Subjetivação e Trabalho na contemporaneidade a partir de um contexto histórico

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Antes do golpe de 1964, os trabalhadores davam apoio aos movimentos de reformas urbanas e agrárias que lhes trariam melhores condições de desenvolvimento profissional, educacional e direitos diversos. Os trabalhadores se organizavam a partir do Comando Geral de Trabalhadores – CGT, fundado em 1962, e para atender às exigências dos trabalhadores o governo tenta equilibrar os interesses desses com os da elite. Mas ao se aproximar da data fatídica do golpe os militares reprimem qualquer ação dos trabalhadores prendendo, torturando seus líderes e representantes sindicais e depredando suas sedes para evitar aglomerações e motins.

Os latifundiários viam na ditadura uma forma de evitar a reforma agraria e assim controlar os trabalhadores para estes não o impedissem de acumular bens. Senhores de engenho e empresários apoiam o movimento militar na esperança de atingirem seus objetivos, assim se fez “o golpe de 1964, a despeito de mascarar seu propósito ditatorial, mediante uma intensa agitação e propaganda em torno da manutenção do regime democrático” (p. 63).

Nesse laço infiltra-se, entre os trabalhadores, os agentes de entidades governamentais (militares) para fins listar os representantes e marca-los, as empresas por sua vez financiavam as ações policiais e nessa colaboração mútua configurou um poder disciplinador, contribuindo para graves violações de direitos humanos tais como violências, ameaças, abuso de poder, crimes diversos, assédio moral, e a repressão, pois “os interventores de plantão, designados pelo governo, podiam identificar e denunciar o passado de militantes, o presente de trabalhadores inconformados e o futuro dos ativistas e das lideranças que planejavam a resistência e a luta” (p.65).

As articulações sindicais em prol dos seus filiados e trabalhadores em geral eram retaliadas e qualquer tentativa de movimentação era muito arriscada levando a consequências como demissões, invasões domiciliares para investigar militantes, tortura de seus parentes para arrancar informações. Os trabalhadores ativistas eram marcados e seus nomes passavam pelas fábricas na tentativa de lhes barrarem ainda na contratação. A vigília e monitoramento reforçam a exploração de trabalho, e põe em voga direitos outrora conquistados.

Fonte: encurtador.com.br/sBIUW

As greves passam a ter um rigor impossível de ser realizadas, salvo os trabalhadores que estavam a mais de três meses sem salários, os salários passaram a ter incidência inflacionária fazendo com que diminuíssem ao invés de aumentarem, isso levou ao aumento de horas extras, venda de férias, esposas e filhos (muito jovens) a ingressarem nas fábricas para compensar a perda dos salários que antes era de apenas um na família. O aumento das horas de trabalho leva ao esgotamento físico contribuindo para a elevação das taxas de acidentes de trabalho e até a mortes.

As violências e violações de direitos ocorriam não só com as lideranças, mas também com os trabalhadores em geral, muitos escondiam em regiões remotas e interioranas incentivados pelo medo da tortura, prisões e mortes, vivam precariamente e muitas vezes com a ajuda de outros colegas que ainda não perderam seus empregos.

As prisões ocorriam individual e em massa de forma sorrateira, o texto mostra alguns relatos particulares de como os trabalhadores eram surpreendidos dentro de seus ambientes de trabalho sem a menor chance de defesa. As prisões coletivas aconteciam durante movimentos como greves e reuniões, ocorriam em todo país sendo em maior número nas regiões onde havia mais trabalhadores. As torturas eram pesadas, intimidantemente punitivas e irracionais, se justificava seu uso como meio de evitar prejuízos maiores. Porém, era essa a estratégia militar para paralisar os trabalhadores e humilhá-los. As mortes eram causadas pelos mus tratos, torturas e falta de recursos, mas também por aniquilação. Muitos suicídios foram computados, bem como aniquilamento e desaparecimento.

A leitura do texto nos coloca a pensar o quão sofrido foi para as pessoas daquela época poder lutar por uma garantia de melhora para seus descendentes, sim, para os descentes pois eles mesmos já se viam imerso em dificuldades que os atormentariam toda a vida. Ainda hoje se vê trabalhadores humildes que reclamam seus direitos com medo de ficarem marcados como ficavam antes. Essa leitura nos instiga a continuar por busca de políticas públicas que nos apoiem como trabalhadores e como cidadãos.

Referência:

BRASIL. Comissão Nacional da Verdade. Relatório. Brasília, 2014. Violações de Direitos Humanos dos Trabalhadores.  [RESENHA].

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Cinema retrata precarização no mercado de trabalho

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“Estou me guardando para quando o carnaval chegar” é um longa-metragem estreado em 2019, que tem como roteirista, diretor e personagem principal o cineasta Marcelo Gomes. O longa se passa na cidade de Toritama – PE, que fica a 171,5 km da capital pernambucana, Recife. O filme é narrado por Marcelo Gomes que exibe em imagens o seu retorno a cidade que atualmente é considerada a capital do jeans no nordeste.

Toritama é responsável pela produção de jeans e essa produção é realizada pelos moradores da cidade, cerca de 40 mil pessoas habitam e mais de 90% da população trabalha na confecção de jeans. As fábricas de jeans são chamadas de facções, que estão localizadas em galpões, garagens, salas e nas casas das pessoas, as facções estão por todos os lados.

Fonte: encurtador.com.br/adnw9

De acordo com Antunes (2001), a partir da década de 90 houve um grande aumento na informalidade e precarização do trabalho, o aumento da informalidade provoca péssimas condições de trabalho, ritmos intensos e carga de trabalho excessiva que não é fiscalizada, pois os trabalhadores são subcontratados por empresas que burlam a legislação.

No caso de Toritama, os trabalhadores são profissionais autônomos e o tempo todo na obra é retratado como eles acreditam na falsa e ilusória ideia de liberdade e autonomia. Os trabalhadores reproduzem o discurso de serem seus próprios patrões e de ganharem mais, pois ganham de acordo com o que produzem. Antunes (2014, p. 40) alerta que:

A flexibilização produtiva, as desregulamentações, as novas formas de gestão do capital, a ampliação das terceirizações e da informalidade acabaram por desenhar uma nova fase do capitalismo no Brasil. As novas modalidades de exploração intensificada do trabalho, combinadas com um relativo avanço tecnológico em um país dotado de um enorme mercado consumidor tornaram-se elementos centrais da produção capitalista no Brasil.

Fonte: encurtador.com.br/cgDJK

Em Toritama, casas passaram a virar fábricas de jeans, famílias inteiras se ocuparam em alguma parte do processo de produção, onde dependendo de qual parte do processo se encontrarem podem ganhar de R$ 0,10 a R$1,00 por peça produzida. É comum ver pessoas de idades variadas trabalhando em facções e todos com um denominador comum que é a informalidade.

Na obra é possível perceber as péssimas condições de trabalho, jornadas excessivas e o enorme cansaço dos trabalhadores que fazem apenas pequenas pausas para refeições rápidas e retornam ao trabalho. Alguns trabalham das 7h da manhã e encerram às 22h, apenas com pequenas interrupções durante a jornada.

