The 90’s are back! a influência midiática e a perpetuação da pressão estética

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O ressurgimento dos “anos 2000” e o impacto biopsicossocial da obsessão pelo emagrecimento.

Nos últimos anos, os padrões de beleza têm se mostrado quase impossíveis de acompanhar devido à sua constante evolução, que ocorre quase na mesma velocidade que as mudanças nas coleções de moda rápida. Este fenômeno reflete uma era onde a estética é transitória e altamente influenciada por ícones da cultura pop, como a família Kardashian-Jenner. Desde meados dos anos 2010, as mulheres deste clã estabeleceram um novo padrão estético com corpos voluptuosos e lábios carnudos, que não apenas mantiveram a atenção do público sobre elas, mas também contribuíram significativamente para a construção de seus impérios comerciais (Smith, 2017).

Um exemplo notável é a Kylie Cosmetics, lançada por Kylie Jenner em 2015. Em dois anos, a empresa foi avaliada pela Forbes em US$ 800 milhões, ilustrando o poderoso impacto de sua influência estética (Forbes, 2017). A própria Kylie, desde os 15 anos, popularizou os lábios preenchidos, influenciando uma geração inteira. A Sociedade Americana de Cirurgiões Plásticos (2016) relatou que os procedimentos de preenchimento labial saltaram de 1,8 milhão em 2010 para 2,6 milhões em 2016, destacando a ascensão dessa tendência estética.

Recentemente, no entanto, observou-se uma guinada das irmãs Kardashian-Jenner em direção a um físico mais esguio, alinhado com a reemergente estética dos anos 2000 e o aumento do uso de medicamentos para emagrecer, como o Ozempic. Este retorno ao padrão de magreza extrema, ou “size zero”, levantou preocupações entre especialistas em saúde e moda (Johnson, 2020).

As interações complexas entre os ideais de beleza disseminados pelas plataformas de mídias sociais e o contexto do gênero feminino resultam em um aumento substancial nas taxas de insegurança e no surgimento de transtornos associados a essa dinâmica. A proliferação de imagens e representações de padrões estéticos irrealistas e estereotipados, amplamente difundidos nas mídias, exerce uma influência considerável sobre a autoimagem e a autoestima das mulheres, impactando negativamente seu bem-estar psicológico e emocional (Lira, 2017).

                Fonte: Miu Miu Fashion Show por Victor Boyko/ Getty Images

A magreza extrema dos anos 2000 foi marcada como um período de tendência no mundo da moda. E está de volta nas passarelas e nas telas.

A preocupação dos especialistas não é infundada. No TikTok, a hashtag Y2K já acumulou mais de 18 bilhões de visualizações, demonstrando a popularidade preocupante deste retorno à magreza (TikTok, 2020). Segundo a psicóloga Vanessa Tomasini, especialista em transtornos alimentares, esse padrão sempre se situa no que é inatingível para a maioria, movimentando uma grande indústria que explora a busca pelo corpo magro e pela juventude eterna (Tomasini, 2021).

Os riscos associados a esse padrão são numerosos e incluem transtornos alimentares graves como anorexia e bulimia, além de problemas físicos decorrentes de dietas extremas e uso de medicamentos sem supervisão médica, como perda de massa muscular, alterações hormonais e desidratação (Bello, 2019). Além disso, essas práticas podem agravar problemas de saúde mental, como baixa autoestima e isolamento social, especialmente em jovens que se veem bombardeados por essas imagens nas redes sociais (Costa et al., 2019).

A mídia, por meio de seus instrumentos de marketing, transforma o corpo em um produto, promovendo um padrão de “corpo perfeito” associado a sucesso, prazer e realização pessoal, evidenciando o poder da mídia como influenciador da percepção corporal (Vargas, 2014; Silva, 2014). As consequências dessas influências podem ser duradouras e devastadoras, como demonstrado pelos estudos sobre o Transtorno Dismórfico Corporal (TDC), onde indivíduos desenvolvem uma obsessão por defeitos percebidos em sua aparência, muitas vezes resultando em comportamentos compulsivos e tratamentos estéticos repetitivos (DSM-5, 2014).

Portanto, é vital que continuemos a promover um entendimento mais saudável e inclusivo dos padrões de beleza, considerando a diversidade corporal e a saúde mental, como maneiras de mitigar os danos causados por essas percepções distorcidas que ainda dominam nossa cultura de consumo. As reflexões propostas por Tomasini e outros especialistas são cruciais para o desenvolvimento de uma sociedade mais consciente e menos focada em ideais inatingíveis de beleza (Tomasini, 2021; Costa et al., 2019).

 

Referências

LIU, B. A estética das Kardashian-Jenner e a busca do ‘corpo trend’: como essa equação afeta as mulheres? Disponível em :< https://revistamarieclaire.globo.com/comportamento/noticia/2024/04/a-estetica-das-kardashian-jenner-e-a-busca-do-corpo-trend-como-essa-equacao-afeta-as-mulheres.ghtml >. Acesso em: 1, mai, 2024.

MUNIZ, C. Magreza anos 2000: os perigos da retomada do padrão de moda. Disponível em: > https://gshow.globo.com/moda-e-beleza/noticia/magreza-anos-2000-os-perigos-da-retomada-do-padrao-de-moda.ghtml >

SANTOS DE OLIVEIRA BASTOS, A. P.; ALVES BENEVIDES, A. L.; FERREIRA DA SILVA, M.; URZÊDO RIBEIRO, L. A influência das mídias sociais no Transtorno Dismórfico Corporal: Uma doença da era digital?. Revista Científica do Tocantins, [S. l.], v. 2, n. 1, p. 1–18, 2022. Disponível em: https://itpacporto.emnuvens.com.br/revista/article/view/48. Acesso em: 1 maio. 2024.

PAULINO, N. L.  Impactos Psicológicos Nas Mulheres Frente Aos Ideais De Beleza Determinados Nas Mídias Sociais. Trabalho de Conclusão do Curso de Psicologia  – Faculdade Fasipe Cuiabá.  Cuiabá, 2023.

