As múltiplas interfaces da gestão em saúde pública no corpo humano e sexualidades

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Os primeiros relatos de gestão em saúde estão presentes na vida dos seres humanos desde os primórdios – mesmo que esse conceito e suas complexidades não possuíssem tais definições, pois culturas e povos antigos já possuíam formas de gerir e administrar recursos naturais e financeiros com a finalidade da melhoria da qualidade de vida dos indivíduos ali presentes.

Recursos financeiros inexistentes em determinadas regiões e populações, assim como a ausência de políticas públicas voltadas para a saúde biopsicossocial, foram responsáveis por determinar a relação de biopoder entre os corpos estabelecendo uma relação biocultural de quem possui (possuía) direito à saúde e a melhorias nas condições de vida ao longo dos séculos – práticas e relações de poder que permanecem até o presente no cotidiano, nas vivências e também nas políticas educacionais.

Fica evidente, numa análise antropológica e social, que toda cultura tradicional possui um curandeiro, benzedeiro e/ou xamã que utilizava da relação divindade-deidade-energia celeste-terrestre para estabelecer diagnósticos aos corpos enfermos, enfermidades físicas, psíquicas ou espirituais ou dentro das três vertentes, criando prioridades para os atendimentos. Por vezes, era necessário que esses corpos doentes fossem encaminhados ou permanecessem em local específico para o tratamento e sua reabilitação. Trazendo essa realidade para os dias atuais, pode-se entender que essa se traduz em uma das práticas e ações da gestão em saúde pública.

Não distante da realidade tocantinense, o curandeirismo, as parteiras, assim como o xamanismo e o saber local em relação às práticas de saúde ainda existem em determinadas regiões, e tais práticas, não deixam de consideradas como ações que proporcionam o bem estar físico/psíquico e espiritual dos indivíduos.

No século XXI, o desejo de controle dos corpos e suas sexualidades, mesmo após a implantação e funcionamento do SUS, incluindo toda a sua complexidade e logística, faz muitos políticos sob influência do neoliberalismo desejarem e lutarem para sua dissolução e privatização, fazendo com que os corpos que ali se encontram necessitando de qualquer nível de atenção e assistência de saúde sejam rotulados como brancos e negros, magros ou gordos, heteros ou gays – o que facilita a compactação de dados populacionais, classes sociais e, a partir de tais dados, se estabelecem as relações de incidência e prevalência de determinantes de doenças, por gênero, idade, etc.

O complexo sistema de gestão em saúde pública é permeado de interfaces que permitem que cada esfera estadual ou municipal tenha acesso e disponibilidade aos recursos físicos, financeiros, logístico, equipe multiprofissional para a manutenção em todos os seus ciclos da vida, incluindo, promoção, prevenção, recuperação e reabilitação das doenças, diagnóstico, tratamentos em todas as faixas etárias e dos mais complexos procedimentos de saúde. Todavia, a construção dos corpos não é meramente biológica, inclui outras perspectivas, como a social, a política e a histórica, ainda que se invisibilizem.

Como a saúde e a educação ainda parecem ser inimigas em determinados assuntos, como “as sexualidades”, pode-se concluir que a gestão em saúde pública, por meio da atenção primária não entra nas escolas utilizando a promoção à saúde por dois motivos: o primeiro, por desconhecimentos dos profissionais de saúde sobre a temática sexualidade e, o segundo, porque os profissionais da educação, para cumprirem metas e objetivos educacionais, são atores no palco de ideologias religiosas e políticas em que as escolas se transformaram, o que oculta formas de existir de um corpo humano sexual e seus gêneros.

Quando as escolas se deparam com situações que fogem à sua capacidade técnica-educacional e ensinagem, se limitam a promover encontros para evidenciar ações preventivas de doenças e problemas já existentes como as Infeções Transmitidas Sexualmente, gravidez na adolescência, higiene corporal, etc. Nesse caso, estabelecer uma relação de esclarecimento sobre o corpo de cada indivíduo, incluindo suas interfaces sociais, as formas violências existentes e sua construção não meramente biológica, é algo que deve ser questionado quando se ouve frases do tipo “meninos devem vestir azul, e meninas cor de rosa”.

Por outro lado, distante dessa discussão, as Conferências Nacionais de Saúde (CNS), de 2003 até 2017, apontaram a importância da discussão e da formação de profissionais no cuidado em saúde coletiva em relação às questões de gênero, sexualidade, orientação sexual e com a comunidade LGBTIQ+.

Em 2006, a Organização de Saúde (OMS) deixou clara a importância da discussão sobre a temática gênero nos currículos dos profissionais de saúde com a finalidade de diminuir a desigualdade no acesso à saúde. Mesmo diante de tantas evidências e documentos que permeiam a construção biológica-social-política do ser humano e seus corpos, a educação ainda está parada no tempo e no espaço, dificultando ações no tocante à Educação Permanente sobre os gêneros e as sexualidades, reproduzindo discursos sexistas e homolesbotransfóbicos de que o ensino de educação sexual e sexualidades transformará crianças em “viados e sapatões”.

O SUS e a Gestão em Saúde Pública

Pensar na conceituação do Sistema Único de Saúde (doravante SUS), desde a sua concepção até a sua forma prática e aplicável, como o direito a todos os cidadãos brasileiros constitui um grande marco para a universalidade do atendimento em saúde em diferentes esferas. Porém, não se pode esquecer que tal movimento de construção e consolidação do SUS somente foi possível através do Movimento Sanitário e da Reforma Sanitária nos anos de 1970 e 1980, pautados em estabelecer a igualdade, a integralidade e a universalidade no campo da saúde pública. Lembrando que, nessas décadas, o Brasil já vivenciava uma grande desigualdade entre as classes sociais e também nos serviços de saúde.

Confirmando essa ideia, Paim (2008, p. 38) afirma que, com base na tese de que a RSB representa um projeto de reforma social, poder-se-ia considerar a hipótese de que ela foi concebida como reforma geral, tendo como horizonte utópico a revolução do modo de vida, ainda que parte do movimento que a formulou e a engendrou tivesse como perspectiva apenas uma reforma parcial.

É evidente que o desenho estruturado e pensado para a Gestão em Saúde Pública do SUS não responde à sua complexidade, pois a sua concepção democrática ainda está pautada em ações políticas que impedem ou diminuem a sua eficácia, assim como a realização de ações de promoção e prevenção à saúde em sua totalidade.

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Quando se afirma que as ações políticas interferem nas ações e na gestão de saúde pública, deve-se entender seus efeitos sobre os corpos, os gêneros, as sexualidades e a Educação Permanente em Saúde, tendo em vista que a escola é um local onde circulam ideologias políticas e religiosas. Dado que os municípios possuem autonomia para gerir as ações de saúde pública, tais temáticas não são abordadas e ou implantadas nestes municípios. Para Junqueira (2009 apud ARAÚJO, 2018, p. 217), a escola como ambiente como um ambiente público representante e legitimado socialmente, assume várias vezes a função de reprodução de discurso e práticas excludentes, tornando-se muitas vezes, como um espaço institucional de opressão, o que deve, ainda, a participação ou a omissão dos sistemas de ensino da comunidade, das famílias, da sociedade, as instituições e o Estado.

Por sua vez, Castanheira (1990, p. 222) descreve algumas dificuldades, […] os conflitos entre a necessidade institucional de estabelecer normas para o atendimento, e as necessidades mais imediatas trazidas pelos usuários”; ou, ainda, “o conflito entre os interesses de grupos de trabalhadores da unidade, e de cada trabalhador individual, com as normas da instituição, de um lado, e com as demandas dos usuários, de outro.

E ainda, conforme aponta Cecílio, Mehr (2003, p. 199), […] o denominado ‘sistema de saúde’ é, na verdade, um campo atravessado por várias lógicas de funcionamento, por múltiplos circuitos e fluxos de pacientes, mais ou menos formalizados, nem sempre racionais, muitas vezes interrompidos e truncados, construídos a partir de protagonismos, interesses e sentidos que não podem ser subsumidos a uma única racionalidade institucional ordenadora.

Os novos horizontes que são propostos pelo SUS dentro dos seus aspectos éticos, cogestão, gestão e movimentos reflexivos somente terão êxito quando os novos olhares e saberes produzidos pela população, em consonância com as políticas públicas de saúde, se constituírem democraticamente, trazendo à tona a execução e a fiscalização para as quais o SUS foi pensado e estruturado.

Visando a constituição não meramente biológica e ideológica do ser humano, entendemos que os gêneros fazem parte da saúde pública, assim como as sexualidades pertencem aos corpos. Foram esses mesmos corpos que pensaram e estruturaram o SUS. Contribuindo com a construção do gênero na saúde pública, Ferraz e Kraiczyk (2010, p. 71-72) esclarecem que: se gênero é uma das dimensões organizadoras das relações sociais que produz desigualdades, então a política de saúde construída no âmbito do SUS deve reconhecer a existência dessas desigualdades e respondê-las, com vistas à promoção da equidade de gênero. […] Ao atribuir significados para a diferença sexual, categorizando e valorizando diferentemente atributos femininos e masculinos, as mais diversas culturas e sociedades transformam a diferença sexual em desigualdades que se expressarão em todas dimensões da existência humana, inclusive nos modos de adoecer e morrer.

Descrever e definir o Sistema Único de Saúde Brasileiro, não é uma tarefa simples, uma vez que implica descrever a complexidade do ser humano e sua existência em múltiplas esferas e, ainda, a evolução desses corpos em suas múltiplas interfaces e territorialidades. Isso exige disposição social e política para que o SUS tenha acesso universal. Porém, alguns pontos de conceituação e construção do SUS são necessários e devem ser evidenciados, dentre os quais está a Constituição Brasileira (1988, p. 63): Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I- descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II- atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III- participação da comunidade.

E ainda, Brasil (1990a, p. 69) descreve no Capítulo II, dos Princípios e Diretrizes:

Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS) são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:  I – universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; II – integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema; III – preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral; IV – igualdade da assistência de saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie; V – direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde; VI – divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a sua utilização pelo usuário; VII – utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação programática; VIII – participação da comunidade; IX – descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo: a) Ênfase na descentralização dos serviços para os municípios; b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde; X – integração em nível executivo das áreas de saúde, meio ambiente e saneamento básico; XI – conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência e saúde da população; XII – capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e XIII – organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins idênticos.

Ao discutir as concepções que constituem a complexidade do SUS, não se pode esquecer que a existência desse sistema de saúde se deve à pressão dos movimentos sociais que entenderam que saúde é um direito de todos. Não distante desses movimentos, para esse trabalho, o enfoque central é na sua função correspondente à educação em suas múltiplas vertentes e definições.

Porém, para que isso aconteça se faz necessário relembrar o seu financiamento, a sua diversidade e a sua própria estrutura. Entretanto, para discutir o financiamento do SUS, é preciso ter em mente que ele advém dos impostos recolhidos pelos cidadãos, ficando assim com recursos advindos da União, dos estados e municípios, além de fontes suplementares de financiamento. Isso também vale para as regiões onde não existem estruturas de saúde pública, quando o SUS contrata os serviços em hospitais particulares, não deixando a população sem atendimento de saúde.