Faltam EPI’s e sobram riscos, pois os trabalhadores se expõem ao contato direto com reagentes químicos, objetos cortantes e têm que ficar na mesma posição por horas repetindo um dado movimento, o que pode ocasionar lesões por esforço repetitivo e outros problemas de saúde ocasionados pela falta de condições básicas e seguras de trabalho.

Fonte: encurtador.com.br/coBCJ

A indústria têxtil é um dos ramos que mais cresceu no capitalismo brasileiro, e junto com ela veio a flexibilização da mão de obra, que criou a falsa ideia de liberdade quando na verdade corresponde a uma neoescravidão. Conforme Antunes (2014, p. 684):

E  a  terceirização,  prática  presente  em  quase  todos os  ramos  e  setores  produtivos,  vem  se  tornando  a  modalidade  de  gestão  que  assume  centralidade  na  estratégia  patronal, uma vez que as relações sociais estabelecidas entre capital e trabalho são disfarçadas em relações interempresas, baseadas em contratos por tempo determinado, flexíveis, de acordo com os ritmos produtivos das empresas contratantes que desestruturam ainda mais a classe trabalhadora, seu tempo e trabalho e de vida, seus direitos, etc.

A cidade de Toritama parou quase que por completo para dedicar-se somente a produção de jeans, existem poucas outras formas de renda no município, além de que existem pouquíssimas opções de lazer dentro da cidade, visto que não há público para consumir ou desfrutar do lazer num lugar onde as pessoas vivem para trabalhar e descansam enquanto trabalham.

Fonte: encurtador.com.br/fjyGZ

Quando o carnaval se aproxima a pacata cidade de Toritama entra em colapso e diversos bazares surgem pelas ruas. Pessoas desesperadas para venderem tudo o que têm visando conseguir dinheiro para que possam viajar no carnaval para o litoral. O desespero é tamanho que aceitam valores inferiores ao que o produto corresponde e juntam tudo o que têm para obter ainda mais dinheiro que seja suficiente.

Algo interessante a respeito disso é que a quantia almejada não costuma ser alta, o que faz com que essas pessoas vendam seus bens por preços extremamente sucateados e quando retornam do carnaval empenham-se novamente para comprar de volta o mesmo produto que venderam e por um valor maior. O carnaval é o único período onde os trabalhadores param suas produções e fecham as portas de suas facções para descansarem e também para aproveitarem a festividade da data.

 FICHA TÉCNICA 

Fonte: encurtador.com.br/nyA56

Nome: Estou me guardando para quando o Carnaval chegar

Nome Original: Estou me guardando para quando o Carnaval chegar

Origem: Brasil

Ano de produção: 2019

Gênero: Documentário

Duração: 85 min

Classificação: Livre

Direção: Marcelo Gomes

REFERÊNCIAS

ANTUNES, R. Trabalho e precarização numa ordem neoliberal. In: GENTILI, P.; FRIGOTTO, G. (Org.). A Cidadania Negada: políticas de exclusão na educação e no trabalho. 2 ed. São P

aulo: Cortez, 2001, p. 37-50

ANTUNES, Ricardo (2015) Desenhando a Nova Morfologia do Trabalho, Revista Estudos Avançados, 28 (81), 2014, Instituto de Estudos Avançados, USP, São Paulo

ANTUNES, R e DRUCK, G. (2014). A epidemia da terceirização in Antunes, R. (org), Riqueza e Miséria do Trabalho, vol III, SP, Boitempo.

 

 

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MP permite suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses

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Texto integra conjunto de ações do governo contra efeitos da covid-19

Por Andreia Verdélio – Repórter da Agência Brasil – Brasília

O governo federal editou medida provisória (MP) com uma série de medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública no país e da emergência em saúde pública decorrente da pandemia da covid-19. A MP já entrou em vigor neste domingo (22) ao ser publicada em edição extra do Diário Oficial da União, e tem validade de 120 dias para tramitação no Congresso Nacional, e caso não seja aprovada, perde a validade.

Entre as medidas estão o teletrabalho, a antecipação de férias, a concessão de férias coletivas, o aproveitamento e antecipação de feriados, o banco de horas, a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho, o direcionamento do trabalhador para qualificação e o adiamento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Durante o estado de calamidade pública o contrato de trabalho poderá ser suspenso por até quatro meses, para participação do empregado em curso de qualificação profissional não presencial, oferecido pela empresa ou por outra instituição. Essa suspensão poderá ser acordada individualmente com o empregado e não depende de acordo ou convenção coletiva.

Nesse caso, não haverá pagamento do salário, mas a empresa poderá pagar ao trabalhador um ajuda compensatória mensal, em valor a ser negociado entre as partes.

De acordo com a MP, essas ações “poderão ser adotadas pelos empregadores para preservação do emprego e da renda” dos trabalhadores até 31 de dezembro, que é o prazo do estado de calamidade pública aprovado pelo Congresso Nacional.

De acordo com a MP, todos os acordos e convenções coletivas vencidas ou que vencerão em até 180 dias poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de 90 dias.

A medida define que os casos de contaminação pelo coronavírus não serão considerados ocupacionais, exceto com comprovação do nexo causal.

Teletrabalho

Os empregadores poderão adotar teletrabalho independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos. Entretanto, deve ser firmado contrato por escrito, previamente ou no prazo de 30 dias, sobre a responsabilidade pelo fornecimento dos equipamentos e infraestrutura ou reembolso de despesas arcadas pelo empregado.

Mesmo que o trabalhador não possua os equipamentos necessários ou o empregador não puder fornecer, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador.

O regime de teletrabalho também poderá ser adotado por estagiários e aprendizes.

Férias e feriados

Os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco da covid-19 terão prioridade para o gozo de férias, individuais ou coletivas.

Caso o empregador decida antecipar as férias, elas deverão ser de, no mínimo, cinco dias, poderão ser concedidas ainda que o período aquisitivo não tenha transcorrido. O empregador e o trabalhador poderão também negociar a antecipação de períodos futuros de férias. Nesses casos, a empresa poderá optar por pagar o adicional de um terço de férias junto com o 13º salário.

No caso de concessão de férias coletivas, o empregador está dispensado da comunicação prévia aos órgão trabalhistas e sindicatos.

As empresas poderão ainda antecipar feriados religiosos nacionais ou locais, mas isso dependerá da concordância do empregado. Nesse caso, os feriados poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas.

Já para os profissionais de saúde ou aqueles que desempenham funções essenciais, o empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas. A decisão deverá ser comunicada ao trabalhador preferencialmente com antecedência de 48 horas.

Banco de horas e qualificação

Os empregadores também poderão interromper as atividades e constituir um regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em favor do empregador ou do empregado. A compensação deverá acontecer no prazo de até 18 meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública, e poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, que não poderá exceder dez horas diárias.

Fonte: encurtador.com.br/klz36

Segurança do trabalho

Também está suspensa a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais. Entretanto, eles deverão ser realizados no prazo de 60 dias, depois do encerramento do estado de calamidade pública.

Caso o médico coordenador do programa de saúde ocupacional considere que a suspensão representa um risco para a saúde do empregado, ele deverá indicar a realização dos exames. No caso do exame demissional, ele também poderá ser dispensado caso o exame ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de 180 dias.