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Exaustão e exclusão – (En)Cena entrevista a professora Dra Camila Craveiro

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A cada ano, no mês março, em que se comemora o “Dia da Mulher” em diversos países, é praticamente impossível não esbarrar em textos, frases de efeito e uma infinidade de produções na mídia e nas redes sociais que se propõem a discorrer sobre a dor e delícia de ser mulher. Em muitos casos, “A mulher” é retratada como a mãe devotada que se aproxima da uma figura sagrada da Virgem Maria. Ou ainda, aparece como a heroína dos filmes e quadrinhos criados por homens, que enfrenta suas batalhas sempre sorrindo e luta, habilmente, usando uma maquiagem perfeita e um salto agulha.

Entretanto, essa época do ano também convida a refletir sobre desafios tipicamente atribuídos ao feminino: feminicídio e violência doméstica; dupla ou tripla jornada de trabalho; equilíbrio entre maternagem e mercado de trabalho; indústria da moda e da beleza e outros temas. A partir de tais problemas, é preciso pensar: o que é ser mulher? Será possível reduzir e resumir toda pluralidade do feminino em um conjunto de palavras ou conceitos?

Lacan, psicanalista francês do século XX, afirma que “a mulher não existe”, por não haver um constructo que abarque todas as parcialidades do sujeito feminino. Existem muitas mulheres distintas e é preciso considerá-las uma a uma, em suas especificidades e nos seus lugares de fala. Com isso, diante da necessidade de saber sobre a saúde mental das mulheres, no Brasil e durante a pandemia, apresentam-se entrevistas com sujeitos femininos que falam de si e do seu lugar neste contexto plural.

Dra Camila Craveiro

Na primeira entrevista da “A mulher não existe! O que significa ser mulher, no Brasil, na pandemia?”, o Portal (En)Cena conversou com a professora Dra Camila Craveiro para entender mais sobre:  o que é ser mulher, no Brasil, durante a pandemia da COVID 19.

Camila Craveiro é PhD em Ciências da Comunicação pela Universidade do Minho, em Portugal, coordenadora do curso de Publicidade da UNIGOIÁS, corresponsável pelo podcast Meia Taça e se dedica aos estudos descoloniais de gênero e migração.

(En)Cena – Camila, considerando o seu lugar de fala, de mulher, professora, publicitária, mãe e usuária ativa das redes sociais: o que é ser mulher no Brasil, durante a pandemia da COVID 19?

Dra Camila Craveiro – Quando falamos de mulheres, enquanto um grupo, essa necessariamente é uma superinclusão. Ainda que seja uma estratégia também de criar coletividade, uma ação grupal. Dentro do meu lugar de fala, da minha mulheridade, eu sinto um cansaço mental e psicológico muito grande durante a pandemia. Primeiro porque ela “starta” diferentes medos: da ausência, da morte, do desemprego, de não produzir a contento…E lidar com esse medo cotidianamente é muito complicado. Além disso, há os papéis sociais que eu desempenho enquanto mãe, professora, usuária das redes sociais e produtora de podcast. Tudo isso precisa ter minha atenção, dividida e focada ao mesmo tempo, algo que não é fácil. Mas eu sou uma mulher branca, de classe média alta, no Brasil, durante a pandemia e estou totalmente ciente dos privilégios dos quais eu gozo dentro dessas categorizações.

(En)Cena – Depois de ter estudado mulheres migrantes por 5 anos, na sua opinião, como podemos compreender o sofrimento emocional das venezuelanas que chegam ao Brasil, durante a pandemia?

Dra Camila Craveiro – Eu acho que a gente precisa rever algumas questões que são mesmo do campo da Sociologia das Migrações. A primeira delas diz respeito à dupla vulnerabilidade de ser migrante e ser mulher. Neste caso, destaca-se especialmente as migrantes econômicas.  Segundo Sassen (2003), a feminização das migrações, ou seja, a tendência de aumento da migração de mulheres em relação ao número de homens, deve-se, na verdade, à feminização da pobreza, à feminização da sobrevivência. Então, são mulheres que deixam as suas casas e, em alguns contextos, deixam suas famílias, para migrarem para países em que haveria maiores recursos de emprego e recursos materiais, para que elas possam também enviar dinheiro aos seus lares de origem. (…) À vulnerabilidade das venezuelanas, sexual e econômica, se soma o estereótipo negativo, pois criou-se no Brasil a ideia de uma invasão. Uma invasão de venezuelanos famintos, miseráveis e que aqui estão para concorrer pelos postos de trabalho e por alguns dos benefícios sociais dos quais gozamos.

No contexto de pandemia, as mulheres imigrantes encontram um país fechado em termos de oportunidades, especialmente, no caso das mulheres indocumentadas. Isso quer dizer de mais uma vulnerabilidade, ou seja, as assimetrias sociais que elas vivenciam as colocam numa posição de vulnerabilidade e de restrição do seu poder de margem de agência, de estratégia de sobrevivência, o que, sim, causa um dano emocional e uma subjetividade ferida.

Fonte: Arquivo Pessoal

(En)Cena – Na sua opinião, qual seria o caminho para as mulheres no pós-pandemia?

Dra Camila Craveiro – Eu torço, eu espero, eu anseio que o caminho pós-pandemia seja um caminho de ressurgimento. Ressurgimento da capacidade de mobilização, de estratégias de luta, da força que se perdeu ou que foi minada durante a pandemia. Essa exaustão que a gente falou anteriormente, foi uma exaustão sentida em todas as camadas sociais de mulheres. Eu espero que uma vez superado este contexto (quando estivermos todas vacinadas), que possamos retomar planos, sonhos e estratégias. Eu espero que a gente ressurja mais fortes, dispostas a lutar por aqueles que são nossos direitos, para garantir a promoção daquilo que já foi assegurado e pela conquista do que ainda está no nosso horizonte. Minha esperança é uma esperança de luta e de resiliência, para que a gente comece também a construção de uma sociedade que promova a igualdade de gêneros, ou seja, a igualdade de oportunidades.

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A captura do invisível nas lentes de Márcio Scavone

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 A boa obra de arte é aquela que emociona antes de ser entendida”.
Marcio Scavone

O fotógrafo Márcio Rubens Teixeira Scavone, nascido em São Paulo, no ano de 1952, tem seu nome comumente associado à celebridades, moda e fotografia publicitária. Uso do preto e branco, captura de pequenos gestos e olhares e das banalidades do dia a dia (coisas que passam despercebidas pela maioria) são marcas fortes em sua obra. Scavone começou a fotografar aos 12 anos de idade com a Rolleiflex de seu pai, cujo ele considera seu primeiro mestre na arte de fotografar. Mas ele não parou no amadorismo. Na década de 1970, estudou fotografia em Londres, retornou ao Brasil e abriu um estúdio na capital paulista. Nos anos 1980, se destacou como um dos maiores expoentes na cena da fotografia publicitária brasileira e participou da Associação Brasileira dos Fotógrafos de Publicidade – Abrafoto (Enciclopédia Itaú Cultural, 2017).

