Além da Sala de Aula: uma forma personalizada de ensinar

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Acredita-se que as relações interpessoais interferem na maneira como o aluno interage com o professor e com os colegas, de modo que o professor não deve somente saber o conteúdo que vai transmitir, mas além disso, deve ter capacidade de saber lidar com seus alunos e ser aceito por eles.

O filme “Além da Sala de Aula” é de origem norte-americana e conta a história, baseada em fatos reais, de Stacey Bess. Desde muito pequena Stacey demonstrou desejo de se tornar professora. Ainda recém formada, foi convidada para lecionar em uma escola-abrigo para pessoas sem teto e no primeiro dia de aula, a professora foi bem vestida,de salto, blazer e ao chegar na escola se deparou um uma situação que jamais imaginara. Stacey foi contratada para dar aula em uma sala onde não havia livros, cheia de sucatas, crianças em diferentes idades, má alimentação, poucos recursos e ainda teve que lidar com os furtos do que ainda lhe restara.

Stacey pensou em desistir, mas ao conhecer um pouco mais das crianças, resolveu buscar recursos para a escola. Sem sucesso, ela compra alguns materiais para tornar o ambiente mais agradável. Então, a professora faz uma reforma na sala, pinta as paredes, coloca jarros de flores, dois painéis coloridos para usar como mural e nos dias seguintes passou a distribuir comida para as crianças se alimentarem e conseguirem prestar atenção na aula. Mas ainda percebeu que precisava da colaboração dos pais para que se tornasse efetiva a aprendizagem das crianças. Stacey marcou uma reunião e pediu a colaboração deles para substituir o uso da televisão por momentos de estudo com seus filhos. A proposta deu certo. Além disso, percebeu-se que houve um vínculo professor-aluno pois ela recebia lembrancinha, as crianças lhe respeitava na sala de aula e chegaram a ir visitá-la quando sua filha nasceu.

Segundo Patto (1997), por muito tempo as relações interpessoais no contexto da educação não era concebida como importante nesse processo, pois nenhuma delas propuseram tentativas de sistematizar e explicar o indivíduo através dessa perspectiva, ou seja, é um tema recente de estudos. No entanto, acredita-se que as relações interpessoais interferem na maneira como o aluno interage com o professor e com os colegas, de modo que o professor não deve somente saber o conteúdo que vai transmitir, mas além disso, deve ter capacidade de saber lidar com seus alunos e ser aceito por eles, ou seja, o educador precisa conhecer sua significação para o educando. (LEITE, 1991).

Nessa interação, o professor dificilmente consegue atuar com neutralidade, e suas práticas ressaltam a simpatia e antipatia. O primeiro refere-se à interpretação favorável do comportamento da pessoa por quem nos simpatizamos e ,assim, o professor passa a agir de acordo com essa interpretação. O segundo, por sua vez, se estabelece em uma situação de interação constante que se intensifica e pode afastar o professor do aluno ou entrar em conflito direto entre si. Essa relação é intensificada onde os bons alunos tendem a ser cada vez melhores e os alunos com atitudes desprezadas pelo professor tendem a agir mais frequente com esse tipo de comportamento (LEITE, 1991) .

A professora Stacey conseguiu manter essa neutralidade e estabelecer relação de respeito mútuo, mas foi possível perceber em um momento, por exemplo, que um dos alunos agrediu o outro quando a professora agradeceu o presente que havia recebido. Essa cena evidencia que não só a interação com o professor fica comprometida, mas pode gerar desentendimentos entre os colegas da turma.

Assim, Tacca e Branco (2008, p. 40-41) afirmam que é importante tentar compreender processos de significação, a fim de que se conheça quais as dinâmicas que, na relação professor e aluno, interferem no processo de aprendizagem. Dessa forma, é necessário mobilizar positivamente e com foco nas atividades escolares e nos objetivos educacionais, as emoções, necessidades e pensamento, tanto de alunos como de seus professores, pois acredita-se que fazendo assim, haverá diminuição da possibilidade de que os processos de significação sejam desviados, e impede que os sujeitos sejam afastados de uma participação comprometida com sua própria aprendizagem e desenvolvimento.

Esse tema é importante pois é difícil manter a neutralidade diante dos alunos que atrapalham a aula, não participam das atividades propostas, nem executam os trabalhos com esmero em comparação aos alunos que além de ter responsabilidade com sua própria aprendizagem, têm respeito pelo professor e colegas. Nesse caso, é mais fácil culpar a criança do que perceber as significações que o professor tem de seus alunos. Isso é constantemente é percebido no cotidiano, seja na forma como fala, nas vantagens que dá a alguns, na atenção que o professor dá no momento em que o “bom aluno” fala, nos elogios ou nas broncas direcionadas à pessoa em público, entre outros. Essa interação pode acarretar em uma não aprendizagem e até mesmo em problemas psicológicos como: baixa auto-estima, crenças distorcidas sobre si, etc.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

Diretor: Jeff Bleckner
Elenco: Emily VanCamp, Treat Williams, Steve Talley, Timothy Busfield; 
Gênero: Drama
País: EUA
Ano: 2011

REFERÊNCIAS:

LEITE, D.M. Educação e Relações Interpessoais. In: PATTO, M. H. S (org). Introdução à Psicologia Escolar. São Paulo: T.A Queiroz, 1991.

PATTO, M.H.S. Parte III- A interação Professor-Aluno. In: PATTO, M.H.S (org). Introdução à Psicologia Escolar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.

TACCA, M.C.V.R; BRANCO, A.U. Processos de significação na relação professor-alunos: uma perspectiva sociocultural construtivista. Estudos de Psicologia, n.13, v.1, p. 39-48, 2008.

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“De encontro com a vida” e os desafios de um quase cego

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O filme alemão “De Encontro com a Vida” conta a história de Saliya (Kostja Ullmann), o qual recebeu um terrível diagnóstico quando estava prestes a terminar os estudos. Certo dia, ao se deparar com a percepção de manchas em seu campo visual que foram aparecendo progressivamente, o jovem precisou buscar ajuda para entender o que estava atrapalhando sua visão e por que enxergava tudo embaçado.

Após vários exames, Saliya descobriu que sofria uma doença hereditária grave a qual causou um descolamento da sua retina em um curto período e que perdeu 80% da sua capacidade visual. Além disso, seu nervo óptico sofreu danos e ficou impossibilitado de transmitir impulsos. A única alternativa foi fazer uma cirurgia, a qual não lhe garantia a cura, mas era a opção mais viável para que ele não ficasse totalmente cego. Feito o procedimento cirúrgico, o rapaz pôde enxergar com apenas 5% da capacidade total.

Desde o início Saliya teve o apoio da mãe e da irmã, a qual lhe ajudou a dar os primeiros passos no enfrentamento dos novos obstáculos. O pai de Saliya sempre demonstrou menosprezo em relação ao filho e agora ainda mais, diante do factível fracasso por não conseguir enxergar, pois “há uma tendência cultural da pessoa vidente considerar este indivíduo como limitado, e, consequentemente, incapaz ou deficiente” (LIRA; SCHILINDWEIN, p.176, 2009). Dessa forma, propôs que o jovem mudasse para uma escola especial, já que ele não era mais uma pessoa “normal”, todavia Saliya estava determinado a continuar, pelo pouco tempo que restava e em razão do sonho de posteriormente estudar gerenciamento de hotéis.

Fonte: encurtador.com.br/luz19

Como a visão de Saliya estava comprometida e considerando que “o organismo dispõe de outras vias que podem suprir ou complementar a via visual” (LIRA; SCHLINDWEIN, p. 173, 2008), ele buscou aprimorar outros sentidos. Todavia, vale ressaltar que para Vigotski (1997, p. 107) a pessoa com deficiência visual não tem sua fonte compensatória no “desenvolvimento do tato ou a maior sutileza do ouvido, mas a linguagem, quer dizer, a utilização da experiência social, a comunicação com os videntes”, o que contraria a perspectiva permeada pelo senso comum. Talvez a dificuldade de Saliya seria muito maior se ele não pudesse contar com sua notável capacidade de memorização, a qual lhe permitia aprender mais facilmente por lembrar-se dos sons, das texturas dos objetos, das falas que ele repetia para si e do cheiro das coisas.