Os empregadores também estão desobrigados de realizar treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados, previstos em normas de segurança e saúde no trabalho. Nesse caso, eles deverão ser realizados no prazo de 90 dias, após o encerramento do estado de calamidade.

Entretanto, esses treinamentos poderão ser realizados na modalidade de ensino a distância, desde que os conteúdos práticos sejam executadas com segurança.

FGTS

Está suspensa ainda a exigência do recolhimento do FGTS pelos empregadores, referente aos meses de março, abril e maio, com vencimento em abril, maio e junho, respectivamente. O recolhimento dos valores para o fundo poderá ser realizado de forma parcelada, em até seis parcelas mensais, sem incidência de multa e encargos, a partir de julho.

As empresas poderão utilizar esse benefício independente do número de empregados, do regime de tributação, da natureza jurídica, do ramo de atividade econômica ou da adesão prévia. Mas para isso, deverão declarar as informações até 20 de junho. Os valores não declarados serão considerados em atraso e, nesse caso, será cobrada multa e encargos.

A suspensão do FGTS não se aplica em caso de demissão do trabalhador.

Por 180 dias, também estão suspensos os prazos processuais para defesa e recurso em processos administrativos de autos de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS.

Atividades de saúde

Durante o estado de calamidade pública os estabelecimentos de saúde poderão prorrogar a jornada de trabalho dos funcionários e adotar escalas de horas suplementares no intervalo de descanso entre 13ª hora e a 24ª hora. Entretanto, as empresas deverão garantir o repouso semanal remunerado.

Nesses casos, deve haver acordo individual escrito entre as partes. A medida é válida mesmo para as atividades insalubres e para a jornada de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso.

As horas suplementares realizadas poderão ser compensadas por meio de banco de horas ou remuneradas como hora extra. A compensação deve ocorrer no prazo de 18 meses, após o encerramento do estado de calamidade pública.

Abono anual

Para 2020, o pagamento do abono anual aos beneficiários da previdência social que, durante este ano, tenham recebido auxílio-doença, auxílio-acidente ou aposentadoria, pensão por morte ou auxílio-reclusão será efetuado em duas parcelas, em abril e maio.

Caso já esteja previsto o fim do pagamento do benefício antes de 31 de dezembro, o valor do abono será proporcional. Caso o encerramento do benefício aconteça antes da data programada para os benefícios temporários, ou antes de 31 de dezembro de 2020 para os benefícios permanentes, “deverá ser providenciado o encontro de contas entre o valor pago ao beneficiário e o efetivamente devido”.

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Um Senhor Estagiário – Uma visão a partir da Saúde Mental e do Trabalho

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O filme “um senhor estagiário”, dirigido por Nancy Meyers, estrelado por Anne Hathaway (Jules) e Robert De Niro (Ben), trabalha temáticas como, comunicação, tecnologia, criatividade, mulher no mercado de trabalho, gerações, liderança, empreendedorismo e relacionamento de uma forma cômica, romântica e cativante.Um filme leve, carismático, reflexivo e divertido, que sem dúvida agradará da juventude à senescência. Jules, uma jovem que com um start up que rapidamente explodiu na internet, agora é dona de uma empresa, que está crescendo a um ritmo inimaginável.

Além de atrair atenção dos consumidores, atraiu também investidores. Porém, lidar com o crescimento dessa empresa, ser mãe de família e manter um casamento, não é tarefa fácil para essa jovem, carismática, moderna, atraente e gestora. Em paralelo com essa história, aparece o personagem Ben, com 70 anos, viúvo e já se entediando com a vida, a fim de sair do tédio e vazio que sente, busca voltar à ativa se candidatando para ser estagiário nessa empresa. Ben havia sido administrador de uma empresa de lista telefônicas por 40 anos, com vasto conhecimento e experiência na bagagem, passa então a trabalhar como estagiário diretamente com Jules.

Este trabalho tem como objetivo analisar, a partir da teoria, os aspectos relacionados à Saúde Mental e do Trabalho presentes no filme. A fim de se ser elucidativo foi dividido a temática da Saúde Mental e do Trabalho em oito eixos:

  1. Espaço Físico
  2. Autonomia no Trabalho
  3. Estruturação do Tempo
  4. Pressão e responsabilidades
  5. Reconhecimento
  6. Relacionamentos interpessoais
  7. Lidar e Solucionar Problemas
  8. Bem-Estar dos Trabalhadores

No texto que segue, será explicitado o os quatro primeiros aspecto (Espaço Físico, Autonomia no Trabalho, Estruturação do Tempo e Pressão e Responsabilidades) do ponto de vista teórico e contrastado com o filme. No trabalho seguinte será apresentado outros quatro restantes.

ESPAÇO FÍSICO

Em 2010 a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou a cartilha “ambientes de trabalho favoráveis: um modelo para ação”, no qual postula aspectos fundamentais para a promoção da saúde do trabalhador. Ao se tratar do espaço físico, a OMS diz que

o ambiente físico de trabalho se refere à estrutura, ar, maquinário, móveis, produtos, substâncias químicas, materiais e processos de produção no local de trabalho. Estes fatores podem afetar a segurança e saúde física dos trabalhadores, bem como sua saúde mental e seu bem-estar (OMS, 2010, p.09).

 A começar a análise da saúde mental dos trabalhadores da empresa principal do filme, o site de moda, pontua-se o espaço físico. Apesar de ser um site de moda, vendas e divulgação, a empresa se concretiza em uma antiga fábrica de listas telefônica, o lugar é amplo, bem iluminado. As mesas e pessoas estão dispostas lado a lado, aspecto este que privilegia as relações e a comunicação na empresa. A empresa disponibiliza ainda para seus funcionários um espaço de descanso com massagista, ressaltando a importância do trabalho tranquilo, produtivo e saudável.

O filme é romantizado e com teor cômico, logo vê-se no local de trabalho um espaço ideal, porém, existe aspectos que podem ser considerados como fatores de risco para o adoecimento dos trabalhadores. Listando tais fatores, tem-se a início uma poluição sonora, que a longo prazo é um aspecto a se considerar para desencadear estresse dos trabalhadores. Ficou explícito ainda a falta de um lugar para colocar materiais inutilizados, que resultou na “mesa da bagunça” tão incômoda para Jules, gestora da empresa. Apesar do local amplo, nem todos se privilegiaram com isso, exemplo claro de Becky, secretária de Jules que desfrutava de um pequeno espaço.

AUTONOMIA DO TRABALHO

Segundo Cecílio (1999), as questões ligadas ao poder e ao controle estão inevitavelmente presentes na vida das organizações. Amitai Etzioni afirma que o êxito de uma organização depende, em grande parte, de sua capacidade para manter o controle dos participantes (1989). Ainda para o mesmo autor, raramente as organizações podem confiar que a maioria dos participantes interiorize suas obrigações e, sem outros incentivos, cumpra voluntariamente seus compromissos. Desta forma, subentende-se que o poder e o conflito são partes das organizações.

Neste âmbito, nota-se que a presença exacerbada do poder e autoritarismo nas organizações configuram um ambiente altamente estressor, e a longo prazo, adoecedor. A ideia de autonomia remete, numa primeira aproximação, a um plano macro, como visão de projeto de sociedade, autonomia da sociedade entendida como poder latente e possibilidade real que a sociedade possui de governar e organizar a si mesma (MOTTA, 1981 apud CECÍLIO, 1999). É visível a autonomia dos trabalhadores da empresa de Jules, uma vez que estes são cientes de seus deveres e o exercem sem que haja cobranças.