Entre os anos de 1982 e 1997 são muitas as peripécias realizadas por Scavone. Ele realiza exposição individual no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp), publica série de fotos de personalidades na revista Vogue, reside em Lisboa e atua no mercado editorial, assina coluna sobre estética e história da fotografia na revista Íris e publica seu primeiro livro, intitulado “Entre a Sombra e a Luz” (Enciclopédia Itaú Cultural, 2017). Segundo Madalena Centro de Estudos da Imagem, Scavone foi descrito na renomada revista Fórum das câmeras Hasselblad na Suécia como “um grand master da técnica, mas alimenta-se de sua sensibilidade diante dos seus retratados para penetrar sob suas peles. ”. O próprio Scavone, em depoimento para o jornal O Estado de São Paulo (2004), enfatiza essa afirmação, ao dizer:

“Sem dúvida. É um jogo do fotógrafo com o fotografado. O melhor retratista é aquele que consegue fazer com que o retratado ache que está no domínio da situação. O comando é dele. Nesse jogo psicológico, você vai criando o seu jeito, até que sua visão como fotógrafo prevaleça. No fim, o retrato pertence aos dois. Porque o fotógrafo é um espelho de quem está sentado à sua frente. É um espelho com memória”.

Não é à toa que Scavone ganha reconhecimento em sua área. De 1994 a 2001, mantém uma seção fixa de retratos na revista Carta Capital, recebe diversos prêmios na área de publicidade, entre eles o Clio Awards e o Leão de Ouro, em Cannes, e, em 2002 e 2004, publica seus livros “Luz Invisível” e “A Cidade Ilustrada”, respectivamente (Enciclopédia Itaú Cultural, 2017). Ao fotografar objetos do cotidiano:

“Sua atenção está voltada para o modo como a luz incide sobre a matéria, pois, além de revelar ou ocultar detalhes, ela é capaz de conferir uma aura (a sensação de que ali se revela algo especial, único e verdadeiro) às situações triviais e nos retratos, cria uma atmosfera de naturalidade simulando flagrantes de momentos íntimos em que (…) o olhar direto encarando a câmera denota a ideia de confiança e cumplicidade entre o fotógrafo e o retratado. Scavone manipula a persona do modelo mostrando-o junto a objetos e cenários que remetem a sua profissão ou, ao contrário, criando situações inusitadas que aludem a sua vida privada”. (Comentário crítico na Enciclopédia Itaú Cultural, 2017).

Algumas de suas obras, em que, com o uso da técnica e de sua sensibilidade, Scavone captura o que foge aos nossos olhos no dia a dia, paralisando a beleza invisível do trivial e de alguns personagens:

Xícara de café – http://zip.net/bftGVS

Austregésilo de Athaydehttp://zip.net/bhtG5c

Banheiro Público – http://zip.net/bhtG5c

Manuelzão, Personagem de Guimarães Rosa – http://zip.net/bctGTy

Fernanda Montenegro – http://zip.net/bjtGTJ

Pelé – http://zip.net/bwtGtg

Mas o que leva Scavone a capturar essas imagens? De acordo com Raffaelli (Scielo, 2002) “na conceituação junguiana, o eu pode ser entendido como um repositório de imagens que se agrupam por significado, oriundas tanto da percepção quanto da memória, formando um complexo de ideias e sentimentos que conferem uma unidade e identidade pragmáticas ao self, em especial nas relações sociais”. A partir disso, depreende-se que tais imagens remetem Scavone à conteúdos mnemônicos, ou seja, a lembranças adquiridas ao longo de sua vida. Essa afirmação torna-se fidedigna em relato do próprio fotógrafo, no seu canal no YouTube, no qual ele fala de suas primeiras referências em fotografia.

Nesse relato, Scavone apresenta um anuário que pertencia ao seu pai e que sempre estava na casa, sendo olhado e admirado por ele de tal maneira que sabe dizer cada foto contida nele. Perceber-se-á que esse anuário em muito influenciou na carreira de Scavone como fotógrafo.

Acho que passei a infância folheando esse anuário e tenho a impressão que isso foi muito informativo para os meus olhos”

A fotografia correndo para mim numa imagem de mulheres”

E olhando esses anuários, comecei a ficar fascinado com o movimento”

Vi que todas as fotos desse livro eu me lembro! ”

Portanto, além da técnica e da sensibilidade, Scavone conta com sua memória como uma forte aliada em seu trabalho, repousando seus resquícios sobre as imagens que constrói e captura.

Referências:

Enciclopédia Itaú Cultural – Marcio Scavone. Atualizado em 23 fev. 2017. Disponível em: https://goo.gl/jpJGNV. Acesso em 28 mar. 17.

Madalena Workshops – Centro de Estudos da Imagem. Marcio Scavone – Fotógrafo. Disponível em: https://goo.gl/WHfsMr. Acesso em 28 mar. 17.

Raffaelli, R. Imagem e self em Plotino e Jung: confluências. Estud. psicol. (Campinas) vol.19 no.1 Campinas Jan./Apr. 2002. Disponível em: https://goo.gl/ucslVP. Acesso em 11 abr. 17.

Scavone, M. Marcio Scavone e suas primeiras referências em Fotografia. YouTube. Publicado em 9 de dez de 2014. Disponível em: https://goo.gl/uQX5Wn. Acesso em 11 abr. 17.

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Um Senhor Estagiário: a moderna gestão feminina

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Este texto tem como proposta uma articulação com o filme “Um Senhor Estagiário”, mais especificamente na personagem Jules Ostin interpretada pela atriz Anne Hathaway, uma CEO [1] (Diretora Executiva) fundadora de um site de moda, cujo objetivo é a venda de roupas. A gestão de Jules permite visualizar as mudanças organizacionais, entre as quais a reestruturação que o mundo do trabalho passou a contemplar por volta do final da década de oitenta, aderida pelas novas formas de administrar e organizar; privilegiando o modelo japonês que busca redução de custo, um maior controle de qualidade e ainda o aumento dos resultados, conforme a autora (BARRETO, 2009, p. 1) vem explicitando acerca de como esse novo modo de gestão vem contribuir para a influência nos valores identitários e a saúde dos trabalhadores e trabalhadoras,  que são absorvidos pelo ideal de competitividade, disciplina e integração à empresa.

