Transformações no âmbito laboral e a terceirização

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Com a globalização da economia e a ampla concorrência, as organizações cada vez mais vislumbram formas de flexibilização como uma alternativa para reduzir os custos organizacionais.

As grandes mudanças ocorridas no capitalismo impactaram diretamente no mundo do trabalho. Um conjunto de medidas constituído de velhas e novas formas de exploração do trabalho passou a redesenhar a divisão internacional do trabalho, após vários obstáculos impostos ao processo de acumulação ocorridos na década de 1980, alterando de forma significativa a composição da classe trabalhadora em escala global (ANTUNES; PRAUN, 2015).

Com a globalização da economia e a ampla concorrência, as organizações cada vez mais vislumbram formas de flexibilização como uma alternativa para reduzir os custos organizacionais. Dentre as formas existentes de flexibilização do trabalho, a terceirização é uma das mais difundidas e expressivas nas empresas, especialmente no setor de serviços (PICCINI; ALMEIDA; OLIVEIRA, 2011). Conforme Antunes; Praun (2015, p. 423):

A terceirização tornou‑se um dos elementos centrais do atual processo de precarização do trabalho no Brasil, constituindo‑se num fenômeno presente praticamente em todos os ramos, setores e espaços do trabalho, pois é uma prática de gestão/organização/controle da força de trabalho que discrimina, ao mesmo tempo em que flexibiliza os contratos, eximindo‑se da proteção trabalhista.

É importante ressaltar que, apesar do processo de terceirização apresentar diferentes características quanto a relação de trabalho com a empresa contratante, os trabalhadores terceirizados são, antes de qualquer forma de labor experimental, seres humanos passíveis de necessidades, portanto, para que haja o movimento qualitativo desses sujeitos é essencial que suas necessidades primordiais sejam atendidas. Nesse sentido, Robbins, Judge e Sobral (2010) lembram que um trabalhador satisfeito é mais propenso a falar bem da organização, ajudar os colegas e ter um desempenho acima do esperado.

Fonte: encurtador.com.br/gprsB

Para que se possa compreender o contexto dos trabalhadores terceirizados faz-se necessário entender o significado do trabalho pela sociedade contemporânea e pelos indivíduos. Segundo Cardoso, Silva e Zimath (2017) o trabalho tem um importante papel na construção da identidade do sujeito. A forma como o indivíduo trabalha e o que produz interfere diretamente no modo como pensa e percebe sua independência e liberdade. “O trabalho, como parte do mundo externo ao sujeito e do seu próprio corpo e relações sociais, representa uma fonte de prazer ou de sofrimento, desde que as condições externas oferecidas atendam ou não à satisfação dos desejos inconscientes” (MENDES, 1995, p. 35).

O sentimento que o trabalhador tem em relação ao trabalho está vinculado às exigências incluídas no processo, nas relações e na organização do trabalho e muitas vezes esses fatores que incluem competitividade, produtividade, carga horária exaustiva, pouco intervalo para alimentação e descanso favorecem o sofrimento do trabalhador, acompanhado de sintomas específicos transformando o trabalho em uma necessidade para garantir a subsistência ao invés de ser uma fonte de prazer.

Contudo, os sintomas apresentados podem ser físicos ou psicológicos que se diferem entre si pois o físico é visível e o psicológico é considerado invisível, tornando mais difícil fazer a relação do nexo causal entre adoecimento e trabalho.

Então é de suma importância a significação do trabalho para cada sujeito, e a desqualificação profissional também pode gerar sofrimento para o trabalhador.

Mesmo trabalhos socialmente apontados como não qualificados necessitam de reconhecimento em termos psicossociais e processos saúde-doença. Pode-se dizer então que o não reconhecimento gera frustração e desmotivação nos trabalhadores, tornando-se por vezes patológico, visto que o trabalhador espera que suas tarefas sejam julgadas pela utilidade, ou seja, que ele seja útil econômica, científica, tecnicamente, entre outros aspectos (CARDOSO, SILVA E ZIMATH apud MERLO, 2017, p. 702).

Cabe refletir também sobre as transformações que vêm ocorrendo no mundo do trabalho a partir do século XX. Antes os empregos eram permanentes e duradouros com a força de trabalho especializada para a função, agora com o surgimento de novas tecnologias, começam a se desenvolver formas inovadoras de organização do trabalho. Assim, as concepções de trabalho mudam porque elas resultam de um processo de criação histórica, sofrendo influência de interesses econômicos, ideológicos e políticos (NEVES, et al. apud BORGES, 2018.)

Fonte: encurtador.com.br/aj168

Para Marx segundo Neves et al (2018), o trabalho na lógica de produção capitalista leva à alienação, pois muda a visão de liberdade do homem quando faz com que ele venda sua força de trabalho para garantir a sobrevivência. O produto (resultado final do trabalho) e o processo de produção estão centralizados na mão de quem detêm o capital, então o trabalhador subordinado não tem controle sobre essas variáveis, está submetido à lógica do consumo e do descartável, onde por um lado existe uma cobrança exacerbada por produtividade que leva a sobrecarga do trabalhador e por outro lado existe uma parte da sociedade que acumula bens.

A introdução de máquinas no processo de trabalho também contribuiu para a mudança nesse contexto já que permite produzir mais e em menos tempo, desenvolvendo essa necessidade de produtividade cada vez maior, o que repercute na exploração da força de trabalho. Essa lógica da produção começa a interferir também nas relações interpessoais onde a ética individualista, a insegurança e a competitividade são intensificadas:

Os trabalhadores submetidos à ameaça constante da demissão e a insegurança em relação à permanência no emprego concorrem entre si para que possam “garantir” sua permanência nele. Assim, o desejo de vencer e obter sucesso se torna uma “obsessão”, requisitando do trabalhador uma dedicação extra sem limites, que se estende para além dos muros das organizações (NEVES, et al. apud ANTUNES, 2018).

Nesse contexto de transformação no mundo do trabalho e mudanças nas estratégias gerenciais surge a terceirização, em que serviços considerados auxiliares pela organização como limpeza, vigilância, manutenção e transporte são realizados por empresas contratadas e não mais por funcionários ligados à própria organização. Essa contratação feita através de uma empresa fora da instituição cria uma diferença entre as classes, fazendo com que os trabalhadores estáveis e terceirizados não se sintam parte de um mesmo coletivo, o que acarreta a não construção de solidariedades e estranhamentos entre as duas categorias.

Fonte: encurtador.com.br/xHNW7

Como relata Lima (2010) os terceirizados são percebidos como menos qualificados e envolvidos na empresa, e os estáveis com direitos legítimos, mais capacitados, entre outras. O mesmo se reproduz no acesso a benefícios da empresa como serviços, clubes e até eventos, no qual os terceirizados não participam. Essa disparidade entre os funcionários reflete no não reconhecimento do trabalho e invisibilidade desse tipo de profissional que como já vimos interfere na significação do trabalho e saúde e doença do trabalhador.

REFERÊNCIAS

ANTUNES; Ricardo, PRAUN; Luci. A sociedade dos adoecimentos no trabalho. Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 123, p. 407-427, jul./set. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/sssoc/n123/0101-6628-sssoc-123-0407.pdf> Acesso em: 16 jun 2019.

CARDOSO, P. S.; SILVA, T.; ZIMATH, S. C.; Todo mundo olha, quase ninguém vê: a percepção de trabalhadores operacionais com relação à invisibilidade social de seus trabalhos. Cad. Bras. Ter. Ocup., São Carlos, v. 25, n. 4, p. 701-711, 2017. Disponível em: < http://www.cadernosdeterapiaocupacional.ufscar.br/index.php/cadernos/article/view/1608/905>. Acesso em: 01 jun 2019.

CARDOSO, J. A. L. Na terceirização selvagem, retrato de um projeto. 2017 Disponível em: <https://outraspalavras.net/sem-categoria/na-terceirizacao-selvagem-retrato-de-um-projeto/>. Acesso em: 17 jun 2019.

Ideal Marketing. Vantagens da terceirização: como seu negócio pode se beneficiar com parceiros personalizados. 2018. Disponível em: <https://www.idealmarketing.com.br/blog/vantagens-da-terceirizacao/>. Acesso em: 17 jun 2019.

LIMA, J. C. A terceirização e os trabalhadores: revisitando algumas questões. Cad. psicol. soc. trab. v.13 n.1 São Paulo 2010. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172010000100003>. Acesso em: 04 jun 2019.

MENDES, M. B. Aspectos Psicodinâmicos da Relação Homem-Trabalho: as contribuições de C. Dejours. Rev Psic ciência e profissão, 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pcp/v15n1-3/09.pdf>. Acesso em: 15 mai 2019.

NEVES, D. R. et. al; Sentido e significado do trabalho: uma análise dos artigos publicados em periódicos associados à Scientific Periodicals Electronic Library. Cad. EBAPE.BR [online] vol.16, n.2, pp.318-330; 2018. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S1679-39512018000200318&lng=en&nrm=iso&tlng=pt>. Acesso em: 01 jun 2019.

PICCININI, V. C.; ALMEIDA, M. L.; OLIVEIRA, S. R. Sociologia e administração: relações sociais nas organizações. Rio de Janeiro: Elsevier. 300 p., 2011.

Pumariega, Y. N.; Paganini, S. S. Trabalho: entre o prazer e o sofrimento. 2017. Disponível em: <http://psicologiaaplicadaets.blogspot.com/2017/06/trabalho-entre-o-prazer-e-o-sofrimento.html>. Acesso em: 17 jun 2019.

Resistência Anti Socialismo, A alienação do trabalho. 2013. Disponível em:<https://resistenciaantisocialismo.wordpress.com/2013/11/01/a-alienacao-do-trabalho/>. Acesso em 17 jun 2019.

ROBBINS, S. P.; JUDGE, T. A.; SOBRAL, F. Comportamento organizacional: teoria e prática no contexto brasileiro. 14. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, p. 633, 2010.

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A cultura na ‘Civilização do Espetáculo’

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O livro “A Civilização do Espetáculo” escrito por Mario Vargas Llosa no ano de 2012, relata a crise de conceitos ligados à cultura e como a mesma se tornou um espetáculo diante de uma civilização sensacionalista. Llosa deixa claro no início o objetivo do livro, que segundo ele é mostrar a transformação que a cultura teve ao longo do tempo. Ao decorrer do livro, o autor pontua também o conceito de cultura e questiona qual o verdadeiro papel da cultura na sociedade.

Llosa apresenta antes das suas considerações o trabalho de outros autores que também abordaram o tema cultura em diversas perspectivas ao longo do tempo. Foi verificado por ele que apesar das diferenças existentes entre os conceitos expostos por cada autor, encontra-se uma pequena semelhança. Todos acreditam que a cultura está percorrendo uma grande crise e tornou-se decadente.