A autonomia existente nessa organização possibilita um ambiente harmônico e contribui para que, à longo prazo, não haja um adoecimento dos colaboradores. O filme contrasta essa perspectiva, uma vez que aborda a autonomia dos colaboradores, com liberdade de criação dos conteúdos da revista, embora, seja necessária a aprovação final de Jules. Esta liberdade promove aos trabalhadores o sentimento de pertencimento à organização, numa função colaborativa.

ESTRUTURAÇÃO DO TEMPO

Nos dias atuais a estruturação do tempo no mercado de trabalho tem sido cada vez mais intensa, devido à busca pela maior produtividade, competitividade, para isso o trabalhador deve trabalhar cada vez mais e acaba “correndo contra o tempo”. Visto que isso, não é bom para a sua saúde mental, pois afeta a qualidade de vida desses indivíduos. Sendo assim, Barreto (2009, p. 5) afirma que

a nova forma de organizar e administrar o trabalho, alterou a relação tempo-espaço, pois os trabalhadores vivem-e-fazem seu trabalho em fluxo continuo, sem tempo para desenvolver vínculos afetivos, para pensar ou descansar. Até mesmo as necessidades biológicas, devem ser consentidas. É uma vida-viva-vivida limitada, disciplinada e intensificada pela fragmentação do processo e especialização das tarefas, pelo uso integral do tempo e ativação do ritmo sob rígida disciplina hierarquizada do corpo que produz.

Dessa forma, pode ser percebido em cenas do filme em que Jules tem várias responsabilidades e todo o seu tempo dedicado ao trabalho, assim não tendo tempo para ficar com a família. E tudo isso refletia na sua secretaria Becky, pois ela tinha que seguir o ritmo da mesma, marcar as reuniões de Jules de cinco minutos para não perder tempo, assim tendo que passar do seu horário de trabalho para cumprir as demandas de Jules. Tais aspectos é adoecedor para duas, pois Jules com elevado número de afazeres passava pouco com a família , afetando a suas relações sociais e interpessoais e Becky sentia-se pressionada em correr contra para não decepcionar Jules.

Em paralelo, temos o personagem Ben, que por ser um senhor com anos de experiência de trabalho, não deixava que o trabalho o adoecesse, e a correria de Jules o afetasse, pelo contrário ele agia de uma forma calma, pacífica e tentava transmitir isso para todos que estava a seu redor. Desse modo Mendes (1995, s/p) ressalta que

o trabalho pode ser considerado como o lugar de satisfação sublimatória, quando o trabalhador transfere sua energia pulsional, que inicialmente é dirigida para as figuras parentais com objetivo de satisfação imediata, para as relações sociais com satisfação mais altruísta.

PRESSÃO E RESPONSABILIDADES

Assim Ben se sentia satisfeito com o trabalho, ele não deixa que o estresse permaneça, sempre buscava formas de relaxar e esse seu equilíbrio psicológico acaba passando para cada um da empresa, até mesmo Jules, e não afetava a sua saúde mental. Mendes (2009), diz que a saúde mental não é a ausência de transtornos, obter essa saúde é uma forma de desenvolver uma existência com uma sensação não apenas portador dela, mas também criador de valores e instaurador de normas vitais.

O equilíbrio seria o resultado de uma regulação que requer estratégias defensivas especiais, elaboradas pelos próprios trabalhadores; porém, a normalidade conquistada e conservada pela força é trespassada pelo sofrimento (DEJOURS, 1994, apud, RODRIGUES et al, 2006.). Assim tendo uma qualidade de vida dentro do que se diz normal e não sofrimento e não adoece por causa do trabalho.

Nos dias que correm, pode-se perceber a frequente pressão por produtividade crescente, em um ambiente extremamente competitivo, na qual os indivíduos enfrentam, sem se importarem com a qualidade de vida desses sujeitos. Isto é, com a saúde mental deles. Visto que, o estresse está cada vez mais preocupante no âmbito mundial. Uma vez que, é uma das principais causas para ocorrência de doenças. Dessa forma, causando sobrecarga, exaustão e pressão devido ao trabalho.

Sendo assim, Costa (2010, p. 2) afirma que

o estresse está intimamente relacionado com a carga mental associada normalmente ao trabalho e é causado por um desajuste entre um indivíduo e o trabalho, pelos diferentes papéis que o indivíduo, tem de desempenhar e pela falta de encontro sobre a vida e sobre o trabalho […]. O termo Stress muitas vezes é utilizado para descrever os sintomas produzidos pelo organismo com resposta à tensão provocada pelas pressões e situações que as pessoas enfrentam.

Dessa forma, pode ser observado na cena, no qual, Jules uma jovem empresária, que agora tem muitos funcionários, um sonho tornado realidade, e muita responsabilidade, expectativa e pressões para suas decisões. A empresa estava funcionando a partir de um sistema centralizador do poder, que todas as decisões deviam passar por ela. Somado isso a sua rotina exaustiva, a jovem empreendedora apresenta alguns comportamentos obsessivos, entre eles o de manter o ambiente sempre organizado, caso não estivesse, apresentava estresse e descontração e o de sempre piscar os olhos, quando alguém conversava com ela . Jules estava distanciando da sua família, e mantendo
dedicação total na empresa, fato que colabora para o adoecimento mental.

Concomitante, temos a personagem Becky, secretária de Jules, que tinha atribuições diárias em excesso. Pois, trabalhava horas a mais do seu expediente com intuito de terminar todas as atividades que foram estabelecidas, para não ocorre reclamações posteriormente. Assim, se sente pressionada e sobrecarregada, acarretando desanimo e tristeza devido à grande quantidade de trabalhos para realizar. Deste modo, a situação de Becky, é configurada como um trabalho adoecedor, ela dorme pouco, alta cobrança e infelicidade pelo cargo inferior que ocupa. Garcia e Silva (2014, p. 26) ressaltam que

no mercado de trabalho, a forma como nos relacionamos com as pessoas é um dos fatores mais importantes para manter um bom clima organizacional. A maneira de ser, pensar e agir influencia diretamente os relacionamentos nas empresas. O trabalho requer a convivência com colegas e superiores, onde é necessário conciliar os interesses pessoais com os interesses e objetivos da organização.

Assim esses mesmos autores, declaram que pode-se considerar o sentido do trabalho em várias dimensões e sentidos diferentes para cada indivíduo e apontar sentimentos e afetos envolvidos dos trabalhadores, tais como o amor, a amizade, o respeito. Assim, aumentando a motivação dos envolvidos, facilita o alcance dos resultados da empresa, além de intensificar o crescimento pessoal e profissional dos trabalhadores. Visto que, o relacionamento interpessoal é uma ferramenta essencial para obter sucesso dentro das empresas é algo primordial nas relações humanas (GARCIA e SILVA, 2014).

No filme, a realidade descrita acima é retratada quando um jovem funcionário ajudou o Ben a ligar o notebook, uma vez que ele era novo no emprego e também não se dava bem com tecnologias. Depois, em outra, Jules estava enviando algumas mensagens pelo seu laptop, e sem perceber enviou uma mensagem por engano para sua mãe, na qual descrevia uma personalidade errônea da mesma.

