Toy Story 4: A herança da amizade

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Concorre com 1 indicação ao OSCAR:

Melhor Animação

O filme caminha de forma cômica para um fim doloroso, que mexe intimamente com nossas vidas. Uma comunidade de brinquedos nos ensina que com amizade não se brinca. 

“Amigo estou aqui”, icônica frase da música que marcou gerações. Desde o primeiro filme da saga, Toy Story fala de amizade, seus conflitos e vantagens. No quarto filme do longa-metragem lançado em junho de 2019, após os brinquedos se despedirem de Andy (antigo dono dos brinquedos) no terceiro filme, eles continuam juntos, mas agora são brinquedos de Bonnie.

O Xerife Woody (brinquedo cowboy e líder dos demais) já não é mais o brinquedo favorito, ele se sente desolado com o que podemos comparar a Síndrome do Ninho Vazio, processo de rompimento quando “seu humano” vai para a faculdade, e mesmo diante da possibilidade de ser esquecido no armário, Woody se mantêm leal a Bonnie na chegada do novo brinquedo: o Garfinho.

No primeiro dia de aula da escolinha, Bonnie cria um brinquedo com peças retiradas do lixo, sendo sua primeira criação e consolo por estar em um novo ambiente. Ela se apega muito ao Garfinho, em contrapartida, ele ainda se prende a sua antiga mentalidade de lixo. Woody, por amor a Bonnie e por acreditar que “nunca se deve deixar um brinquedo para trás”, tenta proteger e ajudar o Garfinho na sua jornada de autoconhecimento e tentativa de pertencimento, enquanto ele também está nessa mesma jornada. Seguindo o que Erich Fromm considera a tarefa principal do ser: dar luz a si mesmo para poder se transformar naquilo que realmente é.

Fonte: encurtador.com.br/agjsF

Albert Bandura conceitua a autoeficácia como, em suas palavras, “as crenças da pessoa em sua capacidade de exercer controle sobre seu próprio funcionamento e sobre os eventos que afetam suas vidas.” Caso a autoeficácia esteja baixa, sentimentos de inutilidade, desesperança e tendência a desistência são perceptíveis. A ideia que é descartável após um único uso faz com que Garfinho se jogue em toda lata de lixo que encontra; pessoalmente acho uma das partes mais engraçadas do filme, mas, num subcontexto, tal comportamento não é incomum em nossas vidas, já que se perceber como inútil e sem propósito é algo que a maioria das pessoas já vivenciaram, à vista disso, o filme ensina as crianças que todos temos um lugar no mundo, uma missão. Como quando Woody mostra ao Garfinho o nome Bonnie escrito na sola dos seus sapatos, assim, com ajuda e insistência do Xerife, ele alcança uma autoeficácia saudável. Agora ele reconhece que merece ser amado, agora ele pertence.

No terceiro filme Andy relata: “Woody tem sido meu amigo desde sempre. É corajoso, como um cowboy deve ser. É gentil, inteligente, mas o que faz Woody especial é que ele nunca desiste de você. Nunca. Ele vai estar contigo para o que der e vier.” De acordo com Erich Fromm, a mais alta realização que justifica a existência é o amor; nele, duas pessoas se tornam uma ao mesmo tempo que continuam sendo dois indivíduos separados. Outro mecanismo para alcançar as respostas da vida é juntar-se a um grupo, com isso, o sentimento de isolamento é superado.

Fonte: encurtador.com.br/bqKY1

O típico heroísmo do Xerife Woody também se mostra no antiquário (lugar onde brinquedos rejeitados esperam uma segunda chance) ao agir com empatia para Gabby Gabby, inicialmente a vilã principal, que traz um clima sombrio e tenso ao filme. Atitude que lembra a famosa frase de Fromm: “Somente a pessoa que tem fé em si mesma é capaz de ter fé nos outros. ”

Garfinho e Woody dividem o protagonismo nesse filme, os brinquedos que antes eram foco não ganharam tanto destaque, o que nos leva a pensar em um irremediável fim, ou quem sabe, um novo começo. Talvez, devido a isso esse filme traz certo grau de maturidade, sendo uma leve comédia para crianças, ao mesmo tempo que é um drama existencial para adultos.

Fonte: encurtador.com.br/iACIX

Mudanças são inerentes a vida. Woody, em um passo de ousadia e com a ajuda de Betty, agora a representação da mulher independente do século XXl, ressignifica sua vida e vai em direção ao desconhecido. O filme caminha de forma cômica para um fim doloroso, que mexe intimamente com nossas vidas. Uma comunidade de brinquedos nos ensina que com amizade não se brinca.

Mas o que fazer depois de entoar diversas vezes “O tempo vai passar, os anos vão confirmar as três palavras que proferi: Amigo, estou aqui!”, e você olha para o lado e o amigo não está mais lá? O que fazer com a esperança, as expectativas criadas que aquela pessoa seria para sempre seu amigo?

Fonte: encurtador.com.br/j2389

Ser amigo é construir um lugar de consolo e descanso, prezando pelo outro, que também preza por você. Antoine de Saint-Exupéry, escritor do Best-seller O pequeno Príncipe, escreveu: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”. Mais adiante ele complementa: “A gente corre o risco de chorar um pouco quando se deixa cativar.” As relações possuem seus prazeres e desprazeres, então, ás vezes, ser amigo também é deixar ir.

Como em todos os filmes da saga, os brinquedos estavam lá uns pelos outros, assim como as crianças costumam enxergar, e servindo de exemplo para nós. São laços que juntam, mas não prendem. Entre começos e términos, despedidas e reencontros, primeiras e últimas vezes, o que importa é a marca que deixam e a marca que fazemos. Como uma colcha de retalhos, pedaços de todos que já passaram em nossas vidas, retalhos costurados de saudades. Assim como as amizades, as lições aprendidas com Andy, Woody e Buzz lightyear certamente irão acompanhar gerações, ao infinito e além.

FICHA TÉCNICA:

TOY STORY 4

Diretor: Josh Cooley
Elenco: Tom Hanks, Tim Allen, Annie Potts, Joan Cusack, Wallace Shawn, John Ratzenberger;
 Gênero: Aventura
País: EUA
Ano: 2019

REFERÊNCIAS:

Erich Fromm – “O desejo de destruir é resultado de uma vida não vivida”. Disponível em: https://www.cultseraridades.com.br/erich-fromm-o-desejo-de-destruir-e-resultado-de-uma-vida-nao-vivida/. Acesso em: 6 set, 2019.