Felizmente o jovem conseguiu a aprovação com exímios resultados e então começou a se candidatar para vagas de aprendiz nos vários hotéis da região, no entanto não era admitido devido à sua deficiência, o que corrobora com a ideia de Lira e Schlindwein (2008), de que ao longo da história, pessoas consideradas “deficientes” e com diferenças visuais como a cegueira, viveram um árduo processo marcado por desvalorização e exclusão social, mas é possível perceber que apesar dos progressos, ainda há muito preconceito. As pessoas duvidavam da sua capacidade. E quando já não havia mais oportunidades, Saliya resolveu tentar novamente, só que dessa vez ele não contou que era praticamente cego e a vaga era em um dos maiores hotéis em Munique.

A irmã de Saliya treinou o rapaz para enfrentar a entrevista de seleção e dava dicas para que seu problema não ficasse tão evidente. Umas das táticas utilizadas era contar os passos e memorizar as direções (direita/esquerda), isso evitava que ele se perdesse ou se acidentasse.

Fonte: encurtador.com.br/kyFMO

No dia de sua entrevista, o rapaz encontrou Max (Jacob Matschenz), o qual se tornou seu parceiro e grande amigo. Max parecia ser de classe média/alta, buscava emprego porque havia reprovado na faculdade duas vezes e seu pai retirou sua mesada. Ele percebeu que havia algo de errado com Saliya, mas só depois descobriu qual era o problema.

Eles precisaram passar por vários módulos nos mais diferentes setores do hotel: serviço de quarto, recepção, cozinha e bar. Apesar de contar com a ajuda do amigo, Saliya passou por alguns constrangimentos e até acidentes no trabalho. Na ocasião, ele estava atuando como auxiliar de cozinha e sofreu um corte no dedo ao manusear uma máquina.

Aos poucos, as pessoas iam percebendo e ao ser interrogado, Saliya confessava sua deficiência. A cada dia aumentava o número de pessoas que davam suporte nas dificuldades do rapaz e o ajudavam a desempenhar um trabalho de qualidade, que tanto era cobrado naquele hotel. Nesse período, o rapaz conheceu Laura (Anna Maria Muhe) uma mulher loira por quem apaixonou-se. Os dois tiveram um romance, mas para ela, Saliya ainda mantinha o segredo.

Fonte: encurtador.com.br/efMQX

Em dado momento, ao visitar a família, foi informado de que seu pai havia lhes abandonado e tirou todo o dinheiro que sua mãe e irmã ainda possuíam. Dessa forma, o rapaz se sentiu-se mais pressionado a cuidar delas e suprir as necessidades enquanto sua mãe procurava emprego. Para aguentar a responsabilidade que assumira e as pressões que sofria durante seu treinamento no hotel, o jovem passou a usar drogas e fazer uso de bebidas alcoólicas o que afetou o seu desempenho nas atividades pois ele tornou-se mais impulsivo e perdia o controle daquilo que estava fazendo.

Certo dia, Saliya se propôs a cuidar do filho de Laura no parque enquanto ela resolvia alguma coisa, mas o menino havia saído de perto do jovem e já não respondia mais quando ele chamava. Saliya entrou em desespero quando percebeu que o menino de 5 anos havia desaparecido. Ao chegar, a mãe do menino pediu que ele ajudasse a procurar, foi então que ele confessou que não podia enxergar. A moça ficou inconformada por ter deixado seu filho sob os cuidados de uma pessoa “cega” e principalmente por não ter tido conhecimento disto antes.

O auge do descontrole se deu porque Saliya havia esquecido que estava escalado para trabalhar em um casamento que ocorreu no restaurante do hotel, mas a sua sorte foi que o atraso não foi notado pelo supervisor. Durante a festa, ao se direcionar para servir os convidados, Saliya tropeçou e derrubou a bandeja quebrando todas as taças ao cair no chão e foi duramente repreendido.

Fonte: encurtador.com.br/BGIOV

Mesmo com o pedido de Max para que ele se ausentasse do serviço e não causasse mais estrago porque estava sob efeito da droga Saliya resolveu continuar, até que pior aconteceu: o jovem esbarrou no bolo e o destruiu por completo causando o maior transtorno na festa. Como resultado, ele seria impedido de fazer o teste final para receber o diploma. Diante do fracasso, Saliya resolveu sair e ficou bêbado a ponto de ser expulso da casa de shows. No caminho de casa caiu de uma escada, ficou ferido e foi socorrido por pessoas que passavam pelo local sendo levado ao hospital.

No hospital, o jovem soube que sua mãe conseguiu emprego e não corria mais risco de perder a casa. Apesar da boa notícia, Saliya estava muito decepcionado com tudo o que lhe ocorrera chegando à conclusão de que não poderia mais lutar contra sua deficiência, e se os hotéis não lhe quisessem, ele iria trabalhar com outra coisa que estivesse dentro de suas condições especiais. O rapaz chegou a visitar uma empresa que oferecia benefícios às pessoas nessa condição, mas não era o que ele gostaria de fazer.

Max encontrou uma maneira de encorajar Saliya, o qual decidiu tentar mais uma vez ao falar com os responsáveis que fariam o teste e pedir que lhes dessem uma última chance de alcançar aquilo que tanto almejava: “A partir de agora vou assumir quem eu sou: um cara que não consegue nada sem os amigos, um cara que está sempre precisando de ajuda por que não consegue enxergar quase nada”. Os supervisores ainda sem acreditar que seria possível, concedeu o direito do jovem de participar do teste.

Fonte: encurtador.com.br/lnwOW

Saliya estava diante da sua maior dificuldade que era pôr a mesa num tempo hábil, com talheres, copos taças e pratos bem posicionados. Com a ajuda de Max, eles estudaram e treinaram bastante e finalmente conseguiram a tão esperada aprovação e o diploma. É importante compreender que “ao assumirem papéis sociais mais visíveis, mais atuantes, a marca da diferença deixa de ser negativa e passa a ser uma característica que define espaços de atuação e valoração” (LIRA; SCHLINDWEIN, p.188, 2008), assim, o jovem fez as pazes com Laura e recebeu uma proposta de emprego no restaurante do seu supervisor, o qual o elogiou por ter um excelente “nariz” para os vinhos.

A ideia do filme foi muito clara e coerente na lição que quis transmitir: de superação, determinação e coragem. Também, percebe-se que para Saliya, o aprendizado mais significativo foi a importância da amizade quando disse: “Se quiser ir rápido, ande sozinho! Mas se quiser ir longe, vá bem acompanhado! E Eu sempre gostei de distância…”.

Estar disposto a ir atrás de seus sonhos não é uma tarefa fácil para a maioria das pessoas, mas Saliya mostrou que mesmo diante do preconceito e de todas as dificuldades inerentes à vida, é possível alcançar aquilo que você deseja. Para isso é importante que você realmente queira e faça acontecer.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

DE ENCONTRO COM A VIDA

Título original: Mit Dem Leben
Direção: Marc Rothemund
Elenco: Kostja Ullmann, Jacob Matschenz, Anna Maria Mühe
País: Alemanha
Ano: 2018
Gênero: Comédia, Romance

REFERÊNCIAS

LIRA, M. C. F de; SCHLINDWEIN, L. M. A Pessoa Cega e a Inclusão: Um Olhar a Partir da Psicologia Histórico-Cultural. Cad. Cedes, Campinas, vol. 28, n. 75, p. 171-190, maio/ago. 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v28n75/v28n75a03.pdf. Acesso em 01 de maio de 2019.

VYGOTSKI, L.S. Obras escogidas: V. Fundamentos de Defectologia. Madrid: Visor, 1997.