Então, Jules comunicou a Ben, e o mesmo chamou seus outros colegas, posto que tiveram uma ótima ideia. O qual seria invadir a casa da mãe de Jules, abrir o notebook e apagar a mensagem antes que a mãe dela chegasse em casa. Porém, houve um contratempo, porque o alarme disparou e eles saíram todos correndo para o carro que haviam ido e foram embora. Ainda bem que conseguiram apagar o recado. Jules então, ficou feliz pelo trabalho em equipe que tiveram.

REFERÊNCIAS:

BARRETO, M. Saúde mental e trabalho: a necessidade da “escuta” e olhar atentos. São Paulo: Caderno Brasileiro Saúde Mental, vol.1, n. 1, 2009.

CECÍLIO, L C. O. Autonomia versus controle dos trabalhadores: a gestão do poder no hospital. Ciência & Saúde Coletiva, v. 4, n. 2, p. 315-329, 1999.

COSTA, P. C.. Gestão do Stress Ocupacional. 2010.  Disponível em: <https://pt.slideshare.net/RafaCunegundes/gesto-do-estresse>. Acesso em: 1 de abril de 2017.

MENDES, A. M. B. Aspectos psicodinâmicos da relação homem-trabalho: as contribuições de C. Dejours. Brasília: Psicologia: Ciência e Profissão, vol.15, 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98931995000100009>. Acesso em: 02 de abril de 2017.

OMS – ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Ambientes de trabalho saudáveis: Um modelo para ação. Brasília: SESI/DN, 2010. 26 p. Disponível em: <http://www.who.int/occupational_health/ambientes_de_trabalho.pdf>. Acesso em: 02 abr. 2017.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

UM SENHOR ESTAGIÁRIO

Diretor: Nancy Meyers
Elenco: Robert De Niro, Anne Hathaway, Rene Russo, Andrew Rannells;
País: EUA
Ano: 2015
Classificação: 10

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Efeitos Pessoais Laborais no Novo Capitalismo

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No último dia 3 (três) de maio aconteceu o “Psicologia em debate”, que foi apresentado pelos acadêmicos Erismar Araújo e Fabrício Veríssimo. O tema faz uma crítica às consequências que o capitalismo traz à vida do trabalhador. Os estudantes relataram que no início do trabalho houve um impasse entre os valores pessoais e aquilo que o autor aborda.

O debate teve início com uma breve apresentação da biografia do autor. Richard Sennett é professor de sociologia da Universidade de Nova Iorque, é considerado um dos maiores intelectuais em sociologia urbana na atualidade. Teve influências da filósofa alemã Hannah Arendt e do filósofo francês Michel Foucault. Sua obra mais conhecida é “O declínio do homem público”, na qual aborda a relação entre a vida pública e o culto ao indivíduo e ao individualismo.

Fonte: http://zip.net/bvtKjd

O livro “A Corrosão do Caráter: consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo” é baseado na história de trabalhadores e um dos pontos que o autor aborda é sobre os vínculos duráveis ou não duráveis no ambiente do trabalho e a importância das relações nesse espaço.

Seguindo com o conteúdo explanou-se a respeito de alguns conceitos, como: Corrosão: ato de corroer, destruição. Caráter: formação moral; honestidade: homem de caráter. O autor, também, argumenta que o capitalismo está em um momento caracterizado como natureza flexível em que o trabalhador deve estar sempre pronto para se adaptar às diversas situações impostas pela empresa.

Fonte: http://zip.net/bhtJZ7

Com isso, o autor acredita que o trabalho flexível tem efeito negativo no caráter da pessoa. No trabalho flexível também entra a questão do trabalhador disciplinado que é aquele que busca sempre dar o seu melhor. No entanto, tanto no trabalho disciplinado quanto no flexível, o trabalho ocupa o centro da vida.

A rotina parte da ideia de reestruturação do tempo; criação de formas e de poder; a mudança do ‘controle face-a-face’ pelo controle eletrônico. Ou seja, com as novas tecnologias, há uma nova rotina em que o trabalhador pode organizar seu próprio tempo, tendo seus aspectos positivos e também negativos, pois com isso enfraquece as relações interpessoais. Dessa forma, a ética do trabalho contribui para a degradação humana, pois não há mais experiências compartilhadas.

Fonte: http://zip.net/bbtJLb

Por fim, foi possível compreender, por meio do relato/apresentação, que o autor expõe a problemática do trabalho flexível, quais seus principais impactos para o trabalhador e, consequentemente, à sociedade em geral, pois uma vez que tais consequências atingem o caráter pessoal de um indivíduo impacta, também, toda a população.

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A Sociedade Individualizada: a dinâmica pós-moderna no trabalho

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O livro “A Sociedade Individualizada: Vidas contadas e histórias vividas” de Zygmunt Bauman começa abordando o significado da palavra “trabalho” em seu primeiro uso e primeiros significados. Assim, de acordo com Oxford English Dictionary, a palavra trabalho se referia a um tipo de trabalho físico para suprir as necessidades de uma comunidade. Porém, séculos depois, já adquire um significado mais complexo de plural de trabalhadores que participam da produção.

Com isso, formaram-se sindicatos e associações que vincularam os dois significados e tornaram isso, uma questão política. O texto traz a ideia do economista Daniel Cohen que fala sobre a desigualdade entre as nações, que é de origem recente e que é um produto dos dois últimos séculos, época em que surgiu a concepção de que o trabalho era a fonte de riqueza e assim, surgiram também as políticas guiadas por essa suposição.

Fonte: http://zip.net/bqtJmr

A nova desigualdade global adquiriu novas noções fornecidas pela nova ciência da economia, a qual substituíra as ideias fisiocráticas e mercantilistas que estava acompanhando a Europa no caminho de sua fase moderna até o limiar da Revolução Industrial. Tais noções foram cunhadas na Escócia, país no qual estava totalmente preparado para ser o epicentro da ordem industrial emergente, mas que estava afastado do impacto cultural e econômico do vizinho. Assim, a Escócia afirma que, o trabalho é talvez, a única fonte de riqueza porque, concordando com o autor, a predisposição de formas de ação no “centro”, são sempre percebidas mais rapidamente e trabalhadas, articuladas, objetivadas e moldadas pelas “periferias” (subúrbio dos centros civilizacionais).

A criação da nova ordem industrial foi a “grande transformação” que se deu a partir da separação dos trabalhadores de seus meios de sustento, como sugeriu Karl Polanyi muitos anos mais tarde ao atualizar a visão de Marx. A partir desse ponto, o trabalho pode ser considerado uma simples mercadoria, pois a produção e a troca passaram a ser deixados do modo de vida mais amplo. Além de que o trabalho passou a ser tratado como tal mercadoria, como a terra e o dinheiro. Essa desconexão deixou a capacidade de trabalhar livre, por conseguinte, ela pode ser colocada, recombinada, de diferentes formas, bem melhores, sendo assim, o exercício mental e físico se tornou um fenômeno de direito próprio.