AZEVEDO, Tiago. A Autoeficácia (Bandura) e sua importância. Disponível em: https://psicoativo.com/2019/02/autoeficacia-bandura-importancia.html. Acesso em: 6 set, 2019.

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Sense8: a reconciliação com a ansiedade de separação

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“A única forma de alcançar o pleno conhecimento é o ato de amar, um ato que transcende o pensamento, que transcende as palavras. Ele é um mergulho ousado na experiência da união.”
Erich Fromm- A arte de amar.

Sense8 é uma série norte-americana original do serviço streaming Netflix, lançada em 2015 e produzida pelas irmãs Lilly e Lana Wachowski e  J. Michael Straczynski com duração de 2 temporadas com 12 episódios cada. O título da série faz uma alusão a palavra do inglês “sensate”, que é o principal aspecto que caracteriza a união de 8 pessoas completamente desconhecidas, que moram em diferentes lugares do mundo, e passam a sentir suas vidas profundamente conectadas.

Fonte: https://bit.ly/2BYNGuL

Will Gorski (EUA), Riley Blue (Irlanda), Capheus Onyongo “Van Damme” (Quênia),  Lito Rodriguez (México), Sun Bak (Coreia do Sul), Nomi Marks (EUA), Wolfgang Bogdanow (Alemanha) e Kala Dandekar (Índia) são os protagonistas da trama. Subitamente, todos têm a visão de uma mulher atirando contra a própria cabeça, e a partir de sua morte descobrem estar psiquicamente conectados, capazes de sentir os outros sensorial e emocionalmente, ver, tocar e se comunicar entre si, ainda que estejam em lugares distintos fisicamente. Angelica é a mulher que “deu a luz” ao grupo antes de se matar para fugir do vilão Wsipers (Sussurros).

Na série, indivíduos com essa capacidade de conexão são chamados de Sensates e estão sempre conectados em grupos de oito pessoas, chamados de Cluster. Agora o grupo precisa se unir para entender suas novas habilidades e também o porquê de estarem sendo ajudados por Jonas, integrante do cluster de Angelica, e caçados por Whispers, chefe de uma organização que mata sensates.

Aparições de Angelica para Capheus (Quênia) e Riley (Irlanda).

Uma (re)descoberta em grupo

Algo que não deixa dúvidas é a inovação implementada (com sucesso) pelos produtores da série. Ainda que atualmente seja menos empolgante falar de Sense8 depois de seu término, que se deu devido ao exorbitante orçamento resultante de gravações em pelo menos oito cidades ao redor do mundo, lembro que ao assistir os primeiros episódios em 2015 pensei que nada no mundo era parecido com o que tinha acabado de assistir, isso é uma qualidade extremamente valiosa que já citei em outro texto.

Os três aspectos que mais chamam a atenção inicialmente são (1) a relação de união entre os personagens, (2) como isso se manifesta sexualmente, e por fim, (3) o resultado da interação das diversidades humanas. À medida em que o grupo descobre o porquê de terem sido unidos, e os motivos de estarem sendo caçados pela BPO (organização a qual Whispers pertence), precisam usar a conjunção de todas as suas habilidades para fugir e se proteger.

Um policial, uma DJ, um motorista de van, uma lutadora de kickboxing, um ator, uma farmacêutica, um gangster e uma hacker; essas são as profissões de cada um dos sensates. Agora, imagine todas essas habilidades combinadas em uma pessoa só, de acordo com a necessidade do momento. Sem dúvida, é uma combinação poderosa. Mas além de apenas habilidades físicas, a união dos sensates transpassa suas histórias de vida, seus traumas, seus medos e suas repressões, culminando em um sentimento mútuo de apoio, afetividade e amor. Essa intensa relação resulta em cenas não incomuns de orgias entre os personagens.

Fonte: https://bit.ly/2zSxIAV

Essas orgias transcendem também os estados físicos, e passam a mesclar-se com estados metafísicos, pois, nem sempre os personagens estão juntos no mesmo local geográfico. As relações sexuais transcendentes que mesclam diferentes expressões de sexualidade e diversas práticas sexuais, como se pode imaginar, não são vistas como belas por todos os olhos. Sense8 definitivamente não é conservadora.  A série não só incomoda a visão de sexualidade ocidental conservadora, como a confronta. Cada episódio é um convite ao expectador a se abrir para as diferentes faces do amor e do sexo, para a natureza humana sem máscaras.

Amor como problema fundamental da existência humana

O psicanalista alemão Erich Fromm, postulou sobre as necessidades humanas de se conectar com outras pessoas para superar a ansiedade da condição humana (você pode ler mais sobre ele aqui).

“Erich Fromm defendeu que a união entre os seres humanos, pelo princípio do amor, é uma resposta potente para a questão elementar da humanidade, a ansiedade de separação e a solidão/angústia existencial. Neste sentido, o amor se torna uma necessidade psíquica básica do indivíduo, e deve ser trabalhado a partir dos mesmos pressupostos da arte, ou seja, tem que ser entendido, observado, treinado e executado, num movimento que engloba não apenas os sentimentos, mas também a razão (evitando assim as polaridades).” (SOUSA, 2018).

Para o psicanalista, a consciência que o ser humano adquire ao se perceber separado gradualmente da mãe e posteriormente da própria natureza, do seu curto período de vida, do seu nascimento e morte contra a própria vontade, da sua solidão e separação, de modo que uma existência apartada e desunida se tornaria uma prisão insuportável. Desse modo, a experiência de separação seria fonte de toda a ansiedade humana (FROMM, 2000).

Personagens no episódio Amor Vincit Omnia (O amor conquista tudo). Fonte: https://bit.ly/2PcsyVx

O ser humano tenta, portanto, encontrar saídas para superar a ansiedade de separação através de: transes auto-provocados, como o sexo e uso de drogas; com a busca de conformidade, ou seja, uma transfiguração do eu para pertencer à homogeneização social; com a atividade criativa, no qual o indivíduo criativo une-se ao seu material, que representa o mundo fora dele; e também a união simbiótica (representada inicialmente pela união gestacional mãe-bebê), na qual o indivíduo busca superar o estado de separação se tornando parte de outra pessoa, ou incorporando outra pessoa em si, através de uma conexão psicológica. Porém, todas essas tentativas de fusão com o mundo seriam imaturas e passageiras (FROMM, 2000).