O primeiro autor citado por ele foi T.S. Eliot, criador da obra Notas para uma definição de cultura, em 1948. Eliot além de conceituar o termo cultura, também critica o sistema cultural da época, afirmando que o modelo de cultura está mudando gradativamente. Logo após surge a obra de Guy Debord, A Sociedade do Espetáculo criada em 1967. Apesar da semelhança dos títulos, a obra de Debord refere-se a concepções diferentes da cultura do livro de Llosa. Debord acreditava que “espetáculo” seria tradução de “alienação” onde o ser humano é levado a crer em necessidades capitalistas.

Fonte: goo.gl/H6LU6L

A publicação de George Steiner, No castelo do Barba Azul: Algumas notas para a redefinição da cultura, de 1971, relaciona a cultura com a religião, onde o autor cita que a grande arte surge da transcendência. Próximo à obra de Llosa, foi publicado o livro Mainstream, de Frédéric Martel, mostrando a “nova cultura” relatada em tempos atrás por outros autores, que já foi deixada para trás com a velocidade do tempo.

Já a obra de Mario Llosa A Civilização do Espetáculo, apresentada neste trabalho, acredita que a cultura não é entendida como algo ligado a economia e ao social, mas sim feita de obras literárias e artísticas, de valores éticos e estéticos que se relacionam com a vida social do homem.

Diante disso, o que seria essa Civilização do Espetáculo, segundo Llosa? Para ele (2012), é a supervalorização do entretenimento, onde a sociedade busca incessantemente divertir-se e fugir do tédio. Somente uma pessoa muito rigorosa em seus princípios reprovaria essa população que busca relaxar e descontrair por terem vidas rotineiras e deprimentes. Mas, nem só de diversão vive o homem, colocar o entretenimento como supremacia acarretaria, segundo Llosa, na “banalização da cultura, generalização da frivolidade e, no campo da informação, a proliferação do jornalismo irresponsável da bisbilhotice e do escândalo.” (LLOSA, 2012, p. 30)

Fonte: goo.gl/5EgFuy

De acordo com Llosa (2012), há também outro fator importante para que essa realidade se tornasse duvidosa, a democratização da cultura. Tal fator surgiu de intenções altruístas, na qual, a cultura precisava estar ao alcance de todos, por meio da educação e das diversas manifestações culturais, e não somente pertencendo a um grupo, sendo patrimônio de uma elite. Entretanto, essa ideia de fazer com que a cultura chegasse a todos, tornou a vida cultural medíocre, devido a facilitação formal e superficialidade dos conteúdos.

Llosa (2012, p. 31) então define cultura como, “… todas as manifestações da vida de uma comunidade: língua, crenças, usos e costumes, indumentária, técnicas e, em suma, tudo que nela se pratica, evita, respeita e abomina”. A cultura logo, não pode ser entendida apenas como um passatempo agradável, visto que isso causará a sua desnaturalização e seu depreciamento. Tudo que pertence a ela se iguala ao extremo, de forma que uma apresentação de ópera e um espetáculo de circo, possuem o mesmo significado.

Na civilização contemporânea é perceptível que a culinária e a moda preenchem um espaço significativo nas seções que são destinadas à cultura, assim como chefs e estilistas se tornaram protagonistas, papel que antes era conferido à cientistas, filósofos e compositores. Dessa forma, fornos, fogões e passarelas, confundem-se com livros, concertos, laboratórios e óperas. Assim como artistas da televisão e jogadores exercem uma grande influência sobre os gostos e costumes, influência essa que antes era exercida apenas por professores, pensadores e teólogos (LLOSA, 2012).

Fonte: goo.gl/8d3WPC

Segundo Llosa (2012), algumas características dessa época são o vazio deixado pelo desaparecimento da crítica, a massificação aliada à frivolidade da cultura do nosso tempo, e o empobrecimento das ideias como força motriz da vida cultural. O desaparecimento da crítica proporcionou que a publicidade se tornasse um vetor determinante na vida cultural, exercendo influência significativa sobre os gostos e costumes. A massificação, corresponde ao culto do corpo ser maior que o trabalho para fortalecer o conhecimento intelectual. O empobrecimento é o ato de deixar-se os livros para trás, dando espaço para cinema, televisão e internet.

Para Llosa (2012), a civilização do espetáculo é cruel. A sociedade esquece rapidamente os acontecimentos, não guarda remorsos, assim não possuem consciência e passam sem perceber por cenas de morte e destruição. Estão sempre buscando novidades, não importa qual seja, mas que seja uma inovação, algo atual.
Ao longo da história foram atribuídos diferentes significados para a “cultura”, sendo esta considerada parte da religião e do conhecimento teológico. Mesmo com as várias mudanças, a cultura sempre significou uma soma de fatores e disciplinas, diante de um amplo consenso social que a construiu e que, por ela, era implicado.

Fonte: goo.gl/f1YzLq

Nos tempos atuais, é possível verificar ainda a ocorrência de mudanças que ampliaram a noção de cultura. Antropólogos estabeleceram que “cultura” é a soma de crenças, conhecimentos, linguagens, costumes e sistema de parentesco, sendo assim considerada tudo aquilo que o povo diz, faz, teme ou adora.  O livro “À Cultura na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais” de Mikhail Bakhtin propunha raciocínios sutis sobre a “cultura popular” que teve como foco se contrapor a cultura oficial. Esta última, nasceu de salões, palácios, conventos e bibliotecas, e, já a popular, nasce e vive nas ruas, nas tabernas e em festas. A cultura popular diferencia-se da cultura oficial por mostrar o que estava oculto na mesma, como o sexo, funções excrementícias, a descortesia, e opunha-se ao “mau gosto”, e ao suposto “bom gosto” das classes dominantes.

É válido mencionar que além das concepções de Bakhtin sobre a cultura popular e a oficial, existem várias outras no mundo, o que implica na não consideração de uma única como verdade absoluta, mas sim considerando um “mix” de cultura, pois cada povo possui um tipo de conhecimento e não se pode saber sobre tudo. Depreende-se então que a cultura é de suma importância para que se possa compartilhar conhecimentos.

Nesse interim, a cultura precede e sustenta o conhecimento, pois o orienta e confere-lhe uma função precisa, podendo ser entendida como um preceito para a dissociação do conhecimento para outros povos distintos que não partilham do mesmo. A cultura pode e deve ser uma experimentação para que se ampliem os horizontes, mediante as experiências de vida, a fim de que se revelem os segredos e consequentemente, se revolucionem as sensibilidades diante da condição humana. É necessário que se tenha pensamentos, sonhos, paixão, e além de tudo, que se tenha uma revisão crítica profunda de todas as certezas, convicções, teorias, crenças, sem que se afaste a vida da vida, para que assim, a cultura também possa ser um processo de reflexão.

Fonte: goo.gl/FXzhwA

Para o autor, não há maneira de saber o que é cultura, tudo é cultura e nada é cultura. Ainda que alguém questione o fato de que, nunca na história houve acúmulo tão grande de descobertas científicas, realizações tecnológicas, nunca foram publicados tantos livros, abertos tantos museus nem oferecidos preços arrebatadores pelas obras de artistas antigos e modernos. O mesmo enfatiza a diferença de cultura e especialização, já que se discute a época em que as naves espaciais construídas pelo homem e a porcentagem de analfabetos é a mais baixa de toda a história, mas isso não é obra de pessoas cultas, e sim de especialistas. Explicando que o número de alfabetizados é um aspecto quantitativo e a cultura não tem relação com a quantidade, mas com a qualidade.

A cultura é ou era, quando existia, a conexão entre povos diferentes que, com o avanço dos conhecimentos, eram obrigados a especializar-se, distanciando uns dos outros e deixando de comunicar-se. A cultura também era uma bússola possibilitando os seres humanos a orientação dos conhecimentos sem perder a direção.
Na era da especialização e da derrubada da cultura, as hierarquias desapareceram numa mistura monstruosa. A confusão que iguala as inumeráveis formas de vida batizadas como culturas, onde todas as ciências e técnica se justificam , não havendo maneira de distinguir o que é belo em artes e o que não é.

O texto afirma que a especialização, que existiu desde os primórdios da civilização, foi aumentando com o avanço dos conhecimentos. As elites,eram as minorias cultas, que, além de estender pontes entre os diferentes campos do saber, ciência, letras, artes e técnicas, exerciam influência, religiosa ou leiga, carregada de conteúdo moral, para que a evolução intelectual e artística não se afastasse demais da finalidade humana, garantindo melhores oportunidades e condições materiais de vida.

Fonte: goo.gl/ZJDpQy

Eliot enxergava nos valores da religião cristã a base do saber e da conduta humana, que ele chamava de cultura. Mas para o autor, a fé religiosa não é o único suporte possível para que o conhecimento não se torne vago e autodestrutivo. Nesse processo, seria confuso atribuir funções iguais à ciências, às letras e às artes. Sendo exatamente o esquecimento de discrimina-las, o que contribuiu para a confusão presente no campo da cultura atualmente.

As letras e as artes se renovam, mas não progridem, não destroem o passado, constroem sobre ele. Por esse motivo, as letras e as artes constituíram até agora o denominador comum da cultura, o espaço no qual era possível a comunicação entre seres humanos, apesar das diferenças de línguas, tradições, crenças e épocas.

Segundo o texto, a cultura pode ser experimentação e reflexão, pensamento e sonho, paixão e poesia e uma revisão crítica constante e profunda de todas as certezas, convicções, teorias e crenças. Mas para o autor a impressão é de que a cultura foi sendo construída de forma tão frágil, assim como os castelos de areia, que desmancham como a primeira ventania.

A partir do exposto, foi possível observar uma diferença relevante na cultura do passado e no entretenimento dos dias de hoje. Antes tudo que era produzido tinha o intuito de permanecer presente para as futuras gerações, até começarem a ir perdendo espaço para outras coisas novas e mais vantajosas. O autor afirma aqui “A cultura é diversão, e o que não é diversão não é cultura” (LLOSA, 2012, p. 27).

Vive-se, então, a civilização do espetáculo, onde tudo é entretenimento, é diversão, é a busca pela evitação do tédio, da tristeza. Em consequência ocorre a democratização da cultura. Esta deixa de pertencer a elites e passa a fazer parte da realidade de todos, gerando, assim, uma cultura medíocre e superficial. Entendendo que a mesma define-se como qualquer “manifestação da vida de uma comunidade” (LLOSA, 2012, p. 31).