Para que o acesso acontecesse de forma igualitária, foi utilizada a estratégia de descentralização dos serviços de saúde pública, ficando assim a União, estados e municípios responsáveis pela integralidade dos atendimentos, conforme a Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012, e a Emenda Constitucional n. 29 de 2000. Contribuindo com essa afirmativa, Pereira et al (2004, p. 48) esclarece que: organizar o sistema de saúde com direção única em cada esfera de governo por meio da descentralização política, administrativa e financeira da União, estados e municípios é um meio para atingir os objetivos do SUS. Portanto, descentralização seria uma diretriz que obedece aos princípios do SUS. Em contrapartida, a descentralização tornou-se um traço estruturante do sistema de saúde brasileiro que muitas vezes confunde-se com um princípio, a ponto de alguns autores apresentá-lo dessa forma.

Nesse contexto a forma igualitária parece não contemplar todas as esferas e níveis correspondentes ao SUS, pois quando se pensa nas temáticas gêneros e sexualidades, a política individual ou coletiva assegurada pela atenção primária e suas funções não conseguem adentrar nas escolas na forma de Educação Permanente em Saúde, ou simplesmente educação em saúde, como direito de todos que ali se fazem presente para produzir esclarecimentos e reconhecimento. A questão que se impõe é: por que isso acontece? Na busca de uma resposta, chega-se à conclusão que a mesma política que assegura cirurgias de readequação de gênero, atendimentos para situações de violências e garantia para o acompanhamento psicoterápico, não é capaz de ultrapassar os muros das escolas.

Corpo, Gênero e Sexualidades nas práticas de educação permanente em saúde Pública.

Definir o que é um corpo e ter um corpo é um tanto complexo nesse momento em que se vive um retrocesso permeado de sexismo e ideologias cerceadoras. Porém, é preciso considerar que as definições e nomenclaturas não excluem a essência do ser humano, mas podem levá-lo a estados de auto reconhecimento ou de cerceamento ideológico, tendo em vista que ter um pênis/vagina não é a essência de homens/mulheres. Nesse contexto, emergem questionamentos sobre o ser e estar enfermo em um hospital onde se ouvia constantemente frases como “esse é meu filho, e ele é macho”.  Desse fato, pode-se questionar o que é ser macho? O que é ser fêmea? O que é ter um corpo estigmatizado? Será que ter um corpo estigmatizado é também ter um corpo assexuado?

Outrossim, em um primeiro momento, é evidente que as escolas excluem as sexualidades e os gêneros, uma vez que a escola é composta por seres humanos e estes possuem gêneros e sexualidades. Nessa linha de raciocínio, Sampaio (2017, p. 12) esclarece que: para viver em sociedade é essencial a transformação do homem de um ser biológico para um ser humano, e é por meio da aprendizagem com as relações experimentadas que se constroem os conhecimentos que vão permitir o seu desenvolvimento mental (interação ser humano-ambiente físico social).

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Neste caso, o ser macho e o ser fêmea, são distinções de gênero que não definem em essência o que é ser homem e mulher em um contexto mais amplo. Mas, quando se depara com as atividades de saúde pública e ou livros de biologia, fica evidente que, biologicamente, ser macho é possuir uma genitália denominada de “pênis”, e ser fêmea é possuir uma genitália denominada “vagina”. Tais atributos e formas inadequadas de interpretação, são situações que aumentam os índices de violências físicas e psicológicas entre os alunos e também no convívio social.

A estigmatização dos corpos e suas sexualidades permanece na construção dos saberes e vivências escolares e em sociedade, o que faz com que o estigma de ser gênero divergente e/ou vivenciar as sexualidades e a orientação sexual diversa de macho e fêmea heterossexual atraia o julgamento de que a comunidade LGBTIQA+ é responsável pelo amento dos números de casos de infecções sexualmente transmissíveis. Nesse sentido, a importância da Educação Permanente em Saúde (EPS) nas escolas se torna essencial como forma de esclarecimento e também de acolhimento aos alunos.

Quando nos deparamos com os inúmeros conceitos de saúde/educação nesse momento, a educação permanente atende à proposta que estamos evidenciando pois, “essa seria uma educação muito mais voltada para a transformação social do que para a transmissão cultural” (GADOTTI, 2000). Ricaldoni e Sena (2006) complementam essa ideia de educação permanente em saúde uma vez que: é necessário que os serviços de saúde revejam os métodos utilizados em educação permanente, de forma que esta seja um processo participativo para todos. Ela tem como cenário o próprio espaço de trabalho, no qual o pensar e o fazer são insumos fundamentais do aprender e do trabalhar (p. 838).

Ao reconhecer que a sexualidade é como uma impressão digital de todos seres humanos e que estes possuem dois grandes órgãos sexuais no corpo (o cérebro e a pele), fica evidente que todos os seres humanos são seres sexuais, pois a sexualidade não representa apenas o ato sexual, mas o afeto, a amizade, a orientação sexual, o amor e a reprodução. Nesse sentido, a escola é o local onde a EPS, com as temáticas sexualidades e gêneros, deve se fazer presente, independentemente da relação ideológica, religiosa e político-partidária dos municípios e estados, tendo que em vista que a escola é formada por seres humanos em processo de construção de si e seus corpos.

“Serás Deus ou Deusa, que sexo terás”: desafios para a gestão em saúde pública.

A complexidade do que é ter e ser um corpo, em suas múltiplas dimensões e ideologias, é uma tarefa difícil quando existe uma dicotomia entre o corpo produto de ciência biológica que alimenta os dados e gera a resposta da gestão em saúde pública e o corpo real que vivencia e experimenta o estar no mundo, vivenciando seu gênero social e suas inúmeras sexualidades. Veiga-Neto (2016, p. 74) esclarece que: se a sexualidade que articula o corpo com a população, é a norma que articula os mecanismos disciplinares (que atuam sobre o corpo) com os mecanismos regulamentadores (que atuam sobre a população). A norma se aplica tanto ao corpo a ser disciplinado quanto à população que se quer regulamentar[…] sem apelar para algo que seja externo ao corpo e à população em que está esse corpo.

Na dualidade existente no contexto da realidade vivida e os recursos públicos, parece existir uma lacuna, pois, como cabe lembrar, a vigilância sanitária e a vigilância epidemiológica demonstram índices crescentes acerca das inúmeras formas de doenças crônicas e também um aumento significativo de novas nomenclaturas sobre transtornos, porém ainda não definiram que os gêneros masculinos e femininos, “macho e fêmea”, não são mais a base de uma construção de saúde pública. E parece que, quanto mais se fixam ideias e afirmações de que os corpos são meramente biológicos, mais transtornos emergem, demonstrando que uma vida reprimida, coercitiva e automedicada é fruto de uma ingerência e/ou negligência por parte das três esferas de poder.

Contribuindo com essa afirmativa Moulim (2020, p. 19) descreve que: trazemos dentro de nós mesmo um novo pecado original, um risco multiforme que teve origem em nossos genes, modificado pelo nosso meio ambiente natural e sociocultural e pelo modo de vida. Na sala de espera do médico, agora, há cinco bilhões de clientes aguardando pacientemente. […] aí está o paradoxo da grande aventura do corpo no século XX, o exibicionismo da doença não é mais admissível, reduzido pelo ideal de decência.

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Tais repressões e situações são evidenciadas quando recursos de saúde pública são destinados para a atenção primária para que sejam realizadas atividades sobre educação em “saúde” com temas sobre os corpos e as sexualidades – que não acontecem por ideologias religiosas que já definiram o que é ser homem e mulher e como o sexo deve ser praticado, expresso nos livros de biologia ou em livros considerados sagrados. Ribeiro e Motta (1996, p. 40), nesse contexto, esclarecem que “não há aprendizagem se os atores não tomam consciência do problema e se nele não se reconhecem, em sua singularidade”.

Para esclarecer melhor essa dicotomia entre a função da atenção básica no tocante à Educação Permanente em Saúde e o não-poder provindo de ideologias cerceadoras, Vilanova (2018, p. 37) demonstra em seu trabalho pessoas em situação de violência sexual entre 0 e 14 anos, no ano de 2017, na cidade de Palmas, Tocantins.

Observa-se, no gráfico acima, que a forma preventiva de atenção à saúde nas escolas sobre temas que envolvem as sexualidades ainda é falha, tanto por parte da gestão e políticas públicas em saúde quanto por parte das Secretarias de Educação e Saúde, sejam elas estaduais ou municipais. Porém, como forma de direito à saúde em sua totalidade, as vítimas de violências possuem atendimento em núcleos especializados, exceto nas situações que envolvem o reconhecimento de seu corpo e de práticas sexuais abusivas.

Além disso, é significativo o aumento dos casos de transtornos dismórficos corporais, automutilações infanto-juvenil e o interesse pelos corpos estigmatizados por parte dos estados e municípios. Mas tais alterações comportamentais e vivenciais ainda não obtiveram fizeram com que os poderes públicos esquecessem suas ideologias, suas visões religiosas e políticas para permitir que a atenção básica de saúde e/ou Instituições de Ensino Superior adentrassem nas escolas para promover a educação sexual. Para Bonfim et al (2016, p. 240), o Transtorno Dismórfico Corporal (TDC) é caracterizado por um comportamento perceptivo distorcido em relação à imagem corporal e uma preocupação com um defeito imaginário na aparência ou inquietação exagerada em relação a imperfeições corporais identificadas.

Teriam os poderes públicos medo de que as Instituições de Ensino Superior em parceria com as Secretarias de Saúde incitem o uso do divulgado, mas nunca revelado, kit gay? Ou, que tais ações esclareçam os alunos sobre as violências e o reconhecimento dos seus corpos e gêneros?

Uma tentativa de responder a esses questionamentos aponta para a criação ideológica e uma falsa política cerceadora direcionada pelo público religioso ao mesmo tempo em que se acredita que o (re)conhecimento sobre os corpos traz questionamentos que muitos professores e escolas não estão dispostos a aceitar e explicar a seus alunos. Se há a ensinagem e o discurso escolar de que a educação deve ser libertadora, torna-se essencial reconhecer, aceitar e entender alunos que nasceram e foram rotulados como macho/masculino/deuses, mas sempre se reconheceram como fêmea/femininas/deusas. Se o ato de educar é libertador, onde se coloca a liberdade de estar e viver o seu corpo enquanto indivíduo? Aqui, vale lembrar que o Estado Brasileiro é laico.

Mas, se esses temas deveriam ser abordados como forma de promoção à saúde nas escolas, na verdade, são excluídos dos projetos pedagógicos por inúmeros fatores, incluindo a ausência de carga horária para ações de educação em saúde ou a invisibilidade do saber reconhecer e agir em determinadas atitudes. De acordo com Casemiro et al (2014, p. 829-830), não é de hoje que se reconhece o vínculo entre a saúde e a educação. Sob o argumento desta íntima ligação entre as duas áreas existe ao menos um consenso: bons níveis de educação estão relacionados a uma população mais saudável, assim como uma população saudável tem maiores possibilidades de apoderar-se de conhecimentos da educação formal e informal. Dependendo do local de onde se fala e de quais tintas são usadas encontram-se os mais diferentes discursos e cenários ou, dito de outra forma, sob aquele argumento cabem as mais diversas abordagens ao tema. A escola tem representado um importante local para o encontro entre saúde e educação abrigando amplas possibilidades de iniciativas tais como: ações de diagnóstico clínico e/ou social; estratégias de triagem e/ou encaminhamento aos serviços de saúde especializados ou de atenção básica; atividades de educação em saúde e promoção da saúde.

Corroborando, Moulim (2020, p. 18) descreve que: paralelamente, a preocupação com a saúde é superior taticamente a preocupação com a doença. Se a palavra do século XVIII era felicidade, e a século XIX a liberdade, pode-se dizer que a do século XX é a saúde … a saúde passou a ser a verdade e também a utopia do corpo.

No século XXI, com inúmeras fontes explicando e evidenciando a importância de se construir esses conhecimentos nas escolas e na saúde pública, ainda me questiono por que as escolas e ideologias têm tanto medo dos termos gênero e sexualidade?