Ao examinar a história dos sensates, não é difícil perceber a solidão que os cercava. A rejeição familiar e da sociedade ou o medo dela os impelia para buscas diversas de superar suas angústias, como uso de drogas (Wollfgang e Riley), tentativas de se encaixar nos padrões sociais aceitáveis (Sun, Lito e Kala), atividades de sublimação no trabalho (Nomi, Capheus, Lito e Will). Mas, a partir do momento em que o Cluster encontra um novo significado para suas existências e todos os integrantes passam por um processo de aceitação e preservação individual e mútua, em doação de si aos seus parceiros, acontece o que Fromm denomina de “amor amadurecido”.

“Em contraste com a união simbiótica, o amor amadurecido é união sob a condição de preservar a integridade própria, a própria individualidade. O amor é uma força ativa no homem; uma força que irrompe pelas paredes que separam o homem de seus semelhantes, que o une aos outros; o amor leva-o a superar o sentimento de isolamento e de separação, permitindo-lhe, porém, ser ele mesmo, reter sua integridade. No amor, ocorre o paradoxo de que dois seres sejam um e, contudo, permaneçam dois.” (FROMM, 2000, p. 23-24).

Então chegamos ao grande paradoxo de Sense8, que nesse caso, oito sejam um, e, contudo, permaneçam oito. A situação de sustentação mútua entre os integrantes do grupo, os fizeram superar inúmeros desafios pessoais, porém, tal amor, não lhes custou sua integridade, suas habilidades e paixões distintas só se fortaleceram.

Fonte: https://bit.ly/2E9PELx

O amor seria um movimento ativo e não passivo; um crescimento, ao invés de uma queda; seria, portanto um fluxo de dar e não de receber. Dar, não se caracteriza aqui, na perspectiva mercantilizada do sentido de perda, mas sim como expressão de potência, onde se põe a prova o próprio poder, é um marco de superabundância, e acima de tudo, uma expressão de vitalidade (FROMM, 2000).

As esferas do “dar” englobam o sexo, como uma expressão de doação do próprio corpo ao outro, porém a mais importante seria a esfera do que é especificamente humano. Dar da própria vida, de seus sentimentos, do que vive em si, seria a mais alta expressão de amor. Enriquece, desse modo, sua própria vitalidade e a vitalidade do outro, só enriquecimento, sem perdas (FROMM, 2000).

Fonte: https://bit.ly/2IFrzui

O que torna Sense8 diferente de outras séries, não é só a relação de união entre os personagens, tampouco apenas como isso se manifesta sexualmente, mas o resultado da interação das diversidades humanas, daquilo que é especificamente humano: alegrias, tristezas, conhecimento e compaixão. A mescla de humanidades fascina os expectadores com o maior anseio de nossa existência: ser amado.

REFERÊNCIAS:

FROMM, Erich. A arte de amar. Trad. de Eduardo Brandão. Martins Fontes: São Paulo, 2000.

SOUSA, S. L. Erich Fromm: só o amor salva o ser humano de sua angústia existencial. Portal (En)Cena: A Saúde Mental em Movimento: Palmas, 2018. Disponível em: <http://encenasaudemental.com/personagens/erich-fromm-so-o-amor-salva-o-ser-humano-de-sua-angustia-existencial/>. Acesso em: 04 de out. 2018.

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Erich Fromm: só o amor salva o ser humano de sua angústia existencial

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Erich Fromm defendeu que a união entre os seres humanos, pelo princípio do amor, é uma resposta potente para a questão elementar da humanidade

Assim como o pai da Psicanálise (Freud), o psicanalista Erich Fromm foi de família judaica com grande tradição para os estudos da Toráh e voltada para o rabinato. Nascido na Alemanha de 1900, por pouco não se transformou, também, num rabino. De qualquer forma a origem semita o acompanhou na carreira acadêmica, uma vez que Fromm acabou se doutorando em 1922 sobre sociologia e lei judaica. Paralelo a isso, obtinha aulas de talmude – para complementar a Torá, que dispõe da lei oral, doutrina, tradições e moral judaica – com o rabino Rabinkow e, na psicanálise, iniciou também nos anos 20 os estudos junto ao Instituto de Psicanálise de Berlim, que à época era capitaneado pelo médico e jurista Hanns Cachs.

Na década de 30 Erick Fromm passou a atuar como diretor do Instituto de Pesquisas Sociais de Frankfurt, que passou a ser conhecido como a Escola de Frankfurt (que ainda hoje influencia o pensamento sociológico e político do ocidente) e, de quebra, deu bases para o marxismo na Psicanálise, ao lado de intelectuais como Wilhelm Reich. Em meados dos anos 30 Fromm teve que sair da Europa devido a crescente onda antissemita e a ascensão de Hitler. A mudança contribuiu para que o psicanalista alemão fosse trabalhar na Columbia University de Nova Iorque.

Escola de Frankfurt. Fonte: https://goo.gl/mXQYEq

No início dos anos 40 se torna cidadão norte-americano e, concomitantemente, depois de uma série de desentendimentos de ordem epistemológica, deixa a Escola de Frankfurt. Fromm também chegou a lecionar na cidade do México e, em meados dos anos 70 volta para a Europa, para morar na Suíça. Casou-se primeiramente com uma imigrante alemã nos Estados Unidos em 1944 – Henny Gurland – e, após a morte desta, casa-se novamente, desta vez com a americana Annis Freeman.

Humanismo como meio e amor como fim

Erich Fromm defendia que além das necessidades básicas, relativas à sobrevivência física do ser humano, este também precisava atender a necessidades psíquicas. Neste sentido, uma dada sociedade poderia promover ou restringir os aspectos que compõem a saúde mental dos seus indivíduos, o que acabou por fortalecer as linhas de pensamento – como de quebra ocorre em toda a Sociologia da época – que não atribuem ao princípio da individualidade os marcadores para alcançar uma boa existência. Era preciso reconhecer o papel do estado e da sociedade, neste processo.