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Acadêmicos de Intervenção em Grupos montam plano de ação junto aos profissionais do IFTO

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Na manhã desta quarta-feira (27/02), acadêmicos da Disciplina de Intervenção em Grupos do curso de Psicologia do CEULP/ULBRA, juntamente com a professora Me. Rosângela Veloso Morbeck, se reuniram no Instituto Federal do Tocantins (IFTO) – Campus Palmas, para discutir sobre a proposta de intervenção, planejamento e organização dos grupos, bem como a definição das turmas do Ensino Médio que participarão do projeto em parceria com profissionais que atuam no Instituto.

O objetivo da disciplina é intervir através de grupos operativos, por meio de encontros semanais, com aproximadamente 10 sessões, no decorrer do primeiro semestre de 2019. Ao final do trabalho com os grupos espera-se que haja uma modificação de estruturas estereotipadas, das dificuldades de aprendizagem e comunicação, fruto de ansiedades despertadas pela mudança. Tal mobilização é terapêutica e os grupos operativos são terapêuticos por promoverem mudanças nos indivíduos que os compõem.

Na reunião estiveram presentes Lowlou Hibrahim Elias (Coordenadora do Ensino Profissional Integrado ao Ensino Médio do IFTO), Tânia Santana (Assistente Social do IFTO), Jaqueline Pilger (Orientadora educacional do IFTO), Tereza Kikuchi do Vale (Técnica em Assuntos Educacionais do IFTO) e Maria Elisa Ribeiro (Psicóloga do IFTO). Foram levantadas as demandas de cunho Psicológico e possíveis temáticas a serem abordadas durante as sessões com grupos.

As profissionais receberam os acadêmicos com muito entusiasmo. Além disso, acreditam na capacidade desses Psicólogos em formação de promover saúde mental e melhorar a qualidade de vida dos alunos do Ensino Médio do Instituto Federal do Tocantins- Campus Palmas.

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Técnicas de Persuasão em ‘A Revolução dos Bichos’

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Para a persuasão ser efetiva é necessário prestar atenção à mensagem, compreendê-la, acreditar nela, lembrar-se dela e comportar-se de acordo.

No livro “A revolução dos Bichos”, George Orwell (2000) conta a história da Granja do Solar em que o Sr. Jones era proprietário. Certo dia o porco por nome de Major resolveu fazer uma reunião com todos os bichos da fazenda para contar-lhes o sonho que tivera e dessa forma deixar um ensinamento que por muito tempo imperou na granja, no entanto, nem mesmo os líderes estavam cumprindo o combinado.

Ao ler o livro, percebemos nitidamente a forma como o Major utilizou a persuasão e como os seus argumentos se perpetuaram mesmo depois de sua morte, uma vez que, foi repassada para os outros porcos a missão de persuadir os animais da fazenda e convencê-los de que “Quatro patas bom, duas patas ruim”.

De acordo com Myers (2014, p.28), a Psicologia social

é uma ciência que estuda as influências de nossas situações, com especial atenção a como vemos e afetamos uns aos outros. Mais precisamente, ela é o estudo científico de como as pessoas pensam, influenciam e se relacionam umas com as outras.

Fonte: https://bit.ly/2GxsEWO

Na disciplina de Psicologia Social, estudamos a ciência da persuasão e como ela se materializa no nosso cotidiano. Assim, aprendemos que essa técnica faz parte de um processo no qual a meta é a mudança de comportamento e existem várias formas de se persuadir alguém, basta utilizar as estratégias (MYERS,2014).

Para a persuasão ser efetiva é necessário prestar atenção à mensagem, compreendê-la, acreditar nela, lembrar-se dela e comportar-se de acordo. O Major utilizou muito bem os elementos que a compõem, ou seja, ele foi o comunicador (Um dos integrantes da granja, o mais velho de todos, introduziu um assunto de interesse coletivo) e por ser experiente os outros animais acabaram dando atenção ao que ele tinha para dizer.

Além disso, Major expôs o conteúdo da mensagem utilizando apelos bilaterais. Dessa forma, ele falava a respeito de como eles estavam vivendo e como seria a vida após a revolução. O porco transmitiu a mensagem por meio de um discurso ao vivo expondo o seu descontentamento com o fato de trabalharem muito e terem pouca recompensa por isso, como se fossem explorados pelos humanos.

Fonte: encurtador.com.br/nAJKW

O público a quem ele se direcionou era composto pelos mesmos animais com quem convivia, então a identificação com os ouvintes tornou a persuasão mais fácil para os líderes da granja que os chamavam de camaradas evidenciando maior proximidade.

Mesmo após a morte do Major, Napoleão e Bola- de- neve continuaram na liderança, já que eram mais inteligentes e por saberem ler, deveriam assumir o controle. Dessa forma, podemos perceber que no discorrer na narrativa, houve momentos em que alguns animais começaram a questionar a cessão de benefícios para os porcos, por exemplo: a distribuição do leite e das maças que pouco tempo depois ficaram sob o domínio dos porcos.

Ao analisar o trecho

‘Camaradas’, conclamou Garganta. ‘Não imaginais, suponho, que nós, os porcos, fazemos isso por espírito de egoísmo e privilégio. Muitos de nós até nem gostamos de leite e de maçã. Eu, por exemplo, não gosto. Nosso único objetivo ao ingerir essas coisas é preservar a saúde. O leite e a maçã (está provado pela ciência, camaradas) contêm substâncias absolutamente necessárias à saúde dos porcos. Nós, porcos, somos trabalhadores intelectuais. A organização e a direção desta granja dependem de nós. Dia e noite velamos pelo vosso bem-estar. É por vossa causa que bebemos aquele leite e comemos aquelas maçãs. Sabeis o que sucederia se os porcos falhassem em sua missão? Jones voltaria! Sim, Jones voltaria! Com toda a certeza, camaradas’, gritou Garganta, quase suplicante, dando pulinhos de um lado para o outro e sacudindo o rabicho, ‘com toda a certeza, não há dentre vós quem queira Jones de volta’ (ORWELL,2000, p.38).

Fonte: encurtador.com.br/akT05

Podemos perceber que existem vários elementos persuasivos os quais utilizam algumas das técnicas para uma persuasão eficaz, por exemplo:

– Estratégia de falar contra si próprio para convencer acerca de uma causa: “Eu, por exemplo, não gosto (de maçã)”.

– Uso de argumentos científicos/racionais para persuadir: “Nosso único objetivo é preservar a saúde. O leite e a maçã (está provado pela ciência, camaradas) contêm substâncias(…)”

– Usar terminologias que aproximem o comunicador do público/ouvinte, por exemplo o uso da expressão “Camaradas”.

– Uso da emoção para persuadir, no caso do medo no trecho “Sabeis o que sucederia de os falhassem em sua missão? Jones votaria!”

Também, pode-se perceber que a ideia de escrever bem grande os mandamentos dos animais serviu para lembrar constantemente do compromisso que havia sido feito no início da revolução. Isso alimentava ainda mais a ideia de que realmente a granja sob os comandos do Sr. Jones era muito pior e que sendo eles mesmos os donos dos próprios negócios teriam mais liberdade, menos trabalho e mais comida.

 Com base nesses aspectos, percebe-se que os porcos utilizaram mais a rota central da persuasão, onde havia foco em relação aos argumentos que eram transmitidos com muita firmeza e uma reflexão acerca de como eles estavam vivendo e o quanto a revolução melhoraria a vida dos animais de modo geral.

Fonte: encurtador.com.br/wBV67

Referências

MYERS, D. G. Psicologia Social. Porto Alegre: Artmed, 2014.

MYERS, D. G. Persuasão. Em: MYERS, D. G. Psicologia Social. Porto Alegre: Artmed, 2014.

ORWELL, George. A revolução dos bichos. Fonte Digital: <http://www.jahr.org> 2000.

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Uma análise das dificuldades de percepção auditiva sob a perspectiva da Gestalt

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O presente texto tem por finalidade apresentar o caso de Juliana e Ana, bem como traçar uma discussão a respeito das principais dificuldades de pessoas com percepção auditiva reduzida ou ausente, além dos conceitos da abordagem Gestalt que têm relação com estes casos.