No filme Um Senhor Estagiário, a característica marcante da CEO Jules, é de um perfil centralizador e uma exigência quanto à garantia de um padrão de excelência no que se refere aos produtos e serviços que a Startup [2] oferece aos clientes internautas. Quanto a esse aspecto os trabalhadores são extremamente comprometidos e motivados, fruto desse controle das mudanças organizacionais que tem alterado a natureza do trabalho humano e o perfil esperado do trabalhador, conforme alerta (SILVA, 2015, p. 133) sobre os gestores adotarem uma postura de escuta atenta, com um ambiente mais saudável, dando margem para o trabalhador procurar “ajustar a realidade do trabalho aos seus desejos e necessidades, o que torna possível a transformação do sofrimento, do reconhecimento e do prazer”. (SILVA, 2015, p. 136).

A realidade do mundo do trabalho e o conceito clássico de emprego perpassam uma realidade em que a autora (BERGAMINI, 2015, p. 113) aponta que após anos de previsões otimistas e alarmes falsos, as novas tecnologias de informação e comunicação fazem sentir seus impactos. Nesse sentido, os administradores diante de uma nova forma de gestão passam a se questionar inquietantemente sobre a possibilidade das pessoas passarem a produzir diante de determinadas condições nas quais elas normalmente não estariam motivadas para o trabalho; esse é o grande desafio da atualidade para o ideal de gestão inovadora.

A preocupação com a gestão de pessoas é tema recorrente e de emergência, devido o impacto que as transformações acontecidas pela globalização oportunizaram para o setor organizacional, acirradas pela competitividade e adequação desse trabalhador ao mercado de trabalho, oportunizando assim práticas de uma gestão motivacional que adeque esse trabalhador ao ritmo de produção afinado com o mercado. A autora define gestão de pessoas como: “um conjunto de políticas e práticas definidas de uma organização, para orientar o comportamento humano e as relações interpessoais no ambiente de trabalho” (CARVALHO, 2014).

Sendo assim, o filme Um Senhor Estagiário oportuniza entender esse embate entre saber conduzir uma empresa com moderna gestão de pessoas, fazendo-as produzir, e assim aumentando os números; a startup de Jules apresentou um recorde de vendas. O crescimento que era esperado para um prazo de cinco anos aconteceu em menos da metade desse prazo.  Entendendo que o capital intelectual como é denominado atualmente na moderna gestão de pessoas, seria o elemento que faz a diferença para o efeito competitivo. Conjuntamente a esse capital intelectual e o aumento crescente da produtividade, oportunizando assim o surgimento das questões relativas ao modo de gestão compatível com essa realidade que requer o cuidado com a dignidade e saúde mental do trabalhador.

Articulando com o filme, a gestão da CEO Jules possibilita perceber traços de um possível adoecimento, pelo fato de que os colaboradores entendem que em certas oportunidades não deveriam se aproximar dela, ficando atentos a certas atitudes do seu comportamento, por exemplo, quando a mesma está piscando muito. O que no filme, Jules parece estar a um passo de ter a sua vida pessoal afetada pela exaustiva demanda da sua gestão, contextualizada no capitalismo.

REFERÊNCIAS:

BASSOTI, J. M. (Org.) Uma Nova Gestão é Possível. São Paulo: FUNDAP. 2015. Disponível em:< https://books.google.com.br>. Acesso em: 29 mar 2017.

BARRETO, M. Saúde Mental e Trabalho: a necessidade da “escuta” e olhar atentos. Cad. Bras. Saúde Mental, Vol. 1. Nº 1 jan.-abr. 2009.

CARVALHO, M. F. S. Gestão de Pessoas: Implantando Qualidade de Vida no Trabalho Sustentável nas Organizações. Revista Científica do ITPAC. V.7, n.1, Pub.6, Jan. 2014. Disponível em:< www.itpac.br/arquivos/Revista/71/6 pdf > Acesso em: 03 abr.  2017.

ROCHA, E. R. G. T. Desigualdades Também no Adoecimento: Mulheres Como Alvo Preferencial das Síndromes do trabalho. XVI Encontro Nacional De Estudos Populacionais, Caxambu-MG. 2008. Disponível em: <www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2008/docs.PDF/ABEP 2008_1215.pdf> Acesso em: 23 abr . 2017.

[1] CEO – Sigla Inglesa de Chief Executive – Officer Diretor Executivo, é a pessoa com maior autoridade na hierarquia operacional de uma organização.

 [2] STARTUP – Empresas jovens que buscam a inovação em qualquer área ou ramo de atividade, procurando desenvolver um modelo de negócio escalável que seja repetível.

FICHA TÉCNICA DO FILME: 

UM SENHOR ESTAGIÁRIO

Diretor: Nancy Meyers
Elenco: Robert De Niro, Anne Hathaway, Rene Russo, Andrew Rannells;
País: EUA
Ano: 2015
Classificação: 10

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Kassandra Valduga: a mulher, a aparência e a feminilidade

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Assim como a preocupação excessiva com a aparência pode denotar uma fragilidade psíquica, o total desapego também é reflexo de um desinvestimento em si mesmo.

Em entrevista ao portal (En)Cena, a jornalista e consultora de imagem Kassandra Valduga demonstra que trabalhar com moda exige bem mais que estar antenada com as tendências ou seguindo-as. O que importa, ao final, é o bem estar do cliente, e para isso sua personalidade deve ser investigada a fundo antes de se identificar a vestimenta mais adequada. Dentre outras coisas, também tratamos dos conceitos de mulher, feminilidade, vantagens e desvantagens do gênero, dentre outros assuntos.

(En)Cena – Para iniciar nossa conversa: o que é ser mulher e o que é ser feminina?

Kassandra Valduga – Ser mulher é ser especial, é ser habilidosa de forma genuína, com charme e graça. É um ser humano com plus, é ter a possibilidade de encantar, em qualquer coisa que faça. E muito disso se expressa através da feminilidade, que pede doçura, delicadeza. Ser feminina é saber explorar o que é ser mulher.