Fonte: https://goo.gl/9hPa8Y

Desta forma Erich Fromm defendeu que o ser humano é moldado pela sociedade e, assim, ao contrário de Freud, o sociólogo afirma que a autoridade e os discursos de interditos – que formarão o superego dos filhos – não parte exclusivamente da autoridade do pai mas, antes, da sociedade, uma vez que as autoridades sociais representam em grande medida as qualidades do superego. Desta forma, se o ser humano estiver de acordo com as diretivas da sociedade, a possibilidade de conflito deste com as normas gerais é mínima; por outro lado, se este mesmo ser humano aderir ao princípio da liberdade – pressuposto em ascensão, já no final da Segunda Guerra –, em algum momento irá sofrer as consequências. Isso se dá a partir do desenvolvimento de neuroses, que impele o humano a não exteriorizar-se de modo espontâneo, sob pena de ver eclodir os complexos.

Estas falhas que impossibilitam uma vida o mais autêntica possível – no sentido de resgate de uma espontaneidade perdida com o histórico de interdições – são produzidas não apenas pela família, e sim pela cultura. Desta forma, o indivíduo acaba reprimindo muitos conteúdos para não correr o risco de ser marginalizado.

Fonte: https://goo.gl/RrGNSq

Esta é a tônica do humanismo de Fromm, que de quebra ainda levanta a hipótese de que o ser humano vive achatado entre duas polaridades, num movimento que parece invencível: ao mesmo tempo em que busca reestabelecer uma harmonia rompida com a natureza (no que Von-Franz caracteriza como a busca pelo paraíso perdido), por outro lado, o princípio da razão parece ser a via mais adequada para superar as limitações humanas. Depois de satisfeitas as necessidades primárias, toda a movimentação humana seguinte é no sentido de satisfazer suas necessidades existenciais. O amor, então, entra nesta perspectiva.

Erich Fromm defendeu que a união entre os seres humanos, pelo princípio do amor, é uma resposta potente para a questão elementar da humanidade, a ansiedade de separação e a solidão/angústia existencial. Neste sentido, o amor se torna uma necessidade psíquica básica do indivíduo, e deve ser trabalhado a partir dos mesmos pressupostos da arte, ou seja, tem que ser entendido, observado, treinado e executado, num movimento que engloba não apenas os sentimentos, mas também a razão (evitando assim as polaridades).

Fonte: https://goo.gl/PNTfcB

Desta forma o amor se configura, também, como uma necessidade da alma, pois possibilita a ligação do amante com ele mesmo, com o/a amado/a e com o mundo. Amar alguém, portanto, é uma boa possibilidade de amar o mundo, colocando-se no lugar do outro e desenvolvendo um olhar amoroso e compassivo para consigo e para com terceiros. Então, por este percurso, o amor se apresenta como um antídoto contra o narcisismo secundário, em que o sujeito não conseguiu superar o narcisismo infantil e passa a identificar no outro e no ambiente apenas dispositivos para satisfação de seus desejos (ainda infantis). Narcisistas, neste aspecto, trabalham incansavelmente para imprimir uma relação de poder sobre o ambiente. Isto não poderia ocorrer no amor maduro de que fala Fromm (Jung também defendia que poder e amor são conceitos/práticas opostos/as), o que se diferencia radicalmente do princípio do amor, cuja ligação entre os indivíduos é pautada pelo princípio da cooperação mútua.

Fonte: https://goo.gl/ewTj9J

Esta talvez tenha sido uma das maiores contribuições de Erich Fromm, que morreu em 1980, aos 79 anos, na região suíça de Muralto. Fromm imortalizou sua obra ao defender que o amor é o único remédio capaz de fazer com que o ser humano cure suas feridas existenciais, sobretudo em relação aos sentimentos de isolamento e solidão para que, assim, pudesse se lançar no mundo – tanto a partir do princípio da razão, quanto pelo prisma da emoção e da alteridade.

Referências

Biografia de Erick Fromm. Disponível em: < https://www.psicologiamsn.com/2012/03/biografia-erich-fromm.html >. Acesso em: 25 Ago. 2018.

Uol Educação. Disponível em: <  https://educacao.uol.com.br/biografias/erich-fromm.htm >. Acesso em: 25 Ago. 2018.

 

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Steven Spielberg: o rei dos clássicos

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Você tem alguma lembrança na qual todo mundo se reuniu em casa para assistir filme? Já passou alguma tarde em frente à TV assistindo aquele filme que todo mundo conhece? Se você respondeu sim para alguma dessas perguntas, provavelmente um desses filmes foi dirigido por Steven Spielberg.

O aclamado diretor tem vitórias variadas em seu cartel, desde blockbusters com efeitos visuais avançados como Jurassic Park: o parque dos dinossauros (1993), Tubarão (1975), Contatos Imediatos do Terceiro Grau (1977), Guerra dos Mundos (2005) e a franquia Indiana Jones; a filmes que captam a essência das fantasias da infância como E.T. – o extraterrestre (1982), A. I. – inteligência artificial, Super 8 (2011), As Aventuras de Tintin (2011) e O Bom Gigante Amigo (2016); além dos tocantes dramas com tensões penetrantes como A Cor Púrpura (1985), A Lista de Schindler (1993), O Resgate do Soldado Ryan (1998), O Terminal (2004),  e Cavalo de Guerra (2011).

E agora, lembrou de algum?

Fonte: https://gph.is/2nRBm75

Um talento precoce

Steven Allan Spielberg nasceu no dia 18 de dezembro de 1946 em Cincinnati, no estado de Ohio nos Estados Unidos, filho dos pais judeus Leah Posner Spielberg Adler e Arnold Spielberg. Após a separação de seus pais, Steven ainda criança foi morar na Califórnia com um casal de amigos da família, enquanto suas irmãs Anne e Nancy ficaram no Arizona com sua mãe. Por ser de família judaica, Steven sofria preconceito, apesar de ser um aluno aplicado.

Ganhou sua primeira câmera com 12 anos de idade, e fez seu primeiro longa aos 16. Aos 19 iniciou o curso de Cinema na Universidade da Califórnia, sendo que aos 22 anos teve sua estréia profissional com o curta Amblin, que foi exibido no Festival de Filmes de Atlanta e premiado no renomado Festival de Veneza. O curta abriu as portas da Universal Studios para Spielberg, que passou a dirigir vários filmes para a TV, entre eles o thriller Encurralado (1971), onde um motorista em uma rodovia é perseguido por um caminhão fantasmagórico. O filme foi tão aclamado pela crítica que foi lançado também para cinema.