“Sem que essa desconexão acontecesse, haveria pouca chance de que o trabalho pudesse ser mentalmente separado da totalidade a que ele por natureza pertencia e se condensasse em um objeto autocontido.” (BAUMAN, 2008, p.29). Onde, na visão pré-industrial da riqueza, a terra era a “totalidade”. Porém, já na nova era industrial, que foi proclamado o advento de uma sociedade distinta (Inglaterra), o que dentre fatores, destruiu o campesinato e o vínculo natural entre terra e trabalhador. Como consequência, parecia aos contemporâneos da Revolução Industrial, a emancipação do trabalho.

Fonte: http://zip.net/bbtHg8

Essa emancipação do trabalho, não se estendeu livremente por muito tempo para estabelecer seus próprios caminhos. A forma de vida não tradicional, que já não era mais viável, a qual tinha o trabalho antes de sua emancipação, seria substituído por outra ordem, desta vez, já projetada e construída, produto de uma racionalização e pensamento, já que tinham descoberto que o trabalho levava a riqueza, agora explorara essa fonte de forma eficiente e planejada.

Para um novo começo era necessárias mudanças, de forma com que os antigos hábitos de convívio fossem exorbitados e deixados de lado, dando lugar a um sensacional e visível início de uma mudança que levara a diversas indagações. O real valor para o que havia acontecido estava sendo encarado de forma séria e com entusiasmo sabendo que a mudança só ocorreu mediante a auto avaliação de como seria o futuro em questão a partir da li, naquele momento a capacidade de pensar, sonhar, projetar estava sendo encarado com seriedade, pois a liberdade descoberta era motivo de grande especulação, levando assim a busca daquilo que era novo e por mais que fosse desconhecida teria que ser passada adiante para que fosse introduzida a rotina diária.

Henry Ford faz uma indagação para que possamos refletir a respeito da real forma no qual queremos viver se e com a famosa tradição imposta por muitos que outrora passada de geração a geração leva especulação, mas que de outra forma percebe que o ser humano vive bastante o hoje, porém alguns atos feitos por Ford para ganhar dinheiro fazem com que refletimos sobre a real forma de ser e estar imposta a seus funcionários, porém teve iniciativa e disse o que os outros queriam dizer a tempos.

Linha de montagem de Henry Ford. Fonte: http://zip.net/bntHn2

O tempo da modernidade pesada fez com que houvesse uma necessidade que o trabalho e o capital teriam que andar juntos um dando segmento ao outro claro que isso não viria se não fosse o fato de que os trabalhadores necessitavam sustentar suas famílias e seguir suas vidas e o capital necessitavam deles para crescerem e expandirem-se, ou seja, um depende do outro. “Para que ambos – capital e trabalho – pudessem se manter vivos, cada um precisava ser mantido como mercadoria: os donos do capital tinham de ser capazes de continuar comprando trabalho, e os donos deste precisavam estar alertas, saudáveis, fortes e de certo modo atraentes para não afastar os possíveis compradores” (BAUMAN, 2008, p.33).

Os desempregados começaram a ser vistos como substitutos ou sucessores daqueles que já trabalhavam, ou seja, o trabalho não poderia parar o capital que estava em jogo. Pensar no bem-estar social nessa situação se tornava meio ambíguo, mesmo nessas circunstâncias o bem-estar era de certa forma visto como algo que iria passar. Na Ford, mesmo com a carga horária um pouco exorbitante, ainda havia um pouco de cuidado com os jovens aprendizes que conseguiam emprego fixo na mesma, visando e uma em um pensamento duradouro sobre o futuro não só do jovem empregado como também da empresa.

A medida que se assumia que ficar na companhia do outro iria durar, as regras desse estar juntos eram de foco de intensas negociações. Os sindicatos refundaram a importância dos trabalhadores e resultou em restrições à liberdade de manobra dos empregadores. Essa situação mudou-se e o motivo é a nova mentalidade de curto prazo que substitui a de longo prazo.  Flexibilidade quando aplicado ao mercado de trabalho significa fim de emprego, trabalha com contratos de curto prazo. É também preciso acrescentar, porque o modo como o trabalho é conduzido do pouco, cada vez menos espaço para as suas habilidades. De maneira distinta dos tempos de dependência mútua de longo prazo, dificilmente existe qualquer estímulo para se ter um interesse sério.

Robert Reich sugere que as pessoas hoje empenhadas em atividades econômicas podem ser grosseiramente divididas em quatro grandes categorias.  “Manipuladores de símbolos”, pessoas que inventam ideias e formas de fazê-las desejáveis e vendáveis, formam a primeira categoria. Aqueles empenhados na reprodução do trabalho, educadores ou vários funcionários do Estado de bem-estar social, pertencem à segunda categoria. A terceira cobre pessoas empregadas em “serviços pessoais”. E por fim a quarta, à qual pertencem as pessoas que durante os últimos 150 anos formaram o “substrato social” do movimento trabalhista.

Fonte: http://zip.net/bmtHf2

Peyrefitte distingue a empresa que oferece empregos como o lugar mais importante para semear e cultivar a confiança. Se os empregados lutaram por seus direitos, foi porque eles estavam confiantes no “poder de controle” da estrutura na qual, como eles esperavam e desejavam, seus direitos seriam inscritos; confiavam na empresa. A procrastinação é o ato de adiar uma ação, neste sentido ela tem uma tendência a romper qualquer limite de tempo e a estender-se indefinidamente. A satisfação por sua vez fica relegada ao adiamento como uma provação simples e pura, uma problemática que sinaliza certo desarranjo social e ou inadequação pessoal.

No fundo o trabalho na modernidade leve, condensa as incertezas quanto ao futuro e ao planejamento em longo prazo, a insegurança estabelecida nas relações e a falta de garantias entre as partes. No mundo do desemprego estrutural ninguém se sente suficientemente seguro ou amparado, ou seja, a flexibilidade é o termo que rege os novos tempos. Assim a satisfação instantânea é perseguida, ao contrário do adiamento da mesma, uma oportunidade não aproveitada é uma oportunidade perdida. Não obstante, a satisfação instantânea é a única maneira de sufocar o sentimento de insegurança, recolocada aqui, não a única, mas sim uma das formas para dominar o sentimento de insegurança, haja vista, que existem outros subterfúgios a serem aplicados no campo da psicologia com esse intuito.

FICHA TÉCNICA:

A SOCIEDADE INDIVIDUALIZADA: VIDAS CONTADAS E HISTÓRIAS VIVIDAS

Autor: Zigmunt Bauman
Tradução: José Mauricio Gradel
Editora: Zahar
Páginas: 324
Ano: 2008

REFERÊNCIAS:

BAUMAN, Zigmunt. A sociedade individualizada: Vidas contadas e histórias vividas. 1. ed. Editora Zahar. Rio de Janeiro, 2008.

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Mito de Sísifo ou dos trabalhadores de saúde mental

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Camus (2004), em sua obra intitulada O Mito de Sísifo, compara o absurdo da vida do homem com a situação de Sísifo, um personagem da mitologia grega, que é condenado a repetir sempre a mesma tarefa. Ocorre que Sísifo desafia os deuses e, quando capturado, sofre uma pesada punição: para toda a eternidade, terá de empurrar uma pedra de uma montanha, que rolaria para baixo, sendo condenado novamente a começar tudo de novo, tornando vão todo o seu esforço, transportando eternamente seu triste fardo.