Em geral, considera-se a dificuldade de aprendizagem uma constelação de fatores de ordem pessoal, familiar, emocional, pedagógica e social. Também, pode ser problema neurológico que afeta a capacidade de cérebro para entender, recordar ou comunicar informações (SMITH, 2007).

Ao observar a Gestalt nas situações que norteiam a vida daqueles que têm dificuldade ou ausência da percepção auditiva, questiona-se a respeito da efetividade dessa abordagem nesses casos. Assim, a partir dos estudos realizados, conclui-se que há evidências de que essa abordagem é eficaz, além da fácil compreensão dos conceitos característicos da mesma em relação à aprendizagem dessas pessoas.

A seguir, é apresentado a descrição do caso considerando a teoria da Gestalt para análise teórica e por fim são apresentadas estratégias e técnicas para o aprimoramento da aprendizagem tanto no âmbito acadêmico quanto social.

GESTALT E SUA TEORIA DA APRENDIZAGEM

Fonte: encurtador.com.br/dvBER

A Gestalt foi criada pelos psicólogos alemães Max Wertheimer, Wolfgang Köhler e Kurt Koffka. Teoria que afirma que o todo, é maior que a soma das partes. E o significado não vem da soma das partes, mas da capacidade humana de perceber sua organização o que se denomina por insight.

A Gestalt não era exatamente uma teoria de aprendizagem, mas uma teoria psicológica. O seu conceito teoria mais importante para o estudo da aprendizagem é o de “insight” – súbita percepção de relações entre elementos de uma situação problemática. Uma característica da aprendizagem por insight é que algumas situações são mais favoráveis do que outras na eliciação do insight. Com isso, em uma situação de ensino, caberia ao professor selecionar condições nas quais a aprendizagem por insight poderia ser facilitada: por exemplo, mostrar ao aluno que a solução de um problema alcançada por insight é facilmente aplicável a outros problemas (OSTERMANN, CAVALCANTI, 2010, p.17).

A visão gestaltista é de que a aprendizagem resulta na formação de traços de memória e a característica mais importante é que o material aprendido, como qualquer informação perceptual, tende a adquirir a melhor estrutura possível (prãgnaz) devido às leis da organização perceptual.

RELATOS DE CASOS

Os casos relatados a seguir são baseados em dados reais obtidos através uma entrevista com duas pessoas deficientes auditivas. Para tanto, foram utilizados nomes fictícios- Juliana e Ana.

Caso Juliana

 Juliana, uma moça de 22 anos, professora de Libras, que perdeu sua capacidade auditiva aos 7 meses de vida devido à uma doença chamada meningite e que começou a aprender libras aos 13 anos de idade.

Juliana relata que teve um processo de aprendizagem difícil pois seus professores não eram capacitados para lidar com surdos e, segundo ela, é difícil para o surdo compreender a linguagem escrita, algo completamente compreensível visto que Libras não é uma representação gestual do Português e tem estruturas de construção gramatical diferenciadas (Oliveira; Walter, 2016; Faria, 2011)

Juliana ainda cita que continua encontrando dificuldades em seu meio acadêmico pois faltam profissionais de libras e ainda quando existem, não são suficientes para o processo de inclusão do surdo. Além das escolas e universidades, Juliana fala da importância de intérpretes em locais públicos e privados pois saber libras é contribuir para o desenvolvimento dessa comunidade que, segundo o censo do IBGE em 2010, constitui 9,7 milhões de pessoas que têm deficiência auditiva; desses, 2.147.366 milhões apresentam deficiência auditiva severa, situação em que há uma perda entre 70 e 90 decibéis (dB). Cerca de um milhão são jovens até 19 anos.

Juliana relata sempre ter tido o apoio da família, mas que ela não é maioria. Nem todas as famílias, apesar de apoiarem, sabem como lidar com esse tipo de situação ou se informam e aprendem o suficiente para auxiliar seus filhos. Juliana mora em Araguaína e faz parte de um grupo de apoio chamado CIL – Central de Interpretação de Libras, que auxilia os surdos na comunicação durante atendimentos públicos, tem guia intérprete, encaminha os surdos para cursos, auxilia a respeito dos seus direitos garantidos em lei, dentre outras coisas.

Fonte: encurtador.com.br/bhjku

 Caso Ana

Ana, tem 21 anos, mora em Porto Nacional- TO, sua família mora em Palmas-TO, faz faculdade de Letras Libras e nasceu surda.

A entrevistada diz que, uma das suas maiores dificuldades é na área da saúde, já que vê como algo muito importante para o ser humano. E uma das barreiras que encontra é a falha de comunicação dos médicos com os surdos, e comenta que já recebeu medicamento errado por isso. Além disso, a não aceitação de um intérprete nessas consultas é outra limitação, e sugere então que, os profissionais na saúde aprendam a língua de sinais para que possam se comunicar com os surdos sem a necessidade de um intérprete.

Já na área acadêmica, ela diz não sentir tanta dificuldade e limitações, embora perceba que às vezes a comunicação não é muito clara, porque as pessoas não são fluentes em libras. Ela afirma que a ausência dessas dificuldades é devido ao curso que ela faz, que é de Letras e Libras, portanto as pessoas estão ali para serem capacitadas nisso e para evitar que outros surdos tenham que enfrentar essas e outras dificuldades.

Ana relata que não foi estimulada a aprender libras desde pequena, pois sua família não tinha conhecimento sobre o que era a língua de sinais. E embora algumas pessoas tentassem uma comunicação por meio de sinalização, ela não aceitava, achava estranho. Ao completar seus 13 anos, quando mudou para outra cidade, encontrou uma intérprete e outra pessoa surda, foram elas que conseguiram ter contato com Ana. A partir do momento em que começou a vê-las sinalizando é que se interessou por isso. Ela diz que oralizava quando criança, mas quando viu essas duas pessoas sinalizando, se identificou mais com a língua de sinais. Portanto, hoje ela é acadêmica do curso de Letras Libras e futura professora de língua de sinais.

Quanto a sua família, Ana percebe que eles sentem orgulho por ela ser surda. Percebe que eles compreendem as falhas que ela têm, mas que confiam nela e sabem que é capaz. Afirma que a família a estimula e dá liberdade para que ela sozinha possa aprender e ter conhecimento de mundo. Compreende que a família a ensinou muito, mas que ela foi atrás de complementos para sua própria aprendizagem.

Ana afirma que os surdos são diferentes entre si. A maioria das famílias de surdos possuem uma mente muito fechada, muitas dificuldades: não confiam; não acreditam nas capacidades do surdo; e são como uma prisão para eles, assim não dando liberdade para que possam sozinhos conhecer o mundo. Por isso há muitos surdos doentes (depressivos), pois estão presos pela própria família.

Existem diversos grupos de surdos, explica Ana. São eles grupos sociais, que combinam de ir para festas, praia, reuniões em casas de amigos. Mas também existem os grupos das instituições de apoio, como: a associação de surdos, CRAS, igrejas, faculdades, entre outros.

Segundo Ana, o maior vilão é na área da saúde, pois ainda vê que a barreira de comunicação é muito grande. Portanto, Ana deixa essa mensagem: “O que eu desejo, o que eu quero, é que vocês tenham essa consciência de aprender…de deixar o intérprete. E caso não queiram a presença do intérprete, que sejam fluentes em língua de sinais, que aprendam a língua de sinais, mas que não seja algo básico, que sejam fluentes para que a gente possa se sentir…ter uma auto-estima maior.”

Fonte: encurtador.com.br/uxAMZ

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

A percepção auditiva, por mais que não seja publicamente difundida é algo intrínseco a todo ser humano e necessita, portanto, de um breve resumo com o objetivo de que sua essência possa ser devidamente absorvida. Desta forma, Buriti e Rosa (2014), em um estudo sobre percepção auditiva em escolares com dislexia, afirmam que a percepção auditiva ocorre por que as células sensíveis a um determinado estímulo- chamada de células receptoras- dão início ao processamento de um sinal acústico audível.