Fonte: https://bit.ly/2PqdGn2

Grandes monstros, grandes fortunas

Em 1975, Steven dirigiu o filme que pode ser considerado o pai dos blockbusters: Tubarão. Além de ter sido o pioneiro em uma temática que virou um subgênero do cinema, que são as franquias de monstros marinhos (Sharknado, Piranha, Orca – a baleia assassina, Círculo de Fogo), Tubarão faturou mais de 100 milhões de dólares e virou uma febre mundial, atraindo os grandes estúdios para as superproduções de verão, com grandes investimentos em marketing e efeitos especiais. Essa tendência do cinema americano só cresceu se tornando a tônica dos maiores lançamentos até os dias atuais. Um belo exemplo é o filme de 2015 “Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros”. Continuação de uma franquia iniciada pelo próprio Steven em 1993 e atualmente dirigida por Colin Trevorrow, a película arrecadou cerca de 1,7 bilhão de dólares, e ocupa atualmente a 4° posição entre as maiores arrecadações mundiais.

Fonte: https://bit.ly/2BuD1Jm

Após o lançamento de Tubarão, vieram os bem sucedidos Contatos Imediatos de Terceiro Grau, Os Caçadores da Arca Perdida e os três primeiros Indiana Jones. Porém, sua consagração como um dos maiores diretores da história veio com o lançamento do filme que é considerado por muitos sua obra prima: E.T. – O Extraterrestre, que ano de 1982 arrecadou cerca de 793 milhões de dólares somente na bilheteria.

Mas nem só de monstros vive o diretor. Em 1993, apesar do primeiro Jurassic Park ter a maior bilheteria da década, o filme “A Lista de Schindler” foi aclamado pela crítica por sua sensibilidade ao retratar o sofrimento dos judeus na Segunda Guerra Mundial. Em partes, “A Lista de Schindler” foi um projeto pessoal do diretor, retratando o cruel passado do povo do qual descendeu, projeto esse que lhe rendeu sua primeira estatueta do Oscar como Melhor Diretor.

Criatividade sem limites

Como humanos, tendemos a simplificar ideias. Um exemplo: é fácil pensar que um filme com o tubarão gigante, um dinossauro gigante ou um alienígena gigante tem o potencial de causar medo ou desconforto, ainda que atualmente seja mais curiosidade pela megalomania. Mas na década de 70, quando as pessoas tinham contato com esses conteúdos pela primeira vez, ocorria uma overdose de sentimentos novos, uma verdadeira ressignificação no contato com o cinema. Isso é comprovado pelos valores cataclísmicos de bilheteria. Mas, pense. Esses temas levam pessoas ao cinema até hoje. Muitas pessoas.

Fonte: https://bit.ly/2nUjF6I

Para cada franquia inacabável que lança filmes cada vez piores (parem de lançar Star War’s e Jurassic Word’s, por favor), existiu um filme inovador que causou um sentimento inédito, e atrás desse filme existiu um diretor que transmitiu através da sua criatividade, algo novo. Para Ostrower (1977), criar é dar formar algo novo, sendo esse “novo” as coerências para a mente humana. O criador possui desse modo, a capacidade de compreender as relações, configurações e significados. Ele é capaz de conectar múltiplos eventos dentro e fora de si, configurando sua experiência de viver em um significado para suas perguntas e respostas (OSTROWER, 1977).

Apesar de a criatividade ser algo inerente à condição humana, em vários momentos de sua história, Spielberg compreendeu as coerências da mente humana e as usou em seus filmes, mas também criando algo totalmente novo, que naquele zeitgeist era inusitado. Portanto, a nomeação de clássico não deve ser confundido com velho, uma vez que os filmes de Spielberg lançaram modelos para os gêneros dos quais fazem parte. Os demais diretores e roteiristas o usaram muitas vezes como referência. O seguiram e o tornaram ainda mais influente, como os vassalos fariam a um rei.

Uma criação, contudo, não se origina de um Big Bang, não vem do nada. Como pontua Ostrower (1977), nós somos o ponto focal de referência da nossa própria criatividade, pois ao relacionar fenômenos nos os vinculamos a nós mesmos, nos orientando de acordo com expectativas, desejos, medo e atitudes de ordem interior. E é nessa busca de ordenação se encontra a motivação de criar.

Steven não teve uma infância tranquila, foi separado de sua família original, de suas irmãs, as quais eram as primeiras atrizes de seus filmes amadores. Sofreu preconceito dos próprios vizinhos por ser judeu. Para Fromm (2000), um dos meios para a superação parcial da ansiedade de separação é a atividade criativa, nela o trabalhador e o objeto tornam-se um, o criador une-se a sua criação que representa o mundo fora dele.

“Mamãe.”
Fonte: https://plbz.it/2vYiYxZ

“A percepção de si mesmo dentro do agir é um aspecto relevante que distingue a criatividade humana” (OSTROWER, 1977, p.2). O agir para Spielberg foi transformar seus filmes em partes, em uma representação de si. A missão de seus protagonistas é quase sempre vencer um desafio, um grande desafio.

Talvez, o expectador sente-se repetidamente na sala de cinema para ver mais um de seus filmes, porque ele próprio tem de se sentir capaz de enfrentar monstros, desvendar mistérios, ajudar alguém que precisa, ainda que você seja apenas uma criança.

Fonte: https://bit.ly/2NSZ3XD

REFERÊNCIAS:

FROMM, Erich; ROSENBLATT, Noemi. El arte de amar. São Paulo – SP: Martins Fontes, 2000.

OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. 1978.

 

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Os objetos de amor do livro “A arte de amar” de Erich Fromm

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O autor expressa por meio deste subtítulo os tipos de amor, relacionando-os com os seus objetos de amor. Pode-se começar citando que antes de adentrar cada um dos temas o autor ressalta o que ele já vinha defendendo durante todo o capítulo a necessidade de se ter um amor maduro que seja representado por amar todo mundo através de uma pessoa e amar a si próprio também por meio deste. Como o primeiro tipo de amor se trata do amor fraterno que se caracteriza por ser um amor entre iguais, um amor de caráter responsável, não exclusivo, cuidadoso, respeitoso, não é centrado em uma só pessoa uma vez que posso amar todos os necessitados da minha ajuda. Tem como objetivo o desejo de melhorar a vida de outro ser humano que esteja fora do seu ciclo próximo de convívio.