* Trabalho resultante da disciplina de Sociedade e Contemporaneidade, ministrada pelo prof. Sonielson Sousa

FICHA TÉCNICA DO LIVRO

Fonte: goo.gl/36ibjp

Título: A civilização do espetáculo
Autor: Mario Vargas Llosa
Editora: Objetiva
Ano: 2013
Páginas: 208

 

REFERÊNCIA:
LLOSA, Mario Vargas. A Civilização do Espetáculo: Uma radiografia do nosso tempo e da nossa cultura. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

 

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A Identidade Cultural na Pós-Modernidade: para entender o contemporâneo

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Stuart Hall, em sua obra “A Identidade Cultural na Pós-Modernidade”, fala inicialmente sobre a crise de identidade que permeia a vida dos indivíduos na sociedade. A crise de identidade segundo o autor é percebida como parte de um processo de mudança, a qual está interferindo nas estruturas, questões centrais das sociedades modernas e influenciando nos moldes de referência que serviam aos indivíduos como sustentação estável no mundo social. O autor deixa claro que sua intenção ao escrever o livro era de explorar questões relacionadas à crise de identidade cultural: como ela se dá, se essa crise existe e até mesmo quais as dimensões que a mesma está tomando.

Uma das hipóteses levantadas acerca dessa crise é a ideia de que as identidades modernas estão sendo descentradas, ou seja, separadas. Stuart debruça-se sobre esse argumento com o intuito de refletir e compreender quais as consequências dessa fragmentação, além de incrementar o texto com complexidades e análises das contradições que o termo “descentrar” desconsidera.

Fonte: http://zip.net/bttNpl

O livro foi organizado dividido em seis partes e no primeiro capítulo o autor discorre sobre “A Identidade em questão” expondo três definições de identidade: o sujeito iluminista; sujeito sociológico e do sujeito pós-moderno. O autor afirma que existe uma alteração na estrutura que está transformando a sociedade moderna do século XX. Essa mudança se dá a partir da dissolução do cenário cultural em termos de sexualidade, gênero, etnia, raça, etc. o que antes era uma base para o direcionamento como indivíduos sociais. Além disso, a identidade pessoal foi influenciada e agora as pessoas não têm mais um sentido de si, quer dizer, houve uma descentração/ deslocamento do sujeito.

Stuart também coloca que esse deslocamento do indivíduo tanto do seu lugar no mundo social e cultural quanto de si, propicia o surgimento de uma crise de identidade para o mesmo. Ele acrescenta que, se analisadas em conjunto, essas alterações podem significar sobretudo uma modificação da modernidade. Concordamos com essa hipótese, uma vez que as pessoas, em sua maioria, têm em mente a ideia de evolução. Talvez seja a globalização com o advento da tecnologia que subsidiou essa transformação conjunta dos vários aspectos sociais que formam o indivíduo atualmente e que está sendo trabalhado no livro.

De acordo com as concepções de identidade apresentadas pelo autor, o sujeito iluminista é individualista e centrado em si, dotado de razão. Assim, o centro para essas pessoas seria o próprio interior. No entanto, ao apresentar o sujeito sociológico, Stuart pontuou que somente o interior não era suficiente, e que nesse tipo de identidade, há a compreensão de que somos formados a partir da relação com as pessoas que mediam valores, símbolos e sentidos, característicos de uma cultura. Já o sujeito pós-moderno, é aquele que se modifica a partir da forma como é representado ou interpretado, ou seja, torna-se “uma celebração móvel”. Concluindo a primeira etapa da definição de identidade, o autor acredita que condição de permanência, a certeza e a continuidade, são condições que se desmancham no ar nestes tempos pós-modernos, o que justifica a mudança entre os extremos.

Fonte: http://zip.net/bhtMRs

É muito interessante quando o autor traz a ideia de que a “identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia” (HALL, 2013, p.13) e que os indivíduos possuem mais de uma identidade. Assim como ele, acreditamos que para as mais variadas situações, temos uma nova maneira de ser e agir na sociedade, ou seja, a nossa identidade não é coerente, uma vez que, a cada nova representação adquirida formamos várias identidades. Além disso, na visão do autor, as sociedades modernas mudam constante, rápida e permanente e é essa a principal diferença das sociedades tradicionais.

Na segunda parte “Nascimento e morte do sujeito moderno” surge o conceito de descentração do sujeito. Além disso, o autor trata de questões como os impactos da globalização sobre a identidade cultural. Stuart explicita de maneira clara e objetiva que a sua intenção nesse capítulo é mostrar como o sujeito humano é, passando pelos diversos processos que moldaram a sua identidade. O quando o sujeito era individual e centrado e aos poucos se tornou um ser interativo. Na sociedade moderna, o indivíduo já se mostra descentrado.

Nesse momento, o autor trata da morte do sujeito cartesiano, ou seja, sujeito racional, pensante e consciente, bem como cita algumas obras e autores que colaboraram com esse processo na modernidade tardia. Também, faz referência às obras e autores que de certo modo agitaram as bases do sujeito moderno e permitiram estabelecer os descentramentos, uma vez que suas ideias narram os deslocamentos do sujeito por meio de várias aberturas nos discursos do conhecimento moderno, as quais foram comentadas por ele com diferentes tipos de descentração do ser indivíduo.

A primeira descentração seria das tradições do pensamento marxista, a qual afirma que o ser humano faz a sua história somente a partir das condições que lhes são dadas. Já a segunda, surgiu a partir de Freud com a descoberta do inconsciente em que para ele a formação da identidade, sexualidade e desejos têm base em processos psíquicos do inconsciente humano. Ferdinand de Saussure colaborou com a perspectiva de que nós não somos os criadores das afirmações que fazemos, nem dos significados que expressamos na língua.

Fonte: http://zip.net/bttNpn

Michel Foucault colaborou para a definição do quarto modelo de descentramento que é o poder disciplinar, este se preocupa não somente com a vigilância e regulamentação da espécie humana, mas também com o indivíduo e o corpo. O quinto descentramento diz respeito ao impacto gerado pelo feminismo “tanto como crítica teórica quanto como um movimento social” (HALL, 2006, p.45), acreditamos que foi por meio desses novos conceitos que os movimentos sociais ganharam força na pós-modernidade. Stuart acredita que se considerarmos o sujeito do iluminismo como tendo uma identidade fixa e estável, perceberemos que foi descentrado, o que resultou nas várias identidades possíveis (sejam elas abertas, contraditórias, inacabadas ou fragmentadas) do sujeito pós-moderno.

No terceiro capítulo o autor vem falar das identidades culturais desse “sujeito fragmentado”, ou melhor, as identidades nacionais desse mesmo. Então ele faz uma pergunta mais especifica: “Como as identidades culturais nacionais estão sendo afetadas ou deslocadas pelo processo de globalização?” Para responder a pergunta Hall conceitua seu pensamento com duas citações, sendo uma de um escritor mais conservador e a outra de um autor mais liberal. Paralelas a essas, Hall se firma no pensamento mais conservador, que acredita que não nascemos com identidades nacionais mas que elas são formadas e transformadas pelas nossas representações.

Ao nos definirmos, algumas vezes dizemos que somos ingleses ou galeses ou indianos ou jamaicanos. Obviamente, ao fazer isso estamos falando de forma metafórica. Essas identidades não estão literalmente impressas em nossos genes. Entretanto, nós efetivamente pensamos nelas como se fossem parte de nossa natureza essencial (p.47).

Fonte: http://zip.net/bvtM56

Portando essa nacionalização da identidade se fez muito importante. Quando uma nação mergulha nessa identidade criam-se formas de apropriá-las, adjetiva-las. E torná-las um diferencial.

A formação de uma cultura nacional contribuiu para criar padrões de alfabetização universais, generalizou uma única língua vernacular como o meio dominante de comunicação em toda a nação, criou uma cultura homogênea e manteve instituições culturais nacionais, como, por exemplo, um sistema educacional nacional. Dessa e de outras formas, a cultura nacional se tornou uma característica-chave da industrialização e um dispositivo da modernidade (p.49).

Com o decorrer do texto o autor cogita uma nação imaginada, que as diferenças entre as nações encontram-se nas formas diferentes pelas quais elas são imaginadas. Logo mais ele menciona cinco elementos para responder a pergunta: “Como é contada a narrativa da cultura nacional?”.

A primeira é a Narrativa da Nação, “tal como é contada e recontada nas histórias e nas literaturas nacionais, na mídia e na cultura popular”. Já a segunda é a Ênfase nas Origens, “Está lá desde o nascimento, unificado e contínuo, “imutável” ao longo de todas as mudanças, eterno”. A terceira é cidadã por Hobsbawm e Ranger, que chamam de Invenção da Tradição. Posteriormente temos a quarta que é a do mito fundacional, “[…] origem da nação, […] [num passado tão distante que eles se perdem nas brumas do tempo, não do tempo “real”, mas de um tempo “mítico”].”. E por fim a quinta, que é simbolicamente fundamentada na ideia de um povo ou folk puro, “nas realidades do desenvolvimento nacional, é raramente esse povo (folk) primordial que persiste ou que exercita o poder”.

O discurso da cultura nacional não é, assim, tão moderno como aparenta ser. Ele constrói identidades que são colocadas, de modo ambíguo, entre o passado e o futuro. Ele se equilibra entre a tentação por retornar a glórias passadas e o impulso por avançar ainda mais em direção à modernidade (p.56).

A outra seção, ainda do mesmo capítulo, é voltada para a questão de saber se as culturas e as identidades nacionais que elas constroem são realmente unificada. O autor pede ainda para nos atentarmos aos três conceitos ressonantes daquilo que constitui uma cultura nacional como uma “comunidade imaginada”: as memórias do passado; o desejo por viver em conjunto; a perpetuação da herança.

Fonte: http://zip.net/bqtNFl

Anteriormente falamos das identidades nacionais, que foram alguma vez tão unificadas ou homogêneas quanto fazem crer as representações que delas se fazem. Porém, na história moderna, as culturas nacionais têm dominado essa “modernidade” e as identidades nacionais tendem a se sobrepor a outras fontes, mais particularistas, de identificação cultural.Ainda no início do quarto capítulo o autor faz o seguinte questionamento :O que, então, está tão poderosamente deslocando as identidades culturais nacionais, agora, no fim do século XX?”

O mesmo logo dá a resposta: um complexo de processos e forças de mudança, que, por conveniência, pode ser sintetizado sob o termo “globalização”.Apesar da globalização não ser um fenômeno tão recente, ela vem tomando forças e alguns autores argumentam que o efeito geral desses processos globais tem sido o de enfraquecer ou solapar formas nacionais de identidade cultural.

Alguns teóricos culturais argumentam que a tendência em direção a uma maior interdependência global está levando ao colapso de todas as identidades culturais fortes e está produzindo aquela fragmentação de códigos culturais, aquela multiplicidade de estilos, aquela ênfase no efêmero, no flutuante, no impermanente e na diferença e no pluralismo cultural […] (p.73).

