuito e outras que podemos chamar de totais (com as características das relações construídas em instituições totais, em especial nos hospitais psiquiátricos) são reproduzidas, mesmo que não sejam a regra, mas são reproduzidas?

E não me venham com respostas que já tenho como, por exemplo, as mudanças culturais, técnicas e conceituais são sempre processuais e daí por diante. Sei que são. Concordo. Mas é que essa problemática que deixei pode ser feita de outra maneira, menos trabalhada conceitualmente, não menos importante e inquietante por isso (talvez por isso mais inquietante, pois direta, sem mediações conceituais). Assim se pode refazer a questão: por que definimos, às pessoas, “cuidados” que elas não querem, como uma internação involuntária? Ainda muito conceitual, tentarei de novo: por que continuamos achando que podemos definir e controlar a vida, em suas mais diversas formas de expressão?

É possível que, deparando-me, mais uma vez com a mesma situação que relatei, faria, hoje, o mesmo. É difícil filosofar na linha de frente, quando lidamos com a vida das pessoas; há urgências mentais e afetivas. A partir da contradição entre a reflexão do parágrafo acima e esta, deste, encerro com uma questão: na saúde, há as ocasiões das urgências e emergências, por exemplo: o corte profundo deve ser rapidamente saturado para que a pessoa não morra por perder muito sangue; hemorragias internas devem ser prontamente tratadas, se não a pessoa corre risco de morte e assim por diante; e a pergunta que encerra é: que tempo é esse em que vivemos que se criam as emergências mentais e afetivas, tanto pra quem sofre (a pessoa em crise) quanto pra quem o atende?

 

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