Ele é expresso por ser uma experiência de união com todos os outros homens e também como uma experiência de solidariedade e reconciliação humana. No entanto não é dada como “valida” a experiência se for com pessoas que você tem contato de convívio, este amor se relaciona a ser um amor aos desamparados. Como o autor mesmo cita as ordenanças bíblicas de amar as viúvas, os órfãos, os pobres e os estrangeiros, no sentido de serem pessoas que não servem de “nenhuma finalidade” para você. Seguidamente vem o amor materno, que também já havia sido abordado no decorrer no capitulo na construção do amar a partir das perspectivas de amor materno e do amor paterno. O amor materno se caracteriza por ser um amor de desigualdade, onde um necessita de toda a ajuda que o outro pode dar, amor ao desamparado. Não restrito a uma pessoa, pois a mãe pode ter mais de um filho e amar a todos eles.

Fonte: https://goo.gl/zRkk7b

Neste contexto de tipos de amor são ressaltados primeiramente os dois aspectos deste amor na vida da criança. O primeiro aspecto diz respeito a responsabilidade que a mão tem com a preservação da vida e do crescimento desta criança. Já o segundo demostra um aspecto além da preservação da vida deste individuo, mas também o amor à vida. Nisso o autor ressalta a importância de a mãe demostrar para o seu bebe o quanto é bom estar vivo, coabitar na terra, é bom ter nascido. O amor da mãe tem um efeito profundo e significativo na vida da criança, o autor coloca que “o amor da mãe pela vida é tão contaminador quanto sua ansiedade” (FROMM, 1956, pg. 62). Fromm ainda defende o caráter narcísico e o desejo de posse que o amor da mãe pode acarretar, enquanto criança é sentida pela mãe como parte dela, o amor e o encantamento do bebe alimento o narcisismo materno e o seu estado de indefesa e sujeita a vontade da mãe alimentam a satisfação de uma mulher dominante e possessiva.

Após este ponto, Fromm já define a diferença entre o amor erótico e o amor materno, onde duas pessoas se tornam uma em um e uma pessoa se torna duas no outro, respectivamente. Isso delineia o fracasso de muitas mães, pois elas não conseguem se desapegar de seus filhos durante o processo de separação e continuar amando-o após isto. Esta mulher que se apresenta narcísica e dominadora tem dificuldade de continuar sendo amorosa depois deste processo, o que era mais fácil enquanto seu filho era pequeno. O amor erótico é a busca por uma fusão completa com uma pessoa. Tem como características ser exclusivo, não universal, de contato, principalmente, sexual.

Fonte: https://goo.gl/oAAD3P

O ciclo do amor erótico se inicia quando um indivíduo procura amor em uma pessoa, esta pessoa em algum momento se torna intima, conhecida, tão conhecida quanto a ele mesmo, se tornando uma pessoa já explorada, esgotada de conhecimento. A relação, que antes era intensa, se torna cada vez menos intensa levando o casal a ter desejo por uma nova conquista, um novo amor, na ilusão de que este será diferente dos anteriores, recomeçando o ciclo. O desejo sexual empregado nesse tipo de amor é mais do que apetite físico, pode ser também ansiedade da solidão, vaidade, desejo de machucar, desejo de conquista, sempre vem mesclado a uma emoção forte, tornando o amor (no caso o amor maduro) apenas uma dessas emoções/motivações.

Este amor é facilmente confundido com relação possessiva devido à sua característica de exclusividade, porém este amor na verdade é de sentimento egoísta das duas partes. São apenas duas pessoas que se identificam uma com a outra, que buscam superar a experiência da solidão, superar seu estado de separação. Separação esta que o autor coloca no início do capitulo como homem e mulher que se buscam como respostas de questões emocionais, existenciais e biológicas. Inclusive coloca de forma figurada que ambos eram um só e foram colocados em estado de separação com o objetivo de se buscarem para serem salvos deste estado.

Neste momento o autor faz uma comparação do amor erótico com o amor maduro que ele vem defendendo durante todo o capítulo, pois no amor erótico se experimento a essência do ser de outra pessoa a partir do amor à minha própria essência. Expõe que o amor erótico deixa de lado o valor vontade que o amor maduro tem onde se ama por decisão, por juízo, por promessa e não apenas por um sentimento forte. O amor deveria ser essencialmente um ato de vontade, de decisão de comprometer minha vida inteiramente com a da outra pessoa. É isso, na verdade, que está por trás da ideia da indissolubilidade do matrimonio […]” (FROMM, 1956, pg. 69).

Fonte: https://goo.gl/BSdiU8

Entrando no amor a si mesmo já se depara com a fala de Calvino que põe o amor próprio como um erro, como se ele fosse uma peste, pois ele compara o amor próprio com o narcisismo de Freud, onde a libido é direcionada para si mesmo. Fromm segue com suas explicações defendendo que o amor a si mesmo é exatamente o posto a isto. Seu primeiro argumento é embasado novamente na bíblia onde cita o versículo “E o segundo [mandamento], semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. ” (Mateus 22:39) que para ele ilustra exatamente a questão de que o respeito, amor e a compreensão de si mesmo não pode ser separado do respeito, amor e compreensão do outro.

Para Fromm as atitudes em relação a nós mesmos e aos outros são conjuntivas, para ele “o amor […] é indivisível no que concerne à conexão entre objetos e nosso próprio ser” (FROMM, 1956, pg. 74). Uma vez que o esforço ativo para o crescimento e felicidade da pessoa amada arraiga a nossa própria capacidade de amar, o poder de amar. Logo, o seu “eu” é objeto de amor tanto quanto outra ´pessoa é. Essa conduta já diferencia o amor próprio do egoísmo, pois o egoísta só se interessa por si mesmo, pois não tem prazer em dar. Ao mesmo tempo que na verdade ele é uma pessoa que se odeia, ela é necessariamente infeliz, pois sua suposta preocupação consigo mesma nada mais é do que uma tentativa de compensar o seu fracasso em cuidar de si. Eles são incapazes de amar os outros, mas também são incapazes de amar a si.