(En)Cena – Então, ser mulher implica em ser feminina para você? Como atender uma cliente não feminina, por exemplo, se tivesse que atender uma homossexual que não gosta muito de feminilidade mas também não é uma transgênero que quer parecer muito masculina. Já pegou um trabalho assim?

Kassandra Valduga – Ser mulher não implica só em ser feminina, mas acho que a feminilidade pode ser encarada como um ponto positivo e não como fraqueza. Seria interessante fazer consultoria para uma homossexual. Tentaria entender o quem ela é como o de qualquer outra cliente. Pessoalmente nunca peguei um caso assim, mas virtualmente sim. Fiz uma consultoria express para duas mulheres que iam se casar e não sabiam o que usar porque não queriam usar vestido, mas também não queriam parecer masculinas. E postei as sugestões no Super Combina. Foi uma matéria que teve muita repercussão e acredito que tenha ajudado as noivas  em questão pelos depoimentos que recebi. Homossexualidade não é um tabu para mim.

(En)Cena – Se não todos, mas a maioria de seus clientes são mulheres. Quando você é chamada para uma consultoria de imagem, qual a sua principal preocupação, o que norteia seu trabalho?

Kassandra Valduga – Quase 100% são mulheres, até porque tenho voltado meu trabalho cada vez mais para elas. Não tem como fazer consultoria dissociada do emocional da mulher e tenho focado muito nisso, em trabalhar o emocional com a imagem. Mas minha maior preocupação é conseguir adentrar o mundo dessa pessoa, é fazê-la entender o que ela gosta de usar, qual sua essência e como transformar isso em uma boa imagem. Porque elas pensam que a consultoria pessoal obedece a regras de certo e errado, de pode e não pode, como a consultoria corporativa, mas não tem nada a ver com isso.

(En)Cena – A partir da sua experiência com suas clientes, o que você diria que são as principais preocupações e angústias dessas mulheres ao te chamarem?

Kassandra Valduga – Aparentemente é de não saber fazer combinações, de não conseguir explorar o que tem no guarda-roupa. Mas na verdade é insegurança com a própria imagem, é falta de conhecimento do próprio estilo, baixa autoestima com a aparência e falta de informação sobre moda. É não saber se estão adequadas para o ambiente de trabalho, para a idade, para o próprio corpo, ou para uma nova fase como o casamento ou maternidade.

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(En)Cena – Como você trabalha os conflitos entre a imagem X identidade de alguém?

Kassandra Valduga – Não dá para construir uma “nova” imagem de alguém sem ter como pilar a sua identidade. Caso contrário, ela não conseguiria se vestir sozinha. Você constrói uma imagem quando trabalha um personagem, um artista no palco, mas no dia a dia, ninguém mantém. Muitas vezes acontece da pessoa projetar uma imagem que ela consideraria ideal e querer ser aquilo, mas se não estiver na essência dela não se sustenta. Procuro mostrar o que a pessoa tem de melhor e que ela pode fazer milagres pelo próprio visual com um pouco de dedicação.

(En)Cena – Qual o trabalho mais difícil que você já encarou e por que ele foi considerado difícil?

Kassandra Valduga – Em consultoria de imagem e moda foi atender políticos para produção de material de campanha. Porque mal dá tempo para conhecer a pessoa, e ter que criar um diferencial, colocar a pessoa com uma boa imagem, selecionar cores que combinem com ela é um desafio. Além disso, tem toda uma equipe opinando. Em trabalhos como este, onde vai sobressair uma foto ou 30 segundos de TV, um brinco ou uma gola que não caiu legal pode comprometer tudo.

(En)Cena – No mundo da moda, como você percebe a mulher frente ao mercado. Há mais homens ou mulheres em destaque, que leitura você faz dessa situação?

Kassandra Valduga – A mulher domina o mercado da moda. Se falarmos em estilismo, as grifes internacionais tem muitos homens à frente, mas o restante da cadeia é toda dominada por mulheres. No Brasil elas ditam moda, sejam estilistas, empreendedoras, jornalistas, editoras, blogueiras, modelos, produtoras, enfim… O peso do homem nessa área é tímido, tomou um pouco mais de corpo de 2010 para cá.

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(En)Cena – Você já encontrou alguma dificuldade por ser mulher, ou esse fato já te favoreceu em algum momento?

Kassandra Valduga – Eu encontro as mesmas dificuldades que todas as mulheres no mercado de trabalho, com a família, com a sociedade, nos relacionamentos. Claro que são dificuldades inerentes ao gênero. Antes de trabalhar com moda, como assessora de imprensa e gestora de comunicação na área pública, o ambiente era mais hostil. Hoje tenho mais fluidez no trabalho, embora ainda sinta alguma dificuldade nos trâmites burocráticos. Por exemplo, o Super Combina foi o único projeto inscrito por uma mulher, selecionado para o Programa de Aceleração de Startups do Sebrae em 2017, em um universo de 20 empresas. Participando do programa tem eu e 19 homens.

(En)Cena – Qual a principal vantagem em ser mulher?

Kassandra Valduga – Hoje em dia, é poder fazer as próprias escolhas e viver os sabores e dissabores disso, e ainda assim segurar a maior onda, ter jornada dupla e ser linda.

(En)Cena – Entrando um pouquinho na sua vida pessoal, ao logo da sua história em que te favoreceu o fato de ser mulher com seus parentes, amigos, amores, na fase escolar ou profissionalmente?

Kassandra Valduga – Sempre amei ser mulher e me sinto especial por isso. Fui a primeira neta do lado materno, em uma família onde só tinham mulheres (minha avó e três filhas), então eu já comecei recebendo todos os mimos e completamente inserida no universo feminino. No interior do Rio Grande do Sul, para uma família pobre, o melhor que uma mulher podia ter era casar. Embora meus pais tenham vivido essa geração, fui criada para ser independente. Isso não significa que não desejo formar uma família. Piloto bem um fogão muito bem, mas por opção, não por obrigação. Então eu usei tudo que sabia como mulher, toda a graciosidade e coloquei isso na minha vida profissional. Hoje eu oriento mulheres a serem mais mulheres, a se amar mais, a aprender a valorizar sua beleza, sua imagem, a aproveitar a moda a favor delas.

(En)Cena – Houve algum momento na vida em que ser mulher representou uma dificuldade para você?