De certa forma o que está sendo discutido é a “tensão entre o “global” e o “local” na transformação das identidades.” As identidades nacionais, são as representações vinculados a lugares, eventos, símbolos, histórias particulares. “Elas representam o que algumas vezes é chamado de uma forma particularista de vínculo ou pertencimento”.

Stuart Hall se opõe à natureza fatalista que muitas pessoas atribuem à globalização, as quais a tratam como um movimento que aniquilaria as identidades locais devido à imposição de uma cultura homogênea sobre ela. Para ele, a grande mudança que vem em decorrência da globalização é simplesmente a forma com a qual o “local” e o “global” se relacionam. No entanto, Hall diz que esse referido “local” seria algo totalmente novo, bem como o “global” também o seria, não deixando nunca de se influenciarem mutuamente.

Fonte: http://zip.net/bmtMzf

Outro aspecto a ser analisado é aquele chamado de “geometria do poder, visto que de acordo com a distribuição social de cada localidade, a globalização acontece de formas diferentes para cada grupo, de acordo com suas particularidades, bem como o grau de acesso que tais indivíduos teriam a uma “cultura global”. Tal cultura, segundo o autor, se trataria de uma produção principalmente ocidental, que parte dos antigos países colonizadores, considerados o centro, para as suas antigas colônias, tratadas como “periferias”.

Para Hall, apesar da relação inegavelmente hierarquizada entre antigas metrópoles e suas colônias, a globalização acabava por colocar ambos frente a frente, estabelecendo assim uma relação entre ambas. Ele observa que apesar de tal dominância sócio-cultural, é nas grandes cidades globalizadas que se pode encontrar marcas de diversas outras culturas pelo mundo, como restaurantes especializados em comidas típicas dos cinco continentes, ainda que para os cidadãos de tais centros a origem de tais restaurantes sejam terras distantes paradas no tempo fantasiosamente criadas em suas mentes.

Um ponto importante a se trazer é que para o autor esses cenários distantes fantasiosos não existiriam desta forma justamente porque, apesar da discrepância de acesso em relação aos países desenvolvidos, tais lugares também se globalizam e pluralizam, ainda que em uma velocidade reduzida. Por motivos diversos, os países ocidentalizados vão deixando de fornecer somente bens de consumo aos periféricos, e passam a observar a chegada de tais populações em seus territórios. Essas novas ondas migratórias acarretam em mudanças drásticas na composição social de tais nações, com novas e variadas formas de pertencimento a tais territórios.

Fonte: http://zip.net/brtMFm

Como resposta mudanças bruscas em curtos espaços de tempo, surgem tanto uma busca dos ditos “exóticos” por uma identidade cultural, quanto movimentos reacionários por parte de determinadas camadas dominantes que se consideram prejudicadas por tais transformações. O fato é que tal variedade contribui para o surgimento de pluralidades, sejam políticas, sociais, culturais ou raciais, mesmo dentro de grupos razoavelmente homogêneos

É importante ressaltar que, para Stuart Hall, o grande fenômeno decorrente é o que ele chama de “tradução” de pessoas para novas culturas, visto que um indiano que viva na Inglaterra nunca deixaria de ter em sua formação os princípios trazidos de seu país de origem, mas também carregaria consigo novos princípios adquiridos no novo país. Considerando ainda que ele venha a ter filhos com uma pessoa de um terceiro país, as crianças seriam influenciadas em maior ou menor escala por um número ainda maior de referências culturais, o que enriqueceria ainda mais esta nova práxis globalizada.

FICHA TÉCNICA 

Título Original: A Identidade Cultural na Pós-Modernidade
Autor: Stuart Hall
Editora: DP&A
Ano: 2005

 

REFERÊNCIA:

HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. 10a. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

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Medo Líquido: os fantasmas contemporâneos

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O PAVOR DA MORTE

O que é a morte? Para muitos o fim, para outros o apenas o começo. O fato é que ela é inevitável para todos, independentemente da espécie, povos, línguas ou classe social. Ela não se importa, em como, os indivíduos se comportam. Se são bons, ou ruim, se são “puros” ou “impuros”. O “fim” faz parte da regra do jogo, e não há nada que o ser humano possa fazer para detê-la. “Só a morte significa que nada acontecerá daqui por diante, nada acontecerá com você, ou seja: nada que você possa ver, ouvir, tocar, cheirar, usufruir ou lamentar. É por essa razão que a morte tende a permanecer incompreensível para os vivos” (BAUMAN, 2008, p. 44).

O autor considera que o medo da morte é um processo inato ou original de todas as pessoas. A morte é um conteúdo acessível a consciência, e constantemente se faz presente na vida de todos da espécie humana, causando em alguns um medo incontrolável. “[…] o medo que se origina, não da morte batendo a porta, mas de nosso conhecimento de que isso certamente ocorrerá, mais cedo ou mais tarde […] (BAUMAN, 2008, p. 46).

Fonte: http://zip.net/brtMZW

A morte pode ser descrita de forma diferente através do processo cultural e das crenças, pois alguns, tendem a vê-la como apenas uma passagem, no qual somente o corpo físico morre e, a alma é imortal, ou seja, vive para toda a eternidade. “[…] não vão deixar o único mundo que existe para se dissolver e desaparecer no submundo da não existência, apenas se mudarão para outro mundo, onde continuarão existindo […]” (BAUMAN, 2008, p. 46). Para estes o medo pode não existir ou pode ser menor. Para outros o medo do desconhecido a incerteza do que poderá ou não acontecer após a morte.

Segundo Simonetti (2003, p. 14) “A imortalidade é algo intuitivo na criatura humana. No entanto, muitos têm medo, porque desconhecem inteiramente o processo e o que os espera na espiritualidade”. Durante todo o ciclo vital relações são estabelecidas e vínculos são criados. Com a chegada da morte de algum ente querido esses laços físicos são desfeitos, porém podem nunca serem esquecidos, pois quem morre levará consigo “parte” de pessoas e consequentemente deixará também “partes” suas, para outros. Assim os que sobrevivem vão ressignificando ou não suas vidas.

O medo pode provocar diversas reações físicas e psicológicas e também ser descritos de várias maneiras, no entanto o autor o descreve como:

Os medos que disseminam são incuráveis e, na verdade, inextirpáveis: chegaram para ficar-podendo ser suspensos ou esquecidos (reprimidos) por algum tempo, mas não exorcizados. Para esses medos não se encontrou nenhum antídoto nem é provável que se venham a inventar algum. Eles penetram e saturam a vida como um todo, alcançam todos os recantos e frestas do corpo e da mente, e transformam o processo da vida num ininterrupto e infinito jogo de “esconde-esconde” (BAUMAN, 2008, p. 44).

Fonte: http://zip.net/bwtMw8

O MEDO E O MAL

As formulações para o conceito do que seria o “mal” têm sido feitas no decorrer dos tempos. Bauman (2008) pontua as variações do termo, relacionando-o a condutas perversas. No entanto, aponta que não é possível explicá-lo totalmente, tampouco evitá-lo. Considerando algumas catástrofes naturais como manifestações do “mal”, destaca-se seu caráter imprevisível, reforçando sua inevitabilidade e imprevisibilidade. No entanto, questiona-se o mal advindo do humano, em termos de prenúncio e consequências.

O sociólogo polonês enfatiza a análise de Hannah Arendt quanto à banalização do mal. Quanto mais as práticas cotidianas são racionalizadas, maior a tendência de não pensar acerca da natureza das tais. E nesse ponto a opinião de Bauman é ratificada, pois salienta que há condições apropriadas ao surgimento de condutas inclinadas ao mal. Observando-se tais circunstâncias, chega-se a um ponto crucial: em vista da sua inevitabilidade, há que se reconhecer que não apenas a natureza, mas o humano pode dobrar-se ao mal.

Ainda que não se discuta ou se reconheça a maldade como intrínseca ao ser humano (HOBBES, 2008 apud SOUSA, 2013), Bauman relata a possibilidade evidente de que mesmo o mais “normal” incorra em atos perversos. Para Correia (2005, p. 87-88), Pode optar por isso

Na busca por identificar o fundamento da propensão para o mal no homem, Kant se vê diante da dificuldade de ter de conciliar natureza e liberdade. Com efeito, se se compreende o mal como decorrente de algum condicionamento natural, ainda que seja uma fraqueza, necessariamente o homem seria inimputável, pois não poderia ser considerado efetivamente responsável (na medida em que não seria livre) pelas ações que desencadeasse. Kant, por razões óbvias, busca evitar uma tal compreensão, sustentando que a propensão para o mal “é uma tendência deliberativa e, como tal, completamente distinta de um impulso natural ou algo assim”.

Fonte: http://zip.net/bqtNZb

Entende-se, portanto, que o medo constante na contemporaneidade cerca o fato de que ninguém pode receber confiança. Uma vez que a configuração atual é instável, acrescente-se a possibilidade de alguém poder, deliberadamente, inclinar-se ao mal. E a despeito das consequências dramáticas do “mal” da natureza, Bauman enfatiza que o produto do mal humano pode ser tão catastrófico quanto o anterior.

O HORROR DO INADMINISTRÁVEL

Bauman inicia o terceiro capítulo de sua obra referenciando ideias de Jean-Pierre Dupuy, importante filosofo moderno e ao desenrolar deste capítulo, Bauman reforça a ideia de que a humanidade está doente e a beira de um colapso, enfatizando que “A humanidade tem agora todas as armas necessárias para cometer o suicídio coletivo, seja por vontade própria ou falha – para aniquilar a si mesma, levando o resto do planeta à perdição” (BAUMAN, 2008, p. 97-99).

A corrida contra o tempo, disputas de poder, busca por status, longas distâncias e pouco tempo, excesso de trabalho e sobrecarga emocional se debruçam sobre a vida do homem moderno com o rótulo de globalização, sobretudo esse evento e sub-eventos trazidos pela globalização se chocam com os valores morais carregados de maneira intrínseca por cada um, e Bauman de maneira esplendida reforça que: “a civilização deve seu potencial mórbido (ou mesmo suicida) às mesmíssimas qualidades de que extrai sua grandeza e seu glamour: a aversão inata à autolimitação, a transgressividade inerente e o ressentimento e desrespeito em relação a todas as fronteiras e limites” (BAUMAN, 2008, p. 100-101).

Ou seja, de onde os homens extraem sua couraça de poder terreno é também a fonte de seus demônios doentios que afetam e contaminam a humanidade, como uma dialética onde de um lado encontram-se os prazeres e ganhos como dinheiro, conforto, luxo, status, reconhecimento social e poder, em contrapartida temos a fadiga, avareza, ganancia, esgotamento psicológico entre outros fatores e agravantes negativos, como uma dialética grega de apolíneo e dionisíaco.