 

 

Assim Camus (2004) vê em Sísifo o ser que vive a vida ao máximo, que odeia a morte e é condenado a uma tarefa sem sentido, como o herói absurdo. Não obstante, reconhecendo a falta de sentido, Sísifo continua executando sua tarefa diária. Esse mito, no entanto, só é trágico porque seu herói é consciente.

Camus (2004) apresenta o mito, para propor uma metáfora sobre a vida humana, particularmente em relação ao trabalhador contemporâneo, que executa as mesmas tarefas diariamente, sendo que esse destino não seria menos absurdo. Nesse caso, contudo, só é trágico nos raros momentos em que se torna consciente.

Sísifo, proletário dos deuses, impotente e revoltado, conhece toda a extensão de sua miserável condição e pensa nela durante a descida. A clarividência, que deveria ser o seu tormento, consuma, ao mesmo tempo, sua vitória. Por algum motivo, os deuses pensavam que não haveria castigo pior que o trabalho inútil e sem esperança. Assim, tomar consciência do caráter insensato dessa agitação, da inutilidade de tantos sofrimentos, é descobrir o absurdo da condição humana, e talvez, se poderia dizer, do trabalho humano repleto de sofrimento; não aquele descrito por Dejours, como parte de uma “normalidade sofrente”, mas aquele caracterizado por ser árduo, duro, contínuo, cansativo.

Um dos pontos mais destrutivos para a saúde mental é o fato de que o trabalho por perder o seu significado vai sendo desinvestido de afeto, o que altera a relação do trabalhador com importante pilar de reconhecimento social. No serviço público, muitas vezes, é a partir dessas questões que surge o descomprometimento, resultado de um processo contínuo de falta de reonhecimento horizontal e/ou hierárquico, perda de autonomia e de desejo,acarretando perda de valor e sentido no próprio trabalho que realiza.

Ocorre que tais características assemelham-se às que os profissionais da área da saúde mental executam, por possuírem uma rotina permeada pelo tolhimento do próprio significado do trabalho, em que apenas ‘rolam pedras’, reproduzindo, assim, rotinas instituídas que, muitas vezes, já caducaram, não fazem sentido; ou ainda por assistirem à degradação dos pacientes, e ao seu retorno, cada vez mais frequente, questões que acabam por transformar o processo de trabalho dos profissionais em um trabalho sem significado e sem fim, com resultados cada vez menos visíveis.

Para elucidar tais afirmações, pretende-se apresentar alguns relatos de trabalhadores de saúde mental que elucidam a dureza do real do trabalho marcado pela loucura e pela esfera pública. Os dados foram obtidos a partir de pesquisa de dissertação (Magnus, 2009) realizada com trabalhadores de um hospital psiquiátrico público e que buscou compreender as implicações do processo de trabalho, em relação à subjetividade dos seus trabalhadores. Através da pré-pesquisa e dos encontros realizados com o grupo de profissionais que atuavam em unidades de internação de pacientes agudos, cujo perfil se modificou para usuários de drogas, mais especificamente, decrack foi possível perceber que estes trabalhadores se encontravam em um espaço do “entre”, ou seja, em um espaço de transição, que trouxe implicações importantes no processo de trabalho e de saúde.

Constata-se a falta de autonomia dos gestores da instituição que serve de desestímulo a todos.

U: Tu tenta até onde dá, mas também não tem muitos funcionários. A gente teve um retorno com colegas, a gente chamou, conversou (rede solidária) […] o que iria ajudar era mais funcionários, mas não depende de nós nem da direção […]

Os trabalhadores relatam que a sua entrada no hospital foi marcada pelo desconhecimento. O que delineia a dinâmica de trabalho na instituição.

V: […] As pessoas quando passam no concurso não sabem que é para trabalhar aqui […] é para onde tem necessidade, muitas quando sabem acabam até desistindo.

V: […] Olha uma coisa te digo, para trabalhar aqui tem que gostar muito, porque o salário não é bom, a gente chama de gorjeta. As condições de trabalho são ruins. Eu não sabia como era isso aqui.

Descrevem o quanto foi assustador e deprimente se deparar, quando ingressaram na instituição, com as patologias dos pacientes por não possuírem experiência prévia.

U: […] foi um pouco assustador porque disseram que eu trabalharia com crianças e adolescentes que eu já tinha experiência, mas quando cheguei a coordenadora me disse que não.

S: Eu nunca tinha trabalhado com este tipo de paciente, mas fui. Daí quando entrei fui direto trabalhar na enfermaria…era deprimente. Os pacientes ficavam sem roupa […]

U: Quando tu passa no concurso e vêm para cá, não têm treinamento, não ensinam como agir em caso de surto, socorro. Tu entra como se tivesse muita experiência.

Z: Eu quase não agüentei no estágio probatório (primeiros seis meses), até adoeci , fui à coordenadora e tive apoio. Ela viu que eu estava no limite, daí fiz rodízio nas unidades.

Quanto às condições de trabalho no hospital, fica evidente o sucateamento dos recursos, o que faz com que em muitas situações os trabalhadores contem apenas com a sorte na resolução dos problemas.

S: Quando trabalhei na ala masculina tivemos sorte, ligamos para o médico e ele desceu correndo (caso de parada cardíaca). Mas as máscaras não se adaptavam ao massageador, dois enfermeiros massagearam (manualmente) e conseguiram ainda bem que poucos pacientes viram […].

U: É um desgaste físico e mental.

S: Nós temos que ter um carro de parada cardíaca. Estamos batalhando e ainda não conseguimos […].

U: Se só agora é que trocaram as lâmpadas da unidade […] depois de 7 anos queimadas […].

Segundo os trabalhadores, os enfrentamentos das situações que estão alicerçadas na proteção política, são improdutivos, pois só geram retaliações e desgastes profissionais e pessoais.

U: Não dá para peitar. A questão é que muita gente questiona porque não se enfrenta […] Ela (colega) tem as costas quentes. Te manda para Itapuã (Hospital Colônia Itapuã em Viamão). Vai peitar para quê? Vai peitar, mas por questões políticas, tu vai para a geladeira, freezer, incinerador […] Quanto menos falar melhor.

Z: […] se tu vai peitar, tu fica marcada. Isso não vai mudar porque as pessoas têm costas quentes. Tem coisas de manejo com pacientes, de inadequação total. Eles (colegas) pipocam em vários setores e depois vão para outras instituições. Te choca ainda, mas não muda […].

Um fator agravante em relação ao novo perfil dos pacientes atendidos nas unidades é o desconhecimento e/ou registro por parte dos trabalhadores de casos bem sucedidos em relação a usuários pesados de crack, o que também não se encontra em referências científicas sobre adição a drogas.

A grande mudança que ocorreu em relação ao perfil dos pacientes internados nas unidades, descaracterizou a patologia ou o sofrimento mental para, em sua maioria, usuários de  crack. Outra questão significativa foi em relação à diminuição da faixa etária, pois os pacientes que se apresentam ao serviço são bem mais jovens do que costumavam ser.

V: E só o que a gente tem agora é usuário de crack.

Y: Nossa população está repleta de gurizada, antes não era assim […] Inverteu, agora a regra é internar novo, a exceção são os mais velhos.