Assim, compreende-se a percepção auditiva como a capacidade que o ser humano possui para compreender os estímulos sonoros externos, ou seja, é a capacidade de interpretar os sons, sendo que, assim como quase tudo na vida, existem os casos de deficiência ou deformidades que impedem o bom funcionamento de determinado órgão, o que sugere uma hipótese neurológica ou neurogênica.

No caso em questão, trata-se da dificuldade na percepção auditiva, que ocorre quando não há um bom funcionamento no processamento de um sinal acústico, que terá por consequência uma má interpretação da mensagem recebida, não absorção do conteúdo, levando até mesmo na confusão de comandos, dessa forma a interpretação errônea do que foi previamente designado.

A deficiência na percepção auditiva pode ter várias causas: hereditária (quando a criança herda um gene defeituoso de um ou ambos os pais), acidente (ocorre durante a concepção da criança ou em qualquer outra ocasião que cause lesões cerebrais), erros no desenvolvimento cerebral (disfunção no processo de desenvolvimento da pessoa, impossibilitando assim, sua completa e perfeita função neurológica) e desequilíbrios neuroquímicos (decorrente do desequilíbrio químico cerebral, ocasionado pela injeção de tóxicos no corpo, como álcool, cocaína e outras substâncias nocivas).

Apesar de pouco conhecidas, existem não só dificuldades, mas também padrões gerais para sua identificação, seja pelo esforço e concentração durante uma oração (virar a cabeça para que “a mensagem penetre o cérebro”); prefere ler uma notícia a ter que assistir o jornal; ler um livro a ver um filme; possui dificuldades de distinguir sons; tem facilidade na compreensão visual; possui pouco interesse musical.

Fonte: encurtador.com.br/qORT4

Em detrimento dos fatos narrados, ocorrem as dificuldades de socialização e aprendizado, de acordo com Smith (2007), a compreensão sobre a temática não é de conhecimento geral, sendo que, em sua grande maioria, até mesmo entre profissionais da educação, ocorre um pré-conceito sobre um aluno, tratando-o como menos capaz ou de menor capacidade cognitiva, conforme se observa: “Ano após ano, muitos desses jovens são erroneamente classificados como tendo baixa inteligência, insolência ou preguiça. Eles são constantemente instados, por adultos ansiosos e preocupados com seu desempenho acadêmico, a corrigirem-se ou a esforçarem-se” (SMITH, 2007, p.14).

É importante ressaltar que as crianças que possuem dificuldades na percepção auditiva geralmente são invisibilizadas socialmente tanto dentro do âmbito escolar quanto familiar. As dificuldades podem gerar novos mecanismos adaptativos não somente para a criança em questão, mas para o meio do qual ela participa.

DISCUSSÃO DOS CASOS

O Insight

O insight pode ser compreendido como a capacidade advinda de uma clareza súbita para resolver determinado problema. Köhler (1969, p.163), entende que essa clareza parte de uma “reorganização de certos materiais” , então é possível dizer que, para que haja um insight, é necessário que haja antes um repertório de conhecimentos no intelecto do indivíduo. Como, então, um surdo haveria de ter um insight?

Como a Juliana citou, é difícil para um surdo compreender a linguagem escrita e, em muitas ocasiões, a fala também devido a falta de intérpretes. Isso não significa, portanto, que o mesmo não tem conhecimento sobre outras situações que envolvem o seu próprio cotidiano. É mais fácil para um surdo ter um insight para resolver um problema enfrentado pelo surdo do que o ouvinte, já que seu repertório de conhecimento e vivência da área é bem maior, e o contrário também procede. Mas é possível ampliar esse repertório para que haja inclusão dos surdos em diversas áreas, como a profissional, por exemplo. Para isso a Libras se torna peça chave, pois permite que o surdo compreenda e se faça compreendido.

Libras e os quatro (4) Princípios da Gestalt

Fonte: encurtador.com.br/cnpIM

Libras é a sigla para Língua Brasileira de Sinais, e se manifesta pelo conjunto de formas gestuais utilizadas para comunicação entre surdos e ouvintes. Ela se diferencia entre países e entre regiões também. Apesar de haver semelhanças com a língua portuguesa, a linguagem de sinais envolve diferentes níveis linguísticos. O surdo no Brasil acaba sendo forçado a ser bilíngue pois deve aprender não somente Libras como a língua de seu país, no caso o português.  No Brasil, a língua brasileira de sinais foi estabelecida através da Lei nº 10.436/2002, como a língua oficial das pessoas surdas, que a compreende como um sistema de natureza visual-motora.

 Embora o surgimento das  Libras não tenha sido inspirado pela teoria da Gestalt, é possível perceber os princípios dessa abordagem na sua formação.

Princípio do Fechamento: visto como um ato de completar uma figura ou ideia, a Linguagem de Sinais é vista como complexa para os ouvintes pois ela te dá as partes para que você, através de estudo e vivência, as complete, tal complexidade pode ser explicada pelo fato da Juliana e Ana terem se interessado em aprender somente aos 13 anos de idade;

Princípio da Continuidade: pode-se dizer que os símbolos se apresentam com a necessidade de uma continuidade que se dá de forma gestual posteriormente;

Princípio da Similaridade: além de se assimilar muito com as formas da escrita brasileira, a linguagem de sinais se assimila também às formas daquilo que se pode ver, relacionando os símbolos aos gestos.

Princípio da Proximidade: esse campo acontece de forma semelhante para o surdo e para o ouvinte, já que depende do campo visual. A exemplo temos o teclado, a proximidade de todas as formas constrói uma composição visual: o teclado.

O Professor

Fonte: encurtador.com.br/ezAR9

Apesar de ideal, o professor nem sempre precisa saber falar em Libras quando há a presença de um intérprete, porém o mesmo é responsável pela busca teórica e elaboração de técnicas que atendam às necessidades do surdo. Recursos visuais se fazem extremamente necessários, conforme Campello (2008, p. 115) “a modalidade viso-espacial, como um dos recursos visuais, é defendida pelos sujeitos surdos na perspectiva de uma política visual da língua de sinais como um conjunto de experiências culturalmente produzidas”. Mas como vimos nas entrevistas, só a sala de aula não resolve os problemas enfrentados por eles. Se tratando de sistema educacional, é necessária uma escola com todos os departamentos adaptados para atender  de forma abrangente os surdos.

A realidade na escola e na sociedade, para o surdo, é uma educação bilíngue, sendo fundamental que o professor consiga lidar de forma dinâmica com as duas línguas, que, nesse caso, trata-se da sua língua oficial – o português – e da língua de sinais, a fim de escolher métodos e oferecer às crianças surdas condições para serem alfabetizadas de acordo com as exigências básicas da educação (BRITO, 2012; 2015; FARIA, 2011; OLIVEIRA, 2011; OLIVEIRA; WALTER, 2016).

ESTRATÉGIAS

Existem algumas estratégias de ensino para a obtenção da aprendizagem de alunos com problemas na percepção auditiva. Dentre elas, a utilização de vocabulários com gravuras, apresentação de filme com legenda, desenhar; fazer detalhes; esquematizar idéias no quadro, utilizar cores diferentes; setas e símbolos, utilizar slides com o máximo de detalhes de informações visuais possíveis (imagens,desenhos e figuras) além de usar ilustrações associadas com frases curtas,fotos ,mapas ,entre outros.

Vale ressaltar que é necessário os pais criarem estímulos visuais para que a criança surda possa chegar a uma compreensão correta daquilo que está sendo discutido. Portanto, verifica-se a importância na relação com os pais, e como eles devem ajustar-se criativamente para receber e lidar com as dificuldades na percepção auditiva dessa criança (SMITH, 2007).

Deve-se considerar as limitações que podem surgir no caminho da família, entretanto é de suma importância que eles assumam a responsabilidade diante da mesma e se comportem de forma assertiva, compreendendo o baixo desempenho que ela pode obter em algumas tarefas, e contribuindo para conscientizar os outros campos sociais que ela participa acerca da sua limitação e as implicâncias que a mesma pode desencadear.