Kassandra Valduga – Dificuldade propriamente não, mas em muitas situações o fato de ser mulher se sobressaiu mais que o meu conteúdo, o meu conhecimento, e isso me constrangia. Mas aprendi a tirar proveito disso. Se a mulher se sobressai, chego como mulher primeiro e depois mostro minhas competências como profissional e minhas qualidades como pessoa. Não só para mim, mas para todo mundo, a imagem vem primeiro.

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(En)Cena – Para finalizar, vamos falar do Super Combina, como nasceu esse projeto?

Kassandra Valduga – O Super Combina é um site que virou uma empresa com outros serviços agregados. Ele nasceu de um sonho antigo de ser editora de moda e com muito incentivo dos amigos para que eu fizesse algo na área. Dividi a ideia com a Agência Public e eles abraçaram o projeto. Comecei o site em 2015 para divulgar informações de moda, beleza e lifestyle que tivessem a ver com nossa realidade. Hoje o Super Combina é uma empresa que agrega os serviços de consultoria, palestras, treinamentos de imagem pessoal e corporativa e o curso Tire o vestir do automático, que faço em parceria com psicóloga Karina Leiko.

(En)Cena – Desmistificando a moda como algo superficial e fútil, de acordo com a visão de algumas pessoas, como você diria que a partir da moda as pessoas são ajudadas? E como você usa seu site para fazer esse trabalho?

Kassandra Valduga – Moda é uma forma de expressão. O vestir passa pela personalidade. Você externa o que é por dentro. O fútil é você querer a qualquer custo obedecer a um padrão, a um estilo só porque você quer ser aceita socialmente, quer se destacar de alguma forma. Quando você usa o que você ama, o que te deixa feliz, você fica muito mais bonita. As pessoas começam a ser ajudadas a partir do momento que elas entendem o que elas gostam de vestir, e usam a moda como fonte de informação para aprimorar seu visual. No supercombina.com.br tento fazer isso. Mostrar o que é legal pra quem. Como você pode usar uma t-shirt com jeans e no trabalho.

(En)Cena – Só mais uma pergunta: sobre a obsessão pelo corpo magro. Você observa isso entre as suas clientes? Como trata dessa questão de aceitação pessoal?

Kassandra Valduga – Hoje, muito mais que a magreza, o que as mulheres buscam é o corpo gostoso. Acreditam que só vão vencer a concorrência com coxas grossas, barriga sequinha e bumbum empinado. A mídia continua insistindo no padrão de beleza magro, especialmente as blogueiras que já acordam maquiadas e escovadas. Eu brinco que mulheres da vida real são diferentes, o que não impede, claro, da gente se cuidar. Passar uma maquiagem, ter um cabelo hidratado, emagrecer, se o peso é um incômodo. Mas a necessidade de estar no padrão deixa muitas mulheres infelizes e as fazem buscar cada vez mais cirurgias estéticas. Tudo é motivo para uma lipo. Conheço gente que já fez duas. Não adianta nada se você não muda seus hábitos de vida. Aceitar suas peculiaridades, mesmo que a seus olhos pareçam “defeitos”, e aprender a valorizar seus pontos fortes é a chave para a felicidade quando se fala em imagem pessoal.

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Dieta do Glúten: Muito além da moda

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Está cada vez mais comum vermos pessoas com uma restrição calórica, comendo em menos quantidades, tentando equilibrar a ingestão de alimentos, fazendo diversos tipos de dieta. Seja dieta das cores, das proteínas, da sopa, lua, dos pontos, é preciso antes de tudo, buscar um profissional para escolher o método mais indicado, com o intuito de atingir os seus objetivos.

Muitas vezes as pessoas acabam escolhendo certo tipo de ajuda para melhorar a saúde e qualidade de vida através de algum conhecido ou revistas e sites visitados, porém, é necessário cuidado ao fazer determinadas mudanças na alimentação. Muito além da moda, em certos casos as dietas se fazem necessárias para controlar ou regular algumas doenças. Atualmente é possível ver vários casos de pessoas com alergias e intolerâncias alimentares, sendo o mais comum na lista de alergênicos o leite, o trigo e a soja, além de algumas oleaginosas, como amendoim ou nozes.

Ultimamente tem sido intensificada a dieta do glúten, que nada mais é que a retirada no dia a dia da principal proteína presente no Trigo, Aveia, Centeio e Cevada, cereais utilizados na composição de alimentos, medicamentos, bebidas industrializadas, assim como cosméticos. Quando se trata de uma enfermidade, qualquer cuidado se torna pouco. Relacionado ao glúten, há uma doença ainda pouco conhecida, em que seus sintomas podem se confundir com outros distúrbios, como é o caso da doença Celíaca: intolerância permanente ao glúten. Geralmente se manifesta na infância, entre o primeiro e terceiro ano de vida, podendo, entretanto, surgir em qualquer idade, inclusive na adulta.

Vilosidades intestinais com aparência normal (esq.) e com as características de um celíaco (Foto: BBC)

Quem tem alergia alimentar precisa de uma dieta radical, monitorando o que deve ser consumido para evitar graves riscos à saúde. Certas pessoas suportam alguma quantidade do alérgeno sem apresentar sintomas imediatos. A mesma coisa acontece com os intolerantes – alguns passam mal com qualquer quantidade do alimento e outros podem consumir um percentual sem apresentar reação.

Segundo algumas análises, o aumento do interesse nas dietas sem glúten tem pouco a ver com uma crescente consciência sobre o Celíaco, e sim porque acreditaram que isso as fará se sentir melhor. Para o Coordenador do Ambulatório de Doenças Intestinais da disciplina de Gastroenterologia Clínica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a doença celíaca é genética. “Há um componente genético bem definido, por isso ela pode acometer várias pessoas da mesma família. Se fizermos o diagnóstico em uma pessoa, todos os parentes de primeiro grau devem ser investigados, pois podem apresentar a doença mesmo sem apresentarem os sintomas”, conclui Ambrogini.

Por lei federal (Lei nº 10.674, de 16/05/2003), todos os alimentos industrializados devem conter informações em seus rótulos se há presença ou não de glúten para resguardar o direito à saúde dos portadores de doença Celíaca.

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O Diabo Veste Prada: o sujeito no mundo contemporâneo

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“A inteligência
é o único meio que possuímos
para dominar os nossos instintos.”