A resposta provável para essa questão pode estar ligada ao desconhecimento, por parte dos professores e gestores escolares, incluindo seus financiadores, de que o corpo não é apenas uma construção biológica, mas uma junção de muitas vivências e experiências. Essa compreensão exigiria vivenciar novas matrizes de corpos, gêneros e sexualidades, aprender a conviver e realizar leituras, sair da zona de conforto que as religiões impuseram ao longo dos tempos e, portanto, mudar todos as abordagens em todos os documentos sobre educação existentes – o que seria, para muitos, desconfortável e constrangedor.

Nesse contexto, justifica-se que a gestão em saúde pública e a própria saúde pública em suas diversas esferas e complexidades, devem aprender que nada é estanque e rígido em termos políticos e sociais. Logo, a escola, como local que proporciona o primeiro convívio de muitas pessoas para a inclusão social, deveria ser vista e vivida como ponto de partida para o novo e não uma vivência do velho imposta, muitas vezes, por um livro não-científico.

Auxiliando nesses questionamentos, Lucchese  (2004, p. 11) esclarece que “no campo da ação social, as políticas públicas de saúde têm por função definir a resposta do Estado às necessidades de saúde da população” e, nesse sentido, as afirmativas mostram que tais atitudes e ações de educação permanente em saúde sobre sexualidades e os gêneros perpassariam ações simplistas e entrariam nos princípios e diretrizes do SUS, tanto no sentido individual quanto no coletivo referente à promoção, prevenção e recuperação da saúde. Contribuindo com a discussão, esclarece-se que: a promoção da saúde enfrenta esta realidade sanitária na medida em que oferece condições e instrumentos para uma ação integrada e multidisciplinar que inclui as diferentes dimensões da experiência humana a subjetiva, a social, a política, a econômica e a cultural e coloca a serviço da saúde, os saberes e ações produzidos nos diferentes campos do conhecimento e das atividades. (BRASIL, 2002, p. 12)

Finalizando, fica evidente que a gestão em saúde pública para a promoção, prevenção e recuperação e reabilitação do ser humano, no âmbito da Educação Permanente em Saúde, por temáticas que incluem o corpo, os gêneros e as sexualidades, voltadas para a escola, é pobre em recursos, suas práticas são ineficazes e os princípios e as diretrizes do SUS não são atendidos.

Fica evidente o quão o SUS é político e, por esse motivo, existem muitas divergências, falhas e também inacessibilidade. Essa ingerência e inacessibilidade dizem respeito às várias dicotomias existentes entre os corpos que construíram e utilizam o SUS diante de tabus religiosos  (novamente, o Estado Brasileiro é laico) e políticos, sustentados por uma concepção biologizante, portanto, cerceadora, de gêneros e de sexualidades.

Proporcionar discussões e reflexões sobre as políticas públicas, gestão em saúde pública, educação em saúde é algo que deve permanecer, pois um dos primeiros contatos e momentos de socialização entre indivíduos acontece nas escolas. E são essas mesmas escolas, que pertencem a um território que constitui uma Unidade Básica de Saúde, que possuem problemas individuais e coletivos que os poderes públicos preferem se isentar ou infringir políticas públicas quando os assuntos desconstroem ideologias já impostas como por exemplo, os gêneros e as sexualidades.

E essa incoerência de ser e estar em um corpo, que possui um gênero e uma sexualidade, deveria ser esclarecido nos projetos de saúde e também nas ações de Educação Permanente em Saúde. Todavia, as escolas também assumiram para si que ensinar e esclarecer sobre as temáticas é função da família e não do Estado. E, nesse constante jogo de incoerências, ingerências e incongruências, quem sofre são os alunos e alunas que estão se construindo e também construindo seu contexto social a partir da vivência nas escolas.

 

REFERÊNCIAS

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VEIGA-NETO, A. Foucault & a Educação. 3ª ed. Belo Horizonte: Autentica Editora, 2016.

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Como você tem se saído como gerente de sua mente?

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A forma de um indivíduo pensar é traduzida em suas diversas ações, em diferentes lugares, seja em casa, no ambiente de trabalho ou apenas em uma fila de supermercado. Já observou que, no último caso, sempre tem uma pessoa estressada que reclama o tempo todo, até chegar ao caixa para efetuar o pagamento. Mas, por que existem comportamentos tão diferentes? O psiquiatra e escritor, Augusto Cury (2015) explica que toda atitude, passa em primeiro lugar pelo campo da mente, e por isso é necessário a gestão de pensamentos.

Atualmente fala-se muito sobre gestão de tempo. No entanto, o que seria a gestão de pensamentos? Cury (2015) declara que o termo consiste na compreensão da formação do pensamento, ou seja, a busca pelo autoconhecimento sobre sua construção. Por isso, segundo o escritor, é imprescindível a produção do pensar positivo, em detrimento ao negativo.  “Critique, cada ideia pessimista e preocupação excessiva e capacite o seu eu” Cury (2015).

A preocupação excessiva vai ao encontro do volume de informação recebida diariamente. Desde cedo, a pessoa acorda e checa o celular para saber se recebeu algum tipo de informação, posteriormente verifica as redes sociais, e por fim liga a televisão. Antes mesmo de sair de casa, ela foi bombardeada por diferentes tipos de informações, que influenciarão na sua forma de pensar, no dia.  Burgos (2014) observa que todo aparato tecnológico deveria ser um meio para se crescer como pessoa, não como um fim em si; ou seja, a excesso de informação influencia na elaboração do pensamento acelerado.

Fonte: Freepik

Como solução Burgos (2014) aponta que a autoanálise, tomar consciência e o monitoramento dos hábitos são algumas das estratégias possíveis no processo de relação mais sadia com a tecnologia. “Creio que o uso moderado das ferramentas que temos à disposição – do smartphone às redes sociais – pode ser certamente mais enriquecedor que a negação total, e o tempo necessário para uma desaceleração pode variar bastante de pessoa pra pessoa” (BURGOS, 2014).

Nessa perspectiva Carr (2014) alerta sobre o mau uso da tecnologia, no dia a dia, como forte influenciador na produção de pensamentos, sem passar pelo autoconhecimento e análise. “Nossa tendência é usar tecnologias para facilitar nossa vida, não para dificultar e, com os computadores em rede, esse desejo por conveniência está tendo uma enorme influência sobre nossas vidas intelectuais, assim como em nas físicas. Acho que existem evidências de que essa tal facilidade pode obstruir nosso aprendizado e nossa memória, e talvez até mesmo nossa disposição para a empatia.” (Carr, 2011).

Carr (2011) explica que a dependência excessiva pelas tecnologias tem prejudicado o ser humano no processo de formação de ideias e do saber. Ou seja, as pessoas estão deixando de serem críticas, produtores de ideias e pensamentos, e estão absorvendo, sem nenhuma análise, o conteúdo exposto na internet.

Fonte: Freepik

Adorno (1971) destaca que a infância tem um papel primordial para a formação do pensamento do indivíduo, bem como acrescenta que a construção do caráter do mesmo acontece quando criança. Compactuando com a ideia de Adorno, que Cury (2015) relata que uma criança de sete anos possui mais informação do que tinha um imperador, na Roma antiga.  Nesse sentido, é preciso regular o tempo de uso das redes sociais, se a forma de pensar de um adulto é influenciada pelo consumo de conteúdo, como enfatizou Carr (2011), imagina uma criança que está em processo de formação do caráter.

A projeção de um adulto crítico, que não deixa se influenciar por tudo que está exposto, no universo da internet, inicia na infância, e como alertou Augusto Cury (2014) uma criança tem mais informação que uma pessoa da antiguidade.  Por isso, é necessário a gestão de tempo, das crianças com as mídias digitais, para futuramente ser uma pessoa que tenha uma gestão de pensamento. Ou seja, somos aquilo que pensamento e permitimos. E para que se tenha pensamentos saudáveis e saber impor limite ao outro sobre as relações interpessoais, começa na infância.

REFERÊNCIAS

Adorno, T W. Emancipação e Educação. Rio de Janeiro. Paz e Terra. 1971.

BURGOS, Pedro M. Conecte-se ao que importa: Um manual para a vida digita saudável. São Paulo: LeYa, 2014.

CARR, Nicholas. A geração superficial: o que a internet está fazendo com os nossos cérebros. 1ª Ed. Tradução de Mônica Gagliotti Fortunato Friaça. Rio de Janeiro: Agir, 2011.

Cury, A. Gestão da emoção: Técnicas de coaching emocional para gerenciar a ansiedade. 2015.

Cury, A. Ansiedade: como enfrentar o mal do século: a Síndrome do Pensamento Acelerado: como e porque a humanidade adoeceu coletivamente, das crianças aos adultos.  Primeira edição. Saraiva. 2014.

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Niède Guidon e sua contribuição para a ciência e história brasileira

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Fonte: http://encurtador.com.br/acyH1

Niède Guidon é uma arqueóloga brasileira, pesquisadora, nascida em Jaú, interior de São Paulo, no dia 12 de março de 1933, hoje com 88 anos, formada em História Natural pela USP, com doutorado em pré-história pela Sorbonne e especialização na Université de Paris. Se mudou para a França, após o golpe de 1964, devido a sua militância política, construindo portanto, sua carreira como arqueóloga. Em 1963 quando estava expondo pinturas rupestres de Minas Gerais no Museu Paulista, conheceu um morador de São Raimundo Nonato no Piauí, informando-lhe que lá existiam pinturas semelhantes, algo que despertou curiosidade na pesquisadora, que já seguia com estudos voltados para a descoberta de vestígios do homem mais antigo das Américas, como assistente da grande arqueóloga francesa Annete Emperaire.

Niède Guidon é conhecida mundialmente como uma arqueóloga que dedicou seus estudos para demonstrar a presença do homem nas Américas, através dos sítios arqueológicos encontrados na região de São Raimundo Nonato, deixando portanto, sua vida de docência na França para se estabelecer no Brasil, e assim intensificar sua pesquisa nessa área, diante de evidências da passagem do homem nesse local. Considerada como uma das arqueólogas mais premiadas no mundo, no ano passado foi homenageada na conquista do renomado Prêmio Hypatia Awards, sendo a única sul americana prestigiada nessa premiação, como reconhecimento pelo seus trabalhos de pesquisas desenvolvidas no Piauí.

Sua trajetória de estudos, portanto, é marcada pela sua mudança em 1992 para a cidade de São Raimundo Nonato, onde inicia suas atividades de pesquisa, porém desde 1973 integra a Missão Arqueológica Franco-Brasileira, concentrando seus trabalhos nesse local, se tornando uma grande lutadora para que suas pesquisas sejam subsidiadas financeiramente e assim possam ser continuadas e ampliadas, mas acima de tudo reconhecidas. Nesse percurso, muitos já foram os desafios superados nesse sentido, porém a valorização dos estudos e suporte financeiro para sua continuidade, como a manutenção das atividades de estruturação turística, pagamento de funcionários, entre outras despesas, ainda são vivenciados pela pesquisadora, que segue lutando isoladamente para que os trabalhos no Parque Nacional da Serra da Capivara permaneçam acontecendo.