Fonte: http://zip.net/bftMZz

Para manter a retroalimentação entre as partes, Bauman (2008) traz nesse capítulo o termo detours que significa desvio, ele também aborda o significado deste termo dentro da modernização, que segundo ele tem a ideia de uma satisfação ou recompensa temporária, ou seja, para evitar o esgotamento total ou um impacto extremamente negativo em si mesmo ou no outro, há uma breve e temporária satisfação, acontece um momento de compensação para aquele provável dano, então a partir dessas breves recompensas, a humanidade se compra e se vende para uma recompensa ilusória e breve.

Ao decorrer do capítulo, Bauman (2008) traz impasses que denunciam até que ponto o homem é capaz de se submeter, e traz referencias de obras de outros autores acerca disso, mostrando-nos de forma objetiva e clara como a persuasão e a busca por controle, poder e domínio conduzem a vida da humanidade.

O TERROR GLOBAL

Bauman afirma que com a globalização, surgiram aspectos negativos que resultaram em medos, inseguranças e incertezas na sociedade. A  “abertura” da sociedade, expressão de Karl Popper como coloca Bauman (2008 p.126), teve como efeito colateral a “globalização negativa” que demonstra um cenário de irregularidades e anormalidades que se tornam regras. O autor descreve que a globalização é altamente seletiva do comércio  e do capital, da vigilância e da informação, da coerção e das armas, do crime e do terrorismo, todos esses desdenham a soberania nacional e desrespeitam quaisquer fronteiras entre os Estados.

O planeta globalizado, comenta Bauman (2008, p.127), ‘habitado por sociedades forçosamente ”abertas” a segurança não pode ser obtida”, o autor acrescenta que consequentemente a “globalização negativa” seria a causa da própria injustiça e as origens dos nossos medos estão relacionadas com a ordem política e a ética. Convivemos com incertezas e com medo em nossos dias.

Fonte: http://zip.net/bhtNbY

Costa (1998) apud Santos (2003) coloca que o medo seria fronteiriço entre sensações e sentimentos: “angústia, mal-estar, desconforto são eventos afetivos que podem ser descritos como sentimentos ou como sensações, dependendo de critérios adicionais como maior ou menor reflexividade, maior ou menor modificação dos estados físicos dos sujeitos etc.”

Conforme coloca Frattari (2008), “ não  há a possibilidade sequer de se falar em termos de ‘riscos’, uma vez que estes podem, de acordo com sua definição ser calculados e, assim, minimizados ou evitados”.  Bauman (2008,p.129) fala que riscos são importantes desde que continuem calculáveis e passíveis de uma análise de custo-benefício, a preocupação aos planejadores da ação são os que podem afetar os resultados, numa perspectiva relativamente curta de espaço e tempo.

O grande desafio do século atual, segundo Bauman (2008 p.166), é a aproximação do poder e a política de forma global. Com a globalização negativa, o poder e a política se desenvolveram em direções opostas. As ações não podem ser locais e sim globais.

Bauman (2008 p.167) afirma que: “…o medo é um dos aspectos mais representativos nas sociedades abertas atualmente, com isso a insegurança e a incerteza nos tornam frágeis e com um sentimento de impotência”. Esse sentimento de impotência persisti, porque não percebemos estar no controle, seja sozinhos, grupos ou coletivamente dos assuntos que são pertinentes a nós, como da mesma forma em relação ao controle de assuntos do planeta. Bauman acrescenta que é preciso criar ferramentas que ajudem a solucionar os males globais e assim recuperar o controle de nossas forças.

Fonte: http://zip.net/bctMGz

TRAZENDO OS MEDOS À TONA

Segundo autor, em sua busca por saber sobre os medos advindos da modernidade líquida, surgidos da insegurança e consequentemente nutridos por ela, sugere que os países desenvolvidos traz uma expectativa de segurança, de estarem protegidos,  nessa parte desenvolvida, os mesmos são considerado o povoado mais seguro, se empregando de meios eficazes de se protegerem, concomitantemente, estão usufruindo de todas as três fachadas em que se agarram os combates em conservação da existência: em oposição a potência da natureza, em oposição ao enfraquecimento inato de nossos corpos e em oposição às ameaças da violência imediatas dos indivíduos.

Contrariando o supracitado, é neste cenário de conforto que o caos se instala, a obsessão por segurança é inevitável, o medo toma conta dessas pessoas, e os torna deslumbrados por tudo que envolve segurança e proteção.  (BAUMAN, 2008).

A promessa moderna de evitar ou derrotar uma a uma todas as ameaças à segurança humana foi até certo ponto cumprida – embora não a promessa reconhecidamente exagerada, altamente ambiciosa e com toda probabilidade impossível de cumprir, de acabar com elas de uma vez por todas. O que, no entanto, flagrantemente de se materializar é a expectativa de liberdade em relação aos medos nascidos da insegurança e por esta alimentados (BAUMAN, 2008, p.169).

Fonte: http://zip.net/bmtMVX

O medo por sua vez, traz na sua raiz a insegurança, a sociedade vive no mais completo desespero, uma busca desenfreada por tudo que possa garantir sua segurança, ou seja, o pânico se instalou na contemporaneidade. Cabe ressaltar que os seres humanos não são isentos de suas responsabilidades, a formas egocêntricas e desumana de ser traz consigo uma participação nesse quadro alarmante de medos sucedidos das incertezas. (BAUMAN, 2008).

Podemos dizer que a variedade moderna de insegurança é marcada pelo medo principalmente da maleficência humana e dos malfeitores humanos. Castel atribui à individualização moderna a principal responsabilidade por esse estado de coisas (BAUMAN, 2008, p. 171).

A humanidade está em volta de seus próprios interesses, a individualidade se instala em maior grau na sociedade moderna.

[…] em nossa sociedade, por trás do medo e da violência, há, na verdade, uma profunda insegurança em relação às transformações que a modernidade trouxe em seu bojo: individualismo, competitividade, perda do status social, perda dos referenciais comunitários, instabilidade emocional e material, desencantamento religioso e, em última instância, as consequências da globalização negativa. Nesse sentido, é importante definir e compreender o estágio atual da modernidade e os elementos que dela decorrem, obscurecendo nosso cotidiano e nossas vidas. (DAMIÃO, 2012, p .26).

O medo paralisa, faz crescer nossas defesas, o que é inevitável diante dos acontecimentos inerentes a espécie humana e dos adventos da contemporaneidade, consequentemente os medos vem à tona.

Fonte: http://zip.net/bvtNrz

O PENSAMENTO CONTRA O MEDO

Bauman termina o livro não fazendo um resumo do que foi disposto nos capítulos anteriores, ou mesmo se coloca alheio a situação, retirando sua responsabilidade do processo. Mas se coloca e também os demais produtores de reflexão social, definido por ele como os “intelectuais”. Em prática, o pensamento contra o medo é justamente usar do pensar para combater os medos que assolam a sociedade pós-moderna. Por isso a importância dos pesquisadores e produtores de conhecimento intelectual buscarem formas de idealizar novos modos positivos e esperançosos.

Para tanto é preciso que tomem consciência do poder que possuem. Em toda a história os sábios sempre davam os conselhos, porém não o executavam, sendo assim nunca tiveram o devido conhecimento e reconhecimento que tinham no processo.

Os intelectuais nunca confiaram realmente em seus poderes de transformar o mundo de carne e osso. Precisavam de alguém para empreender a tarefa que, insistiam, deveria ser realizada. Alguém com o poder real de fazer as coisas e assegurar que continuassem sendo feitas (o conhecimento não necessita do poder para mudar o mundo? Da mesma forma que o poder precisa do conhecimento para mudá-lo da maneira certa e com o propósito correto?). (BAUMAN, 2008, p. 210).

Sendo assim deve-se levar em conta a imensa responsabilidade no combate aos medos, assim como preconceitos, mentiras ou injustiças que assolam a vida dos sujeitos e das relações contemporâneas, não se mostrando assim indiferente a tais mazelas sociais afim de redesenhar a “possibilidade de um atalho para um mundo mais adequado à habitação humana que se perdeu de vista e parece mais irreal do que antes” (BAUMAN, 2008, p. 221).

Sendo assim, o que se espera é essa união entre os intelectuais e o povo, de modo a juntos caminharem em um processo terapêutico, e assim ressignificando a “humanidade e seu conjunto”.

REFERÊNCIAS

BAUMAN, Zygmunt. MEDO LÍQUIDO. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2008.

CORREIA, Adriano. O conceito de mal radical. Trans/Form/Ação, Marília, 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31732005000200005&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 22 mai. 2017.

SOUSA.

DAMIÃO, Abraão Pustrelo. Modernidade, Medo e Violência: Reflexões Teóricas e o Caso de Marília/SP. 2012. Disponível em: <https://www.marilia.unesp.br/Home/Pos-Graduacao/CienciasSociais/Dissertacoes/DAMIAO_A_P_ME_2013.pdf.> Acesso em: 21 mai. 2017.

FRATTARI, Najla Franco. Insegurança e medo no mundo contemporâneo: uma leitura de Zygmunt Bauman. Sociedade e Cultura, v. 11, n. 2, 2008.

SANTOS, Luciana Oliveira. O Medo Contemporâneo: Abordando Diferentes Dimensões. Psicologia Ciência e Profissão, 2003, 23 (2), 48-55

SIMONETTI, Richard. Quem tem medo da Morte? 3a Edição – Ceac Editora -Bauru-SP Janeiro/2003 <http://bvespirita.com/Quem%20Tem%20Medo%20da%20Morte%20(Richard%20Simonetti).pdf.> Acesso em 20 mai. 2017.

SONIELSON L. Vamos falar da maldade? (En)Cena. Disponível em: <http://encenasaudemental.com/comportamento/insight/vamosfalar-da-maldade/>. Acesso em: 22 mai. 2017.

 

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Um Senhor Estagiário: a moderna gestão feminina

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Este texto tem como proposta uma articulação com o filme “Um Senhor Estagiário”, mais especificamente na personagem Jules Ostin interpretada pela atriz Anne Hathaway, uma CEO [1] (Diretora Executiva) fundadora de um site de moda, cujo objetivo é a venda de roupas. A gestão de Jules permite visualizar as mudanças organizacionais, entre as quais a reestruturação que o mundo do trabalho passou a contemplar por volta do final da década de oitenta, aderida pelas novas formas de administrar e organizar; privilegiando o modelo japonês que busca redução de custo, um maior controle de qualidade e ainda o aumento dos resultados, conforme a autora (BARRETO, 2009, p. 1) vem explicitando acerca de como esse novo modo de gestão vem contribuir para a influência nos valores identitários e a saúde dos trabalhadores e trabalhadoras,  que são absorvidos pelo ideal de competitividade, disciplina e integração à empresa.