Sigmund Freud

Uma das maiores e mais notáveis características da contemporaneidade é a contradição que nos enreda, e, com certeza, confunde. No filme O Diabo Veste Prada, evidenciam-se questões tão complexas como felicidade e sofrimento, que, em nosso século, tornam-se cada vez menos discutidos e mais difundidas em meio a uma rotina compulsória que deixa de ser vivida – apreciada – e passa a ser consumida freneticamente.

Em contexto mais amplo, não sobra tempo para pensarmos sobre nós mesmos, ou trabalhar conflitos de ordem pessoal.  Imperados pelo princípio do prazer, deleitamo-nos sobre nossa própria maldição – o consumismo moderno – e nos deixamos levar pelo gozar, gozar e gozar por cima de nossos desalentos, a sobrevida. Aparentemente, é esse o atual o sentido da vida: o gozo a qualquer preço. Sem balancear seus riscos e benefícios.

Andrea Sachs, conhecida como Andy, (personagem de Anne Hathaway), é uma jovem e talentosa jornalista, que acaba indo trabalhar na maior revista de moda do país. Tendo agora como chefe a surpreendente Miranda Priestly, (Meryl Streep), ditadora da conceitual revista de moda Runaway.

Miranda, famosa por seu temperamento hostil, é uma das mais importantes celebridades do mundo da moda. Eficiente e focada em sua carreira, é extremamente rígida em seu ambiente de trabalho, dificulta a inserção de Andy no perfil de trabalhadores do núcleo de produção da revista. A editora chega a chamar Andy de “a moça gorda” (para os padrões de beleza da revista), porém inteligente.

Após vários conflitos e embates no local de trabalho, e de cogitar uma demissão, desistindo do estágio que lhe proporcionaria um bom currículo para empregos futuros, Andy acaba externando seu desespero e decepção com um dos estilistas da revista, Nigel, (Stanley Tucci). Este atua como um verdadeiro analista para com a doce menina, mostrando a ela que a realidade é bem diferente e muito mais ampla do que o mundo que seu ego havia idealizado.

De volta à consciência, Andy se vê determinada a conquistar seu espaço naquele mundo, imergindo num mundo de valores e conceitos que, segundo ela sempre repetia, eram alheios ao seus, mas que ela abraçou tão rapidamente, que ela passa a agir conforme os modelos que ela sempre criticava. O que pode ser interpretado como um mecanismo de defesa do seu ego (Formação Reativa), que não aceitava que ela, vestida de um ego culto, não poderia se deixar levar pela futilidade – assim como ela chamava – do consumismo do mundo contemporâneo. Ao longo do filme, a jornalista externaliza conflitos internos, caindo em contradições, enquanto imerge no mundo, agora fantástico, da fama, deixando de lado, família e amigos.

Miranda Priestly é outra personagem que nos proporciona uma visão panorâmica da antítese que é sua existência. Ela apresenta um comportamento autoritário, consequência de sua busca incessante por gozo e satisfação, para manter sua imagem perfeita, o qual ela tenta compensar sendo a fada madrinha de suas filhas. Ela realiza todos os desejos das meninas, mesmo que para isso seja necessário sacrificar a sanidade de seus funcionários. As ricas meninas são coibidas de passar por qualquer restrição, e assim, privadas do sofrimento, o que indica um sintoma marcante de nossa contemporaneidade, a satisfação a qualquer custo.

A mensagem central do filme é pautada na “Escolha”. Andy passa grande parte do filme privando-se de tomar decisões por conta própria, depositando noutros a responsabilidade por tornar-se o ser desprezível que ela tanto criticava.

Após desestruturar inconscientemente todo seu mundo e vínculos sociais, os quais ela tanto prezava, Andy viaja a trabalho para Paris, onde passa por novas e significativas experiências, que lhe despertam para as entrelinhas do universo do qual ela agora fazia parte, partindo para uma autorreflexão. Nesse momento ela é acordada para um insight, e pode perceber o sujeito que ela realmente quer ser, frente a uma realizada que não condiz com sua visão subjetiva de mundo.

Agora, a personagem que no início, se fazia autônoma e indiferente ao sistema capitalistae estilo de vida consumista, guiado por modismos e padrões a serem seguidos, é capaz de ser e estar numa realidade, sem deixar-se imergir a tal ponto que se esquece de suas particularidades subjetivas, Andy torna-se sujeito, não indiferente ao mundo que a cerca, mas ciente do que pode/deve/quer fazer nele.

Esse relato contempla uma história fictícia da realizada onde a personagem central para pôr uma transição, ondeo ego de Andy perpassa o extremo de dois mundos opostos para enfim, alcançar o equilíbrio, tornando-se sujeito. É uma lição de aprendizado para os seres humanos, na construção de suas histórias de vida, pessoal e coletiva, onde o primeiro passo é, certamente, escolha de quem nós queremos ser.

 

 

 

FICHA TÉCNICA

O DIABO VESTE PRADA

Título Original: The Devil wears Prada
País: Estados Unidos
Direção: David Frankel
Roteiro: Aline Brosh Mc Kenna
Elenco:  Adrian Grenier, Anne Hathaway, Emily Blunt, Gisele Bündchen, Meryl Streep, Stanley Tucci, Tracie Thoms
Gênero: Comédia/Drama
Duração: 109 min
Ano: 2006

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Moda e Psicologia: quais interfaces?

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A Moda não pode ser vista de forma ingênua. Para além do consumo, da publicidade e da superficialidade, há um todo muito maior que deve ser considerado. Trata-se de um fenômeno social e histórico, que expressa a subjetividade das sociedades ocidentais pós-modernas (BARNARD, 2003; LIPOVETSKY, 2009). Devido a isso, deve ser estudado em toda a sua complexidade, e abordado por diferentes áreas do saber.

Enquanto fenômeno, a Moda pode ser compreendida pelo olhar da Psicologia Sócio-Histórica, que o conceitua como um processo em permanente movimento e transformação, que se encontra simultaneamente, dentro e fora dos indivíduos (BOCK et al., 2001). Isto leva a considerar a Moda como uma intrincada teia de múltiplas relações, onde cada homem tem sua parcela de contribuição num todo maior e, ao mesmo tempo, é influenciado por ele.