Fonte: http://encurtador.com.br/CLNST

Niède Guidon afirma que o material arqueológico encontrado no Piauí, indica que o homem chegou no local cerca de 100 mil anos atrás e apesar de ser alvo de questionamentos, por diversos estudiosos, a pesquisadora acredita que o Homo Sapiens veio da África, por via marítima, atravessando o oceano atlântico, chegando então até o Piauí. Sua teoria se sustenta na constatação que, diante da seca enfrentada na África, o homem teria ido buscar alimentos pelo mar, que a distância entre a África e a América eram muito menores, sendo esses os argumentos que explicam, porém sua teoria se choca com a defendida pela arqueologia tradicional, ao qual relata que a chegada do homem nas Américas tenha acontecido cerca de 13 mil anos atrás, vindo da Ásia, pelo estreito de Bering.

A luta de Niède Guidon perpassa pelo incentivo necessário para manutenção de pesquisas no país, algo relevante, pois as descobertas são contribuições imprescindíveis para aprofundamento e ampliação do conhecimento. A arqueóloga enfrenta o desafio de manter a gestão do Parque Nacional da Serra da Capivara em funcionamento, por meio da Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham), porém na atual conjuntura da pandemia, enfrenta a batalha do custeio dos trabalhos, com grandes prejuízos para o andamento das pesquisas.

Em 2015, a pesquisadora viu seus trabalhos serem paralisados, por falta de recursos, mesmo sendo retomados logo depois, a luta se intensificou para que os projetos e pesquisas não mais tenham grandes prejuízos, apesar da necessidade ser bem maior, que os recursos atualmente disponíveis, revelando uma dura realidade enfrentada por muitos pesquisadores no Brasil. Ainda assim, Niède Guidon, se coloca na linha de frente de defesa do maior tesouro arqueológico brasileiro, e acima de tudo, da ciência como um campo a ser desbravado e fonte de crescimento e desenvolvimento de um país.

Fonte: http://encurtador.com.br/COS24

Niède Guidon acredita com seus estudos poder reescrever a versão da história demográfica do homem e mesmo existindo aspectos controversos, contestados por outros estudiosos, a pesquisadora acumula evidências científicas, que fortalecem suas hipóteses, com grandes descobertas de sítios arqueológicos e centenas de fósseis localizados na região de São Raimundo Nonato.

Além da pesquisadora ser perseverante no cuidado à manutenção dos vestígios arqueológicos, com toda certeza, o impacto da criação do Parque Nacional da Serra da Capivara é bastante positivo para o contexto turístico da região. Uma cidade no interior do Estado do Piauí, que tem um crescimento no seu turismo, pela intensificação da movimentação de visitantes, sem dúvida, tem com isso uma modificação no cotidiano dos seus moradores, contribuindo para um desenvolvimento social e econômico no local.

Niède Guidon define sua luta como algo primoroso e se preocupa com o avanço da sua idade frente a direção da Fumdham, como uma necessidade de passar esse trabalho para outra pessoa com igual interesse em manter as pesquisas e o funcionamento do Parque. No entanto, segue ainda no comando, lidando com escassez de recursos, para o mais importante sítio arqueológico do país, mas acreditando na promessa de novos repasses por parte do Governo, no apoio de outras entidades colaboradoras e principalmente, nos resultados já alcançados pelos seus estudos, que fortalece diariamente a sua luta.

REFERÊNCIAS:

DUARTE, Cristiane Delfina Santos. A mulher original: produção de sentidos sobre a arqueóloga Niéde Guidon. 2015. 242 p. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem e Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, Campinas, SP. Disponível em: http://www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/271103. Acesso em: 24 abr. 2021

MARTIN, Gabriela. PESSIS, Anne-Marie. Entrevista: Niède Guidon. Clio Arqueológica, v35N1, p.1-13, 2020. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/clioarqueologica. Acesso em: 24 abr. 2021.

MUSEU DO HOMEM AMERICANO. A arqueóloga Niède Guidon. Disponível em: http://www.fumdham.org.br/museu-do-homem-americano. Acesso em: 24 abr. 2021.

GAUDENCIO, Jessica. Niède Guidon: a cientista brasileira responsável pelo tesouro arqueológico nacional. História da ciência e Ensino: construindo interfaces, vol. 18, pp 76-87, 2018. Disponível em: http://dx.doi.org/10.23925/2178-2911.2018v18i1p76-87. Acesso em: 24 abr. 2021.

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Minha jornada no SUS: de profissional a usuária

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Com o avanço na área da saúde brasileira advindo da criação do SUS, o país enfrenta, entre outros, dois grandes desafios a serem vencidos pelo próprio sistema: primeiro é a ampliação do acesso a suas ações e o entendimento por parte da população, de seu uso, fluxo e rotinas considerando os pressupostos da universalização das suas ações e serviços. Em segundo lugar, a ampliação dos processos formativos para uma melhor atuação dos trabalhadores e operadores do SUS junto aos usuários.

Para equacionar o segundo desafio, o Ministério da Saúde editou a Portaria nº 198/GM em 13 de fevereiro de 2004, instituindo a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde como estratégia do Sistema Único de Saúde para a formação e o desenvolvimento de trabalhadores para o setor, considerando sua responsabilidade constitucional de ordenar a formação de recursos humanos para a área de saúde e de incrementar, na sua área de atuação, o desenvolvimento científico e tecnológico, provendo políticas orientadoras da formação e desenvolvimento de trabalhadores para o setor, articulando os componentes de gestão, atenção e participação popular com o componente de educação dos profissionais de saúde.

Fonte: https://bit.ly/2talgZb

É neste contexto que me insiro como trabalhadora e operadora do Sistema Único de Saúde na gestão, de 1994 até 2016, acompanhando cada fase de sua constituição, seja representando os profissionais de saúde nos recém-criados Conselhos Municipais e Estadual de Saúde na década de 90, seja na gestão de serviços de saúde de município e estado, seja na gestão de politicas de saúde e no estabelecimento de redes de atenção junto a gestores municipais através de Comissões Intergestores Regionais.

Com o intuito de buscar um maior aprimoramento das ações por mim desenvolvidas, procurei acessar os dispositivos de educação permanente oferecidos pelo SUS através do Ministério da Saúde: ENSP/FIOCRUZ, ENSP/ ESPJV, OPAS/ UNODC, e da Secretaria Estadual de Saúde (ETSUS-TO)  em seus diferentes níveis  de capacitação (Atualizações, Formações, Especializações, MBA), não só para cumprir os requisitos da Lei 8080/90, mas sobretudo para empoderar o trabalho com conhecimento qualificado no arcabouço das tecnologias leves que o SUS oferece aos seus trabalhadores.

Meu primeiro contato com a Política de Educação Permanente do SUS aconteceu em 1995, quando foi ofertado aos técnicos, vários treinamentos para a atenção de pacientes com Diarreia e Infecção Respiratória Aguda (IRA). Desde então, vários outros treinamentos foram disponibilizados e em 1997 pude fazer minha primeira especialização em Saúde Coletiva, através de um consórcio entre Secretaria Estadual de Saúde, Secretaria Municipal de Saúde em Araguaína, Universidade Federal do Tocantins – UFTe Escola Nacional de Saúde Pública – ENSP/FIOCRUZ.

Fonte: https://bit.ly/2JORWCa

Após o término desta especialização, a Secretaria Estadual de Saúde e a ENSP/FIOCRUZ disponibilizou aos trabalhadores de Saúde Mental, o primeiro Curso de Especialização em Saúde Mental e Saúde Coletiva e fui selecionada para participar deste curso. Outros cursos se seguiram, tais como Curso de Especialização em Educação Permanente em Saúde (o primeiro do país, e que ocorreu em nosso Estado do Tocantins), e o curso para tutores em Educação Permanente todos capitaneados pela SES/ ENSP/FIOCRUZ, além de um MBA em Gestão de Projetos Governamentais SES/ PMI-GO/ UNITINS

Na área de Saúde Mental, pude fazer mais algumas especializações em Saúde Mental, Álcool eoutras Drogas pela UNODC/ MS/SENAD e por ultimo tive o privilégio de cursar a Especialização em Gestão de Redes de Atenção à Saúde que me proporcionou uma maior visão do campo de atuação dos profissionais no contexto da regionalização e na construção de Redes de Atenção à Saúde no Estado.

Neste sentido, percebi que os trabalhadores do SUS têm a oportunidade de se capacitarem de forma efetiva a partir de suas vivências no trabalho, aumentando o nível de capacidade técnica operacional dos serviços ofertados aos usuários dos serviços de saúde de forma universal, regionalizada e equânime.

Vale ressaltar que os processos formativos desenhados pelos dispositivos educacionais no SUS ocorrem de forma permanente e continuada, sem custo para os trabalhadores, visando uma maior troca de saberes entre as equipes, proporcionando a Inter e a transdisciplinaridade nos processos de trabalho, e contribuindo para o aprimoramento científico. Segundo Maturana (1997), “A ciência desempenha um papel central na validação do conhecimento em nossa cultura ocidental e, portanto, em nossas explicações e compreensão dos fenômenos” (p.256).

Fonte: https://bit.ly/2MD97UI

Finalmente, percebo que apesar dos grandes desafios que a efetivação do SUS impõe a todos os envolvidos no processo, as iniciativas operacionalizadas pelos profissionais de saúde através das instancias de gestão existente, faz com que esta poderosa política pública chamada SUS se imponha como uma das mais abrangentes e complexas politicas de saúde pública do mundo, na qual eu me beneficio tanto profissionalmente quanto como usuária de sua atenção nos mais diversos níveis.

REFERÊNCIAS:

BRASIL _ Ministério da Saúde. PORTARIA Nº 198/GM Em 13 de fevereiro de 2004 Institui a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde como estratégia do Sistema Único de Saúde para a formação e o desenvolvimento de trabalhadores para o setor e dá outras providências.

MATURANA, Humberto. A ontologia da realidade. Belo Horizonte: Editora da Universidade Federal de Minas Gerais, p. 256. 1997.

http://conselho.saude.gov.br/legislacao/lei8080_190990.htm, Acesso em 25/05/2018 às 23h 51m

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Acadêmicos recebem palestra sobre desafios profissionais

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Na noite desta terça-feira (13), os acadêmicos da disciplina de Gestão de Pessoas I, do curso de Administração, receberam a visita da Psicóloga e Master Coach Lunna Dias. Durante a conversa, Lunna mencionou sua trajetória de trabalho e desafios enfrentados, abordando seu trabalho junto com as empresas, onde desenvolve os serviços de gestão de pessoas.

Psi Lunna Dias – Fonte: https://goo.gl/SxdLvh

A disciplina Gestão de Pessoas I, tem como objetivo aproximar as teorias estudadas pelos alunos à prática profissional. Para e Profa. Me. Muriel Rodrigues, psicóloga que ministra a disciplina, uma visita como a de Lunna é importante por “dar a possibilidade de perceber a teoria no dia a dia, a vivência dentro da gestão de pessoas, as possibilidades e desafios, e também de trazer as atualidades da nossa região”.

Lunna Dias, que é egressa do Ceulp/Ulbra, possui também formação como Consultora DISC, Analista de cargos e salários e MBA em Gestão de Pessoas, além de ser especialista em Arte, Educação e Tecnologias Contemporâneas. Atualmente empresaria, é proprietária da Smart Group, uma empresa de gestão de pessoas.

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Sepsi conta com nova gestão

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Assume o lugar de Thaís Monteiro a psicóloga Fernanda Oliveira, também egressa do curso

O Sepsi – Serviço Escola de Psicologia do Ceulp/Ulbra – conta com nova gestão. Sai a psicóloga Thaís Monteiro, que assume a docência e pesquisa no curso, e entra a psicóloga Fernanda Gomes de Oliveira. Ambas são egressas do curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra.

