‘Meu nome é Ray’ alerta para os desafios de uma criança trans

Meu nome é Ray, filme lançado em 2015, dirigido por Gaby Dellal, estrelado por Elle Fanning e Naomi Watts, traz por enredo a vida de um menino transgênero e os desafios durante a caminhada de transição de sexo.

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Ramonna (Elle Fanning) nasceu menina em sua forma biológica, no entanto, aos quatro anos de idade não se identificava como uma menina, mas sim como um menino. Nesse momento, Ramonna não quis mais ser chamada por esse nome e passou a ser chamada de Ray.

O processo de identificar-se com o sexo masculino ou feminino é chamado de Identidade de Gênero. Neste, o corpo biológico não é determinante para a identificação, uma vez que o indivíduo pode nascer em um corpo biologicamente feminino, mas não se identificar com o sexo feminino, e sim com o masculino (SILVA; BEZERRA e QUEIROZ, 2015).

O papel dos cuidadores é de grande influência nessa caminhada, e Maggie (Naomi Watts) consegue transmitir toda a compreensão e conhecimento sobre o assunto na tentativa de ajudar seu filho. Tal suporte colabora muito para o alívio do sofrimento causado pelo preconceito que Ray vivencia na escola por parte de alguns alunos.

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O grande desejo do personagem principal é conseguir iniciar o processo de transição do sexo feminino para o masculino, e para isso ele precisa do consentimento dos seus pais. E essa é umas das grandes questões que o filme ressalta, fazendo o telespectador refletir sobre o sofrimento que Ray passa por ter o destino do seu próprio corpo e percepção de si entregue nas mãos de outros.

Apesar de esse sofrimento ser genuíno, Ray ainda tem a possibilidade de tentar o processo de transição, o que muitas vezes não é a realidade das pessoas transgêneros que não tem acesso gratuito à transição, e/ou não podem pagar por ela.

As adversidades durante a jornada de obtenção da autorização dos pais mexem muito com Ray, que já se sente cansado de ter fingido ser alguém que ele não é. Tal consternação é representada por ele, em uma fala muito marcante à sua mãe, em resposta a pressão que ela dizia estar sentindo para assinar logo os papéis. Ele então verbaliza: “Uma decisão difícil? Para mim tem sido uma existência difícil!”.

As pessoas transgêneros não se sentem pertencentes ao corpo em que nasceram, experimentando um enorme desconforto em se verem dentro desse corpo, e relatam que a sensação é de despersonificação e falta de identidade. Muitas vezes elas alegam sentir repulsa e nojo por seus órgãos genitais, visto que o órgão não é representativo de como eles se veem como indivíduos.

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Há também a recusa em performar os papéis de gênero do sexo biológico com o qual nasceram, sendo essa recusa motivo de preconceito e conflitos, tanto com os familiares como com pessoas desconhecidas que se sentem no direito de impor como essas pessoas devem existir no mundo. No filme, Ray não gosta de usar vestidos ou acessórios que são “delegados pela sociedade” como pertencentes ao sexo feminino, ele não possui cabelo comprido e se veste de forma compatível a maneira como se vê.

Mas o que é um papel de gênero? Como ele se constrói? De acordo com Grossi (1998) apud Sayão (2002, p.6) “(…) papéis de gênero são as formas de manifestação ou representação social de ser macho ou fêmea (…).” Essas formas são pré-estabelecidas pelos indivíduos que vivem na comunidade social em que estão inseridos, e a partir delas, eles esperam que todos os novos seres humanos que nasçam sigam essa forma de existir.

Mas então onde está a liberdade de escolha do que ser ou não ser? É por essa liberdade que Ray luta desde os seus quatro anos de idade, sofrendo imposições e cobranças de todos ao seu redor para que se comportasse como um menina.

A sexualidade humana e sua experimentação individual, diz respeito apenas ao próprio sujeito, dono de seu corpo e de sua existência. O teórico da Psicologia Fritz Pearls, já dizia sobre isso, Eu não estou neste mundo para viver as suas expectativas. E você não está neste mundo para viver as minhas. Você é você, e eu sou eu, e se, por acaso, nós nos encontrarmos, será lindo. Se não, nada se pode fazer.” Ray, assim como qualquer outro ser humano deseja ter seus desejos respeitados, independente se tais desejos estão ou não, dentro dos padrões estabelecidos como socialmente aceitáveis. 

FICHA TÉCNICA DO FILME:

MEU NOME É RAY

Título original:  3 Generations
Direção: Gaby Dellal
Elenco: Elle FanningNaomi WattsSusan Sarandon
Ano: 2016
País: EUA
Gênero:  DramaComédia 

REFERÊNCIAS:

MISKOLCI, Richard; PELðCIO, Larissa. FORA DO SUJEITO E FORA DO LUGAR: REFLEXÕES SOBRE PERFORMATIVIDADE A PARTIR DE UMA ETNOGRAFIA ENTRE TRAVESTIS. Gênero, Niterói, v. 7, n. 2, p.257-269, jan. 2017. Disponível em: <file:///C:/Users/gabri/Downloads/155-430-1-PB.pdf>. Acesso em: 08 jan. 2019.

SAYÃO, Deborah ThomÉ. A CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES E PAPÉIS DE GÊNERO NA INFÂNCIA: ARTICULANDO TEMAS PARA PENSAR O TRABALHO PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL. Pensar A Prática, Florianópolis, v. 5, n. 1, p.1-14, jun. 2002. Disponível em: <https://www.revistas.ufg.br/fef/article/view/43/39>. Acesso em: 08 jan. 2019.

SILVA, Rodrigo Gonçalves Lima Borges da; BEZERRA, Waldez Cavalcante; QUEIROZ, Sandra Bomfim de. Os impactos das identidades transgênero na sociabilidade de travestis e mulheres transexuais. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, [s.l.], v. 26, n. 3, p.364-372, 26 dez. 2015. Universidade de Sao Paulo Sistema Integrado de Bibliotecas – SIBiUSP. http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-6149.v26i3p364-372. Disponível em: <http://www.periodicos.usp.br/rto/article/view/88052/109664>. Acesso em: 08 jan. 2019.