No filme Um Senhor Estagiário, a característica marcante da CEO Jules, é de um perfil centralizador e uma exigência quanto à garantia de um padrão de excelência no que se refere aos produtos e serviços que a Startup [2] oferece aos clientes internautas. Quanto a esse aspecto os trabalhadores são extremamente comprometidos e motivados, fruto desse controle das mudanças organizacionais que tem alterado a natureza do trabalho humano e o perfil esperado do trabalhador, conforme alerta (SILVA, 2015, p. 133) sobre os gestores adotarem uma postura de escuta atenta, com um ambiente mais saudável, dando margem para o trabalhador procurar “ajustar a realidade do trabalho aos seus desejos e necessidades, o que torna possível a transformação do sofrimento, do reconhecimento e do prazer”. (SILVA, 2015, p. 136).

A realidade do mundo do trabalho e o conceito clássico de emprego perpassam uma realidade em que a autora (BERGAMINI, 2015, p. 113) aponta que após anos de previsões otimistas e alarmes falsos, as novas tecnologias de informação e comunicação fazem sentir seus impactos. Nesse sentido, os administradores diante de uma nova forma de gestão passam a se questionar inquietantemente sobre a possibilidade das pessoas passarem a produzir diante de determinadas condições nas quais elas normalmente não estariam motivadas para o trabalho; esse é o grande desafio da atualidade para o ideal de gestão inovadora.

A preocupação com a gestão de pessoas é tema recorrente e de emergência, devido o impacto que as transformações acontecidas pela globalização oportunizaram para o setor organizacional, acirradas pela competitividade e adequação desse trabalhador ao mercado de trabalho, oportunizando assim práticas de uma gestão motivacional que adeque esse trabalhador ao ritmo de produção afinado com o mercado. A autora define gestão de pessoas como: “um conjunto de políticas e práticas definidas de uma organização, para orientar o comportamento humano e as relações interpessoais no ambiente de trabalho” (CARVALHO, 2014).

Sendo assim, o filme Um Senhor Estagiário oportuniza entender esse embate entre saber conduzir uma empresa com moderna gestão de pessoas, fazendo-as produzir, e assim aumentando os números; a startup de Jules apresentou um recorde de vendas. O crescimento que era esperado para um prazo de cinco anos aconteceu em menos da metade desse prazo.  Entendendo que o capital intelectual como é denominado atualmente na moderna gestão de pessoas, seria o elemento que faz a diferença para o efeito competitivo. Conjuntamente a esse capital intelectual e o aumento crescente da produtividade, oportunizando assim o surgimento das questões relativas ao modo de gestão compatível com essa realidade que requer o cuidado com a dignidade e saúde mental do trabalhador.

Articulando com o filme, a gestão da CEO Jules possibilita perceber traços de um possível adoecimento, pelo fato de que os colaboradores entendem que em certas oportunidades não deveriam se aproximar dela, ficando atentos a certas atitudes do seu comportamento, por exemplo, quando a mesma está piscando muito. O que no filme, Jules parece estar a um passo de ter a sua vida pessoal afetada pela exaustiva demanda da sua gestão, contextualizada no capitalismo.

REFERÊNCIAS:

BASSOTI, J. M. (Org.) Uma Nova Gestão é Possível. São Paulo: FUNDAP. 2015. Disponível em:< https://books.google.com.br>. Acesso em: 29 mar 2017.

BARRETO, M. Saúde Mental e Trabalho: a necessidade da “escuta” e olhar atentos. Cad. Bras. Saúde Mental, Vol. 1. Nº 1 jan.-abr. 2009.

CARVALHO, M. F. S. Gestão de Pessoas: Implantando Qualidade de Vida no Trabalho Sustentável nas Organizações. Revista Científica do ITPAC. V.7, n.1, Pub.6, Jan. 2014. Disponível em:< www.itpac.br/arquivos/Revista/71/6 pdf > Acesso em: 03 abr.  2017.

ROCHA, E. R. G. T. Desigualdades Também no Adoecimento: Mulheres Como Alvo Preferencial das Síndromes do trabalho. XVI Encontro Nacional De Estudos Populacionais, Caxambu-MG. 2008. Disponível em: <www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2008/docs.PDF/ABEP 2008_1215.pdf> Acesso em: 23 abr . 2017.

[1] CEO – Sigla Inglesa de Chief Executive – Officer Diretor Executivo, é a pessoa com maior autoridade na hierarquia operacional de uma organização.

 [2] STARTUP – Empresas jovens que buscam a inovação em qualquer área ou ramo de atividade, procurando desenvolver um modelo de negócio escalável que seja repetível.

FICHA TÉCNICA DO FILME: 

UM SENHOR ESTAGIÁRIO

Diretor: Nancy Meyers
Elenco: Robert De Niro, Anne Hathaway, Rene Russo, Andrew Rannells;
País: EUA
Ano: 2015
Classificação: 10

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Bauman: a globalização e o mal-estar na pós-modernidade

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o mundo que se move

Fonte: http://migre.me/vmdsf

O período da pós-modernidade é essencial para entendermos os livros “Globalização: as consequências humanas” e “O mal-estar da pós-modernidade” e assim relacionarmos as linhas de pensamento de Bauman. Na pós-modernidade o mundo existe de maneira instável, onde tudo é imprevisível. Antes desse período se vivia na modernidade, podendo-se desfrutar uma vida mais estável em alguns aspectos como o estilo de vida. A mudança de um período para outro ocorre graças a todo um aparato tecnológico e social. A globalização, comunicação eletrônica, narrativas curtas, fluidez e extraterritorialidade são alguns desses motivos. Troca-se um estilo de vida onde as pessoas primavam por uma permanência em um local, diferente do que ocorre hoje, onde há dezenas de mudanças.

Portanto, o ser humano passa por profundas mudanças decorrentes dessa transição de período. Essas mudanças são as que causam o que Bauman denominou de mal-estar pós-moderno. Algumas características desse mal-estar são: incerteza, insegurança, ansiedade, medo, além de diversos outros problemas que assolam tal período. Há ainda uma busca exacerbada pela individualidade, deixando de lado a preocupação com quem está ao redor. Essa busca além de impossível de se realizar com eficácia torna o homem mais egoísta, trazendo para o período ainda mais instabilidade. Essa instabilidade ocorre pelo fato de o indivíduo necessitar de uma plateia, mas está não pode o odiar, deve antes torcer pelo mesmo.

egoista

Fonte: http://migre.me/viUd5

Nesse período as relações são menos duradouras, diferente do que ocorria na modernidade. Se junta a essas relações curtas a dificuldade de se estabelecer amizades duradouras, colocando o homem só em meio a tudo. Em muitas situações há ainda a dificuldade de se formar uma família estável. Se por um lado o homem alcançou níveis de instrução grandiosos, em contrapartida ele se tornou solitário e incapaz de ser totalmente feliz no período em que vivemos.

Possivelmente esse período pode deixar de existir, caindo inclusive na sua característica de fluidez. Essa queda repetiria o que ocorreu com a modernidade, no entanto, a perspectiva de melhora sempre será mínima, pois a configuração da era globalizada em que vivemos pode ser inconsistente nas relações, porém, é certa enquanto sistema político e econômico. Assim, as doenças causadas por essa época continuarão a existir. Todos os problemas relacionados ao período causam desordens psicológicas que não são curadas em definitivo, apenas podem ser tratadas. Portanto, podemos dizer que decidimos conviver com os problemas, que não podemos vencer estes. Assim temos dezenas de autores preocupados em retratar esse período e seus defeitos. Um deles é o polonês Zygmunt Bauman, do qual trabalharemos dois capítulos de dois de seus livros.

Livro: Globalização – As consequências humanas

Cap. 4: Movendo-se no mundo x O mundo que se move

No capítulo é feita uma analogia entre o poder econômico do “turista”, que representa o que há de melhor no capitalismo, mostrando-o como um consumidor em potencial. Na outra ponta do iceberg está o “vagabundo viajante”, que não é um turista propriamente dito, este se diferencia do primeiro, pois não é bem visto e não representa o poder econômico da sociedade capitalista. A passagem resume o que o capitalismo e o sistema produzem: De um lado o consumidor potencial que representa as grandes desigualdades e do outro o “viajante vagabundo”, que representa a pobreza.

O capítulo discorre sobre questões como o consumo, onde o consumidor e mostrado como alguém incapaz de contentamento, quanto mais este tem mais ele pensa que não tem o bastante. Tal atitude delineia o quanto a sociedade consumidora é problemática. O rico é posto como um modelo a ser seguido pela sociedade. Nas últimas décadas essa visão se alterou, sendo que na atualidade o mais importante a riqueza em si, não os exemplos de quem a produz. Essa visão se deve ao fato de como o rico escolhe seu modo de vida, pois para a visão geral, não há defeitos nos modos de vida de alguém abastado.

turista-fazendo-compras-2

Fonte: http://migre.me/viYcL

Já o consumidor (turista), vê o vagabundo (viajante) como um ser que nada acrescenta a sociedade, não ajudando no crescimento da economia e merecedor de um “exilamento”, pois são vistos apenas como despesa ao estado. O turista muitas vezes pode ser infeliz mesmo vivendo a sua vida conhecendo diversos lugares. Essa infelicidade pode ocorrer caso o turista viaje como forma de mostrar seu poder aquisitivo, ou caso ele tenha outras atividades que não pode pôr em prática graças as suas viagens. Outro ponto levantado no texto permeia o que seria uma hibridização do indivíduo “viajante”. Essa pessoa teria agregado as suas ideias diversas outras dos mais diferentes lugares, no entanto, o mesmo cai em um erro de se achar superior ao habitante local. O “ser” local também cairia em um erro caso perdesse suas características culturais.

Livro: O mal estar da pós-modernidade

Cap. 1: O Sonho da pureza

O capítulo O Sonho da Pureza discorre sobre os impactos que as grandes ideias causam quando estas são aplicadas. Levanta-se a questão da pureza x impureza. A ideia de pureza está intimamente ligada com as desigualdades, não havendo estas disparidades é impossível se buscar a pureza. A ideia de pureza se relaciona com a harmonia com que algo esteja inserido no meio. A impureza ou o que é sujo também pode ser vista como algo que pode ser modificado, dependendo do lugar de sua colocação. Ex: algo pode ser impuro e mudando de lugar se torna puro. A consequência da pureza é a ordem, já o da impureza é a desordem social. Essa ordem pode variar conforme a época e lugar, tendo ligações com o modelo econômico e político.

Fala-se sobre uma empatia de ações, onde um indivíduo no lugar de outro teria as mesmas ações e reações para determinada situação que fosse imposta a ele em uma sociedade pura. No entanto, um indivíduo externo a qualquer lugar que seja, quando se depara com questões de costumes do grupo no qual acaba de se inserir e as acha inadequadas ele acaba levantando ideias contra a mesma, pois esta pessoa nova no grupo não precisará ter o mesmo pudor do restante do grupo.