Fernanda Gomes de Oliveira – Fonte: Arquivo pessoal

De acordo com Fernanda, “o Sepsi, sendo braço importante de apoio à comunidade, foi uma das minhas maiores oportunidades de crescimento durante a graduação. Lá, aprendi sobre acolher, escutar, acalmar, encorajar e, acima de tudo, sobre ser mais humana”. Ainda de acordo com Fernanda, “é muito gratificante e desafiador poder dar continuidade aos meus aprendizados neste campo, agora assumindo o papel de Coordenadora e responsável técnica, e contribuir para a formação de futuros colegas de profissão”.

Para a coordenadora do curso de Psicologia, profa. Dra. Irenides Teixeira, o serviço tem contribuído de modo decisivo para a qualidade profissional do psicólogo em formação. “Não há dúvidas de que temos um dos melhores serviços-escola do país, com equipamentos e recursos atualizados, acomodação de alto padrão e profissionais de apoio extremamente competentes”, destacou.

Serviço – O Serviço Escola de Psicologia (SEPSI) é uma unidade suplementar do Curso de Psicologia do CEULP/ULBRA. Sustenta a formação profissional dos acadêmicos, bem como auxilia na execução das atividades de ensino, pesquisa e extensão por meio da prestação de serviços psicológicos à comunidade. Surgiu em 2005 em razão da Lei nº 4.119, de 1962, que institui a profissão de Psicologia e enfatiza que a faculdade deve organizar serviços nos quais os alunos possam exercitar a prática profissional por meio da aplicação da teoria aprendida.

Desde 2008 o Sepsi está situado no Núcleo de Atendimento à Comunidade (NAC) do CEULP/ULBRA – localizado na Avenida JK, Quadra 108 Norte, Alameda 12, Lote 10, Plano Diretor Norte Palmas/TO. No local são oferecidos serviços psicológicos gratuitos à comunidade nas seguintes modalidades: Psicoterapia individual, casal, familiar e em grupo; Avaliação psicológica e neuropsicológica.

O SEPSI é composto das coordenadoras do Curso de Psicologia, profa. Dra. Irenides Teixeira e profa. Me. Cristina Filipakis, da coordenadora e responsável, agora a psicóloga Fernanda Gomes de Oliveira, de estagiários, supervisores Acadêmicos de estágio, pesquisa, extensão e prática de disciplinas vinculadas ao serviço, além de estudantes vinculados a estágio ou projetos registrados no serviço.

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Um Senhor Estagiário: a moderna gestão feminina

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Este texto tem como proposta uma articulação com o filme “Um Senhor Estagiário”, mais especificamente na personagem Jules Ostin interpretada pela atriz Anne Hathaway, uma CEO [1] (Diretora Executiva) fundadora de um site de moda, cujo objetivo é a venda de roupas. A gestão de Jules permite visualizar as mudanças organizacionais, entre as quais a reestruturação que o mundo do trabalho passou a contemplar por volta do final da década de oitenta, aderida pelas novas formas de administrar e organizar; privilegiando o modelo japonês que busca redução de custo, um maior controle de qualidade e ainda o aumento dos resultados, conforme a autora (BARRETO, 2009, p. 1) vem explicitando acerca de como esse novo modo de gestão vem contribuir para a influência nos valores identitários e a saúde dos trabalhadores e trabalhadoras,  que são absorvidos pelo ideal de competitividade, disciplina e integração à empresa.

No filme Um Senhor Estagiário, a característica marcante da CEO Jules, é de um perfil centralizador e uma exigência quanto à garantia de um padrão de excelência no que se refere aos produtos e serviços que a Startup [2] oferece aos clientes internautas. Quanto a esse aspecto os trabalhadores são extremamente comprometidos e motivados, fruto desse controle das mudanças organizacionais que tem alterado a natureza do trabalho humano e o perfil esperado do trabalhador, conforme alerta (SILVA, 2015, p. 133) sobre os gestores adotarem uma postura de escuta atenta, com um ambiente mais saudável, dando margem para o trabalhador procurar “ajustar a realidade do trabalho aos seus desejos e necessidades, o que torna possível a transformação do sofrimento, do reconhecimento e do prazer”. (SILVA, 2015, p. 136).

A realidade do mundo do trabalho e o conceito clássico de emprego perpassam uma realidade em que a autora (BERGAMINI, 2015, p. 113) aponta que após anos de previsões otimistas e alarmes falsos, as novas tecnologias de informação e comunicação fazem sentir seus impactos. Nesse sentido, os administradores diante de uma nova forma de gestão passam a se questionar inquietantemente sobre a possibilidade das pessoas passarem a produzir diante de determinadas condições nas quais elas normalmente não estariam motivadas para o trabalho; esse é o grande desafio da atualidade para o ideal de gestão inovadora.

A preocupação com a gestão de pessoas é tema recorrente e de emergência, devido o impacto que as transformações acontecidas pela globalização oportunizaram para o setor organizacional, acirradas pela competitividade e adequação desse trabalhador ao mercado de trabalho, oportunizando assim práticas de uma gestão motivacional que adeque esse trabalhador ao ritmo de produção afinado com o mercado. A autora define gestão de pessoas como: “um conjunto de políticas e práticas definidas de uma organização, para orientar o comportamento humano e as relações interpessoais no ambiente de trabalho” (CARVALHO, 2014).

Sendo assim, o filme Um Senhor Estagiário oportuniza entender esse embate entre saber conduzir uma empresa com moderna gestão de pessoas, fazendo-as produzir, e assim aumentando os números; a startup de Jules apresentou um recorde de vendas. O crescimento que era esperado para um prazo de cinco anos aconteceu em menos da metade desse prazo.  Entendendo que o capital intelectual como é denominado atualmente na moderna gestão de pessoas, seria o elemento que faz a diferença para o efeito competitivo. Conjuntamente a esse capital intelectual e o aumento crescente da produtividade, oportunizando assim o surgimento das questões relativas ao modo de gestão compatível com essa realidade que requer o cuidado com a dignidade e saúde mental do trabalhador.

Articulando com o filme, a gestão da CEO Jules possibilita perceber traços de um possível adoecimento, pelo fato de que os colaboradores entendem que em certas oportunidades não deveriam se aproximar dela, ficando atentos a certas atitudes do seu comportamento, por exemplo, quando a mesma está piscando muito. O que no filme, Jules parece estar a um passo de ter a sua vida pessoal afetada pela exaustiva demanda da sua gestão, contextualizada no capitalismo.

REFERÊNCIAS:

BASSOTI, J. M. (Org.) Uma Nova Gestão é Possível. São Paulo: FUNDAP. 2015. Disponível em:< https://books.google.com.br>. Acesso em: 29 mar 2017.

BARRETO, M. Saúde Mental e Trabalho: a necessidade da “escuta” e olhar atentos. Cad. Bras. Saúde Mental, Vol. 1. Nº 1 jan.-abr. 2009.

CARVALHO, M. F. S. Gestão de Pessoas: Implantando Qualidade de Vida no Trabalho Sustentável nas Organizações. Revista Científica do ITPAC. V.7, n.1, Pub.6, Jan. 2014. Disponível em:< www.itpac.br/arquivos/Revista/71/6 pdf > Acesso em: 03 abr.  2017.

ROCHA, E. R. G. T. Desigualdades Também no Adoecimento: Mulheres Como Alvo Preferencial das Síndromes do trabalho. XVI Encontro Nacional De Estudos Populacionais, Caxambu-MG. 2008. Disponível em: <www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2008/docs.PDF/ABEP 2008_1215.pdf> Acesso em: 23 abr . 2017.

[1] CEO – Sigla Inglesa de Chief Executive – Officer Diretor Executivo, é a pessoa com maior autoridade na hierarquia operacional de uma organização.

 [2] STARTUP – Empresas jovens que buscam a inovação em qualquer área ou ramo de atividade, procurando desenvolver um modelo de negócio escalável que seja repetível.

FICHA TÉCNICA DO FILME: 

UM SENHOR ESTAGIÁRIO

Diretor: Nancy Meyers
Elenco: Robert De Niro, Anne Hathaway, Rene Russo, Andrew Rannells;
País: EUA
Ano: 2015
Classificação: 10

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Saúde mental na graduação em Psicologia – avanços e desafios

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O psicólogo e professor doutor Sérgio Seiji Aragaki, da Universidade Federal do Tocantins fala sobre o ensino da Psicologia e os desafios do acadêmico no território da saúde mental.

Sérgio Aragaki é Doutor em Psicologia Social (PUC São Paulo) e professor do curso de Medicina e do Mestrado Profissional em Ciências da Saúde na Universidade Federal do Tocantins – UFT.

Foto: Katiúscia Gonzaga

(En)Cena – Como trabalhar saúde mental (um tema transversalizado por questões sociais, políticas, econômicas), em um curso que tem orientação biologicista?

Sergio Aragaki – Se eu considerar que o curso de Psicologia tem se diferenciado ao longo das décadas e mais recentemente eu tenho entendido e acompanhado que esse caráter mais biologicista tem perdido um pouco a força, não tanto, mas tem perdido… Acho que tem diversas maneiras de trabalhar a saúde mental e acho que a melhor maneira é essa; transversalizando. Claro que saúde mental é um tema transversal e hoje a gente entende  saúde de uma maneira ampliada, como decorrente de vários determinantes. Por exemplo, saúde hoje implica em boa moradia, boa condição de educação, trabalho, alimentação, enfim ,saúde é resultante de várias coisas e , pra se ter uma boa saúde e consequentemente uma boa saúde mental a gente tem que ter uma boa qualidade de vida. Creio que trabalhar com formação em saúde mental é uma possibilidade que se faz também transversalizando saúde mental em várias disciplinas, não só focada em uma disciplina, é claro que a gente foca na disciplina de psicopatologia, por exemplo, mas eu sei que há outras possibilidades tais como os estágios, o próprio Encena, que eu acho muito bom, enfim há várias possibilidades de se trabalhar com saúde mental.

(En)Cena – O aluno que cursa psicologia sai preparado para trabalhar com a questão das doenças mentais ou é preciso outras especializações?

Sergio Aragaki – Atualmente a gente tem buscado, muitos autores têm optado por falar em portadores de transtornos mentais, não mais em doentes mentais, entendo que doença mental é um termo estigmatizante.

O aluno pode sair, ele deveria sair minimamente preparado para atuar no campo da saúde mental e não mais tanto focado a trabalhar com doenças, com patologias. Quando a gente fala de uma formação mais ampliada, é justamente, por exemplo, formar para o SUS, a gente sabe que a maioria dos psicólogos hoje em dia atuam primeiro no SUS, o grande mercado de trabalho da saúde é junto ao SUS. O que a gente tem visto então é uma melhoria na formação nas grades curriculares, uma preocupação das faculdades de psicologia e outras da área de saúde em melhorar essa formação mais voltada pro SUS, mais voltada para compreensão da saúde e não só das doenças. É obvio que quanto mais o aluno estuda, se ele faz aprimoramento, especialização, mestrado, doutorado, se faz outros cursos, se freqüenta congressos, enfim, tudo isso contribui pra uma melhoria, eu diria assim, minimamente eu considero que os alunos, claro, isso depende de cada experiência, de cada faculdade, cada curso, mas minimamente a impressão que tenho é que eles têm sido formados pra um inicio de atuação, e que deve ser, com certeza, cada vez mais melhorada.

(En)Cena – Em sua opinião, quais são às maiores dificuldades ou desafios para o aluno durante o curso?