A partir desse movimento, se forma a subjetividade, que é ao mesmo tempo individual e coletiva, porque estas constituem momentos contraditórios que se integram na constituição da psique humana (GONZÁLEZ-REY, 2003). Não obstante, elas podem ser observadas em cada um destes momentos, porque a subjetividade individual está relacionada a história de vida, sentidos e significações de um indivíduo, ainda que esta seja permeada pelos valores sociais. Nas palavras de Bock et. al (2001, p.93) “a subjetividade individual representa a constituição da história de relações sociais do sujeito concreto dentro de um sistema individual”.

Na moda, esta subjetividade individual pode ser observada no estilo de vestimenta, na forma como o indivíduo se apropria das tendências, nas peças que escolhe e no modo como as coordena. Ainda que os meios de comunicação influenciem os indivíduos sobre o que vestir, cada um poderá seguir essa moda ou não, apropriar-se de seus elementos. Uma vez que o fizer, será de um modo particular, de modo que é impossível que duas pessoas tenham seu vestuário idêntico.

Ainda que cada indivíduo se comporte de modo singular, é impossível deixar de considerar a subjetividade social, se constitui num complexo “sistema de sentidos procedentes de diferentes zonas do social” (GONZÁLEZ-REY, 2003, p.216) que, ainda que sejam produzidos individualmente, ganham caráter coletivo na forma de um discurso socialmente produzido, orientando as ações da sociedade como um todo.

Esta subjetividade social aparece nas tendências de moda, que estão vinculadas a um desejo coletivo e aos valores que predominam em um determinado momento na sociedade. Em geral são captadas por pesquisas de mercado e pela observação de estilos individuais que vão se generalizando, ganhando amplitude social. E é importante salientar que, enquanto parte da subjetividade social, a moda não está desvinculada dos diferentes sentidos e dos demais aspectos da sociedade pós moderna, como o consumismo, a tendência ao individualismo, a massificação e a valorização do novo.

Ainda que a subjetividade não tenha uma forma física, ela é formada pela ação do homem sobre o ambiente externo, e do efeito que isto produz em sua psique. Pois a “a alteração provocada pelo homem sobre a natureza altera a própria natureza do homem” (VIGOTSKI, 2000, p.73). Assim, ao produzir roupas e ao consumi-las, o homem modifica o ambiente e a si próprio, numa contínua interação. Ao se vestir, ele leva em consideração os diferentes cenários sociais e as relações daí decorrentes. A roupa, então, permite a apresentação do corpo no mundo, permitindo ao ser humano expressar sua identidade, seus valores, suas preferências estéticas e até mesmo seu estigma.

Além dessas interfaces entre Moda e Psicologia, existem outras, que não foram citadas aqui, como a Psicologia do Consumidor, a Psicologia das Cores. E ainda muitas outras, que ainda não foram construídas, mas que devem ser escritas a partir das conexões que se estabelecem entre as diversas áreas do saber, porque o conhecimento extrapola as rígidas divisões do saber consolidado.

Referências

BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria de Lurdes Trassi. Psicologias – uma introdução ao estudo de Psicologia. 13ªed. São Paulo: Saraiva, 2001.

BARNARD, Malcolm. Moda e Comunicação. Trad. Lúcia Olinto. Rio de Janeiro: Rocco, 2003.

GONZÁLEZ-REY, Fernando Luís. Sujeito e subjetividade: uma aproximação histórico-cultural. Trad. Raquel Souza Lobo Luzzo. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003.

LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. 1ª reimpressão. Trad. Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

VIGOTSKI, Lev S. A formação social da mente – O Desenvolvimento dos Processos Psicológicos Superiores. Trad. José C. Neto, Luís S. M. Barreto e Solange C. Afeche. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

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tristeza

Sofrer está na moda

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Conversava com um amigo sobre coisas rotineiras do dia a dia, quando ele afirmou categoricamente, “O problema é que sou bipolar, sempre começo as coisas e não as termino…”.

Eu me ri, e disse: “Acho que você quis dizer que você é inconstante, não?”.

Ele retrucou: “Mas é que bipolar é mais bonitinho…”.

E começamos a rir juntos.

Quem diria… Houve um tempo em que sofrer de um transtorno mental era vergonhoso. Por séculos a sociedade escondeu “o diferente” em asilos psiquiátricos. Mas hoje me dia as pessoas não se importam, e vestem-se do sofrimento mental porque é bonitinho, e está na moda.

Há um consenso coletivo das massas de que: Depressão, Transtorno Bipolar, Estresse, Transtorno Compulsivo Obsessivo (TOC) e Síndrome do Pânico estão em alta. É elegante e chamativo sofrer de um ou mais desses transtornos.

E o que falar das Psicopatias e da Esquizofrenia? Viraram sinônimo de comédia e divertem centenas de pessoas em forma de piada e/ou jargões na boca de comediantes da TV aberta.

A Hiperatividade por sua vez, é o mal do século desse ano… Quem é que não tem um filho, sobrinho, enteado ou filho do vizinho que sofre desse mal?

As pessoas ficam se diagnosticando a bel prazer, quem sabe já até não se medicam? Afinal, não é difícil ver na teledramaturgia um personagem ou outro que exibe uma cartela de comprimidos que precisa tomar para dormir, assim mesmo, como um troféu!

É uma carência generalizada meu povo, e tudo é válido só para receber atenção.

A quem devemos culpar?

Mas deve-se culpar alguém?

É o movimento das massas, do grupo. E nas palavras do celebre pai da psicanálise:

Um grupo é impulsivo, imutável e irritável. É levado quase que exclusivamente por seu inconsciente […] não pode tolerar qualquer demora entre seu desejo e realização do que deseja. Tem um sentimento de onipotência: para o individuo num grupo a noção de impossibilidade desaparece. (CORRÊA e SEMINIOTTI, 2005, p. 144, apud Freud, 1921:101).

O Simão Bacamarte de nosso tempo certamente iria interditar o ser crítico. Afinal quem é louco de questionar o sistema? Fica aqui a reflexão e o convite a repensar nossa postura como sujeitos ativos e cheios de vontade frente à sociedade, para além de um idealismo, a fim de alcançarmos a real construção do mundo que queremos.

Referência:

CORRÊA, Juliano; e SEMINIOTTI, Nedio. Contratransferência do psicólogo coordenador de grupos. Psic. Clin., Rio de Janeiro, vol. 17,nº2, p.141- 155, 2005.

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