Smith (2007) também comenta que o papel da escola é propiciar um ambiente adaptado e inclusivo à criança resguardando seus direitos e prezando pelo seu desenvolvimento cognitivo no que tange a escolaridade. Assim, é imprescindível que o professor espere o aluno copiar primeiro para depois fazer a explicação, aplicar as matérias de maneira reduzida e bem trabalhada para uma aprendizagem eficaz, dar tempo e ter paciência com eles ,para que ele possa prestar atenção no intérprete e depois escrever no caderno. Além disso, os pais devem manter-se atentos ao papel desempenhado pela escola, fazendo a ponte entre os outros profissionais que atendem a mesma e entre a escola.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se concluir que as dificuldades de aprendizagem englobam diferentes causas, as quais podem afetar o desempenho acadêmico, ou seja, a criança apresenta um baixo desempenho inesperado em relação ao que ela deveria fazer e o que ela realmente faz.

Na  percepção auditiva, percebe-se que a maior dificuldade está na comunicação, tendo em vista que a Língua Brasileira de Sinais se configura como a língua oficial do surdo e são poucas as pessoas que têm domínio dela para a eficaz comunicação através de símbolos e isso dificulta a interação social, com profissionais da saúde, bem como professores.

Além disso, pôde-se perceber o quanto os princípios da Gestalt de  estão relacionados com as estratégia utilizadas para o estabelecimento de uma aprendizagem  de pessoas com problemas no processamento auditivo. Tais estratégias evidenciam a importância da utilização de recursos visuais com símbolos, cores, imagens, compreensão por parte dos pais e professores do baixo desempenho que ela pode obter em algumas tarefas, e incentivá-la em suas atividades acreditando que é capaz de ter uma vida mais independente e de desenvolver suas potencialidades.

 

REFERÊNCIAS

BRITO, J. B. Alfabetização de crianças e jovens: superando desafios da inclusão escolar. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Educação, UFRN. Natal, 2012.

BURITI, A. K. L; ROSA, M.R.D. Percepção auditiva em escolares com dislexia: uma revisão sistemática. Rev. psicopedag. [online]. 2014, vol.31, n.94, pp. 82-88. ISSN 0103-8486. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-84862014000100010> acesso em: 24 nov 2018.

BRITO, R. S. O professor e o processo de alfabetização do aluno surdo. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Pedagogia, UFRN, Campus Caicó. Caicó, 2015.

CAMPELLO, A.R.S. Aspectos da visualidade na educação de surdos. 2008. 245 f. Tese (Doutorado) – Curso de Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2008.

FARIA, N. R. B. Forma e substância na linguagem: reflexões sobre o bilinguismo do surdo. Leitura, Maceió, v. 1, nº 47, p. 233-254, jan.-jun. 2011.

OLIVEIRA, M. F. N. Alfabetização da criança surda no Ensino Fundamental numa perspectiva bilíngue. Monografia. Curso de Especialização em Desenvolvimento Humano, Educação e Inclusão Escolar, UAB/UnB-IP. Brasília, 2011.

OLIVEIRA, P. C. F.; WALTER, C. C. F. Educação bilíngue: sua importância na aprendizagem e inclusão escolar de alunos surdos. Cadernos de Pesquisa, São Luís, v. 23, nº 2, p. 31-45, mai./ago. 2016.

OSTERMANN, F; CAVALCANTI, C.J.H. Teorias da aprendizagem. UFRGS, 2010. Disponível em: <http://files.pibid-unibr-sao-vicente.webnode.com/200000051-0d0a70e086/Teorias%20de%20aprendizagem.pdf> Acesso em: 29 de Novembro de 2018.

SMITH, C. L. S. Dificuldades de aprendizagem de A a Z: um guia completo para pais e educadores [recurso eletrônico]; tradução Dayse Batista. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre: Artmed, 2007.

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Eugênio Vilaça Mendes e a Atenção Primária à Saúde

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Deve-se reconhecer que o SUS possui uma estruturação que permite seu funcionamento eficaz, mas existem dificuldades para colocar em prática da maneira correta.

A Atenção Básica pode ser caracterizada como “um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde” (LAVRAS,2011, p.868). Além disso, ela é orientada seguindo os princípios da universalidade, acessibilidade e da coordenação do cuidado, do vínculo e continuidade, da integralidade, da responsabilização, da humanização, da equidade, bem como da participação social.

Eugênio Vilaça Mendes fez uma discussão sobre a Atenção Primária à Saúde (APS) nas Redes de Atenção à Saúde e inicia comentando sobre a situação da saúde no Brasil. Segundo ele, um dos motivos que contribuem com a tripla carga de doenças é a transição demográfica, a qual resulta em uma população maiormente idosa, ou seja, pessoas que são naturalmente mais suscetíveis à doenças.

Além disso, a maioria dessas doenças são crônicas. Outro fator importante é a agenda não concluída de infecções, desnutrição e problemas de saúde reprodutiva, a forte predominância relativa das doenças crônicas e de seus fatores de risco, como tabagismo, sobrepeso, inatividade física, uso excessivo de álcool e outras drogas e alimentação inadequada. Também, o crescimento das causas externas (fruto do fenômeno da urbanização e violência).

Fonte: https://goo.gl/9KsWng

Deve-se reconhecer que o SUS possui uma estruturação que permite seu funcionamento eficaz, mas existem dificuldades para colocar em prática da maneira correta. Sendo assim, Eugênio expõe que o problema crítico do SUS é a incoerência entre uma situação de saúde que combina transição demográfica acelerada e tripla carga de doença, com forte predominância de condições crônicas, e um sistema fragmentado de saúde que opera de forma episódica e reativa e que é voltado principalmente para a atenção às condições agudas e às agudizações de condições crônicas. A condição crônica exige uma resposta social proativa, contínua, dos sistemas de atenção à saúde.

Vilaça acredita que a causa fundamental da crise do SUS, bem como do sistema privado no Brasil é que sistema utilizado é fragmentado, opera de forma episódica e reativa e que se volta principalmente para questões agudas e paras as agudizações crônicas. Já que o manejo clínico para as condições crônicas “se constitui em processo complexo que envolve o desenvolvimento de práticas de autocuidado, abordagens multiprofissionais e garantia de continuidade assistencial, o que só pode ser obtido através de sistemas integrados” (LAVRAS,2011,p.871).

O descompasso entre fatores contingenciais que evoluem rapidamente, como:transição demográfica, transição epidemiológica e inovação tecnológica, além dos fatores internos (cultura organizacional,recursos, sistemas de incentivos, estilos de liderança e arranjos organizativos) justificam uma situação de saúde do século XXI sendo respondida socialmente por um sistema de atenção à saúde da metade do século XX. É possível perceber que existe uma dificuldade do sistema em adaptar -se às mudanças, o que resulta no dilema que se baseia em como acelerar as mudanças no sistema já que esses fatores citados acima são bem vindos.

Fonte: https://goo.gl/8gaJDd

Eugênio expõe que o sistema praticado hoje é baseado no sistema ainda do século XX, quando metade das mortes era por causas infecciosas. Para ele, a crise é universal, ou seja, até nos EUA há problemas com casos de diabetes, significa que a crise ocorre independente do volume de recursos. Semelhante à esse posicionamento, Lavras (2011) também acredita que é necessário valorizar e legitimar as práticas que estão em desenvolvimento, mas antes deve-se superar um padrão cultural pré- estabelecido tanto na sociedade como no aparelho formador.

Após apontar as dificuldades que permeiam o sistema, Vilaça sugere uma solução possível para a crise fundamental do SUS: proposta da rede de atenção à saúde. Sua ideia consiste no restabelecimento da coerência entre a situação de saúde com transição demográfica acelerada e tripla carga de doença com predomínio relativo forte de condições crônicas e um sistema integrado de saúde que opera de forma contínua e proativa e voltado equilibradamente para a atenção às condições agudas e crônicas.

Se seguir a lógica da atenção às condições agudas de modo geral, o sistema poderá ser descontínuo, fragmentado e reativo. Mas isso não se aplica às condições crônicas. Pois, assim como afirma LAPÃO et al (2017, p. 714), espera-se que uma APS não restrinja a “um nível de serviço ou focalizada em grupos em situação de pobreza, mas capaz de assumir a coordenação de todos os seus usuários e a integração do seu sistema”.