Sergio Aragaki – Acho que depende de cada experiência, acho que as experiências são heterogêneas. Se eu considerar que o curso de psicologia é um curso que no meu entender deve levar muito a uma reflexão, a um posicionamento crítico diante da realidade, consequentemente o aluno tem que considerar as questões que são históricas, que são sociais, políticas, econômicas, então essa formação deve ser um pouco mais ampliada também, pra dar boas condições de formação para os psicólogos, seja em que campo de atuação eles forem trabalhar, não só na saúde, mas na área de trabalho, educação e daí em diante… Então, dificuldade é mais de conseguir articular e estar presente em redes que possibilitem esse posicionamento crítico, essa formação mais crítica.

(En)Cena – Fale de sua experiência como professor de psicologia. Quais as suas áreas de atuação profissional?

Sergio Aragaki – Eu sou professor no curso de medicina, e dialogo, sou apoiador da Política Nacional de Humanização… trabalhei durante muito tempo na área de saúde mental. Trabalho a partir da abordagem do Construcionismo Social em psicologia social que é uma vertente crítica em psicologia social. Já ministrei aulas de psicopatologia, hoje atuo no curso de medicina dando aula de psicologia para alunos de medicina e também no mestrado em ciências da Saúde.

(En)Cena – O que chama mais a sua atenção na Psicologia?

Sergio Aragaki – Vertentes brasileiras que vieram se fortalecendo a partir da década de 1980 aqui no Brasil, vertentes que questionam o cunho ideológico da profissão, que fazem com que a gente possa pensar criticamente, se posicionar de uma maneira mais coerente com a população brasileira, com aquilo que nós brasileiros e brasileiras precisamos e entendemos como uma melhor vida, uma melhor saúde, é o que me chama muita atenção na psicologia, pra além de uma psicologia que vai se voltar a um reducionismo psicológico, pra além de uma psicologia que vai se fazer no entendimento do individuo sem considerar de fato as questões históricas , sociais, políticas, econômicas, culturais. Nós temos aí uma ascensão e cada vez mais a possibilidade de um diálogo, de uma formação, de encontros tais como os da Associação Brasileira de Psicologia Social que se baseiam então numa postura latino americana e brasileira de formação em psicologia, e dentro disso, do campo da saúde como eu já disse, muitos psicólogos dialogando com sociólogos, antropólogos, economistas, historiadores, lingüistas, assistentes sociais e outras profissões pra compor então a sua própria formação chegando, inclusive, a questionar algumas fronteiras disciplinares e propiciando uma visão mais ampliada, mais coerente com a libertação, com a  produção de vida.

(En)Cena – Qual importância de discutir e ter espaços como o (En)Cena para tratar questões de saúde mental?

Sergio Aragaki – Creio que são fundamentais iniciativas como o (En)Cena por que se baseia numa postura ampliada, numa postura que percebe que a gente tem que trabalhar com saúde e não com doenças. A partir do momento que a gente trabalha com saúde é obvio que a gente vai trabalhar com doença, com sofrimento, angústias etc. Mas é fundamental  a iniciativa do (En)Cena pois tem essa possibilidade de um diálogo, de dar voz as diferentes pessoas e isso não tendo como marcador prioritário ter ou não ter um problema mental, mas escutá-las na sua diversidade, na sua multiplicidade e reconhecê-las  como cidadãos, cidadãs, acho que isso é  super louvável. Parabenizo.

(En)Cena – Para finalizar, deixe a partir da sua experiência alguma mensagem de incentivo, e/ou um conselho, e/ou sugestão, para os alunos de Psicologia, tanto para aqueles que estão iniciando o curso como para os que estão prestes a se formar.

Sergio Aragaki – A mensagem que eu deixo é pra gente reconhecer que a psicologia tem que ter um compromisso muito sério de melhoria das condições da população brasileira e pra isso é inevitável que a gente reconheça que a gente não é neutro, que as nossas teorias elas são interessadas, elas possibilitam ou uma melhoria da população ou simplesmente processos adaptativos e a conformação, a adequação à realidade, o que, nesse último caso, de adequação e conformação é muito grave, por que você perde a noção histórica do quanto a gente produz ativamente a cada momento a nossa própria história, as nossas  próprias vidas, e isso não sozinhos, mas coletivamente. Então o grande incentivo, a palavra que dou para os acadêmicos é poder de fato investir numa profissão que é séria e que é muito valorizada e que você possam se juntar a nós. (risos)

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Saúde Mental – o desafio da gestão pública

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Ester Cabral é assistente social, especialista em Saúde Pública e Mental, responsável pelo gerenciamento técnico da Saúde Mental no Tocantins. Sua relação com esta área já passa de uma década. Agora, ao assumir a gerência técnica, toma para si o desafio de recompor e fortalecer a política de saúde mental no Estado. Nesta entrevista ao portal (En)Cena, Ester Cabral fala sobre sua trajetória profissional,  investimentos necessários para equipar e melhorar o atendimento aos pacientes com transtornos mentais no Tocantins  e o modelo  da rede de assistência implantado no Brasil. 

Ester em suas atividades profissionais. Foto: Arquivo Pessoal

(En)Cena – Como começou sua relação com a Saúde Mental?

Ester Cabral – Fiz Serviço Social e me especializei em Saúde Pública e Saúde Mental. Comecei em Saúde Mental coordenando o CAPS de Araguaína. No início, o CAPS estava com um problema organizacional na instituição e a Secretaria de Saúde do Estado, na época, passou a gerência do serviço para uma fundação evangélica; então, assumi a gerência por esta fundação, trabalhei por 11 anos como coordenadora do serviço, que virou um serviço de referência aqui no Estado. Depois deste período, saí de lá, porque eu fui para a Psicologia. Tenho esta passagem aí na Psicologia. Tive que mudar de cidade, fui trabalhar no CAPS de Colinas, trabalhei um ano entre o CAPS e o Hospital de Colinas, fazendo estes dois serviços. Depois vim pra cá, para a secretaria, na área técnica de Saúde Mental. Em Junho deste ano, eu assumi a gerência da área técnica de Saúde Mental. Esta área, aqui, nestes últimos oito anos, teve retrocesso muito grande. Nós saímos de coordenação para área técnica. Perdemos muito! Agora a gente está querendo recompor a área. Como é pelo Governo Federal e também pelo Estado, a gente acredita que volta a ser uma coordenação para poder efetivar melhor a política de Saúde Mental. Peguei a gerência em Junho e, desde Janeiro, estamos em processo de Matriciamento nos municípios de pequeno porte, que foi um recurso que o Ministério de Saúde disponibilizou no apagar das luzes de 2010.

(En)Cena – É do PEAD?

Ester Cabral – É do PEAD (Plano Emergencial de Ampliação do Acesso do Tratamento para usuários de Álcool e Drogas), sim. Esse recurso foi de R$ 10 mil para os municípios de pequeno porte. Aqueles que já têm o Pacto assinado, já receberam direto no fundo municipal. Os que não têm o Pacto, o dinheiro veio para a Secretária Estadual, que  repassou para que estes municípios pudessem executar esta ação de Matriciamento. O que é o Matriciamento? Matriciamento é uma ação estratégica que o município faz através de um profissional de Saúde Mental; este profissional vai ser o articulador entre as políticas públicas do município e resolver os casos de álcool, drogas e violência. Então, este matriciador vai fazer, estrategicamente, a rede acontecer nos municípios base deste grupo. É a saúde a partir da Estratégia da Saúde da Família, mas junto com este grupo da Saúde da Família está o grupo do  CRAS, na Assistência Social, nos municípios que têm o CREAS, Conselho Tutelar, Educação, Segurança Pública.

(En)Cena – Contextualizando esta rede…

Ester Cabra – É contextualizando esta rede. Nas cidades que têm população indígena, a pessoa que precisar de atendimento ao indígena também estará presente. Aí, este grupo trabalha os problemas do município, onde cada um também é responsável por uma área. E todos sabem o que estão fazendo. Se for um caso de violência doméstica, eles sabem quem chega primeiro, quem vai dar suporte, quem vai junto e como vai acudir esta pessoa. O agente não pode ir sozinho, tem que ir com agente público. E a educação da rede básica de promoção à saúde, prevenção ao uso do crack, álcool e outras drogas. Então, o matriciamento, a filosofia do matriciamento é essa, a construção intersetorial de redes nos municípios. Porque o Ministério entende e a gente também, que precisamos criar uma estrutura básica no Estado, onde os pequenos municípios saibam o que fazer com os que chegam. O município tem o suporte técnico aqui da nossa secretaria e também dos municípios que tem CAPS. Porque os municípios que tem CAPS são referencia para os pequenos municípios. Então, os casos que chegam e precisam de atendimento especializado, esses casos vão para o CAPS. Hoje nós temos uma rede de CAPS no Estado que cobre oito municípios e seis regiões. Temos dois CAPS II: Araguaína e Palmas e um CAPS AD.

(En)Cena – O de Porto Nacional não é II também?

Ester Cabral – Não. Eles querem ser II, mas ainda não conseguiram fazer essa mudança. Temos um CAPS AD II aqui em Palmas. Nós estamos trabalhando agora na construção, além do matriciamento. Queremos formar três blocos regionais com a atenção de álcool e drogas tanto para os transtornos mentais, quanto para adulto e infantil, em Araguaína, Palmas e Gurupi. Então, já estamos conversando com os órgãos públicos. Araguaína já vai abrir o CAPS AD, agora em Novembro, entrar em funcionamento no mês de Novembro AD III. O CAPS “i”,  em Araguaína, está em implantação. Creio que até o fim do ano a gente abre o  infantil, porque já funcionou, não como CAPS, mas como ambulatório.

(En)Cena – Naquela Clinica de Repouso São Francisco?

Ester Cabral – Não, aquela Clínica de Repouso São Francisco é outro dispositivo que a gente utiliza para internação. Temos 160 leitos em internação para Saúde Mental e agora estamos revendo o convênio, fazendo um novo convênio, onde, destes 160 leitos, 20 deles sejam para álcool e drogas. Estamos fechando o convênio, estamos em fase final de negociação para assinar, para mandar os outros casos que precisam de internação involuntária ou compulsória neste serviço, que é um serviço particular conveniado com o SUS. Mas, hoje, já temos em Araguaína o CAPS AD II, que é a base de onde vai sair o CAPS AD III. E o CAPS “i”, estamos preparando a equipe para fazer este trabalho. Junto a isto, estamos trabalhando em Gurupi; já sensibilizamos o gestor. Eles já enviaram para o Ministério da Saúde para vir o incentivo para a implantação do CAPS AD III lá. Em Palmas, estamos aguardando o gestor, que a gente já conversou várias vezes com ele para que ele assumisse, transformasse o CAPS AD II em CAPS AD III. Mas ainda não conseguimos um parecer favorável dele, eles ainda estão se organizando para isto. O que temos pensando para o Estado são estas três regiões e, junto com eles, estamos esperando o Ministério da Saúde soltar a portaria para ampliação que aí também em Araguaína, Palmas, Gurupi, a gente projeta a Casa de Acolhimento Provisório que, quando a pessoa sai do CAPS ADIII, vai para esta residência para fazer a reinserção social. Temos planos para três Casas de Acolhimento no Estado: em Palmas, Araguaína e em Gurupi. Se nós tivermos cobrindo a região sul, centro e norte, a gente entende que vamos ter um pouco mais de suporte para recebermos estas pessoas que estão com problema e destituídas de estrutura que dê conta.

(En)Cena – Você disse que teremos CAPS AD III, já existe alguma experiência desta, de CAPS no Brasil?