T: É em função das drogas, do crack.

U: A gente tá atendendo muita “craqueirinha” (usuária de crack) […] Mas os plantadores do interior também estão usando bastante droga […].

Os fracassos repetitivos em relação à continuidade do tratamento, após a agudização, fazem com que os profissionais assistam à degradação física e psicológica dos pacientes. Essa realidade está bem presente no discurso dos trabalhadores:

U: […] às vezes tu vê uma guria bonita que se perdeu. A gente aposta, tu conversa, passa a fissura, elas ficam bem conscientes. Daqui a três ou quatro meses estão de volta, cada volta é pior, voltam das recaídas mais enfraquecidas. Tu vê na equipe […] o psiquiatra que não aposta, que desacredita […] e como é que tu vai atender desacreditando na capacidade de inserção?

Z: Eu também pensava em trabalhar com crianças porque a gente ainda pode modificar alguma coisa, alterar o padrão, daí o prognóstico é melhor, tu vê acontecer. Sou um pouco impaciente, de querer ver outras coisas.

A questão do retorno sistemático dos pacientes, em função do crack, torna o trabalho sem fim, semelhante ao Mito de Sísifo, repetitivo e interminável, uma vez que o produto final fica cada vez menos palpável.

Y: […] Tu vê que eles (pacientes) saem, mas voltam depois de três, quatro meses. O uso de drogas e uma rede de apoio e tratamento que não se sustentam, no meu entender, são as causas dos retornos sistemáticos, o nosso trabalho nunca acaba […].

O trabalho em saúde mental coloca em xeque a questão do poder e do saber no cotidiano do trabalho nas unidades. Quando esse saber/poder é colocado em funcionamento, o paciente perde a sua verdade internalizada, ou seja, perde a possibilidade de exercitar o seu desejo.

Entender que o paciente poderá ter desejos que diferem dos da equipe provoca frustrações, mas também gera algumas reflexões.

U: […] são limitações do desejo deles também. Tem pacientes que desejam ficar na rua, não adianta, tem que trabalhar em cima da realidade da pessoa, muitas vezes o paciente quer viver na rua, fazer o quê? […]

A questão do individualismo associado à desesperança e a forma pela qual o trabalho está organizado acaba por enfraquecer a força do grupo, desmobilizando e despotencializando possíveis conquistas para os trabalhadores.

Nardi (2006) aponta para um individualismo social que se sobrepõe à solidariedade. Trata-se de um individualismo solitário, que vem permeando a sociedade de um modo difuso, que assume expressões especiais no mundo do trabalho. Conforme marca a fala a seguir.

Y: […] Não adianta tu lutar […] a gente fica de bode (expiatório) […] não melhora nada, ninguém ajuda. A gente viu que não vai melhorar mesmo.

E: É, não vai ter muita melhora […].

A frustração acaba por conduzir ainda mais as relações para o âmbito individual.

Y: Eu desisti […] Tu querer unir é utopia. Quando tu bota muita energia, tu bota afeto […].

T: […] Tu investe afeto e depois se decepciona. Tu tenta melhorar, mas a coisa morre […] agora faço só o meu trabalho […].

X: […] a falta de união entre as categorias então […] é bem diferente dos médicos […] Eu acho que é falta de motivação […] agora só quero fazer o arroz com feijão bem temperadinhos, não me importo mais muito com o resto.

Ocorre que no hospital o sofrimento é banalizado, em todas as direções, de forma a ser aceito pelos trabalhadores como inerente à sua própria atividade no campo da saúde mental. O que acarreta uma postura mais passiva diante da possibilidade de mudança em relação ao seu sofrimento, ao dos colegas e dos pacientes.

Percebe-se que o sofrimento está muito presente no cotidiano de trabalho e, também, na história da instituição.

V: […] às vezes a gente sai tonta daqui. Quando fogem (pacientes) sobra para todo mundo, e isto ocorre normalmente. Às vezes elas brigam entre elas.

X: O 1º ECT (eletroconvulsoterapia) que a gente assiste a gente nunca esquece. É muito chocante […]. Botam pano na boca […]quando a gente sai daqui quer um vento no rosto […] imagina no lugar do paciente […].

V: Às vezes eu xingo todo mundo, eu viajo..meus filhos acham horrível (o trabalho) […].

U: […] Quanto ao sofrimento, a gente não vê o nosso só o do paciente. Vi uma residente que se desorganizou, a idéia dela era uma e quase surtou porque viu que na prática não era assim, que a rede não dá conta e começou a acreditar no hospital.

V: É, realmente se tu não tiver muita vontade de trabalhar, tu não vem, porque motivo não falta. Quando chega o horário de ir embora quero sair logo, no outro dia volto, mas naquela hora o que eu mais quero é sair.

Para penetrar no campo da relação trabalho-saúde mental, é necessário considerar as “relações sociais” e articular um modelo de funcionamento psíquico que não seja o ocupado apenas pela normalidade, mas, também, pela loucura. Entendendo assim que a dita normalidade dos comportamentos não implica em ausência de sofrimento. Vale lembrar, ainda, que o sofrimento não exclui o prazer, o que assinala uma lógica de coabitação, entre esses elementos, transformando o trabalho em um campo ainda mais complexo.

Mas como afirma Dejours (1999), os trabalhadores são as pessoas mais indicadas para encontrar as soluções e oferecer sugestões para transformar a organização do trabalho. Pois se estes conseguirem entender melhor os dados da situação em que enfrentam, eles mesmos terão ideias, a partir dos coletivos de como transformar a organização do trabalho. E essa é a grande aposta no sentido de gerar mudanças que sejam realmente efetivas e produtoras de significado, que permitam produzir saúde mental aos próprios servidores e pacientes.

Para finalizar, vale lembrar de que é na possibilidade de deslocar os constrangimentos, os limites do real por estratégias, pela mobilização da inteligência, que a saúde e o prazer podem ser conquistados, mesmo que de forma instável. Pois, como afirma Dejours (2008), saúde e prazer estão sempre por serem conquistados, nunca são definitivamente adquiridos. Esta deve ser uma conquista de todos os trabalhadores, mas de forma particular e especial, dos profissionais de saúde mental: que parem de rolar apenas pedras e que possam construirenfim saúde.

 

Referências:

CAMUS, Albert. O Mito de Sísifo, ensaio sobre o absurdo. Lisboa, livros do Brasil, 2004.

DEJOURS, Christophe. Conferências Brasileiras: Identidade, Reconhecimento e Transgressão no Trabalho. São Paulo: Fundap, 1999.

______; MOLINIER, Pascal. O trabalho como enigma. In: LANCMAN, S.; SZNELWAR, L. I. Christophe Dejours: Da Psicopatologia à Psicodinâmica do Trabalho. Rio de Janeiro: Fiocruz. Brasília: Paralelo, 2008.

MAGNUS, Cláudia de Negreiros. Sob o peso dos grilhões: um estudo sobre a Psicodinâmica do Trabalho em um Hospital psiquiátrico Público. 2009. 275 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social e Institucional) – Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, Universidade Federal do Rio Grande do Sul [2009].

NARDI, Henrique C. Ética, Trabalho e Subjetividade. Porto Alegre: UFRGS, 2006.

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