Fonte: https://goo.gl/MsrfUQ

Por fim, Vilaça fala sobre os elementos importantes para composição das rede de atenção à saúde, quais sejam:

– uma população: a população adscrita à rede de atenção à saúde.

– um modelo lógico: O modelo de atenção à saúde.

-uma estrutura operacional: os componentes da rede de atenção à saúde.

Vale ressaltar que a população de uma rede não é a mesma contabilizada pelo IBGE, mas sim a população efetivamente cadastrada na atenção primária de saúde. Portanto, para que a APS no SUS possa desempenhar esse papel com efetividade grandes medidas devem ser tomadas conjuntamente pelas três instâncias de gestão do SUS, visando seu fortalecimento.

REFERÊNCIAS

LAPÃO,Luís Velez; ARCÊNCIO, Ricardo Alexandre; POPOLIN, Marcela Paschoal e RODRIGUES, Ludmila Barbosa Bandeira. Atenção Primária à Saúde na coordenação das Redes de Atenção à Saúde no Rio de Janeiro, Brasil, e na região de Lisboa, Portugal. Ciência & Saúde Coletiva, 22(3):713-723, 2017.

LAVRAS, Carmem. Atenção Primária à Saúde e a Organização de Redes Regionais de Atenção à Saúde no Brasil. Saúde Soc. São Paulo, v.20, n.4, p.867-874, 2011.

MENDES, Eugênio Vilaça, 2012.  A APS nas Redes de Atenção à Saúde. Disponível em:<https://www.youtube.com/watch?v=_U9Yx02xwgA&list=PLQ2Ue6m-QUZI0lQ500NMIqX N2rgEHUwir>. Acessado em: 04 de outubro de 2018.

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Dinâmica inovadora em Psicologia da Aprendizagem

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No dia 21 de setembro, a professora Ana Letícia Odorizzi, propôs uma dinâmica muito diferente do que os alunos estão acostumados em sala. A ideia foi fazer uma revisão para fixação do conteúdo antes da prova de G1. Na Disciplina de Psicologia da Aprendizagem, aprendemos que ela se caracteriza por aquele que aprende ou dá os primeiros passos em uma atividade, arte ou ofício. É o ato de aprender ou adquirir conhecimento através da experiência ou de um método de ensino. Além disso, pode ser entendida como um processo de mudança de comportamento, como resultado de estudo, experiência, formação, raciocínio e observação. Durante as aulas, foram discutidas as diferentes formas de conceber a aprendizagem na visão da Psicanálise, Behaviorismo, Aprendizagem Social, Humanismo e Gestalt, deixando claro o paradigma de cada teoria.

A dinâmica se chama “Lego” e procedeu-se da seguinte forma: os alunos dividiram-se formando cinco grupos e receberam uma caixinha com várias peças de lego. Cada grupo deveria discutir sobre o seu tema, dos 5 que foram sorteados, e levantar os assuntos abordados durante a aula. Feito isso, deveriam criar algum objeto/ situação com as peças que foram entregues de modo que fizesse sentido com a Teoria da Aprendizagem que o grupo ficou responsável e ao final explicar para toda a turma o produto dessa atividade. Para os acadêmicos, a atividade foi muito divertida e através dela perceberam que a própria interação no grupo fez sentido com as teorias da aprendizagem estudadas.

Acervo fotográfico

Processo de montagem
Psicanálise
Humanismo
Aprendizagem Social
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Eu, mãe de 6 filhos: uma experiência no SUS

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Baseado no relato de Ivone Creuza Santos Antunes

15 de maio de 2018, Conceição do Araguaia-PA

Somos de São Paulo-SP. Mudamos para Conceição do Araguaia-PA em julho do ano de 1998. Todos os nossos familiares ficaram lá enquanto eu, meu esposo e nossos 5  filhos viemos embora, a saber: Aline, Thiago, Angélica, Samuel e Letícia.

Na segunda metade do ano de 1999 descobri que estava gestante há 3 meses e que a família iria aumentar um pouquinho. Esperávamos uma menina.

Tinha muita preocupação em relação à assistência que receberíamos, por que eu já sabia que na cidade quase não havia recurso. Sendo assim, comecei a fazer o pré-natal em uma clínica particular e ao final do acompanhamento falei para a médica que eu queria muito que ela fizesse meu parto já que eu não conhecia nenhum médico da cidade. Ela negou alegando que o parto teria que ser pago. Eu então perguntei o valor e ela apenas sorriu na minha cara. Falou o nome de alguns médicos e falou para eu procurar outra pessoa. Naquela época a cidade era comandada pelos médicos. Eles eram tão unidos que sempre que chegava algum novo, davam um jeito de mandar ir embora.

Não foi muito fácil no início, pois ainda tínhamos pendências para resolver em São Paulo.

Já nos dias perto do nascimento da nossa filha, meu esposo recebeu um comunicado e teve que viajar às pressas. Mas pediu ao seu primo, Mário, que morava na mesma cidade, que desse assistência à nossa família enquanto ele estivesse longe. E assim foi.

Certo dia, estava na minha casa e comecei a sentir as dores. Na época nós tínhamos uma Kombi e um irmão da igreja, amigo nosso, dirigiu rumo ao hospital.

Como a cidade era pequena e com poucos recursos,  resolvi ir direto para o hospital particular da cidade o “São  Lucas”, pois achava que era o melhor.

Cheguei lá a noite e passei bastante tempo andando de um lado para outro já quase sem aguentar de tanta dor. Enquanto isso, as enfermeiras sorriam, conversavam, brincavam. O assunto tava mais interessante do que as minhas contrações sufocantes. Passado certo tempo, fizeram o exame para saber quanto tinha de dilatação e continuaram conversando.

Fonte: https://goo.gl/RJ71bL

 Quando eu senti que os ossos do meu quadril se abriram, não consegui mais andar e a dor só piorava. Eu dizia:

– Por favor!  Não estou  aguentando mais!..

A resposta era sempre a mesma:

-Continua fazendo força. Agora é com você!

-Ela já vai nascer!!

-Faz força, “siá”.

E o assunto delas ainda era mais importante do que minha filha que já estava quase nascendo enquanto eu ficava imóvel de tanta dor no corredor do hospital.

A cada vez que eu as interrompia, percebia que elas se irritavam mais.

Era a noite do dia 15 de maio de 2000. E finalmente quando elas viram que já era hora, uma foi preparar a cama, colocar a escadinha para eu subir. Pensei “Eu não consigo nem me mexer, como vou subir uma escada?”

Consegui me ajeitar e finalmente minha bebê nasceu. Mas não ouvi o chorinho dela. Muito estranho, pois todos os 5 filhos choraram, menos ela.

As enfermeiras a levaram para fazer os procedimentos e eu fiquei naquela cama, sem ninguém para me preparar. Tive medo de contrair alguma infecção.

Logo depois me trouxeram ela. No quarto tinha apenas um ventilador e eu com tanto calor que o suor escorria. Coloquei a Luciana na ponta da cama para o vento não ir nela, enquanto esperava passar aquele calor insuportável. Fiquei olhando tentando imaginar se ela seria branquinha ou morena, já que só eu e o Thiago somos negros. Mas ela tinha a cor estranha, era pouco acinzentada com tons rosados.

Na manhã do dia 16 fui liberada para ir embora. A irmã Camila foi me buscar no hospital e levar para casa.

A Leticia e o Samuel eram bem pequenos, ela tinha quase 2 anos e 8 meses, ele faria 4 aninhos dois dias depois. Os dois estavam brincando na terra, todos sujos. Quando viram que nós havíamos chegado,  ficaram elétricos, ansiosos para conhecer a irmã recém nascida. Falei para tomarem banho primeiro e foram correndo, disputando quem terminaria primeiro. Não demorou muito tempo e vieram, os dois, limpinhos e cheirosos para ver o rostinho da nossa bebê.