Ester Cabral – Sim. É uma experiência que já existem mais de 15 CAPS AD III no Brasil. CAPS AD III é uma experiência que alguns CAPS AD II fizeram em abrir 24 horas e ser CAPS ad III. Então, no ano passado, o Ministério soltou a portaria instituindo como um serviço contemplado pelo Ministério de Saúde. Nós temos muitos CAPS AD III funcionando no Brasil; nós temos experiência no Pará, Maranhão, na região Norte – estes dois estados – em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul já tem, em São Paulo tem vários, em Minas, quase todos os estados tem este serviço. A região norte é a que menos tem CAPS AD III, mas as outras estão construindo também esta alternativa. Uma vez que só agora, no fim do ano passado, que a portaria do Ministério saiu. Facilita porque tem recurso, né? É melhor trabalhar na lógica do recurso. É o que a gente está tendo hoje. Nós temos uma residência terapêutica em funcionamento em Araguatins, tem seis moradores; essa residência terapêutica é um recurso, uma casa onde as pessoas que perderam o vínculo familiar, por conseqüência da doença,  ficam morando lá. Elas são moradoras desta casa por tempo indeterminado. O Ministério da Saúde está lançando agora no mês de Setembro, já finalizou várias portarias, instituindo outros serviços para área de saúde mental e a gente está aguardando para saber que outros serviços serão estes. O que a gente sabe é Ampliação dessas Casas Terapêuticas Transitórias, que estão sendo chamadas de Unidades Residenciais Terapêuticas Transitórias. Também os aluguéis sociais, esperando recurso maior para trabalhar com a economia solidária, porque não adianta nada a gente tratar a doença, se não houver este suporte social. Sem este suporte social fica inviável qualquer tipo de ação curativa, que nem chega a ser potencializada. A gente precisa potencializar outras ações e a intersetoriedade, que a gente precisa no Estado e não estamos conseguindo.

(En)Cena – Você sente que a formação acadêmica tem faltado algo ou ainda está muito centrada no Modelo Biomédico?

Ester Cabral – É, a gente percebe que a formação acadêmica tem que voltar MUITO nas ações sociais e comunitárias, especialmente no atendimento social e comunitário. Eu creio que tenho que fazer uma conversa maior com a academia dos serviços e das políticas de serviços. Os alunos saem conhecendo um pouco só da política, mas o máximo é ter passado por um estágio em algum dos nossos serviços, mas não têm comprometimento, não tem pesquisa, não tem extensões universitárias que possam potencializar estes estudos nas academias. Se nós tivéssemos uma conversa com a academia, teríamos avanços maiores tanto para quem está saindo como para o serviço e a política, de modo geral. Eu creio que a gente vai fazer esta costura aí. Aqui na gerência, a gente está pensando em colocar, trabalhar em três dimensões: o atendimento do serviço de Saúde Mental, atendimento com Álcool e outras Drogas, atendimento com a intersetoridade. Na intersetoridade, a gente vai ter uma discussão permanente, questão das universidades, conversar com elas, projeto de economia solidaria, atenção básica. Na intersetoridade, inter e intra, nas secretarias que, às vezes, a gente se perde aqui dentro por não ter tempo e nem espaço para essas conversas. A vigilância sanitária, a gente está tendo uma abertura maior, porque nós estamos tendo uma conversa, porque nós estamos precisando estudar a questão dos indicadores, formular pesquisas epidemiológicas na área de álcool e drogas, que a gente não tem, a questão do suicídio. Nós precisamos avançar e nós estamos fazendo esta conversa ainda. Com a atenção básica, tivemos uma conversa a partir do matriciamento, mas a gente precisa avançar, e muito. Os hospitais com os leitos psiquiátricos no Hospital Geral, nós precisamos ter. Hoje nós temos uma unidade só, que é aqui em Palmas. Uma unidade com 10 leitos, que é no Hospital Geral de Palmas. Mas nos outros hospitais do estado não temos. Nós não temos leitos para a Saúde Mental, mas isto é uma conversa que tem que ter dentro das secretárias, intrasetor. Fora das secretarias, temos tido uma conversa com a Secretária de Justiça e de Direitos Humanos, está começando esta conversa, no Ministério Público, está muito difícil.

(En)Cena – Como é que é, eles não compreendem?

Ester Cabral – Compreender até que compreendem, mas é uma questão institucional, porque lá já tem uma superintendência especifica para de álcool e drogas, tem outra visão do tipo de abordagem, então, precisamos costurar esta visão. Ainda está no começo, mas a gente tem tido conversas. Nós participamos do Conselho sobre drogas e, ainda é muito incipiente, gostaríamos de ter avançado mais, até porque nós entendemos que o papel da superintendência seria o de fazer essa articulação política e não apreender. Então, esta articulação política que ainda precisamos construir com eles, ainda precisou fazer, mas ainda não estamos conseguindo, por a questão do tratamento deveria ser com a gente, o atendimento e nós estamos trabalhando para montar esta estrutura de rede. Eles fazem também o discurso do tratamento, mas com outra vertente, outra visão, ideologia. E a gente vai ter que afinar este discurso, nós sabemos que é longo caminho e estamos completamente dispostos a participar dele com todas as nossas dificuldades, todas nossas carências e, principalmente, pessoal, estrutura física. Mas a gente quer participar desta discussão para construir algo que faça sentido dentro da Reforma Psiquiátrica, dentro do conceito da lei 10.216, que é a lei que orienta a ação de Saúde Mental, PEAD, o Plano de Ampliação de Álcool e Drogas e a lei que rege o PEAD, a legislação que rege todo este plano. A gente quer fazer de forma mais clara, mas de trânsito dentro das secretarias nem começamos a discussão. No Conselho da Assistência nem começou uma conversa, já enviou o oficio para que, pelo menos, participassem do matriciamento e sabemos que estão participando. Mas, enquanto instituição, não sentamos para conversar. Fomos ao Conselho de Assistência Social, levamos o assunto, mas não tivemos muito eco nesta inter-relação. Com a Educação também precisamos afinar o discurso; não chegamos ainda pra essa conversa, temos um caminho, aí, muito grande para trilhar. Estamos estruturando a nossa área técnica, estamos esperando os concursados entrarem para saber quem vai compor a nossa equipe para fazer este trabalho acontecer.

(En)Cena – E assim, dentro do matriciamento o que você acha que é dificuldade e potencial?

Ester Cabral – Olha, dentro do matriciamento temos duas dificuldades muito fortes: primeiro, é o entendimento do que é matriciamento, por parte dos gestores e parte da equipe, segundo, encontrar pessoas que teriam perfil para ser matriciadores. Essa foi a grande dificuldade Alguns municípios queriam e querem, mas não tem recursos humanos para fazer isto. Nós recebemos do Ministério uma lista com o nome de três pessoas para cobrirem o Estado e não tem condição. Então, nós mapeamos 25 pessoas, mais ou menos, que a gente achou que teria condição para estar nos ajudando, mas a gente viu que essas pessoas também não tinham tempo, pois estavam em outros processos. Então, o Ministério sinalizou que nós poderíamos pegar pessoas recém-formadas para que pudessem também depois se fixar naquelas cidades. É uma forma de onde poderia interiorizar os profissionais. Então, abrimos  a discussão para o Estado e falamos assim para os gestores: que se conhecesse alguém que pudesse fazer, que contratasse. Não fizeram porque não têm pessoas para fazer e outras que não sabem e nem entendem a importância do matriciamento. Fizemos um trabalho com o Conselho de Secretários do Estado e do Município. O Ministério Público tem nos ajudado muito nesta ação do matriciamento, cobrando que os municípios façam, cobrando os recursos. O CONSEMS tem nos ajudado bastante, pois conscientiza, orienta os municípios. As próprias equipes da Saúde da Família nos ajuda, mas, assim, as dificuldades são muitas e também porque foi uma estratégia que vem tendo sem muita explicação. O Ministério da Saúde mandou a portaria no dia 27 de Dezembro, sem explicar para gente como iria acontecer. Então, todo o entendimento desta portaria, levamos um mês para entender. O Ministério depois mandou o passo-a-passo, fomos entendendo, achamos os municípios para fazer e o resultado é esse: muitos estão com o matriciamento bem avançado e com bom produto, rede. Daqueles municípios que conseguiram realmente implantar desde o inicio, está bem adiantado o processo de construção da rede; tem grupo que conversa, tem grupo de estrategia de ação, nós temos bons planos, apareceram bons planos, outros nem tão bons, mas temos bons planos. Sempre a partir desta disposição que o município teve de contratar recém-formados, outros profissionais que estavam vindo para o Estado agora e os resultados tem sido estes. Infelizmente, a gente não conseguiu alcançar todos, ainda não estamos conseguindo.

(En)Cena – Em questão da supervisão clinica-institucional, como ela tem acontecido?

Ester Cabral – A supervisão clinica-institucional é um programa do Ministério da Saúde para dar suporte técnico e teórico pros CAPS de saúde da Atenção Básica. Alguns municípios mandaram projeto, foi aprovado, receberam recurso e fizeram. Ainda está muito na fase de editais. Quando o Ministério manda um edital, consegue o recurso e faz. O Ministério, no ano passado, soltou uma verba para escola de supervisores institucional e o Tocantins foi contemplado com uma Escola de Supervisores. Estamos ainda em negociação com a Escola de Medicina Tropical. Eu creio que ela comece no próximo ano, agora não tem como. Estou esperando Janeiro até Fevereiro que abra realmente a Escola de Supervisores. A ideia é ter 30 supervisores por turma assim, a gente vai formar a massa crítica, recursos humanos que tenham condição de fazer apoio institucional dentro dos serviços, não só nas três regiões, mas em todas as regiões do Estado, que hoje são 15. Os apoiadores devem ser chamados para escola de supervisores, possam estar ajudando técnica  e teoricamente   estas equipes a trabalharem a temática Saúde Mental e Álcool e drogas.

(En)Cena – Um dado de 2009 indica que  todo ano passam pelo CAPS cerca de 12 mil  pessoas, mas que só 1.904 pessoas são acompanhadas por ano, por quê esta discrepância entre estes números?

Ester Cabral – Na verdade, eles têm uma lógica de atendimento que sejam por nível de atenção. Então, há pessoas que chegam em crise, ela entra no plano terapêutico intensivo, então ela vai para o CAPS todos os dias e fica o dia todo para receber todo o tratamento. Ela tem que receber, no mínimo, 22 procedimentos no mês pelo médico, psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, cuidados de enfermagem, dentre outros programas, oficinas terapêuticas. Quando melhora da crise, sai da crise,  continua indo no Centro,  pode ficar três meses neste intensivo e, se precisar ficar mais, é renovado. O paciente vai para o semi-intensivo, não precisa ir à casa todo dia, vai três vezes por semana. Pode fazer 12 procedimentos por mês. Assim, vai criando autonomia, pode ir uma vez por semana. Então, esta forma progressiva, não diria de alta, mas de autonomia do paciente. Quem olha de fora, pensa que estes estão deixando de ser atendidos, mas não, esta é uma alta acompanhada. Então, essa é uma forma de autonomia, no período que o paciente não está no CAPS, está em outras atividades comunitárias, em curso profissionalizante, se ele tiver condições, estiver com a família ou na escola. Quando vai para o não-intensivo, volta para o ambulatório, onde recebe acompanhamento ambulatorial, que é um serviço que não é feito mais dentro CAPS. Então, a pessoa sai deste número e está no ambulatório, ela está na rede, na rede ambulatorial. Se tiver algum problema, ela pode voltar para o serviço, para o não-intensivo ou para o semi-intensivo ou, caso de crise, para o intensivo. O que acontece é que muitos vão para o ambulatório e perdem consulta, param de tomar medicação e voltam para crise e assim voltam para o serviço; ou, às vezes, é uma forma da família garantir a medicação, é pedir para ficar no não-intensivo, porque pelo menos ele está lá três vezes por semana ou só uma vez por mês, porque moram longe, mas está garantida, ali, a medicação. É isto que a gente tem visto. Aí você vê uma diferença de quem é atendido e quem é acompanhado, por exemplo, no CAPS II que tem 220 por mês, só 45 precisam  de acompanhamento diário; na verdade, o resto precisa de acompanhamento semanal ou mensal, não precisam de acompanhamento diário.