Fonte: https://goo.gl/1C83V2

Também é comparado o amor próprio com a abnegação neurótica, que se caracteriza por ser aquela pessoa que não quer nada para si, rejeita qualquer valor ou bem para si mesma, abre mão de viver para si e vive apenas para os outros. Essa pessoa, na verdade é infeliz, pois tem seu relacionamento com os mais próximos fracassada. Por estas questões que Fromm defende o amor próprio como forma de garantia de que aquela pessoa tem condições de amar. E para mim, a frase que melhor sintetiza todo esse subtópico do capitulo seria a citação que o próprio Fromm faz de Mestre Eckhart. A citação engloba bem o sentimento que Fromm demostra ter ao trazer a questão dos tipos de amor e seus objetos, pois o cuidado que ele tem culmina neste último tópico do amor próprio. Por exemplo no amor materno, que se a mãe tiver amor próprio ela evita passar para o filho ansiedades e questões que podem se apresentar cada vez mais profundas se não evitadas.

No amor fraternal onde se cuida do próximo por caridade e igualdade, se você não demonstrar ser uma pessoa de bem consigo mesma, o próximo não sentirá o amor que você está tentando expressar. Fromm dá o exemplo do que significa de fato ser rico quando está fazendo as definições do “dar” no início do capitulo. Ele coloca que o rico é aquele não é mesquinho ao dar, pois ele se experimenta como alguém que é capaz de se entregar aos outros (FROMM, 1956, pg. 30). Estes são dois exemplos que culminam neste último sentimento que me foi passado no momento da leitura e como encerramento da síntese eu deixo a citação de Mestre Eckhart também para reflexões posteriores.

Fonte: https://goo.gl/XRR3w6

Se você ama a si mesmo, você ama todos os outros tanto quanto a si mesmo. Se você ama outra pessoa menos do que se ama, na verdade não conseguirá amar a si mesmo; mas, se você amar a todos, inclusive a você, igualmente, então amará todos eles como se fossem uma só pessoa [..] “ (FROMM apud ECKHART, 1956, pg. 78)

Referência

FROMM, Erick. The Art of Loving. [s. L.]: Harper, 1956. 133 p.

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Um olhar a mais para A Arte de Amar: relato de experiência

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O presente relato, que é resultado do seminário apresentado pela acadêmica de Psicologia Gabriela Gomes no Psicologia em Debate, uma “deslumbrada por temas sobre amor”, como ela bem pontuou, versou sobre uma apresentação com traços psicanalíticos envolvendo técnicas que buscam atenção e empatia. Ao contextualizar tal abordagem a apresentadora indica seu professor de psicanálise, Drº Adriano Machado de Oliveira, pela influência e sugestão da leitura do livro A Arte de Amar.

Para a palestrante o autor evidencia a questão de comparar o amor com uma arte. Uma forma artesã de construir com conhecimento e esforço o sentimento que eclode nas mais diferentes visões de amar. E por meio das informações apresentadas o amor passa por modalidades diferentes como: 1) Amor fraterno – Não tem exclusividade de pessoas. As pessoas passam a ser mais altruístas de uma forma geral; 2) Amor materno – trata-se de um amor incondicional porém dependente da mãe ser feliz consigo mesma e com o fato de ser mãe. Faz uma metáfora sobre o “leite e mel” na convivência de mãe e filho, onde o “leite” representa as necessidades básicas do filho que a mãe supre ao amamentá-lo, ao educá-lo, ao amá-lo. O “mel” representa o que instiga, que incentiva, que motiva no filho o sentimento de viver neste mundo como sendo algo bom; 3) Amor erótico – tido como amor exclusivo. Ele funde intensamente apenas com uma pessoa. Reforça ao fato de você se entregar a uma única pessoa. 4) Amor próprio – este dentro do universo de amar é ter amor por você mesmo e objetos relativos a sua pessoa.

casal de mãos dadas

Fonte: https://goo.gl/9bAMhK

Segundo Fromm (1971), o amor pode inspirar o desejo da união sexual, mas mistura nela a ternura e se o desejo da união física não for estimulado pelo amor é algo orgíaco e transitório. O autor também procura harmonizar amor próprio com o amor por outra pessoa. Explica que a pessoa que ama a si mesma é diferente da pessoa egoísta, o egoísta é ele e mais ninguém. Este amor egoísta termina quando a pessoa não lhe oferece mais algo do que se esperava; apenas uma das partes deste relacionamento é favorecida. Também foi elucidada a questão de que amor é indivisível em se tratando do objeto do amor e o próprio ser.

Contudo, a palestrante deixa uma reflexão a qual deixo minhas considerações pessoais: “O amor genuíno é uma expressão de produtividade e implica cuidado, respeito, responsabilidade e conhecimento. Não é um “afeto” no sentido de ser afetado por alguém, mas um esforço ativo pelo crescimento e felicidade da pessoa amada, enraizado na própria capacidade de amar que alguém tem.” (FROMM, 1971).

Após a citação de Fromm (1971), a palestra é finalizada com intuito de despertar o entendimento de construir uma vida pela autenticidade, respeito, responsabilidade e pureza. Valorizando o que é fidedigno em relação a mim, aos outros e objetos em geral. Esta atitude e conduta humana pode-se chamar de amor. É o compreender e aprender com ternura uma atividade prática com reciprocidade de sentimentos e ações que levam ao bem estar e não apenas ao que é afetado ou se afeta no outro.

“Psicologia em Debate” é um espaço permanente para apresentação de trabalho de pesquisa e extensão, TCC, entre outros, dos estudantes e egressos de psicologia do CEULP/ULBRA, dando oportunidade de divulgação das atividades desenvolvidas no curso. Entre os objetivos do projeto está a instrumentalização dos alunos e o estímulo para que mais acadêmicos se envolvam em atividades científicas. – Com informações do site do Ceulp/Ulbra.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

FROMM, Eric. A arte de Amar. Belo Horizonte: Editora Itatiaia Limitada, 1971. 171 p.  Tradução de Milton Amado. Título do original americano: The art of loving.

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O amor para além do romantismo

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Como participante ouvinte do Psicologia em Debate, ocorrido em 06 de setembro de 2017, com o tema “A arte de amar: o amor para além do romantismo”, sob o viés do psicanalista Erich Fromm, ministrado pela acadêmica Gabriela Gomes, na Sala 203, às 17 horas no Ceulp/Ulbra, elaborei o meu relato de experiência.