Com o passar dos anos houve uma preocupação com o ser externo ao grupo local e suas ideias para implementação de uma nova ordem, com o tempo houve a queda da ordem vigente dando início a pós-modernidade. Porém, um grande defeito dessas purificações correntes é justamente o fato de que hoje vivemos em uma ordem e no amanhã essa ordem já se tornou impura e deve ser modificada. No mundo atual a incerteza e desconfiança governam a sociedade.

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Fonte: http://migre.me/viZHt

Ideias totalitárias também se correlacionam com a ideia de pureza onde muitos movimentos totalitaristas buscavam a ideia de pureza e de um mundo perfeito através da força. O que se firmou independente das mudanças do tempo é a preocupação em manter as pessoas com sede de consumo. Pode-se alterar de tudo, mas o consumo deve ser mantido como algo essencial para viver mesmo não o sendo. Atualmente o critério de pureza se correlaciona com a capacidade de consumir, onde quem não pode consumir na quantidade que o padrão exige é considerado impuro, tornando-se um consumidor falho.

Correlação

Os capítulos 4 do livro “Globalização – As consequências humanas” e 1 do livro “O mal estar da pós-modernidade” se relacionam quando discorrem sobre as desigualdades sociais. No primeiro de um lado há o turista e o viajante, onde um é o consumidor em potencial e o outro não respectivamente. Já no capítulo 1 há o discurso da pureza colocando o consumidor em potencial como o ideal de pureza, contrapondo com o consumidor inabilitado, com baixo poder aquisitivo e que equivale ao viajante.

Nos títulos dos livros já percebemos que haverá semelhanças entre os textos. O título “globalização – As consequências humanas” e o outro “O mal estar da pós-modernidade” chegam a ser complementares, o mal-estar que existe nessa pós-modernidade acorre justamente pelo mundo globalizado, trazendo inúmeras consequências para o homem. Nos dois capítulos existem várias passagens que se correlacionam. Quando Bauman diz que na busca pela pureza existe a necessidade de se eliminar os excluídos socialmente que não possuem poder de compra logo nos lembramos do “turista” citado no capítulo 4, o que há em comum com os dois é justamente o empecilho que a sua existência causa ao sistema vigente.

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Fonte: http://migre.me/viYAn

Ainda sobre o consumismo, nos dois capítulos são amplamente discutidos, no primeiro é dito que o consumidor não possui capacidade de contentamento quanto ao consumo. Já no segundo é mostrado que há uma preocupação em se purificar os costumes, desde que o hábito do consumo exacerbado seja preservado. Ambos os capítulos falam sobre a infelicidade que ocorre ao consumidor na ordem vigente na sociedade, pois com este há sempre a preocupação de consumir. Já o turista pode ser infeliz pelas coisas que não pode fazer devido as suas viagens. Ambos discorrem sobre um mal-estar presente em quem vive inserido na pós-modernidade.

No capítulo do livro “Globalização – As consequências humanas” é citada a hibridização do indivíduo que viaja, pois o mesmo agrega ideias dos mais diferentes lugares. Esse ponto se relaciona no mal-estar da pós-modernidade onde o indivíduo externo na busca pela “pureza” e por conhecer diferentes lugares discorda da ordem vigente, podendo assim modificar a mesma, causando um leve mal-estar em que não se pode afirmar que o que era aceito ontem vai ser aceito hoje. Podemos pensar em uma ideia de pureza como a buscar por ter apenas turistas, não havendo assim os viajantes. O viajante representa o consumidor falho, ao qual na busca da purificação e melhoria da ordem é necessário retirar do meio em que o consumidor em potencial (turista) vive.

Bauman mostra uma grande preocupação com a dinâmica da pós-modernidade, fazendo uma crítica que permeia inclusive as mazelas do capitalismo. Quando adentramos nos textos do autor queremos não estar inclusos na classe dos menos favorecidos que devem desaparecer. E se somos da classe com poder aquisitivo não iremos querer associar a futilidade descrita da mesma com as nossas atitudes. O grande problema na sociedade atual é a grande quantidade de pessoas que pertencem as classes menos favorecidas. Nesse contexto as ideias totalitárias, muito presentes no nosso mundo, há uma busca por eliminar ou diminuir essas classes de alguma forma, seja reciclando os mesmos ou até mesmo erradicando essas classes.

Essa ideia corrobora a tese do artigo Marx pós-modernidade e a crítica contemporânea à pós-modernidade, que traz um indivíduo que considera a sociedade como um obstáculo a acumulação de riqueza. Como já dito anteriormente, as mudanças na ordem causadas pelos seres externos ou por ideias exteriores, há quase que um incentivo para que essas ideias sejam aceitas. Em contrapartida a essa nova tendência podemos destacar sociedades mais fechadas que não são abertas as novas tendências, essas sociedades poderiam ser definidas como protetoras para que não haja o mal-estar tão presente na pós-modernidade? Provavelmente não, pois o simples fato de um governo ou grupo proibir essas mudanças é algo que permeia uma espécie de totalitarismo.

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Fonte: http://migre.me/viYQb

Muitas ideias são levantadas sobre uma uniformidade dos pensamentos, coloca-se em questão se uma pessoa em lugar de outra tomaria as mesmas decisões que a primeira. No entanto, sabemos que pessoas externas e com ideias adversas não teria pudor algum em tomar uma decisão diferente. Isso traz a tona o grande mal-estar que a pós-modernidade passa com frequência, onde as incertezas são maiores que as certezas graças a essas decisões adversas.

Como citado no artigo Marx pós-modernidade e a crítica contemporânea à pós-modernidade, já existe essa crítica há muito tempo. Como é dito no texto, a pós-modernidade representa apenas os interesses do poder econômico que domina a sociedade, além de ser um fenômeno ligado a “mundialização”, sendo assim uma tendência. Ainda sobre o artigo podemos dizer a pós-modernidade é o modelo capitalista em sua globalização total. O artigo cita que uma reflexão sobre a crítica marxista pode ser uma ferramenta para superação da pós-modernidade.

Podemos concluir com os escritos de Bauman é que há um mal-estar motivado pelos fatores citados anteriormente. Esse mal-estar tende a continuar pela dinâmica que vivemos, sendo esse modo de viver imperfeito. Bauman mostra com exemplos práticos que em qualquer situação o indivíduo que é menos favorecido é aquele das classes menos favorecidas. Pode-se tirar grande vantagem dos escritos do autor, o que contribui para tomar decisões e entender porque determinada situação ocorre. Os capítulos são claros e explicativos, podendo servir de exemplo para tal entendimento do contexto em que vivemos.

REFERÊNCIAS:

BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as consequências humanas. Zahar, 1999.

BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Zahar, 1999.

MAIA, Antônio Glaudenir Brasil; DE OLIVEIRA, Renato Almeida. Marx e a crítica contemporânea à pós-modernidade. Argumentos, v. 3, n. 5, 2011.

DA MODERNIDADE, A. Passagem Interna para a Pós-modernidade. Psicologia Ciência e Profissão, v. 24, n. 1, p. 82-93, 2004.

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Giddens: auto-identidade em tempos de insegurança

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Anthony Giddens nasceu na Inglaterra e aos 21 anos graduou-se na Universidade de Hull. É sociólogo, conferencista e professor, reconhecido pela sua “Teoria da Estruturação”. Tem mais de trinta obras publicadas, que se caracterizam em três fases de sua vida acadêmica. Inicialmente, redefine a nova visão sociológica apontando uma abordagem teórica e metodológica baseada em uma interpretação crítica dos clássicos da sociologia. Na segunda fase, desenvolveu a “Teoria da Especulação” que definiu como a forma da dependência mútua entre o “agente humano” e a estrutura social, que está intimamente implicada na produção da ação. A terceira fase compreende os trabalhos mais recentes, em que destaca a modernidade, a globalização e a política, principalmente o impacto da modernidade sobre o social e a vida pessoal dos indivíduos. Define os postulados da Terceira Via entre o Capitalismo Liberal e o Socialismo.

O livro Modernidade e Identidade é constituído por sete capítulos, sendo eles, nesta ordem: Os contornos da alta modernidade; O eu: segurança ontológica e ansiedade existencial; A trajetória do eu; Destino, risco e segurança; A segregação da experiência; Tribulações do eu, e O surgimento da política-vida. A obra traz como alvo principal “o eu” e tem como ênfase o surgimento de novos mecanismos de auto-identidade que são constituídos pelas instituições da modernidade. Apenas os dois primeiros capítulos serão abordados nessa resenha.

No primeiro capítulo, Giddens, inicia com a pesquisa “Segundas Chances”, de Judith Wallerstein e Sandra Blakeslee, que fala sobre o divórcio e um novo casamento, dando ênfase no processo da ruptura ao recomeço para que possa fazer uma conexão da vida pessoal a um plano mais institucional. Em seguida dá um sentido geral ao termo modernidade, que são instituições e modelos de comportamentos estabelecidos após o feudalismo, e que também deu inicio à “industrialização da guerra“. A modernidade produz formas sociais distintas como o estado-nação. As instituições modernas surgem como um extremo dinamismo, visto que ocorre um ritmo rápido de mudança social. O autor divide o caráter dinâmico da vida social moderna em três conjuntos de elementos, que são eles: Separação de tempo e espaço (a condição para a articulação das relações sociais ao longo de amplos intervalos de espaço-tempo, incluindo sistemas globais), seguido por Mecanismos de desencaixe (consiste em fichas simbólicas e sistemas especializados. Separam a interação das particularidades do lugar) e, por ultimo, Reflexividade institucional (o uso regularizado de conhecimentos sobre as circunstancias da vida social como elemento constitutivo de sua organização e transformação).

2Fonte: www.behance.net

As pessoas que vivem hoje nos países industrializados estão sujeitas a tensões para o “eu” e a sociedade como um todo. Embora relativamente mais protegidos da atuação das forças naturais, estão submetidos a outros riscos. Os perigos ambientais que ameaçam os ecossistemas da Terra são hoje muito mais presentes. Esses exemplos ilustram o que o autor denomina de dialética do local e do global e tanto a cultura quanto a economia e as dimensões sociais têm papel preponderante.

Segundo Giddens, o encontro entre o eu e a sociedade torna a auto-identidade problemática, mas que não se trata de situação de perda ou de aumento da ansiedade. Assim, tanto a terapia ao nível dos indivíduos quanto das instituições maiores da modernidade é um meio de lidar com uma expressão da reflexividade do eu.