Então, na verdade, o que quando a gente vê algo desesperador nos dados não é tão desesperador, pois é uma progressão do serviço.

Isso, é a lógica do sistema da politica de atendimento. O que a Reforma vem pensar é a ideia de que não precisamos e nem podemos cronificar o doente, nós precisamos, nós temos que desinstitucionalizar. Tivemos aí séculos que a doença mental foi institucionalizada, onde a pessoa é rotulada como doente e tem que estar naquele tratamento eterno. Nós viemos de um processo histórico, de anos de internação, pessoas que viveram 60 anos, viveram uma vida, pessoas que foram internadas crianças e saíram depois que morrerão. Então foram eternos moradores dos manicômios. É isto que a reforma quer quebrar, é a desinstitucionalização da doença mental, porque ele precisa ser tratado na comunidade, em serviços comunitários. Então, ele vai sair da lógica hospitalocêntrica para a lógica do serviço comunitário que quanto menor for o grau de dependência da pessoa com este serviço, melhor indicador que a rede funciona. Se eu estou tendo um grande numero de pessoas sendo acompanhadas, isto significa que em algum lugar o serviço está falhando, agora se o numero do acompanhamento está sendo menor, isto indica que o acompanhamento reintegra na sociedade. Aí entram outros dispositivos, a economia solidária, as associações, os grupos de produção da economia solidária, empreendimentos sociais. Porque a gente sabe que o problema de emprego e renda para esta população é muito mais complicada do que para outra. Para isto, o suporte do serviço é importante. Já a partir do trabalho que é feito dentro do CAPS, pra gerar uma autonomia e uma consciência maior dos seus direitos. Isto é feito por meio das assembleias, que acontecem dentro dos serviços, todos os CAPS precisam ter, gerar este espaço democrático, da construção da cidadania. E construção da ideia que eu tenho direitos. E não é porque sou doente e estou doente e que não tenho direitos, a  garantia da efetivação destes direitos.

(En)Cena – Fico até emocionada com isto! Mas assim, em dados 14% das internações são de álcool e outras drogas, você considera ser necessário um maior investimento nesta área?

Ester Cabral – A questão do álcool e drogas é do momento, é a crise da sociedade no momento, especialmente agora com o crack que, antigamente, a droga era elitizada, quem usava eram os intelectuais, empresários, mas agora não; há uma rede capitalista e capitalizada de distribuição da droga. Então, a sociedade fica assim, sem saber o que fazer. Se pegar os dados de álcool e drogas, você vai ver que a quantidade de álcool é muito, muito maior do que do crack. A questão é que o barulho que o crack faz é muito maior do que o álcool. O álcool é lícito e o crack não. E o prejuízo do crack é muito grande, do álcool também. Como o álcool é lícito, a sociedade aceita até que não atrapalhe a viver. Eu vejo que, assim, está faltando esta intersetoridade, a sociedade parar de se culpar e jogar a culpa no outro. Eu estava conversando com uma mãe, que a gente tem em uma clinica de reabilitação fora do estado. Nós só mandamos por uma questão judicial e lá, nessa noite, ele fugiu. A mãe veio pedir para que o filho fique lá. A família não sabe o que fazer e ninguém sabe o que fazer. Então, temos que juntar forças pra montar uma estratégia do que fazer. Como acudir? Se for montando a rede, a gente está montando, mas não temos garantia que esta rede vai dar certo. Ontem, estava assistindo um videozinho do SENAD, neste filme, a saúde, a educação, o conselho tutelar, o conselho sobre drogas, assistência social, a habitação chamando pra si a responsabilidade. Quando eu puxo pra mim a responsabilidade, estou aumentando a chance de dar certo, mas eu não posso garantir sozinha, porque tenho que construir, montar a rede. Se ainda não tem dado certo é porque não temos uma política única, intersetorial; é para fazer acontecer. A gente ainda tem que limpar a ideologia, nós temos muita ideologia, principalmente no estado do Tocantins, nós temos muita ideologia e pouca ação. Muita gente dizendo: “Só isto aqui que dá certo”, “Não, vocês não fazem”, ”Só fazem se for desse jeito”. Então, a gente está tendo muita ideologia e pouca ação, acho que a gente tem que desmontar o nosso medo de agir, sair de cima do pedestal e começar a sentar em roda e admitir a nossa fragilidade que a gente não tem dado conta e aí temos que fazer alguma coisa e não sair acusando: “Só a gente que dar conta disto”. A gente tem ajuda das comunidades terapêuticas, serviços suplementares, tem muita gente que precisa da saúde. Clínica de recuperação, existem algumas no estado, mas que sequer tem alvará da vigilância sanitária. Como é que eu, como órgão público, vou mandar alguém para um serviço que o próprio órgão não reconhece? Não tem como. Eles podem ser potencializados, mas aí resolve? No afoito de fazer as coisas acontecerem, corre o risco de praticarmos uma ideologia higienista, onde eu vou tirar da rua o que eu não quero ver e esconder dentro de uma clínica. Não é assim, não precisamos voltar à era do manicômio, precisamos encarar, propor ações intersetoriais e a sociedade tem que dar as mãos e resolver, parar de empurrar e esconde-esconde. Nós precisamos é resolver! Então, a gente está vendo…

Ester e sua equipe em reunião de trabalho. Foto: Arquivo Pessoal

 

(En)Cena – Você considera que o Estado ainda vive uma ideia manicomial, porquê parece até que o Estado tem um dos maiores números de leitos no Brasil?

Ester Cabral – Não, é porque no Estado do Tocantins é o único que não tem Hospital Psiquiátrico. Nós temos 160 leitos conveniados, mas que não são do Estado. Nós temos estados aí que tem mais de 4.000 pessoas em clinicas. O que nós temos no Estado é a ideia que só internando resolve, principalmente álcool e drogas. Até que na doença mental já desmontamos bastante esta ideia com o CAPS; já sabem que dá certo, já tem família que pede para ir para o CAPS. Então, isto já está desmontando, mas isto tem o quê? 15 anos. É um trabalho que, agora, com esta questão álcool e drogas, está todo mundo muito assustado e o jeito é tirar de perto. Então, vamos higienizar o ambiente, jogar fora, colocar este povo em um lugar bem escondido e não pode sair de lá. Eu recebi uma demanda judicial esta semana que dizia que queria que eu internasse uma pessoa que cometeu delito, inclusive, por tempo indeterminado. Isto me diz que ele está pedindo uma prisão perpetua e a gente sabe que as casas de custódia, manicômios judiciários são prisões perpétuas. O que estou dizendo? Posso alimentar isto? Não, não posso alimentar isto! E aqui vai uma denuncia que, se a gente não tomar cuidado, vai instaurar no país e é o que a gente tem feito é instaurar prisões perpétuas, nos manicômios judiciários. Na III Conferencia Nacional de Saúde Mental a gente já vem apontando que isto não pode acontecer e a lei 10.216 é muito clara: não podem ter internações indeterminadadas. Não pode colocar a pessoa lá e esquecê-la! Ainda vamos ter que pensar como tratar o louco infrator, o pessoal de álcool e drogas que cometem delito todo dia e comete delito para sustentar a droga. Será que a saúde é só ação de repressão do tráfico? O que pode ser feito? Há uma discussão muito grande da legalização da droga, mas é isto que vai resolver? Legalizar? E o que vamos fazer com isto legalizado? Nós estamos vendo o álcool legalizado. O que acontece? O nosso maior número de problemas é o álcool. Uma discussão que a gente vai ter que fazer mesmo. Sem paixão ideológica, mas com o pé no chão. É isto que está acontecendo hoje.

(En)Cena – Quais as suas dificuldades na gerencia técnica de saúde mental?

Ester Cabral – Hoje a maior dificuldade que a gente está tendo aqui é a estrutura da secretaria para esta gerencial. Nós ainda estamos dependendo de recursos humanos. Hoje eu conto apenas com dois assistentes administrativos. Ontem veio uma assistente social que, possivelmente, vem trabalhar conosco, mas ela ainda está em processo de tomar posse, né? Então, eu ainda não posso contar com ela. Mas ainda preciso de gente! Como técnica, estou sozinha. A gente tinha a Raquel, mas hoje é o seu último dia. Infelizmente, né? É uma perda muito grande para o Estado; ela está indo para outro estado. Mas mesmo com ela aqui, nos já estávamos batalhando. Outra dificuldade que vejo é a estrutura organizacional da secretaria, pois, nós não estamos, porque se você olhar o organograma da saúde, a Saúde Mental e Álcool e outras drogas, nós não estamos. Ela ainda não existe. Nós já conversamos com o secretário, ele está sensível a isto, ele já autorizou que se criasse esta área dentro da estrutura, agora vai depender de muitas coisas, de estrutura física, nós não temos. Você viu, o espaço é muito pequenininho, não temos recursos humanos e não estamos no organograma da saúde, que contemple a Saúde Mental, que é uma área estratégica. Agora, neste ano, que viramos estratégia; uma das ações que o nosso secretário fez que foi louvável: ele nos colocou no gabinete até que esta estrutura aconteça. Isto facilitou muito o processo, porque processos que demoravam seis meses duram, agora, 30 dias. A gente despacha logo com ele, nós não temos que passar pela burocracia. Se eu tenho um problema, já despacho direto com o secretário, então, isto facilitou, mas a gente sabe que isto não é a solução. Foi uma ação emergencial que mostrou uma sensibilidade do secretário com a área, que ele vê a importância e, especialmente, pelo Álcool e Drogas, que há uma secretaria nacional, mas que está ligada a presidente da república. Nós precisamos dar um nível de importância também compatível, junto com isto. Ele já assinou a portaria para o colegiado de Saúde Mental. Quem pertence a este colegiado? O colegiado é composto pelos técnicos das secretarias de saúde, de Saúde Mental, todos os coordenadores de serviço do estado e alguns serviços intersetoriais; nós temos lá o pessoal da área indígena, nós temos gente do hospital, da unidade hospitalar, dos conselhos de saúde e álcool e drogas; este é colegiado. O colegiado caminha junto com a gerência para pensarmos estratégia de Saúde Mental e avaliar as políticas.

(En)Cena – O que considera um potencial para a gerência de saúde mental, aquilo que tem possibilidade de crescer?

Ester Cabral – Eu creio que se a gente trabalhar direitinho o que temos planejado. O que temos esperado é uma Saúde Mental estruturada dentro do estado; a população esteja garantindo a Saúde Mental. Saúde Mental, onde a gente não tenha mais que internar pacientes por crises que, se precisar internar, a gente saiba pra onde mandar e que a população tenha uma gerência de saúde eficaz para cobrir as suas necessidades. A gente está trabalhando no PPA, para colocar recurso, que nem isto a gente tem tanto para especialização. Começa agora em Novembro o segundo curso de especialização de Saúde Mental   para pessoas que são da rede; nós estamos também com outros cursos de atualização para as equipes de unidades da família e dos CAPS; aprimoramento e aperfeiçoamento das equipes de álcool e drogas. Então, a gente quer trabalhar na estruturação da saúde, aprimoramento das equipes e também CONSTRUÇÃO de trabalhos alternativos para os pacientes que são atendidos. A gente conta com a intersetoridade também.

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