A acadêmica refere-se que, procurou trabalhar a ideia geral do livro sobre o tema amor. O autor Erich Fromm expõe o tema de forma magnífica, quando faz uma analogia sobre o ato de amar como o trabalho minucioso do artesão que, para chegar ao produto final da sua arte, é necessário dedicação desde a escolha dos materiais que serão utilizados. Onde o mesmo trabalha a reflexão que, para alguém dizer que ama uma pessoa, torna-se indispensável refletir sobre o que está sendo construindo em prol de tal objetivo. Nisso, Gabriela discorre que existem diferentes modalidades de amor. Referindo-se, sobre a definição do amor fraterno que todo ser humano precisa ter por outro ser humano, independente do papel que este ser ocupe na sua vida. “Um amor universal”, com sentimento de responsabilidade, de respeito, de conhecimento e de desejo de aprimorar o outro. Aplicado a qualquer pessoa no curso da vida, como não sendo um amor exclusivo, mas representado como solidariedade humana.

Fonte: https://goo.gl/tkzy7u

O amor materno afirmado por Erich Fromm, como sendo um sentimento genuíno e incondicional. Porém é imprescindível, que a mãe esteja feliz consigo mesma. Visto que, existem diversas circunstância em que de fato a mãe não desejaria aquele filho. Em virtude de fatores ocorridos na vida dessa mulher, que vão desde a concepção da criança, e às vezes, ela recebe uma pressão social, que a impõe o seu dever de amar o filho incondicionalmente. Mas não é sua culpa. E o autor faz uma analogia com leite e mel, referindo-se à mensagem bíblica sobre a Terra Prometida “Canaã”, que mana leite e mel. Simbolicamente o leite, traz o sentido de que quando a criança nasce, a mãe supre todas as suas necessidades. O mel significa a mãe transmitindo ao seu filho que nascer nesse mundo é algo muito bom. E que para ser uma boa mãe, esta mulher necessariamente precisa implicitamente estar feliz.

Fonte: https://goo.gl/6Z4Rx9

Relata a acadêmica que, de acordo com o autor, o amor erótico é um anseio e fusão completa por duas pessoas . Porém, não é amor genuíno, visto que não é possível, encontrar alguém na fila do pão, e já se esteja amando. Nessa condição, o outro é explorado e logo exaurido. Em virtude do encantamento pelo que a outra pessoa faz, se ela é bonita, rica, jovem, bom trabalho, etc. Com o passar do tempo todos esses atributos são explorados, chegando num momento da relação que não há mais o que explorar no outro. Daí manifesta-se a crise interna, e vem a frase clássica: “eu não amo mais”.

O autor discorre sobre a superação da separação, trazendo vários fatores. Pois o que se busca num relação amorosa, é a oportunidade de falar da própria vida pessoal, das próprias esperanças e ansiedades, mostrar-se nos seus aspectos infantis e pueris – a sua pior parte. Podendo mostrar também ao outro a sua ira, o seu ciúme. Daí pensa-se que “aquela pessoa é o verdadeiro amor da sua vida”. Porém, quando todas as barreiras são superadas, ela vai procurar outra. Pois o ser humano, precisa de objetivos sequenciais, uma vez que essa pessoa já exauriu as suas expectativas.

Fonte: https://goo.gl/pn9UEE

A acadêmica, refere-se ao outro fator, sendo o desejo sexual como fusão de corpos passando a representar o amor e a pessoa relata que está amando intensamente o outro. Discorre ainda, que no desejo sexual, há uma interação profunda com o outro, em virtude desse sentimento, a pessoa tem uma ansiedade de solidão cessada. Porém, chega momento que essa ansiedade acaba e o desejo sexual pelo o outro, não é mais suficiente para que a sustentação da relação. Porque quando há amor na relação, o desejo sexual não é algo exacerbado, no sentido de impressionar o outro com a sua performance pessoal. Numa relação de amor verdadeiro, isso não se faz necessário o tempo inteiro. O amor erótico se torna exclusivo na dedicação somente àquela pessoa, com a qual ela está envolvida emocionalmente. Cita exemplo, que não se pode pegar na mão de outra pessoa, porque pode ser considerado que deixou de amar. Tal condição faz o casal se fechar no seu mundo, como duas pessoas solitárias fundidas na sua paixão, numa espécie de amor narcísico. E Erich Fromm, traz sua concepção que quem ama, não ama somente a pessoa amada, mas também todo o seu universo.

Fonte: https://goo.gl/E4tpU6

O amor próprio e o amor erótico tem uma relação muito próxima. Onde o amor em si mesmo tem que estar em choque, de acordo com a acadêmica, o autor afirma que amar a si mesmo não significa que não tenha a capacidade de amar os outros. Pois, o objeto de amor não é indivisível. O amor pode inspirar o desejo de união sensual, a vontade de conquistar e ser conquistado, pois com o amor há a ternura, o desejo da união física deve ser estimulado pelo amor, e o amor erótico também deve ser fraterno.

E discorre a acadêmica, que afirma Erich Fromm, que a pessoa deve amar-se primeiro antes de procurar o outro. “Que o amor genuíno é uma expressão de produtividade que implica cuidado, respeito, responsabilidade e conhecimento, não é um afeto no sentido de ser afetado por alguém, mas um esforço ativo pelo crescimento e felicidade da pessoa amada”. Finalizando com a frase do autor: “Se te amas, amas a todos os demais como a ti mesmo. Enquanto amares outra pessoa menos que a ti mesmo, não conseguirás realmente amar a ti mesmo, mas se a todas as pessoas amares igualmente sem exclusão de ti, amá-los-ás como uma só pessoa” (FROMM, 2000). A acadêmica Gabriela solicita aos participantes, que façam a reflexão sobre o conceito de amor genuíno trazido por Erich Fromm. E conclui referindo-se que, as relações amorosas cotidianas terminam, citando o exemplo comum: “não deu certo o nosso relacionamento”. Mas será que estava havendo um trabalho cuidadoso artesanal, para a construção dessa obra de arte?

Fonte: https://goo.gl/hJK6rJ

Como preciosa experiência da minha participação do debate, “A arte de amar: o amor para além do romantismo”, foi magnífico conhecer a concepção de Erich Fromm, explanado pela acadêmica Gabriela, quando o autor faz analogia sobre o ato de amar com o trabalho minucioso e dedicado do artesão, que vai desde a escolha dos materiais a serem utilizados até conclusão do produto final da sua arte, o amor genuíno.

Referência:

FROMM, Erich. A arte de amar. Tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

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