No segundo capítulo, Giddens defende o ponto de vista explorado pela perspectiva fenomenológica existencial e da filosófica de Wittgenstein onde o ser humano é saber, quase sempre, em termos de uma descrição ou outra, tanto o que se está fazendo como por que se está fazendo. No decorrer do capítulo, o autor aborda segurança ontológica e a confiança. A noção de segurança ontológica liga-se intimamente ao caráter tácito da consciência prática e a confiança básica se liga de maneira essencial à organização interpessoal do tempo e do espaço. Para Giddens, ansiedade é um estado geral das emoções dos indivíduos e devemos ver a motivação como um estado de sentimento, envolvendo formas inconscientes de afeto bem como angústias e estímulos mais conscientes. A relação de confiança, ansiedade e segurança estão interligadas e o autor exemplifica com o cotidiano de uma criança e suas relações sociais.

3Fonte: infjunraveled.tumblr.com

O autor aborda a questão existencial da auto-identidade que está mesclada com a natureza frágil da biografia que o indivíduo deixa transparecer. A identidade de uma pessoa não se encontra no comportamento ou nas reações dos outros, mas na capacidade de manter em andamento uma narrativa particular. A biografia do indivíduo, para que ele mantenha uma interação regular com os outros no cotidiano, não pode ser inteiramente fictícia. O eu é analisado tanto em sua dimensão ontológica quanto em sua trajetória na modernidade e o controle do corpo é um meio fundamental através do qual se mantém uma biografia da auto-identidade e ao mesmo tempo o eu está quase sempre em exibição para os outros.

Do ponto de vista acadêmico, não poderia descartar a obra como fonte de conhecimento frente ao surgimento de novos mecanismos de auto-identidade que são constituídos por instituições da modernidade.

4Fonte: unknownbuddhist.com

Fica claro o sólido conhecimento que o autor possui acerca do tema proposto e por ser um dos sociólogos mais profícuos da atualidade, empenha-se em apresentar circunstâncias para nos levar a compreender melhor sua obra com exemplificações do convívio social atual e de tempos mais antigos. Sem dúvida é uma leitura que exige certo conhecimento prévio para ser entendida claramente, além de diversas releituras e pesquisas quanto a conceitos, autores e contextos apresentados.

Giddens aborda os temas, como exemplo a ansiedade, de uma maneira detalhada tanto para a psicologia como para a sociologia, pois é de fundamental importância o entendimento amplo não apenas do contexto social, a realidade, mas também o contexto psicológico, como os medos e barreiras emocionais, que enfrentamos diariamente.

 

REFERENCIAS

GIDDENS, ANTHONY. Modernidade e identidade. Tradução Plínio Dentzien. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor,2002. 224 p. Cap. 1 e 2.

Biografia de Anthony Giddens. Disponível em < https://www.ebiografia.com/anthony_giddens/ > . Acesso em 01 de jul. 2016.

CARDOSO FREIRE, Letícia de Freitas. Modernidade e Identidade: Anthony Giddens. Disponível em < http://www.cienciassociais.unimontes.br/arquivos/ed_09/12_Leticia%20Freire.pdf > . Acesso em 01 de jul. 2016.

PERALVA DIAS, Rafaela Cyrino. Resenha: modernidade e identidade. Disponível em < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822005000300013 > . Acesso em 01 de jul. 2016.

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“Vida Líquida” tem no desapego a tônica do momento

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No livro Vida Líquida o sociólogo polonês Zygmunt Bauman traz uma reflexão de alguns conceitos como cultura, progresso, amor, medo e consumo, presentes na sociedade atual que está em uma constante mudança. Ele apresenta um resumo dos efeitos que a estrutura social e econômica, com base no que é descartável e efêmero. Segundo o sociólogo, a destruição criativa própria do capitalismo suscita uma condição humana na qual predominam o desapego. Desta forma, o livro aborda assuntos que são essenciais para as relações humanas na sociedade consumista do século XXI, assuntos estes que estão sendo negligenciadas sem as pessoas se darem conta de sua importância.

No primeiro capítulo, Bauman fala sobre a necessidade das empresas e das pessoas de quererem estar em constante mudança e sempre procurarem motivos nos outros para mudarem. A mesmice é vista como um erro fatal para todos no Mundo Capitalista.  A perpetuação do que é concreto é uma ameaça para os seres humanos dessa sociedade, que visam que o que é concreto, sólido tem que ser trocado por algo descartável que pode ser trocado a qualquer momento, assim eliminando os ‘fracos’ da jogada dos ‘poderosos’. Talvez seja porque as inovações tecnológicas, os governos, a mídia e o mercado produziram um ambiente em que é cada vez mais fácil “apagar, desistir, substituir”. E a velocidade com que isso ocorre é que dá à vida esse caráter inconstante. É como se cada pessoa estivesse eternamente à procura de algo que possa ser seu novo objetivo ideal. Assim, a rapidez com que as variáveis mudam é condição necessária e suficiente para a sobrevivência no mundo líquido-moderno.

A velocidade com que o indivíduo transita entre o amor e o desapego, entre a relevância e o descaso, entre o moderno e o ultrapassado, entre o essencial e o desnecessário provoca um aumento do lixo. Cada pessoa carrega consigo seu lixo particular, que precisa ser despejado em algum lugar. E isso acontece através da ajuda dos mais diversos meios, desde terapias e pílulas mágicas até religião e sistemas educacionais.

Fonte:http://66.media.tumblr.com/tumblr_llvaasFwcz1qfyd90o1_500.gif

O principal assunto do capítulo 2 é a formação dos heróis. Nos séculos passados, os heróis eram as pessoas que tinham ideais puros e lutavam por alguma causa nobre e morriam para ajudar as minorias e eram quase santificados pelo povo. Na sociedade consumista, os heróis perderam sua “eternidade” e se tornaram Celebridades. Não carregam em suas falas e discursos lemas igualitários ou praticam boas ações. Apenas tem rosto bonito, estão na mídia constantemente, tem seus cabelos copiados por multidões, suas vidas são vigiadas 24hs por dia. A individualidade e a futilidade tornam-se o glamour dos heróis do século XXI. A morte por alguma causa é vista como loucura ou fanatismo.

No capítulo 3 temos como abordagem principal a formação da cultura. Na sociedade líquido-moderna não são os marcos históricos, lembranças, memórias ou glórias passadas que fazem de algo um “produto cultural”, mas seu valor no mercado. Se as pessoas querem consumir determinado lugar ou coisa, aí sim teremos um produto comerciável e não uma Utopia. São os mercados que ditam o que é “essencial” para a cultura e não o inverso. No século XXI não há espaço para valorização nacional e sequer regional. A globalização vem para derrubar barreias não só geográficas, mas ideológicas, econômicas, educacionais e até culturais. Há uma necessidade de uma “cultura global” que seja identificada como um produto pronto para consumo e preparado para ser jogado “no lixo” quando se torna obsoleto.

No capítulo 4, o assunto é “construções modernas”, ou seja, a vida urbana atual. Bauman nos traz vários dados que confirmam suas suposições e estudos que analisam a fundo esse problema que afeta toda a população do século XXI: O Medo Onipresente. As arquiteturas atuais trabalham em prol do isolamento social. Não proporcionam convívio com os demais vizinhos. As residências tornaram-se fortalezas humanas e preparadas para “guerras” invisíveis e irreais. A maior guerra não se encontra nas ruas ou nos campos de concentração do século XX, mas em nossas mentes. Formos dominados pelo estado permanente de Insegurança e nosso “sensor-aranha” a todo o momento detecta algo inimigo inventado pelo Estado e o Mercado.

Fonte:http://www.diarioliberdade.org/archivos/Administradores/Maur%C3%ADcio/2013-06/150613_consumismo.jpg

No capítulo 5  Zygmunt trata sobre nós, Consumidores. Nesse capítulo uma nova faceta nos é apresentada. Somos apenas peças no tabuleiro dos “Poderosos Chefões” do Mercado Global. O mercado não quer satisfação plena de seus consumidores. Ele quer o contrário. Geram constantemente produtos que criem mais insatisfação em seus clientes. A insatisfação é a válvula que move o mercado atual, sem isso tudo seria perdido. Todas nossas frustrações, dores. Sofrimentos podem ser “curados” num shopping centeresse que é o símbolo máximo da nossa sociedade.

Viver deslizando por águas muitas vezes desconhecidas, já que a água é corrente e dá a impressão de que nunca estamos imersos no mesmo contexto, apesar de que tudo pareça sempre igual, é viver no limite. E isso significa, em alguns aspectos, manter-se em constante autoexame e autocensura, pois o mais complexo na vida líquida é criar meios que permitam estar satisfeito consigo mesmo. Assim, na reflexão de Bauman, “a sociedade de consumo consegue tornar permanente a insatisfação. O que começa como necessidade deve terminar como compulsão ou vício”.

E não é desejo da sociedade de consumo reduzir essa ansiedade, muito pelo contrário, a ideia é intensificá-la. Assim, a renovação do desejo eterno pelo ‘novo’ continua sendo a mola propulsora do mercado e do ideal de “destruição criadora”. Para ansiedade, há medicamento. Logo, cria-se a verdade ilusória de que “ficaremos bem”.

Fonte: http://www.cepb.com.br/tim.php?src=uploads/artigos/2014/05/74-1401199887.jpg&w=620&h=310&q=100

O capítulo 6 traz como tema central a Educação. Na sociedade de consumo o processo educacional tornou-se tão volúvel quanto seus atores principais. Todo o conhecimento parece ter virado um “produto” assim como alimentos, roupas e sapatos. Encontramos agora a Indústria do Conhecimento, que mostra que toda informação tem prazo de validade e as pessoas necessitam sempre estarem se atualizando. Nesse ritmo o termo APRENDIZAGEM tornou-se o sinônimo de Educação. Isso causa um desconforto nos educadores, pois apresenta o conhecimento como arma principal para o jogo dos “Chefões”, entretanto o conhecimento é tão obsoleto quanto um celular do ano passado, porque já foi lançado um da nova geração. Nesse diálogo antagônico, as pessoas pisam em um campo-minado e podem ser excluídas da guerra, simplesmente porque seu conhecimento tornou-se “ultrapassado”.

Aqui a educação das universidades não condiz com o que o MERCADO quer e o diálogo torna-se cada vez mais contraditório e caminha para um rumo que pode afetar os princípios conhecidos pelos educadores e apenas satisfazer o “Chefão”.

No capítulo final da obra, Bauman fecha o livro com chave de ouro falando de todos os temas anteriores juntamente com a responsabilidade do Estado em influenciar nas escolhas das pessoas. As pessoas parecem querer ser enganadas. Sabem que estão sendo enganadas, mas deixam-se ser levadas pelo Mercado. Nisso entraria a ação do Estado na ajuda de “escolhas certas”, onde produtos e serviços realmente visassem a satisfação e a felicidade das pessoas e não simplesmente alimentar um ciclo completamente vicioso.

Referência

BAUMAN, Zigmunt. Vida Líquida; tradução Carlos Alberto Medeiros. – 2. ed. – Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

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