Lembro que a Camila estava dando banho nela na banheira e o Samuel chegou a jogar água com aquela mãozinha pequena. Os olhos deles brilhavam de tanta felicidade.

No meio da tarde a Luciana começou a  chorar desesperadamente e pela minha experiência, acreditava que fosse cólica. Pedi ao Thiago que fosse na farmácia comprar um remedinho enquanto eu massageava a barriguinha dela na esperança que aquele choro cessasse.

A Luciana chorava demais e resolvi levá-la ao hospital. Naquela hora tinha uma pessoa nos visitando e ela foi comigo. Enquanto eu dirigia, a nossa amiga segurava minha filha em seus braços.

Fui até o hospital mais próximo de casa, mas não quiseram atender pois ela não tinha nascido lá. Então fui correndo novamente para o hospital São Lucas. Estava escuro lá dentro, não tinha ninguém na recepção. Chamei, chamei até que veio um rapaz. Expliquei o que estava acontecendo e ele me disse que a consulta era particular, eu implorei para que nos atendesse pois tínhamos saído cedo de lá, mas ela não estava bem. Eu já estava desesperada e perguntei se tinha recurso para minha filha. Ele disse que não. Resolvi sair correndo para o Hospital Regional.

O médico, ainda no corredor, viu que minha filha chorava muito e perguntou o que estava acontecendo, expliquei a situação. Mais uma vez, ouvi o médico dizer que  não tinha condições de atender minha filha. Segundo ele, no hospital só tinha “injeção para cavalo”. Como estávamos no corredor, a enfermeira chefe  viu e me perguntou onde ela tinha nascido. Em pouco minutos ligou no São Lucas e falou que eu podia ir que eles iriam me atender.

A noite estava chegando e então voltei para o hospital onde ela nasceu. Ao chegar lá, fui muito mal recebida, as pessoas me olhavam com expressão de desprezo e me deixaram falar com o médico.

Fonte: https://goo.gl/e5GGGq

Ele veio, examinou minha filha e começou a resmungar que ela estava desidratada, falou comigo como se eu não tivesse cuidado da minha filha. Fiquei indignada! Onde já se viu dar água para uma bebê recém nascida??!  Ele saiu no corredor sem nem olhar no rosto das enfermeiras dizendo:

-Aplica isso, aquilo, coloca tal coisa!!

E logo vieram as enfermeiras para aplicar medicamento. Começou a saga para encontrar a veia da Luciana. Fura daqui, dali e nada de achar.

Meu coração se partiu em mil pedaços, estavam judiando da minha bebê. Algum tempo depois a moça que estava comigo comentou que poderiam encontrar alguma veia na cabeça e só então eu lembrei que quando o Samuel e Thiago foram internados com pneumonia, o medicamento era na cabeça. Na hora me culpei por não ter lembrado desse detalhe e por deixar furarem minha filha tantas vezes.

Perguntei à elas se poderia ser feito isso. E a resposta foi:

-Pode ser sim, mas nós precisamos da sua autorização para raspar o cabelinho dela.

“O que era cortar um cabelo, que pode crescer depois, perto do sofrimento que estavam causando na minha filha tão pequena???”

Nesse período em que me ausentei de casa, a irmã Edna ficou com as crianças enquanto a Aline, que é a mais velha, não chegava da escola.

Mais tarde o Mário ficou sabendo do ocorrido e foi atrás de nós no hospital, ao chegar lá perguntou se tinha condições dela ser bem atendida e que dinheiro não seria o problema já que era só disso que eles falavam.

Decidimos levá-la à Araguaína, e o médico falou que ela não aguentaria a viagem, a menos que tivesse uma bomba de oxigênio.

Dessa forma, começamos a procurar quem tinha essa bomba já que não tinha no hospital. Fomos atrá de três médicos. Um tinha mas estava quebrada, o outro tinha mas faltava uma parte, e a outra já tinha emprestado.

Conseguimos achar um no Hospital Regional, mas a enfermeira não podia emprestar e deixar o hospital sem.

Insisti tanto com ela e prometi que devolveria logo. Ela percebeu o tamanho do meu desespero e resolveu emprestar. Pediu segredo absoluto pois ela poderia ser prejudicada.

Finalmente conseguimos a bomba, mas na hora de testar, percebeu-se que não tinha a máscara que colocava no rosto. A enfermeira pegou um frasco de soro que estava vazio e improvisou uma máscara.  Conseguimos o botijão com o oxigênio que segundo eles estava cheio e poderia aguentar ir até Goiânia, apesar de Araguaína ser perto.

Na madrugada do dia 17 seguimos viagem. Eu, o Mário e a irmã Camila. Ela foi levando minha filha no colo, pois eu tinha medo de algo pior. Por vezes perguntava se a Luciana estava respirando. Ela dizia que sim.

O Mário conseguiu contactar um amigo de Colinas e contou que estava levando a filha do Zé (meu esposo), em estado grave. Esse amigo dele conseguiu uma clínica e falou que poderíamos ir. Naquele dia eu só tinha almoçado e não comi mais nada, já estava fraca.

Durante a viagem, perguntava se minha filha estava respirando e a Camila dizia que sim. O Mário corria bastante para chegar o mais rápido possível.

Em dado momento vimos as luzes da cidade e ele falou que em 15 minutos já estaríamos lá. Me enchi de esperança! Perguntei novamente se a Luciana respirava. Mas logo desta vez a Camila respondeu:

-Quando chegar lá a gente vê!

Ao chegar na clínica, ainda de madrugada, a equipe estava na porta esperando a gente chegar e eu nem tive forças de descer do carro. Eles pegaram a criança e a médica gritou:

-Nesse botijão não tem oxigênio!!!!

Foram depressa para a clínica e lá de fora eu via eles colocando ela na mesa para examiná-la, enquanto todos ao redor estavam de cabeça baixa.

Eu ainda dentro do carro já estava pensando no que poderia ser.

Logo a médica veio, toda carinhosa dizendo:

-Ôh, Mãezinha! A sua filha não resistiu… E vocês não podem ficar aqui por que ela veio a óbito ainda em trânsito. Agora você precisa ser forte por que tem mais 5 te esperando! Eles precisam de você!

Me doparam de medicamento e pouco tempo depois tomamos viagem de volta à Conceição do Araguaia.

A Camila novamente levou ela em seus braços, já sem vida. O Mário abriu as janelas do carro na intenção de não dormir por causa do vento. E como entrava um vento gelado, algumas vezes cobri minha filha, pensei “Ela deve estar com frio!”.

Chegamos na nossa cidade quando o dia já estava amanhecendo e fomos direto na funerária comprar o caixãozinho dela. Era branco. Lá mesmo colocamos ela no caixão.

O seu sepultamento foi marcado para às 11h. Fui para a minha casa mas não  tive coragem de dizer aos pequenos o que havia acontecido. Na época ainda não era todo mundo que tinha telefone e o Thiago pegou a bicicleta e foi contar para os nossos amigos e irmãos na fé.

Quando deu a hora de ir para o velório, no cemitério mesmo, o Mário foi me buscar em casa. Deixei o Samuel e a Leticia em casa pois não queria que eles vissem aquilo.

Fui para o cemitério. Sobre duas cadeiras estava o caixãozinho com a minha Luciana.

Em determinado momento olhei perto de uma coluna e vi o Samuel olhando para a irmãzinha com o semblante triste e de cabeça baixa.

Não aguentei! Foi demais para mim! Me dilacerou…

Por fim, enterraram ela e eu nem quis mais ver nada.

Hoje ela completaria 18 anos. Não chegou a ser registrada e não tem certidão de óbito.

Fonte: Arquivo Pessoal

Não existe nenhuma foto. Nem seu pai o conheceu. Para o cartório ela nem existiu. Mas fez parte da nossa história e nunca deixou de ser minha filha. O único registro que temos dela é o exame do pezinho.

Luciana Antunes viveu quase dois dias, mas permanece em nossa memória até hoje. Quando me perguntam quantos filhos eu tenho, digo que tive 6, mas uma morreu.

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